Qualidade ambiental urbana X Qualidade de vida urbana



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Transcrição:

Qualidade ambiental urbana X Qualidade de vida urbana Msc. Marilia Araujo Roggero & Dr. Ailton Luchiari marília.roggero@usp.br & aluchiar@usp.br O presente artigo é parte do projeto de Doutorado de Msc. Marilia Araujo Roggero (Qualidade de vida urbana nas bordas da metrópole centralidades e periferias) que se encontra em fase inicial de desenvolvimento (primeiro ano), a discente faz parte do Programa de Pós-Graduação em Geografia Física FFLCH/USP). Dr. Ailton Luchiari é docente do departamento de Geografia da FFLHC/USP e orientador da presente pesquisa. Resumo Fazer ciência, elaborar estudos científicos, pressupõe abstrações necessárias para compreensão do todo que se deseja estudar. Conforme Lencione (2008) menciona no texto Observações sobre o conceito de cidade e urbano, a pesquisa científica necessita de momentos desconstrução, construção, eleição de conceitos, para depois estabelecer o caminho pelo qual a pesquisa científica irá trilhar. Quando o pesquisador decide o tema a ser trabalhado em sua pesquisa, procura seguir caminhos teóricos e metodológicos os quais julga necessários para atingir seus objetivos científicos. Ao trabalhar com qualidade de vida urbana, uma série de indagações são postas com relação a definições de conceitos, mas um elemento que não pode ser perdido de vista e que é ressaltado tanto por Nahas (2001) como por Mendonça (2006) é a noção de equidade e o seu dimensionamento na distribuição espacial e no acesso social a determinados recursos e serviços urbanos. Portanto, quando se opta por pesquisar na estrutura socioespacial urbana os elementos pelos quais serão delimitados fragmentos, de modo a analisar a qualidade de vida urbana é necessário se ter em mente quais serão os aspectos a serem analisados, ou melhor, os indicadores necessários e/ou existentes para se realizar esse tipo de análise. Isso porque atualmente existe certa confusão entre trabalhar com conceito(s) de qualidade ambiental urbana e qualidade de vida urbana. Nahas (2001) afirma que quando se deseja formular indicadores para o planejamento urbano, a qualidade ambiental em um sentido amplo, torna-se um dos elementos para dimensionar a qualidade de vida urbana e quando se deseja o contrário, a qualidade de vida urbana é um elemento importante para mensurar a qualidade ambiental. Um exemplo claro dessa inversão de elementos, pode ser quando na qualidade de vida mensuramos o saneamento básico, item de fundamental importância para a qualidade de vida, que se trata de um aspecto ambiental. Já com relação à qualidade ambiental, trabalhamos com indicadores de qualidade do ar, das águas, do saneamento, 1

contaminação, entre outros, os quais são elementos importantes para se garantir a vida e logo, a sua qualidade. Palavras-chave: qualidade de vida urbana, qualidade ambiental urbana, indicadores, conceitos. Introdução A questão ambiental aparece atualmente com grande destaque em discussões acadêmicas e políticas, tendo em vista a profunda degradação ambiental proveniente do rápido progresso tecnológico ocorrido nos últimos cem anos. Junto a esse progresso, veio o crescimento das concentrações urbanas que além de ampliar as desigualdades de acessos a bens e serviços e também evidenciar os problemas ambientais, apresentam uma piora na qualidade de vida de suas populações. Essas questões evidenciam que o modelo de desenvolvimento adotado não priorizou a melhoria da qualidade de vida e de um meio ambiente saudável, pelo contrário, assistimos o agravamento das questões sociais e ambientais. Desde meados década de 1970, felizmente esse quadro vem sofrendo algumas alterações com a mudança de paradigmas apoiados na sustentabilidade e no desenvolvimento, o tão aclamado desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável segundo Veiga (2005) une dois conceitos complexos que são a sustentabilidade e o desenvolvimento. Como sustentabilidade entende-se uma produção que vise à preservação do meio ambiente e/ou que reverta obstáculos ambientais para a continuidade do desenvolvimento econômico. Já o desenvolvimento pode ser entendido como desenvolvimento econômico, como o era feito até a década de 1960 ou como bem esclarecido por Amartya Sen (prêmio Nobel de economia em 1998) como liberdade. Autor do livro Desenvolvimento como liberdade, Sen demonstra que apesar do crescimento econômico, ainda é necessário conhecer o papel da liberdade em suas diferentes formas no combate à pobreza, opressões, privações em um mundo marcado por desigualdades. Nesse sentido, tanto a qualidade ambiental como a qualidade de vida urbana acabam sendo apêndices do conceito desenvolvimento sustentável que também não é 2

