UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA MÁRCIO SILVÉRIO FILHO



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Transcrição:

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA MÁRCIO SILVÉRIO FILHO O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO E A INTERVENÇÃO DO SENADO FEDERAL, A TEORIA DA ABSTRATIVIZAÇÃO Palhoça 2012

1 MÁRCIO SILVÉRIO FILHO O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO E A INTERVENÇÃO DO SENADO FEDERAL, A TEORIA DA ABSTRATIVIZAÇÃO Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Patricia de Oliveira França, Msc. Palhoça 2012

2 MÁRCIO SILVÉRIO FILHO O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO E A INTERVENÇÃO DO SENADO FEDERAL, A TEORIA DA ABSTRATIVIZAÇÃO Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina. Palhoça, 07 de novembro de 2012. Patricia de Oliveira França, Msc. Universidade do Sul de Santa Catarina Prof(a). Universidade do Sul de Santa Catarina Prof(a). Universidade do Sul de Santa Catarina

3 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO E A INTERVENÇÃO DO SENADO FEDERAL, A TEORIA DA ABSTRATIVIZAÇÃO Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia. Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico. Palhoça, 07 de novembro de 2012. MÁRCIO SILVÉRIO FILHO

4 "Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver. Amyr Klink

5 RESUMO O presente estudo vislumbra uma abordagem específica relacionada ao dispositivo presente no art. 52, X, da Constituição Federal, do qual se refere à intervenção do Senado Federal nas decisões proferidas pela Corte Suprema do Poder Judiciário em sede do controle difuso de constitucionalidade com o intuito de suspender a lei infraconstitucional viciada. Consequentemente, a abstrativização do controle de constitucionalidade vem à tona por se tratar de uma argumentação que fundamenta a mutação legítima que modifica a interpretação referente a aplicabilidade do referido dispositivo magno. Objetiva-se com o trabalho monográfico, analisar a aplicabilidade do dispositivo constitucional na atualidade, demonstrando os posicionamentos atuais acerca da possível mutação. Introduz-se a referente pesquisa por um todo, partindo dos princípios da Supremacia e Rigidez da Constituição, verificando a origem histórica do controle de constitucionalidade e as influências admitidas pelas constituições anteriores a vigente, procurando uma base para a dissertação acerca dos modelos de controle admitidos no ordenamento jurídico atual. Apresentadas as especificidades de cada instrumento controlador, parte-se para uma análise a respeito da intervenção senatorial, apresentando de forma abrangente as argumentações necessárias para uma melhor compreensão do instituto da abstrativização. Por fim, conclui-se que a mutação constitucional, mesmo que não pacificada no ordenamento jurídico brasileiro, vem sendo utilizada em alguns julgados do Supremo Tribunal Federal apoiado por doutrinadores dos quais defendem a aproximação dos instrumentos controladores, fazendo com que os efeitos das decisões proferidas em sede do controle de constitucionalidade difuso tornem-se vinculantes e erga omnes, algo que até então somente era conferido ao controle de constitucionalidade abstrato. Palavras-chave: Supremacia da Constituição. Controle de Constitucionalidade. Abstrativização. Concreto. Abstrato.

6 LISTA DE SIGLAS CRFB Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 STF - Supremo Tribunal Federal STJ - Superior Tribunal de Justiça EC - Emenda Constitucional CCJ - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade ADC - Ação Direta de Constitucionalidade ADO - Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental RI - Representação Interventiva

