A C Ó R D Ã O T E R C E I R A T U R M A. COMPETÊNCIA. BENEFÍCIOS DECORRENTES DA RELAÇÃO DE EMPREGO. A Justiça do Trabalho é competente para julgar não só questões diretamente relacionadas ao vínculo de emprego, mas também outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, entre elas naturalmente se alinhando questões relativas aos benefícios proporcionados pelo empregador, ou seja, em virtude do contrato de emprego. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário, em que são partes HELIO TEIXEIRA DA SILVEIRA, como recorrente, e BANCO VR S.A. e UNIBANCO UNIÃO DE BANCOS BRASILEIROS S.A., como recorridos. Inconformado com a r. sentença de fls. 149/151, proferida pela MM. Juíza Valéria Couriel Gomes Valladares, na 3ª Vara do Trabalho de São Gonçalo, que julgou improcedente o pedido, recorre ordinariamente o autor, pelas razões expostas na peça de fls. 155/161. Pretende o recorrente indenização por danos morais, por 3738 1
alegada situação que lhe gerou constrangimentos e humilhações. Autor dispensado do recolhimento de custas às fls. 151. Contrarrazões do UNIBANCO às fls. 164/169 e do BANCO VR às fls. 173/178, com preliminar de incompetência desta Especializada. É o relatório. VOTO de admissibilidade. CONHECIMENTO Conheço do recurso, uma vez preenchidos os pressupostos PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA O primeiro réu (BANCO VR S.A.) argui a incompetência desta Especializada para julgar a matéria, sob a alegação de que não existe uma relação de trabalho entre o BANCO VR e o autor, mas sim, uma relação de consumo entre um prestador de serviço e o consumidor, o que, por si só, afasta a competência da Justiça do Trabalho. Contudo, não merece acolhida a preliminar. A Justiça do Trabalho é competente para julgar, não só questões diretamente relacionadas ao vínculo de emprego, mas também "outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho", entre elas naturalmente se alinhando questões relativas aos benefícios proporcionados pelo empregador, ou seja, em virtude do contrato de emprego. É o que prevê o art. 114 da Constituição da República, com a nova redação que lhe deu a 3738 2
EC nº 45. In casu, o fato a que o autor se refere deriva da relação de emprego que foi mantida com o segundo réu (UNIBANCO), que forneceu a seus empregados o cartão SMART VR (destinado à aquisição de gêneros alimentícios em mercados conveniados), com administração do primeiro réu (BANCO VR), competindo, pois, à Justiça do Trabalho processar e julgar a presente ação. MÉRITO O autor, empregado do segundo réu (UNIBANCO), alega haver passado por situação constrangedora e humilhante, ao ter tido recusado por diversas vezes o seu cartão VR SMART, administrado pelo primeiro réu (BANCO VR) e fornecido por seu empregador, quando tentou efetuar pagamento de sua compra de gêneros alimentícios em um supermercado conveniado, apesar de ter saldo no valor de R$ 140,07. Sustenta fazer jus a indenização por dano moral decorrente desse fato. Afirma que somente pôde pagar as compras, que somavam R$ 151,46, com o dinheiro que sua companheira lhe trouxe, retornando à sua residência muito abalado, tendo em vista que está em auxílio-doença, com problemas de ordem psicológica e psiquiátrica, devido aos assaltos que sofreu na agência onde laborava. Explica que o MM. Juízo a quo cometeu equívoco ao entender que se tratava de um cartão de débito que, evidentemente, tem que ter saldo para se comprar. Segundo o recorrente, o cartão de alimentação do primeiro réu pode ser utilizado independentemente do saldo, porque se pode complementar o saldo disponível com dinheiro ou outra forma de pagamento. Apesar disso, acrescenta que, no caso em tela, o cartão foi recusado por cinco vezes. 3738 3