sinônimo de sustentabilidade ou de desenvolvimento, mas sim uma composição desses dois conceitos. Entretanto, com relação à qualidade ambiental e a qualidade de vida urbana vêm ocorrendo uma série de problemas com suas conceituações. Alguns pesquisadores das temáticas (qualidade de vida e qualidade ambiental) vêm considerando e trabalhando esses dois conceitos como se na realidade fossem sinônimos, mas eles não o são. Certamente existem conexões importantes entre a qualidade de vida e qualidade ambiental, porém, dependendo do estudo a ser realizado cada um desempenhará um papel na pesquisa e essa será a discussão central do presente artigo. Qualidade ambiental urbana De acordo com Guimarães (2005) na qualidade ambiental urbana é possível encontrar preocupação acerca da temática ambiental e da qualidade de vida desde os textos bíblicos. Entretanto, foi a partir da Revolução Industrial que se começou perceber o cenário de miséria e exclusão social marcada pela intensa poluição, refletindo em baixa qualidade de vida. Dessa época até nossos dias, as indústrias alteraram e muito seu modo de produzir, todavia, ainda assistimos à degradação ambiental prejudicando a qualidade de vida da população, principalmente das grandes cidades. Assim, quando o pesquisador está pensando em poluição ambiental, a preocupação não está centrada apenas na alteração da paisagem provocada por tal poluição, mas também nos prejuízos para quem vive nesse ambiente. Portanto, quando se pretende estudar a qualidade ambiental urbana, deve-se ter em mente quais são as variáveis possíveis para auxiliar a compor o conceito ou os conceitos. Por exemplo, ao construir indicadores para se analisar a qualidade ambiental urbana, o estudioso deve ter em mente o conjunto de variáveis que poderão dar subsídios para essa análise. Pois, existem estudos que para analisar a qualidade ambiental utiliza indicadores de escolaridade, focada na alfabetização ou mesmo rendimento dos chefes de família. Ocorre que se o pesquisador está analisando a população de determinado local, não se trata de análise de qualidade ambiental e sim da análise de parâmetros que compõe a qualidade de vida. Para analisar a qualidade ambiental de determinado lugar, o pesquisador deve focar em variáveis relacionadas ao ambiente, por exemplo: a qualidade do ar, a qualidade das águas, a quantidade de área verde, a qualidade de determinadas 3

infraestuturas, são componentes de avaliação da qualidade ambiental que podem fazer parte de uma análise de qualidade de vida urbana, o contrário nem sempre ocorre, pois o nível de escolaridade e o rendimento da população não possuem necessariamente relação direta com a qualidade do ambiente. Qualidade de vida urbana A qualidade de vida urbana tem sido estudada por diversas disciplinas como a Sociologia, Arquitetura, Economia, Geografia entre outras. Cada ciência a estuda de acordo com suas bases teóricas, suas metodologias e logo, seus conceitos. Na Geografia a conceituação/análise da qualidade de vida urbana por meio da satisfação das necessidades básicas; diferentemente da ótica economicista que dão ênfase aos bens e utilidades, no qual o desenvolvimento não ocorre sem a prosperidade material, tenta estabelecer critérios a partir da organização espacial, visando uma classificação que ofereça subsídios para a implantação de políticas públicas, e conseqüentemente uma melhora na qualidade de vida da população. Para Nahas (2009) o conceito de qualidade de vida urbana foi consolidado a partir da década de 1960, quando esse passou a ser utilizado como contraposição a avaliações do nível de desenvolvimento estritamente econômico dos países. Ao longo das décadas de 1970 e 80 esse conceito sofre influencias de novas transformações sociais, oriundas da questão ambiental, que começa a ser alardeada nessa época. A qualidade de vida então passa a ser então discutida a partir da questão urbana, o foco do conceito passa a ser a cidade e o urbano. Para a mesma autora, ocorre uma fusão entre qualidade de vida e qualidade ambiental, quando se deseja formular indicadores para o planejamento urbano, a qualidade ambiental em um sentido amplo, torna-se um dos elementos para dimensionar a qualidade de vida urbana e quando se deseja o contrário, a qualidade de vida urbana é um elemento importante para mensurar a qualidade ambiental. O que Nahas enfatiza é que o conceito de qualidade de vida urbana é o resultado do desenvolvimento das cidades, dos problemas socioambientais e da necessidade de monitoramento em nível local. Entretanto, para que esse monitoramento seja efetivo é necessário o desenvolvimento de instrumentos que forneçam subsídios ao planejamento local, como o caso de um sistema de indicadores de qualidade de vida urbana. Esses indicadores devem expressar a capacidade dos municípios em oferecer determinada 4