7 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 09 2 A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO E A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: CARACTERÍSTICAS DO ESTADO CONSTITUCIONAL... 12 2.1 BREVE DIGRESSÃO HISTÓRICA SOBRE O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE... 2.1.1 O judicial review of legislation norte-americano... 13 2.1.2 O modelo de controle de constitucionalidade austríaco... 15 2.2 ANÁLISE EVOLUTIVA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BRASILEIRO: UMA BREVE HISTÓRIA DE SUAS CONSTITUIÇÕES PASSADAS... 17 2.2.1 Constituição imperial: ano 1824... 17 2.2.2 Constituição da República do Brasil de 1891... 18 2.2.3 Constituição da República Federativa do Brasil de 1934... 19 2.2.4 Constituição da República Federativa do Brasil de 1937... 20 2.2.5 Constituição da República Federativa do Brasil de 1946... 21 2.2.6 Constituição da República Federativa do Brasil de 1967... 21 2.2.7 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988... 22 2.3 CONCEITO DE INCONSTITUCIONALIDADE... 24 2.4 ESPÉCIES DE INCONSTITUCIONALIDADE... 25 2.4.1 Inconstitucionalidade por ação e por omissão... 26 2.4.2 Inconstitucionalidade formal e material... 27 2.4.3 Inconstitucionalidade total e parcial... 29 2.4.4 Inconstitucionalidade originária e superveniente... 29 2.5 MOMENTOS DE CONTROLE... 31 2.5.1 Controle prévio ou preventivo... 31 2.5.2 Controle posterior ou repressivo... 34 2.5.2.1 Controle político... 34 2.5.2.2 Controle jurisdicional... 35 2.5.2.3 Controle Híbrido... 35 13

8 3 MODELOS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE... 36 3.1 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONCENTRADO... 37 3.1.1 ADI - Ação direta de inconstitucionalidade... 39 3.1.2 ADC - Ação declaratória de constitucionalidade... 42 3.1.3 ADPF - Arguição de descumprimento de preceito fundamental... 43 3.1.4 ADO - Ação direta de inconstitucionalidade por omissão... 45 3.1.5 RI - Representação interventiva federal... 46 3.2 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO... 47 3.2.1 Reserva de plenário e maioria absoluta... 49 3.3 O CONTROLE INCIDENTAL DE NORMAS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL... 51 3.4 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONCRETO E SEUS EFEITOS... 53 4 A INTERVENÇÃO DO SENADO FEDERAL NO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DIFUSO... 56 4.1 SEPARAÇÃO DOS PODERES E O SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS... 58 4.2 O PAPEL DESEMPENHADO PELO SENADO FEDERAL NO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE INCIDENTAL... 59 4.2.1 Circunstâncias justificadoras da participação do Senado Federal no controle de constitucionalidade incidental... 61 4.2.2 Resolução do Senado Federal em matéria de controle incidental: natureza jurídica e limites a sua atuação... 62 4.2.3 A (im)prescindibilidade da intervenção do Senado Federal. Estaria o Senado obrigado a Suspender os efeitos? Omissão: Juízo discricionário e político de conveniência e de oportunidade... 64 4.3 ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE CONCRETO DE CONSTITUCIONALIDADE... 66 4.4 OPOSIÇÃO A ABSTRATIVIZAÇÃO DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE... 72 5 CONCLUSÃO... 75 REFERÊNCIA... 79

9 1 INTRODUÇÃO A Supremacia da Constituição Federal frente às normas infraconstitucionais pertencentes ao ordenamento jurídico pátrio torna o sistema controlador de constitucionalidade um instrumento essencial para a garantia de respeitabilidade ao princípio que confere o grau máximo da hierarquia sistemática legislativa a Magna Carta, que tem como seu guardião, a cúpula do Poder Judiciário brasileiro, o Supremo Tribunal Federal. O objeto temático da presente pesquisa busca abordar a intervenção do Senado Federal em sede do controle de constitucionalidade difuso. Intervenção essa, responsável pela suspensão de determinada lei e consequentemente pela conferência de efeito vinculante e erga omnes às decisões proferidas pelo real Guardião da Constituição Federal (STF), quando esse declarar inconstitucional determinada lei ou ato normativo possuidor de vício constitucional, em sede do controle incidental de normas. A moderna teoria da abstrativização do controle de constitucionalidade difuso será da mesma forma abordada pelo fato de fundamentar uma nova tendência de aproximação das características do controle de constitucionalidade difuso ao controle abstrato, principalmente no que tange aos efeitos dos atos decisórios do STF. O presente estudo tem como objetivo verificar a necessidade ou não da intervenção do órgão senatorial em sede do modelo difuso de controle, bem como apresentar a moderna teoria da abstrativização que vem sendo utilizada pelo órgão máximo do Poder Judiciário, ainda que não pacificada, de forma que a decisão proferida incidentalmente no controle de constitucionalidade concreto, no que tange aos efeitos por ela gerados, assemelhe-se a determinadas características presentes nas decisões proferidas em sede do controle de constitucionalidade abstrato. O ato interventivo do Senado Federal presente no art. 52, X da CRFB, demonstra ser objeto de grande relevância no ordenamento jurídico atual, haja vista os divergentes posicionamentos presentes nas decisões judiciais e exposições doutrinárias, fazendo com que não haja um entendimento em comum entre as correntes que defendem de forma antagônica determinada intervenção política. As controvérsias presentes no entendimento acerca da intervenção do Senado Federal e a demonstração da ocorrência de um possível caso de mutação

