Greenpeace Brasil Rua Fradique Coutinho, 352 São Paulo - SP - 05416-000 Ao Ministério de Minas e Energia pde2024@mme.gov.br São Paulo, 7 de outubro de 2015 Ref.: Contribuições do Greenpeace Brasil para aprimoramento da proposta apresentada para o Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2024 Seguindo o disposto na Portaria nº 445, de 15 de setembro de 2015, o Greenpeace Brasil apresenta os seguintes pontos para aprimoramento da proposta apresentada para o Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2024: Primeiramente, manifestamos nosso desacordo com o período disponibilizado para contribuições ao Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2024. Dada a extensão do documento (466 páginas), o prazo de 21 dias corridos não é suficiente para analisar todas as informações contidas no mesmo. Antes de dar início à análise da questão energética propriamente dita, é importante ressaltar que, mais uma vez, as premissas macroeconômicas apresentadas (página 20) precisam ser revistas. Apesar de o PDE 2024 haver reduzido a previsão de crescimento do PIB de 4,3 para 3,2% a/a, a nova estimativa continua em desacordo, pelo menos nos anos de 2015 e 2016, com a análise econômica de outras instituições, notadamente do próprio Banco Central, cujo último Boletim Focus, publicado em 02 de outubro de 2015, indica um crescimento atual do PIB de -2,85% e a previsão de que, em 2016, a média ficará em -1%. Geração de Eletricidade - Solar, Eólica, Biomassa e PCHs Página 76/91/93/95/435/440 - A capacidade instalada e a oferta de energia para as fontes eólica, solar, PCH e biomassa são apresentadas de forma agregada. Tal formato deve ser revisto, pois é importante que a capacidade dessas usinas seja demonstrada de forma individual, para melhor análise dos dados. Página 92 - O Plano menciona sobre as centrais heliotérmicas que deve-se ressaltar as vantagens dessa tecnologia quando associadas a armazenamento térmico de energia. Elas podem servir como complemento às fontes renováveis intermitentes, como eólica e fotovoltaica, além da capacidade de atendimento às demandas máximas requeridas pelo SIN. Apesar disso, o Plano não considera a inserção de tal tecnologia em nossa matriz no cenário decenal e deveria fazê-lo, ainda que nos anos finais do horizonte de projeção. Página 96 - Apenas por meio do Gráfico 29 é possível avaliar a expansão da capacidade instalada das fontes eólica, PCH, biomassa e solar. A apresentação desagregada por fonte deveria ser adotada em todo o Plano.
Página 96 - De acordo com o Plano, são previstos 7 GW de energia solar fotovoltaica instalados até 2024. Dado que nos últimos dois leilões, já foram contratados 1.723 MW e que há mais um leilão previsto para ocorrer ainda em 2015, o Plano se mostra pouco ambicioso para a fonte. Isso porque a previsão de 7 GW em 2024 significa a contratação de 5.277 MW até 2021, ou seja, menos de 900 MW por ano. Sugere-se que haja alteração para que a previsão decenal seja equivalente, no mínimo, à soma da contratação média anual que a fonte teve entre 2014 e 2015. Página 96 - De acordo com o Plano, são previstos 24 GW de usinas eólicas instalados até 2024. Considerando o que o país já tem hoje - entre empreendimentos em operação e empreendimentos em construção ou contratados - um total de 17,7 GW da fonte, há previsão da adição de somente 6,3 GW até 2021. Isso representa uma contratação de cerca de 1 GW por ano, um retrocesso em termos de contratação média anual em relação ao que é visto hoje para a energia eólica. Página 119 - As estimativas de investimentos na geração de energia também consideram de forma agregada os valores para as fontes eólica, solar, biomassa e PCHs. Assim, o Plano inviabiliza a análise detalhada para essas fontes e tira a clareza e transparência do planejamento. Além disso, a apresentação de forma agregada faz parecer que os investimentos são maiores do que em relação ao das outras fontes, mas isso somente porque o valor é dado para um conjunto e não de forma individual. Página 440 - As PCHs deveriam ser consideradas junto à fonte hidráulica, ou como uma subdivisão dela, já que se tratam de