qualidade de vida a seus moradores, enfatizando a acessibilidade a determinados serviços. Já para Mansilla (2001) as paisagens urbanas constituem um elemento representativo da qualidade de vida urbana, pois, acessibilidade, limpeza, fluidez, qualidade das edificações, o tamanho das residências, o traçado viário, a presença de áreas verdes e a disponibilidade de serviços básicos são elementos indicativos do grau de satisfação das necessidades básicas e tornam-se referenciais para as gestões locais que almejam além da inclusão social, uma melhoria da qualidade de vida. Afinal sem o mínimo de bem-estar social e material não faz sentido avançar no debate da qualidade de vida urbana. Qualidade ambienal urbana X Qualidade de vida urbana Ocorre atualmente demasiada confusão conceitual na abordagem da qualidade de vida e qualidade ambiental urbana. De acordo com Nahas (2001) a partir da década de 1970 o aprofundamento da consciência ecológica provocada pelo agravamento da degradação ambiental urbana e o agravamento dos problemas ambientais globais, vincula o conceito de qualidade de vida ao conceito de qualidade ambiental. Nessa década o debate acerca da qualidade ambiental assume lugar de destaque no debate político internacional e sua incorporação trouxe uma série de outras implicações com relação ao dimensionamento, e a própria concepção de qualidade de vida vinculada à noção do desenvolvimento sustentável. Deste modo, a partir da compreensão de que a sustentabilidade do desenvolvimento humano é fruto da interação de processos socioeconômicos e da dinâmica ambiental, ao longo dos anos, foram, sendo produzidos subsídios teóricos e metodológicos voltados para a mensuração de variáveis ecológicas e de monitoramento ambiental, que culminaram na formulação de metodologias; visando avaliar a população acerca da qualidade do seu meio ambiente, assim como ocorreu com os indicadores sociais. (Roggero, 2009) Portanto, segundo Nahas tanto o(s) conceito(s) de qualidade ambiental quanto o de qualidade de vida tornaram-se vinculados, devido ao fato de que os problemas ambientais atingem diretamente a qualidade de vida da população. Como se observa até aqui, no campo conceitual, a mescla entre os dois conceitos (qualidade de vida e qualidade ambiental) é de tal ordem, que muitas vezes torna-se difícil estabelecer se a qualidade de vida é um dos 5

aspectos da qualidade ambiental, ou se a qualidade ambiental é um componente do conceito de qualidade de vida. Na prática, a abrangência de cada um dos conceitos se explicita ao serem estabelecidos e aplicados métodos para sua mensuração, que acabam, assim, contribuindo para a formação do próprio conceito. (Nahas, 2001:3 Com relação ao vínculo conceitual citado por Nahas entre a qualidade de vida e qualidade ambiental, talvez seja neste aspecto que se encontre a dificuldade de se delinear na prática os métodos de mensuração e o que será mensurado de modo a conceituar e explicitar o caráter da pesquisa (qualidade ambiental ou qualidade de vida urbana ou ambos) com maior transparência. De acordo com Guimarães (1982) a ideia de qualidade ambiental aparece no debate político em várias dimensões, uma delas é a de que a preservação de condições mínimas de qualidade ambiental para as gerações futuras é obrigação. Não se trata de criar padrões de qualidade de vida, uma vez que esses padrões refletem valores e ideais, que talvez não sejam compartilhados por nossos sucessores. Trata-se de garantir água, ar, fonte de nutrição, consideradas condições básicas. Deste modo, o conceito de qualidade ambiental aparece como condição para garantir a qualidade de vida para futuras gerações e não criar parâmetros para medi-la. Em Roggero (2009) a qualidade de vida do distrito de Cachoeirinha não foi medida de acordo com os parâmetros de qualidade ambiental existentes, mas sim por meio de critérios socioeconômicos e estrutura básica de saneamento. Outro modo de medi-la poderia ser por esses critérios explícitos somados à qualidade dos serviços básicos prestados (a água de abastecimento é boa, o esgoto é tratado, a acessibilidade é boa?), entretanto, as opções metodológicas refletem as opções delineadas no início desse artigo. Considerações finais Quando se decide o objeto de estudo, passa a ser de suma importância as opções do pesquisador. Conceitos são criados para facilitar a compreensão de elementos da pesquisa e não o contrário. Existe um longo caminho a ser percorrido tanto pelos estudiosos da qualidade de vida quanto da qualidade ambiental urbana. Por serem temáticas recentes, muito ainda há para se desdobrar, para se conceituar e estudar a respeito. 6

Tentou-se destacar neste artigo as formas de análise e conceituações a partir de suas mensurações. Ambas constituem instrumentos de análise importantes e tem sido cada vez mais promissoras para os elaboradores de políticas públicas no apoio à tomada de decisões. Entretanto, novamente é importante ressaltar que a renda do chefe de família de um local, não necessariamente reflete sua qualidade ambiental. Alphaville, por exemplo, é um bairro construído para classes média alta e alta em Barueri e Santana de Parnaíba, mas nem por isso, lá a as águas do Rio Tietê são limpas. Pelo contrário, próximo à soleira do Rio Tietê foi construído um parque linear para disfarçar visualmente a poluição, mas com o mau cheiro é difícil fazer o mesmo. Há outros exemplos de estudos que no título levam análise da qualidade ambiental e o primeiro item da qualidade ambiental é a escolaridade. A metodologia muitas vezes está de acordo com a proposta do estudo, entretanto, os problemas centram-se nos conceitos. Os exemplos dados foram somente para ilustrar os cuidados necessários para determinados tipos de análise, no caso das qualidades discorridas ao longo do presente texto. A Geografia certamente já deu contribuições importantes para definições e conceitos tanto de qualidade de vida quanto de qualidade ambiental. Às vezes questões como essas são postas no sentido de quem veio antes o ovo ou a galinha, mas não é esse o caso, o grande desafio principalmente para os geógrafos talvez seja focar em questões mais práticas e direcionadas ao planejamento, amiúde todas as barreiras e desafios impostos no plano metodológico e operacional. 7

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