10 constitucional fundada na não mais utilização do dispositivo presente no art. 52, X da CRFB para fornecer efeitos vinculantes e erga omnes as decisões proferidas pelo STF em sede do controle de constitucionalidade difuso, são os motivos pelos quais levaram o pesquisador a procurar aprofundar-se no tema para realização da pesquisa monográfica. Sendo assim, formula-se o seguinte questionamento: Um órgão investido de caráter político, representado por uma das Casas do Congresso Nacional representante do poder legislativo, possui ainda no ordenamento jurídico contemporâneo competência para suspender determinada norma já declarada inconstitucional pelo Guardião da Constituição? A realização da pesquisa será baseada no método de abordagem dedutivo qualitativo, tendo em vista que a construção monográfica partirá de um todo, como os princípios da Supremacia e Rigidez da Constituição Federal, para que seja realizada uma apreciação referente aos posicionamentos atuais acerca do tema, utilizando-se do método monográfico para a concretização da pesquisa. O trabalho monográfico, baseado na doutrina, legislação, jurisprudência e artigos científicos, terá por esse motivo a utilização da técnica de pesquisa bibliográfica. O estudo desenvolveu-se em cinco seções, sendo a primeira e a última reservadas para a introdução e a conclusão e três seções responsáveis pelo desenvolvimento, as quais visam uma melhor compreensão do tema. A segunda seção parte da exposição dos princípios da Supremacia e Rigidez da Constituição Federativa da República do Brasil, de forma introdutória, apresentando em seguida uma breve digressão histórica acerca do controle de constitucionalidade e suas origens, partindo então para uma apresentação dos textos constitucionais passados, presentes nas constituições brasileiras que antecederam a atual. As diversas formas de inconstitucionalidades também estarão presentes na seção segunda para que seja possível a compreensão do momento do qual deva ser realizado o controle de constitucionalidade, tema que encerra a segunda parte do estudo. A terceira seção será responsável pela apresentação dos modelos de controle de constitucionalidade, presentes na atualidade do ordenamento jurídico brasileiro, especificando primeiramente o controle abstrato e suas variadas ações, das quais põe em prática o exercício controlador concentrado. Em seguida será da mesma forma apresentado o controle de constitucionalidade difuso, suas

11 especificidades, finalizando com os efeitos gerados pelas decisões proferidas em sede do modelo controlador incidental. Por fim, na quarta seção, será exposto o real tema e problematização do trabalho monográfico, tratando-se da intervenção do Senado Federal no controle de constitucionalidade difuso. Serão apresentados os posicionamentos acerca do ato interventivo senatorial, a separação dos Poderes, a demonstração da moderna teoria da abstrativização e os argumentos a favor de sua implementação, finalizando com os argumentos opositores a teoria que aproxima os dois modelos de controle de constitucionalidade, presentes no ordenamento jurídico pátrio. A pesquisa, assim, colabora para um novo ponto de vista acerca do dispositivo constitucional, presente no art. 52, X da Constituição Federal, tendo em vista a apresentação dos diferentes argumentos e posicionamentos acerca do ato interventivo, de forma que fundamente a nova teoria da abstrativização do controle de constitucionalidade difuso e a nova forma de visualização do Supremo Tribunal Federal, referente a aproximação dos instrumentos controladores.