usinas hidrelétricas. Geração Distribuída & Energia Solar Fotovoltaica Página 381/382 - No tocante à geração distribuída, sobretudo com relação à energia solar fotovoltaica, a nova projeção apresentada limita-se a incorporar a previsão contida na nota técnica 19/14 da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), no cenário de alteração do Convênio do ConFaz que trata da incidência de ICMS na eletricidade oriunda de micro ou minigeração, o que de fato ocorreu em abril deste ano. O plano, contudo, desconsidera as ações previstas no próprio bojo do Governo Federal. Dentre elas, destaca-se a revisão da resolução 482/12, da ANEEL, que tem potencial de fazer com que tenhamos 2GWp de potência instalada em sistemas fotovoltaicos até 2024. Eficiência Energética Página 372 - Analisando comparativamente o PDE 2024 e o PDE 2023, percebe-se que o Plano proposto prevê um percentual de energia conservada menor do que o do plano anterior (4,7% no atual contra 5,2% do anterior). O potencial de eficiência energética deveria ser revisto e o Plano deveria impulsionar a adoção de medidas para que o sistema alcançasse um patamar de eficiência mais ambicioso e não mais tímido do que o do Plano anterior. Página 374 - Analisando comparativamente o PDE 2024 e o PDE 2023, percebe-se que no horizonte do Plano proposto a intensidade energética é maior do que no PDE 2023 e o consumo per capita é menor do que no PDE 2023. A conclusão de que teremos uma intensidade energética maior, com um consumo per capita menor deveria ser explicada à luz do que se pretende implementar no País com relação à eficiência energética.
Página 375 - O Plano apresenta a eficiência energética na indústria, com alguns indicadores, mas não menciona que o percentual de energia conservada e de eletricidade conservada são menores do que no PDE 2023. O Plano também não menciona e não explica os aumentos nas intensidades energética e elétrica para o setor industrial em relação ao PDE 2023. Nesse sentido, não se veem avanços em termos de eficiência energética. Página 376 - O Plano também alterou para baixo a eficiência energética no setor de transportes em relação ao que era previsto no PDE 2023 (3,9% no Plano proposto contra 5,4% no PDE 2023). Assim, o Plano não pode apresentar os dados como ganhos de eficiência calculados para o setor de transportes. Hidrelétricas na Amazônia Página 85 - De acordo com a Tabela 42, o Plano considera a entrada em operação de diversos grandes empreendimentos hidrelétricos que ainda não passaram por processo de avaliação e licenciamento ambiental. Essa metodologia deveria ser revista para os grandes empreendimentos hidrelétricos, para considerar apenas empreendimentos que estejam aptos à licitação e assim ter sua entrada em operação planejada, dada a complexidade de avaliação ambiental dos mesmos e considerando que podem ser considerados não aptos à outorga das Licenças. Página 85 - De acordo com a mesma tabela, a maior parte da expansão hidrelétrica planejada situa-se na região Norte e, caso seja efetivada, incorrerá em graves e irreversíveis impactos socioambientais. Isso deveria ser considerado no planejamento energético do país e a informação deveria ser disposta de forma explícita, pois é relevante à sociedade brasileira. Página 85 - Ainda de acordo com a tabela 42, a UHE São Luiz do Tapajós tem entrada em operação prevista em 2021. Considerando o sistema de contratação por leilões e que esse empreendimento deve ter tempo de construção de ao menos 5 anos, entende-se que o Plano prevê a realização de uma leilão de contratação em 2016. Isso precisa ser revisto, já que, ainda não foi realizada consulta prévia livre e informada às populações potencialmente afetadas, condição essencial para o licenciamento do empreendimento. Página 87 - O Plano menciona Devido às dificuldades na obtenção de licenças ambientais, a expansão do sistema conta com apenas três usinas hidrelétricas com reservatórios de acumulação [...] e depois os inventários hidrelétricos apontam projetos importantes que poderão ser viabilizados nos próximos anos, a despeito da crescente complexidade socioambiental [...]