Data venia, merecem acolhida as razões do recorrente. Não há dúvidas de que o UNIBANCO creditou ao autor os valores que eram devidos, fato incontroverso, em cartão administrado pelo BANCO VR, para compra de gêneros alimentícios. Ocorre que o autor não conseguiu realizar suas compras por meio do benefício concedido por seu empregador, embora houvesse saldo no cartão, ficando retido no caixa, vivenciando uma situação de constrangimento e vergonha, conforme se vê das declarações da testemunha de fls. 129, que presenciou o acontecido:...quando viu uma confusão com o sr. Hélio, esclarecendo que este se encontrava no caixa;...que o reclamante estava discutindo com o caixa dizendo que havia crédito e o caixa dizia que não havia e apertava a luz para chamar o responsável para a solução do problema; que parou em razão do tumulto que ocorreu no local pois viu o guarda ao lado do reclamante... Analisando o histórico narrado e confrontando-se os documentos de fls. 26/27, tem-se que, em 04/07/2007, após verificar o seu saldo no valor de R$ 141,78, o autor realizou um pagamento de compras no valor de R$ 1,71, restando um saldo de R$ 140,07. Na sequência da transação, houve nova tentativa de pagamento com o cartão, no mesmo estabelecimento, só que desta vez no valor de R$ 145,00, negada por falta de saldo, já que, como dito anteriormente, o cartão só tinha um saldo de R$ 140,07. Logo em seguida, verifica-se mais três tentativas de pagamento, nos valores de R$ 140,07, R$ 140,00 e R$140,00, levando à informação de cartão sem saldo. Ou seja, mesmo havendo saldo suficiente ao débito desses valores, houve a negativa do cartão, como se vê do documento de fls. 27. 3738 4
Em sua defesa, alega o primeiro réu (Banco VR) que houve um problema operacional pelo mau uso do cartão, com sensibilização de saldo pelo não encerramento da operação, trazendo em seu socorro explicações desprovidas de robusta demonstração, sendo certo que não se cogita de operações bancárias de conhecimento geral; vale dizer, não há a necessária robustez no conjunto probatório. O que há de certo é que o empregado não pôde realizar suas compras naquele momento, não dispondo do benefício oferecido por seu empregador, restando provado que o problema somente foi resolvido com a chegada da esposa do recorrente, que pagou a compra em dinheiro. Configurada, pois, a situação vexatória e constrangedora perante terceiros, que na versão do autor até demandou a presença de segurança do estabelecimento. Nesse caso, tenho por caracterizada a dor moral e, por conseguinte, configurado o dano moral passível de indenização. Quando se fala em indenização no caso dos autos não se cogita do ressarcimento propriamente do dano, mas na fixação de uma quantia simbólica, a fim de refazer psicologicamente a dor do ofendido, e impingir aos reús a reflexão e a conscientização da necessidade de adoção de medidas, até mesmo informativas, que evitem situações como essa. A indenização de que aqui se fala, portanto, tem adornos distintos da concepção originária ou ordinária de que desfrutamos. Tem ela, no plano do empregador e do Banco conveniado, um caráter punitivo, assim encarado pela busca, com a condenação, de uma recomposição patrimonial, com uma conduta ou caráter educativo e/ou corretivo, no sentido de adotar eficientes medidas de prevenção de situações como essa. De outro lado, e agora no plano do ofendido, oferece-se a ele algo com caráter compensatório, mas não no sentido que nos é de prática e conceituação cotidiana, mas na 3738 5
acepção do estabelecimento de um estado de prazer, em contrapartida ao mal sofrido. Não se cria ou estabelece, portanto, compensação aritméticomatemática e/ou economicista, como vulgarmente nos é dado pensar. A sutileza da situação, portanto, impõe raciocínio diferente, não se perdendo de vista que o empregador tem responsabilidade sobre os benefícios que oferece a seus empregados. Diante disso, merece ser provido o apelo, para condenar os réus ao pagamento de indenização por dano moral de R$ 1.400,00 (hum mil e quatrocentos reais), valor que ora arbitro seguindo os critérios de prudência e proporcionalidade sugeridos pela doutrina e jurisprudência. Pelo exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, para condenar os réus ao pagamento ao recorrente de indenização por dano moral no valor de R$ 1.400,00 (hum mil e quatrocentos reais), com reversão da sucumbência. Custas de R$ 28,00, pelas recorridas. A C O R D A M os componentes da E. Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para condenar os réus ao pagamento ao recorrente de indenização por dano moral no valor de R$ 1.400,00 (hum mil e quatrocentos reais), com reversão da sucumbência. Custas de R$ 28,00, pelas recorridas. Rio de Janeiro, 02 de dezembro de 2009. CARLOS ALBERTO ARAUJO DRUMMOND Relator rlsr 3738 6