12 2 A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO E A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: CARACTERÍSTICAS DO ESTADO CONSTITUCIONAL A idealização do controle de constitucionalidade parte de uma premissa que está inteiramente conectada ao Princípio da Supremacia da Constituição Federal em relação a todo o ordenamento jurídico, isso quer dizer que, atos normativos, leis, emendas, e todos os demais dispositivos legais infraconstitucionais que regem a sociedade, devem estar sempre enquadrados na mesma lógica instituída pela Carta Magna do país, estando ela no escalão maior da pirâmide hierárquica jurídica. Nesse sentido Alexandre de Moraes declara: Em primeiro lugar, a existência de escalonamento normativo é pressuposto necessário para a supremacia constitucional, pois, ocupando a constituição a hierarquia do sistema normativo, é nela que o legislador encontrará a forma de elaboração legislativa e o seu conteúdo. Além disso, nas constituições rígidas se verifica a superioridade da norma magna em relação àquelas produzidas pelo Poder Legislativo, no exercício da função legiferante ordinária. Dessa forma, nelas o fundamento do controle é o e que nenhum ato normativo, que lógica e necessariamente dela decorre, pode modifica-la ou suprimi-la 1. "A lei promulgada sem observância dos pressupostos constitucionais, não tratava-se de um injusto, nem de um ato estatal viciado, mas de um nada jurídico." 2 A consequência principal da rigidez constitucional de nosso país é o fato de o texto presente neste documento tornar-se lei fundamental e suprema do Estado. Os fundamentos, conferência de poderes e competências governamentais, estarão presentes na Carta Magna, fazendo com que as autoridades somente encontrem tais matérias no documento constitucional. Nenhum tipo de governo, seja ele federal, estadual ou municipal será superior ou soberano, pois estão abaixo hierarquicamente da Constituição, o que faz com que esses poderes tornem-se limitados pelas normas positivadas expressa ou implicitamente no documento constitucional. 3 A conjuntura entre o princípio da Supremacia da Constituição, a Rigidez constitucional e os direitos fundamentais, é o alicerce para que então fosse criado o 1 MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional, São Paulo: Atlas S.A, 2011, p. 729. 2 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Wmf Martins Fontes 2009, p., 288. 3 DA SILVA, José Afonso, Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 31ª Edição, 2007, p. 46.

13 controle de constitucionalidade, instituto que poderá, respeitando as próprias normas da Constituição, modificar e até mesmo suspender, antes ou após sua publicação, dispositivos legais infraconstitucionais "viciosos", presentes nas mais variadas leis e atos normativos que vão de encontro aos fundamentos de validade existentes na norma constitucional. Esse instituto, conhecido como controle de constitucionalidade, é o maior exemplo do que no direito contemporâneo tem-se como pirâmide das normas, pois demonstra a supremacia da CRFB e a total dependência dos demais dispositivos legais para com a Carta Magna. 2.1 BREVE DIGRESSÃO HISTÓRICA SOBRE O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE O controle de constitucionalidade foi desenvolvido através de concepções filosóficas variadas, e os primeiros relatos sobre a criação de institutos similares ao controle, mesmo não havendo uma corte constitucional, foram encontrados na Grécia, por volta dos anos 404 462, porém chamava-se graphe paranomon o que significava dizer (arguição de inconstitucionalidade), fazendo com que cada cidadão se tornasse responsável pela defesa das leis e da Constituição pela qual eram regidos. Porém foi recepcionado de uma forma diferenciada, pois sofriam sanções os atos praticados pelos cidadãos e não as normas, o que ocorria era um meio de fiscalização pelo povo em relação aos seus semelhantes, que de certa forma possuíam atitudes legislativas contrárias as normas da época. 4 2.1.1 O judicial review of legislation norte-americano A primeira notícia que se teve em relação a um modelo de controle de constitucionalidade, do qual seria possível a revisão jurídica de determinada lei, ocorreu no celebre caso Marbury v. Madison, em 1803, nos Estados Unidos. Isso ocorreu quando o juiz John Marshall de forma inovadora até então, no caso concreto citado, realizou uma verificação acerca da constitucionalidade da lei que estava sendo aplicada, decidindo que nessa situação deveria prevalecer o texto presente 4 BATTAGLINII, Mário. Contributi allá Storia del Controllo di Costituzionalità delle Leggi, Dott. Milão: A. Giuffrè-Editore, 1962, p.10 apud PAES, Sara Maria Stroher, Sistema Brasileiro de Controle de Constitucionalidade: origem e evolução, pg. 2 e 3. Disponível em: www2.senado.gov.b. Acesso em: 18 e agosto de 2012.