. Esse parágrafo traz desinformação à população, pois leva a crer que o único problema do sistema é a dificuldade do licenciamento ambiental, sem nada dizer sobre o fato de que muitos empreendimentos não são licenciados exatamente por causarem graves impactos socioambientais. Esse posicionamento precisa ser revisto, pois é dever do Governo e, assim, do PDE, informar corretamente os impactos associados a esses empreendimentos e a importância de se conduzir de maneira cuidadosa o processo de licenciamento ambiental. Página 392/393 - Complementando a exposição feita no item anterior, também aqui o Plano não cumpre seu papel de informar a sociedade. Nessas páginas, fica implícita como certa a entrada em operação de usinas hidrelétricas que ainda não obtiveram suas licenças
ambientais e não considera a possibilidade de que alguns empreendimentos podem não cumprir com os requisitos para obter as licenças. Menciona, ainda, a morosidade no processo de licenciamento ambiental como algo decorrente, dentre outros fatores, das solicitações de complementações de estudos. Omite-se, contudo, no caráter crucial de tais exigências para uma avaliação cuidadosa de empreendimentos complexos e com potencial de gerar impactos socioambientais irreversíveis. Além disso, o próprio Plano menciona que alguma usinas planejadas em áreas com interferência em Unidades de Conservação e Terras Indígenas, mesmo com estudos em andamento, não têm a entrada em operação prevista no horizonte decenal, por conta da complexidade de seus processos de licenciamento ambiental. Isso deveria valer para a totalidade de usinas hidrelétricas que se encontram na mesma situação, como é o caso da Usina Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós e que mesmo assim continua no Plano. Página 396 - No trecho Em relação às terras indígenas, nenhuma UHE planejada interfere diretamente em TI não fica claro o que o planejador entende por interferência, uma vez que o empreendimento da UHE São Luiz do Tapajós, por exemplo, se construído, deve alagar parte da Terra Indígena Sawré Muybu e alguns locais sagrados para a etnia Munduruku - estimados em 12 mil pessoas. Os impactos também atingirão indígenas de outras etnias, ribeirinhos, colonos e residentes urbanos. Biocombustíveis Páginas 65 e 66 - o documento não considera aumento substancial na utilização do biodiesel adicionado ao diesel. A participação do energético deveria ser revista para cima, caso se queira caminhar para uma matriz energética renovável, com avanços principalmente no setor de transportes, que é um dos grandes consumidores de energia do país (28,6% do consumo) e com dependência elevada de combustíveis fósseis. O próprio Plano menciona que alguns setores, interessados em diminuir as emissões de GEE, verão nos biocombustíveis uma alternativa viável, mas isso não foi considerado nas projeções e seria pertinente que o fosse. Página 70 - O Plano revisa para baixo a expansão da demanda de etanol no setor de transportes, em benefício do consumo de gasolina. A revisão é um retrocesso se o país pretende caminhar para uma matriz energética mais renovável e deixa de considerar o potencial brasileiro para a produção desse combustível. Página 440 - Além do fato de que 70,6% dos investimentos são destinados para o setor de Petróleo e Gás Natural ser um verdadeiro despropósito para a descarbonização da nossa matriz, apenas 2,6% dos investimentos são direcionados para os biocombustíveis. Em termos absolutos, os investimentos em Biocombustíveis caíram de R$82 bilhões no PDE 2023 para apenas R$39 bilhões no Plano proposto. Essa indicação vai contra os planos do País para contribuir com o combate às mudanças climáticas e que serão levados à Conferência das Partes (COP), em dezembro próximo, o qual prevê o aumento das fontes renováveis na matriz energética para 45% em 2030, ao invés dos 40% atuais. Página 471 - A oferta de etanol prevista, de 46 bilhões de litros em 2024, é inferior àquela prevista no PDE 2023, que era de 48 bilhões de litros em 2023. As estimativas deveriam ser revistas de modo a orientar incentivos para a manutenção da adoção do etanol como combustível.
