Notas a respeito da capitalização diária de juros, a antecipação dos efeitos da tutela e a. Cédula de Crédito Bancário.



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Transcrição:

Notas a respeito da capitalização diária de juros, a antecipação dos efeitos da tutela e a Cédula de Crédito Bancário. Pós Ph.D Desembargador J. S. Fagundes Cunha Para enfrentar a matéria a ser debatida impende de plano destacar o entendimento do STJ acerca dos requisitos necessários que os consumidores devem atender para obterem um provimento liminar, em caráter de antecipação de tutela, que os autorize extirpar das prestações mensais, tudo aquilo que se entenda como cobrança abusiva no contrato entabulado entre a instituição financeira e o consumidor. O julgamento do REsp nº 527.618-RS de relatoria do eminente Ministro Cesar Asfor Rocha, estabeleceu tais parâmetros, conforme se denota do excerto a seguir: CIVIL. SERVIÇOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. REGISTRO NO ROL DE DEVEDORES. HIPÓTESES DE IMPEDIMENTO. A recente orientação da Segunda Seção desta Corte acerca dos juros remuneratórios e da comissão de permanência (REsp's ns. 271.214-RS, 407.097-RS, 420.111-RS), e a relativa frequência com que devedores de quantias elevadas buscam, abusivamente, impedir o registro de seus nomes nos cadastros restritivos de crédito só e só por terem ajuizado ação revisional de seus débitos, sem nada pagar ou depositar, recomendam 1

que esse impedimento deva ser aplicado com cautela, segundo o prudente exame do juiz, atendendo-se às peculiaridades de cada caso. Para tanto, deve-se ter, necessária e concomitantemente, a presença desses três elementos: a) que haja ação proposta pelo devedor contestando a existência integral ou parcial do débito; b) que haja efetiva demonstração de que a contestação da cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; c) que, sendo a contestação apenas de parte do débito, deposite o valor referente à parte tida por incontroversa, ou preste caução idônea, ao prudente arbítrio do magistrado. O Código de Defesa do Consumidor veio amparar o hipossuficiente, em defesa dos seus direitos, não servindo, contudo, de escudo para a perpetuação de dívidas. Recurso conhecido pelo dissídio, mas improvido. (STJ - REsp 527618 / RS - Ministro CESAR ASFOR ROCHA (1098) - S2 - SEGUNDA SEÇÃO - Data de julgamento: 22/10/2003 - Data da Publicação/Fonte: DJ 24/11/2003 p. 214). Verifica-se que a colenda Corte Superior, ao estabelecer tais requisitos, já cuidou de repugnar a conduta daqueles consumidores que ajuizavam ação somente com o fito de impedir, indevidamente e abusivamente, o exercício de direito legítimo dos credores. Tanto é, que o julgado mencionado é um daqueles que serviram de base para a edição da súmula nº 380 daquela mesma Corte Superior, 2

de seguinte teor: A simples propositura da ação de revisão de contrato não inibe a caracterização da mora do autor. 1 Partindo para a análise dos requisitos cumulativos, mostra-se necessário, antes de qualquer coisa, proceder-se uma releitura do primeiro. Com efeito, não é somente a existência de ação proposta pelo devedor contestando o débito que preenche a exigência contida no item a do julgado acima. Isso porque na contestação em sede de Ação de Busca e Apreensão, também é facultado ao devedor discutir eventuais abusividades que maculam o contrato. Nesse sentido, já decidiu o STJ: RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - RECONHECIMENTO DE CLÁUSULAS ABUSIVAS POSSIBI- LIDADE - MORA DESCARACTERIZAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE ENCARGOS ABUSIVOS NO PERÍODO DA NORMALIDADE - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA ILEGALI- DADE - INSUFICIÊNCIA, POR SI SÓ, PARA A DESCA- RACTERIZAÇÃO DA MORA - RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - A discussão do valor do débito no bojo da ação de busca e apreensão, seja em sede de contestação, seja na ação de consignação em pagamento, é admitida, desde que haja pedido expresso da parte interessada quanto à verificação de ilegalidades dos encargos cobrados no contrato de alienação fiduciária; 1 Súmula 380 - Órgão Julgador - S2 - SEGUNDA SEÇÃO - Data do Julgamento - 22/04/2009 - Data da Publicação/Fonte - DJe 05/05/2009 - RSTJ vol. 214 p. 536. 3