14 na norma constitucional, pelos motivos já citados no item anterior, sendo eles, a hierarquia e a Supremacia constitucional para com o restante das legislações 5. O controle conhecido hoje como americano, concreto, difuso ou incidental foi criado através desse julgado realizado na Suprema Corte estadunidense, onde o judiciário através de um elemento de controle, somente se pronunciou em ralação ao caso concreto, incidentalmente na demanda entre os famosos autor e réu citados em variadas doutrinas nacionais. A decisão imposta por Marshall somente atingiu as partes pertencentes a esse decisivo processo americano, primeiro exemplo prático do controle de constitucionalidade. 6 João Bosco Marcial de Castro concretiza o célebre caso americano da seguinte forma: No caso Marbury vs. Madison (1803), John Marshall declarou a inconstitucionalidade do artigo 13 da lei 1789, afirmou a incompetência do Tribunal para o exame do caso em concreto e estabeleceu que as partes interessadas buscassem o direito pretendido perante uma Corte de Distrito. Em grau de recurso, se cabível, a questão seria submetida à Suprema Corte. Assentava-se, dessa maneira, o método do controle "difuso" de constitucionalidade, no qual todos os órgãos judiciários, inferiores ou superiores, federais ou estaduais, têm o poder e o dever de não aplicar as leis inconstitucionais nos casos concretos submetidos a seu julgamento. 7 Apesar de ter sido o primeiro sistema controlador de constitucionalidade que se teve notícia, a história do direito constitucional por se tratar de um aspecto jurídico relevante e fundamental para a construção de um ordenamento consistente, demonstra que, não somente o controle de constitucionalidade norte-americano embasou os demais ordenamentos jurídicos contemporâneos, percebendo-se a existência de um modelo de certa forma mais recente, patrocinado pelo jurista e filósofo Hans Kelsen. 5 MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p.1058. 6 BARROSO, Luís Roberto, O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2003, p. 27. 7 CASTRO, João Bosco Marcial de. O controle de Constitucionalidade das Leis e a Intervenção do Senado Federal. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2008, p.24.

15 2.1.2 O modelo de controle de constitucionalidade austríaco A amplitude de abrangência das normas constitucionais, fez com que o controle de constitucionalidade não permanecesse limitado tão somente ao modelo concreto, responsável por uma análise incidental das normas presentes em determinada demanda, do qual somente geraria efeitos entre os litigantes. Por esse motivo, um novo modelo controlador surgiu no início do século XX, com o jurista e filósofo austríaco Hans Kelsen, controle esse que seria positivado no ano de 1920 na Constituição austríaca, e por esse motivo, ainda nos dias de hoje conhecemos o instrumento controlador pelo nome de controle austríaco. 8 O novo modelo, conhecido também por concentrado, ou até mesmo por via de ação, foi constituído com a ideia de se criar um órgão ou tribunal superior onde fosse concentrada uma competência exclusiva para julgamentos de ações que versassem única e exclusivamente a respeito de matérias constitucionais. Nota-se que o novo instrumento controlador possui uma certa disparidade quanto ao originário (americano), pelo fato de na nova modalidade, quando verificado um conflito entre determinada lei ou ato normativo em face da Constituição, o remédio a ser utilizado seria uma ação direta, onde somente seria debatido e julgado o ponto conflitante entre os dois institutos. 9 Entretanto, a principal diferença notada entre os dois institutos está relacionada ao efeito das decisões impostas. No controle por via de ação ou concentrado, nota-se que a partir do momento em que uma lei é julgada inconstitucional, mostrando uma certa incompatibilidade junto a Constituição, necessariamente essa lei deverá ser removida, excluída do ordenamento jurídico da qual pertença, de forma total ou parcial. A partir do momento em que determinada lei ou ato normativo é excluído através do controle por via de ação, gera-se um efeito perante toda a sociedade regida pela Carta Magna, conhecido como efeito erga omnes, passando a não mais existir no mundo jurídico-social daquele estado. 10 Insta destacar que o controle concentrado sofreu algumas alterações com o passar do tempo. Como bem diz a nomenclatura, de forma redundante, esse 8 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 309. 9 BARROSO, Luís Roberto, O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2003, p. 41. 10 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo:Saraiva, 2012, p. 241.