Caráter Não Renovável da Matriz Energética Página 436 - Pelos Gráfico 139 e 140, está claro que esforços mais contundentes e ambiciosos são necessários se o país deseja caminhar rumo a uma matriz energética que seja de fato renovável, já que a mesma continua sendo baseada em fontes não renováveis (54,8% em 2024), com avanços não expressivos em favor das renováveis. Página 440 - Do total de investimentos planejados para o horizonte decenal, 70,6% são destinados para o setor de Petróleo e Gás Natural, porcentagem superior ao que havia sido planejado no PDE 2023. Isso reflete a intenção do Governo Brasileiro de seguir com uma matriz energética fóssil no plano decenal. A posição deveria ser revista se o governo pretende aumentar a participação das fontes renováveis na matriz energética brasileira, de acordo com o compromisso do País no tocante à diminuição das emissões de GEE e no combate às mudanças climáticas. Geração Termelétrica Páginas 15/42/70/388 - A inclusão do carvão mineral como fonte para geração de energia elétrica deveria ser descartada do Plano, dado seu alto nível de emissões de gases de efeito estufa (GEE) e considerando que o país possui outras alternativas energéticas para o atendimento da demanda. De acordo com a Tabela 14, a participação relativa do carvão mineral e coque no consumo final energético do País deve ser mantida no horizonte decenal, com aumento da demanda em termos absolutos. De acordo com a Tabela 40, ainda que o aumento no uso do carvão seja impulsionado pela atividade metalúrgica, há um expressivo aumento no uso do carvão a vapor no horizonte decenal, destinado à geração termelétrica. Isso não parece estar de acordo com o fato de que o PDE constitui o plano para mitigação e adaptação às mudanças climáticas do setor energético. Portanto, o PDE é o instrumento para a formulação da estratégia de atendimento à meta no que se refere à produção e ao uso da energia, assim como para seu monitoramento (art. 3º do Decreto nº 7.390/10). Página 119 - De acordo com a Tabela 47, o valor de investimento alocado para apenas uma usina nuclear (Angra 3) é similar ao alocado para todas as usinas a gás natural contratadas ou planejadas e deve ser superior ao investimento alocado para outras fontes renováveis de energia já contratadas, que não hidrelétricas e consideradas individualmente, ainda que os dados, apresentados de forma agregada para essas fontes, inviabilizam a análise detalhada. Isso revela que os investimentos estão sendo mal direcionados, já que um montante elevado é alocado para apenas uma usina que traz inúmeros riscos à segurança do meio ambiente e da população brasileira. Recursos Não Convencionais Página 239/255/256 - Sobre a produção de petróleo e gás natural a partir de recursos não convencionais, o Plano menciona que Embora sejam reconhecidas várias fontes de incertezas e riscos, incluindo embargos jurídicos [...] e também que há muitas incertezas, riscos e desafios técnicos, econômicos e socioambientais a serem superados nos próximos anos, antes de uma efetiva produção. Apesar de suas próprias ressalvas, o documento projeta um aumento na produção de gás natural a partir de recursos não convencionais em um patamar significativo de 16 MM m3/dia. Isso deveria ser revisto dadas as incertezas e riscos associados a essa produção, que incluem riscos e danos socioambientais.
Página 240 - A Figura 29 mostra a distribuição geográfica das Unidades de Produção de recursos convencionais em áreas contratadas e das áreas de bacias efetivas da União que poderão ser projetadas para contratação no período decenal. No entanto, dentre as áreas apresentadas, incluindo a Bacia do Amazonas, os blocos de exploração e produção podem trazer graves e irreversíveis danos socioambientais, podendo abarcar Unidades de Conservação e Terras Indígenas. O planejamento energético do País deveria considerar a questão e informar sobre a mesma e não deveria permitir a inclusão de áreas sem a devida avaliação da viabilidade socioambiental. Conclusão Em um momento em que o país passa por diversas crises - das quais se destaca a econômica, elétrica e hídrica -, o Ministério de Minas e Energia parece seguir míope à realidade brasileira. Apesar de pequenos avanços no tocante a números absolutos da capacidade instalada da energia solar fotovoltaica, por exemplo, o panorama geral demonstra que, se depender do Governo, seguiremos no mesmo rumo. Falta ambição no tocante à expansão das fontes renováveis, notadamente eólica, biomassa e solar, que muito poderiam fazer pelo planejamento energético e pelos próprios brasileiros nesse momento de crise. A energia solar fotovoltaica, por exemplo, é não só a fonte que tem o maior potencial de geração de empregos diretos e indiretos associados, como também representa uma possibilidade clara de reduzir a demanda do sistema elétrico e a conta de luz do cidadão. Ainda assim, o Governo não vai além do já previsto em 2013 pela EPE, e desconsidera que, no mesmo documento é apresentado o potencial de geração residencial fotovoltaica como suficiente para abastecer 2,3 vezes o consumo desse setor. Pelo contrário, determina investimentos da ordem de R$ 993 bilhões nas mesmas fontes fósseis que, hoje, são responsáveis por 30,2% das emissões de gases de efeito estufa do País e também têm papel preponderante no aumento de mais de 50% da conta de luz dos brasileiros no último ano.