(STJ - REsp 1036358 / MG - Relator(a) - Ministro MASSAMI UYEDA (1129) - Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA - Data do Julgamento - 27/05/2008 - Data da Publicação/Fonte - DJe 20/06/2008). PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ALIENA-ÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. RECONVENÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. ADMISSIBILI-DADE. ART. 315 DO CPC. - Consolidou-se o entendimento no STJ de que é admitida a ampla defesa do devedor no âmbito da ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária, seja pela ampliação do objeto da discussão em contestação, a partir do questionamento a respeito de possível abusividade contratual; seja pela possibilidade de ajuizamento de ação revisional do contrato que deu origem à ação de busca e apreensão, que, por sua vez, deve ser reunida para julgamento conjunto com essa. Nada impede e é até mesmo salutar do ponto de vista processual o cabimento de reconvenção à ação de busca e apreensão decorrente de alienação fiduciária, para pleitear a revisão do contrato, bem como a devolução de quantias pagas a maior. Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp 801374 / RJ - Relator(a) - Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) - Órgão Julgador - T3 - TERCEIRA TURMA - Data do Julgamento - 06/04/2006 - Data da Publicação/Fonte - DJ 02/05/2006 p. 327). 4

Diante disso é evidente, portanto, que o requisito da letra a, em verdade, quer dizer existência de intenção manifestada judicialmente, por parte do consumidor (seja qual for o meio adotado), de discutir abusividades do contrato. Sanada essa imperfeição textual do requisito a, demonstrado o quadro atual daquilo que se deve analisar para dirimir as lides dessa natureza, importa destacar uma peculiaridade processual, diretamente ligada ao segundo requisito. A discussão nevrálgica que permeia as lides envolvendo contratos como o da casuística, atualmente, gira em torno da modalidade de cobrança dos juros remuneratórios. E o que reclama solução jurídica, é se podem ou não as instituições financeiras aplicar os juros de forma capitalizada (juros compostos) e, em caso positivo, qual a periodicidade aceitável a ser adotada para tanto (mensal, semestral, anual, etc.). É cediço e é necessário esclarecer, desde logo, que todas as instituições financeiras intermediadoras de tais relações contratuais, aplicam a capitalização composta 2 mensal. Ou seja, a taxa de juros mensais pactuada incide sobre o capital principal e, para o cálculo dos juros incidentes sobre a segunda parcela, a base de cálculo utilizada é o capital principal já acrescido dos juros da parcela anterior. Evidente, nessa dinâmica, a cobrança de juros sobre juros, o que projeta uma dívida excrescente se comparada ao montante de crédito concedido. Daí se infere a abusividade, pois o débito gerado mostra-se onerosamente excessivo para o consumidor. 2 O regime de capitalização composta incorpora ao capital não somente os juros referentes a cada período, mas também os juros sobre os juros acumulados até o momento anterior. É um comportamento equivalente a uma progressão geométrica (PG) na qual os juros incidem sempre sobre o saldo apurado no início do período correspondente (e não unicamente sobre o capital inicial). GONDIM FILHO, Jurandir Gurgel. O anatocismo dos sistemas de amortização. p. 5. Artigo disponível em: <http://www.iesc.edu.br/pesquisa/arquivos/o_anatocismo_dos_sistemas_de_amortizacao.pdf>. 5

A grande mácula dessa modalidade de cobrança, que a condena, notadamente quando é utilizada nas relações consumeristas, é o seu caráter perverso 3 que oculta, embutindo nas parcelas fixas, a incidência de juros sobre juros. Abstraído o fato de ser, por si só, abusiva a incidência de juros sobre juros, já que a instituição financeira, nessa dinâmica, ao fim e ao cabo, acaba aplicando a taxa remuneratória sobre um capital que na verdade não desembolsou, 4 o fato é que juridicamente se mostra impossível tal modalidade de cobrança. Explica-se. No caso, é frequente encontrar nos autos que as partes contrataram expressamente a capitalização de juros, em periodicidade diária. Veja-se: 2. Juros... Periodicidade de Capitalização Os juros serão capitalizados diariamente,... Em que pese à legislação que regula a Cédula de Crédito Bancário permitir a capitalização de juros na hipótese de expressa pactuação, a periodicidade mínima de sua incidência é a mensal, sendo vedado o anatocismo diário, sob pena de abusividade flagrante. 3...é inquestionável o anatocismo do Sistema Francês, bem como a Tabela Price, uma vez que se enquadram no mecanismo de uma Série de Capitais Uniformes ou Prestações Constantes. A literatura em matemática financeira escamoteia a prática de juros sobre juros nos sistemas de amortização com prestações constantes, (...) A capitalização neste sistema ocorre pela aplicação dos juros compostos sobre o valor atual de cada uma das parcelas, valor este que representa o capital. O procedimento de apuração do saldo devedor, da forma em que normalmente encontramos, baseado no qual, alguns afirmam não haver a capitalização, camufla a ocorrência da capitalização dos juros. Ibidem, p. 12. 4 De se destacar, ainda, que a norma alvejada autoriza o credor a cobrar juros não apenas do valor principal, mas também sobre o que não emprestou, obtendo, portanto, receita sem trabalho, sem contraprestação, agredindo brutalmente o artigo 170 da nossa Lei Magna que assim estabelece: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social observados os seguintes princípios: V. defesa do consumidor. (TJRN - Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n 2008.004025-9/0002.00 - Relator: Desembargador Amaury Moura Sobrinho - Julgamento: 08/10/2008). 6