16 controle estava concentrado nas mãos do governo federal, já que era ele o único órgão competente para a propositura da ação controladora. Por esse motivo percebe-se uma reforma significativa, principalmente na Constituição austríaca, relacionada aos entes competentes para o levantamento frente ao estado quanto a determinado conflito entre a Constituição e as normas infraconstitucionais, pelo fato de não mostrar-se como o instrumento mais adequado à preservação dos direitos fundamentais dos indivíduos, abrangendo assim um número maior de entes competentes para tal proposição. 11 Paulo Bonavides bem disserta acerca desta determinada evolução: O sistema, interditando aos cidadãos tal iniciativa, não era dos instrumentos mais adequados a uma defesa direta das liberdades e direitos individuais. Com a reforma constitucional de 1929, a legitimação para suscitar a controvérsia sobre a constitucionalidade, reservada até então com exclusividade a órgão político do Governo Federal, foi dilatada também a órgãos judiciários ordinários, como o Oberster Gerichtshof e o Verwaltungsgerichtshof, que no entanto somente podiam atuar pela via "incidental" ou de "exceção", fazendo assim o sistema austríaco tomar, segundo Cepelletti, um caráter híbrido, com hibridez consistindo na presença de uma via de exceção paralela à via de ação. 12 A garantia dos direitos fundamentais de cada cidadão é a essência principal de qualquer documento constitucional, independente do país em que ela seja publicada, e por esse motivo, nota-se que a evolução do controle constitucional concentrado vai ao encontro da ideologia presente na Carta Magna, abrangendo assim um número maior de entes competentes para o ajuizamento de ações diretas de inconstitucionalidade. 13 Porém, somente essa evolução não se mostrou suficiente, fazendo com que, a partir de então, fosse criado em algumas constituições espalhadas pelo mundo, um sistema onde estivessem incorporados os pontos principais de cada controle existente até então. A essa criação deu-se o nome de controle de constitucionalidade Misto, uma inovação que viria a revolucionar futuramente o sistema de controle constitucional de todas as Constituições. Um dos exemplos fundamentais dessa evolução para um sistema de controle misto é a própria Constituição brasileira, que engloba os dois institutos, 11 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 310. 12 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 310. 13 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo:Saraiva, 2012, p. 248

17 tanto na forma de controle difuso quanto por ações, visto que o documento constitucional brasileiro possui uma grande gama de ações diretas de inconstitucionalidade (Ação direta de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Representação Interventiva, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental). 14 2.2 ANÁLISE EVOLUTIVA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BRASILEIRO: UMA BREVE HISTÓRIA DE SUAS CONSTITUIÇÕES PASSADAS Apesar de nos dias de hoje, a Lei Maior de o estado brasileiro adotar o sistema misto de controle de constitucionalidade, nem sempre foi essa sua ideologia guardiã constitucional, passando por uma grande evolução sistemática, onde por influência do direito francês, pode-se até mesmo perceber a falta desse instituto na Constituição Imperial, primeira da história constitucional deste país, porém voltando a aparecer na Constituição seguinte. 2.2.1 Constituição imperial: ano 1824 A palavra império nos remete a figura do Imperador, principal responsável pela organização do país onde exerce sua soberania. E é justamente por esse motivo que a Lei Maior brasileira do ano de 1824 impede a fiscalização constitucional, através de um órgão jurisdicional, pois cabia tão somente ao Imperador a função de solucionar determinados conflitos que iam de encontro a Constituição primeira do Estado brasileiro. 15 A respeito da Constituição Imperial Brasileira, Clèmerson Merlin Clève informa: O dogma da "soberania Parlamentar", a previsão de um Poder Moderador e mais a influência do direito público europeu, notadamente inglês e francês, sobre os homens públicos brasileiros, inclusive os operadores 14 MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p.1058. 15 BULOS, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao Alcance de Todos, São Paulo, Saraiva, 2ª Ed., 2010, p. 166.

18 jurídicos, explicam a inexistência de um modelo de fiscalização jurisdicional da constitucionalidade das leis no Brasil no tempo do Império. 16 Desde os primórdios constitucionais, percebe-se a influência política que recebe o instituto do controle de constitucionalidade, algo de certa forma compreensível para a época, porém algo que insiste e perdura até hoje no controle de constitucionalidade difuso, porém, através do Senado Federal. 17 2.2.2 Constituição da República do Brasil de 1891 Ao final da fase imperial brasileira uma das principais consequências notada foi a diminuição das influências jurídicas europeias. A Constituição Republicana brasileira substituiu suas fontes influenciadoras e realizou uma compilação das normas constitucionais norte americanas, vindo a inaugurar a presença do instituto de controle constitucional no Brasil, permanecendo no ordenamento jurídico pátrio até os dias de hoje. Na Magna Carta republicana o constituinte fornece a competência única para o julgamento de determinada lei confrontante com a CRFB ao Supremo Tribunal Federal, onde através de análise do recurso extraordinário, julgaria de forma incidental a convergência existente. 18 No ano de 1894, ainda na vigência da Constituição republicana, a Lei nº 221, de 20 de novembro, foi criada para fundamentar de forma mais ampla o novo sistema de controle de constitucionalidade adotado pelo legislador brasileiro, presente no seu art.13 10: Os juízes e tribunais apreciarão a validade das leis e regulamentos e deixarão de aplicar aos casos ocorrentes as leis manifestamente inconstitucionais e os regulamentos manifestamente incompatíveis com as leis ou com a Constituição 19 Percebe-se, a partir de então, uma transformação significativa no sistema de controle constitucional pelo fato de o grande responsável pela análise jurídica 16 CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 1995, p. 63-64. 17 CASTRO, João Bosco Marcial de. O controle de Constitucionalidade das Leis e a Intervenção do Senado Federa. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2008, p.59. 18 BULOS, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao Alcance de Todos, São Paulo, Saraiva, 2ª Ed., 2010, p. 166. 19 MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1086.

19 agora passar a ser um órgão jurisdicional, retirando das mãos do governo o poder de revisão e possível exclusão de normas confrontantes com a carta magna. 2.2.3 Constituição da República Federativa do Brasil de 1934 A Constituição publicada no ano de 1934 vem de certa forma revolucionar o instituto do controle de constitucionalidade brasileiro, pois foi responsável por diversas inovações políticas e jurídicas presentes na Magna Carta pátria. 20 Com a finalidade de garantir a segurança jurídica dentro do instrumento de controle de constitucionalidade, o constituinte, no art. 179 do documento constitucional da época, ordenou que, para que determinada lei ou ato normativo fossem declarados inconstitucionais, esta declaração deveria ser realizada por intermédio da maioria absoluta dos membros do tribunal. 21 Outra inovação relevante criada pela segunda Constituição Republicana brasileira foi a implementação da "declaração de inconstitucionalidade para evitar a intervenção federal", onde foi conferida ao procurador geral da república a competência para propositura de tal declaração (ação de inconstitucionalidade), quando verificadas ofensas aos princípios e direitos fundamentais consagrados na norma constitucional. 22 Dessa forma, percebe-se que a partir de então, o Brasil passa a adotar um novo modelo de controle constitucional em conjunto com o controle incidental, o modelo através de ação, onde o objeto de tal demanda seria única e exclusivamente a possível inconstitucionalidade existente em determinada norma infraconstitucional, alegada na representação interventiva do Procurador Geral da República. 23 Porém, a inovação que mais importa ao presente trabalho monográfico está relacionada à intervenção do Senado Federal, onde a partir de então para que uma norma fosse suspensa no todo ou em parte, quando já declaradas inconstitucionais pelo poder judiciário, seria necessária tal intervenção senatorial, tornando-se tal Casa Legislativa, a responsáveis pela ampliação dos efeitos perante 20 BULOS, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao Alcance de Todos, São Paulo, Saraiva, 2ª Ed., 2010, pg. 166. 21 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo:Saraiva, 2012, p. 247. 22 MENDES, Gilmar. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p.1087. 23 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 328.