Nesse sentido julgados do TJPR: "AÇAO REVISIONAL DE CONTRATO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. INSURGÊNCIA CONTRA DECISÃO QUE INDEFE- RIU OS PEDIDOS LIMINARES DE DEPÓSITO JUDICIAL DAS PARCELAS INCONTROVERSAS E ABSTENÇÃO DE INSCRI- ÇÃO NOS CADASTROS DE INADIMPLENTES. CAPITALIZAÇAO DE JUROS. PERIODICIDADE DIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. ABUSIVIDADE FLAGRANTE. PREENCHIDOS OS REQUISITOS ELENCADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA DEFERIMENTO DAS LIMINARES. CONTRATO ACESSÓRIO DE GARANTIA FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. CONTRATO PRIN- CIPAL (CRÉDITO PESSOAL) QUE NAO GUARDA QUALQUER RELAÇAO COM O IMÓVEL OBJETO DA GARANTIA. DESA- TENDIMENTO DA FINALIDADE DO INSTITUTO DA ALIE- NAÇAO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS (LEI Nº 9.514/97). RECUR- SO PROVIDO.... 3. Em que pese a Lei nº 10.931/2004 permitir a capitalização de juros na hipótese de expressa pactuação, a periodicidade mínima de sua incidência é a mensal, sendo vedado o anatocismo diário, sob pena de abusividade flagrante. (grifo nosso) (TJ/PR, 17ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento nº 773.270-9, Rel. Lauri Caetano da Silva, DJ. 01.07.2011) "APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE (CHEQUE ESPECIAL) - SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL, EXCLUINDO APENAS A CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - RECURSO DO BANCO - CONTRATO QUE PREVÊ CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS EM 7

PERIODICIDADE DIÁRIA - ILEGALIDADE - IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO PELA PERIODICIDADE MENSAL SEN- TENÇA MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO - RECURSO DESPROVIDO. "PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARA- TÓRIOS. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS E HIPOTE- CÁRIA. CAPITALIZAÇAO DIÁRIA DOS JUROS. INADMIS- SIBILIDADE. PERIODICIDADE MENSAL. AUSÊNCIA DE PACTUAÇAO VÁLIDA. IMPOSSIBILIDADE. I. Havendo o acórdão afastado a capitalização diária dos juros, não é possível substituí-la pela periodicidade mensal, eis que o que se identificou foi pactuação inválida do encargo, que resta indevido. II. Embargos rejeitados." (STJ, 4ª T., EDcl no REsp 147353/DF Embargos de Declaração no Recurso Especial 1997/0063006-4, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ 25/11/2002 p. 236) (grifo nosso) (TJ/PR, 14ª Câmara Cível, Apelação Cível nº. 669.271-5, Rel. Themis Furquim Cortes, DJ. 11.08.2010) No mesmo sentido precedente do Superior Tribunal de Justiça: "COMERCIAL. AGRAVO REGIMENTAL. CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO." (STJ, 4ª Turma, AgRg no Ag 966.398/AL, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, j. 26.08.2008, DJ 13/10/2008)" Em verdade, nos contratos formalizados por Cédula de Crédito Bancário, poderá ocorrer capitalização até mensal de juros, haja vista que a Lei 10.931/2004, no seu artigo 28, 1º, previu: 8

1º. Na Cédula de Crédito Bancário poderá se pactuados: I os juros sobre a dívida, capitalizados ou não, os critérios de sua incidência e, se for o caso, a periodicidade de sua capitalização, bem como as despesas e os demais encargos decorrentes da obrigação. Porém, a capitalização de juros diariamente acarreta onerosidade excessiva, prática absolutamente vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. Afastada a cláusula que permite a capitalização diária de juros, não cabe admitir sua cobrança em período mensal. Isso porque tal alteração, à míngua de previsão contratual e legal, acarreta-ria interpretação extensiva incabível. A lei permite a cobrança de capitalização anual de juros (art. 591 do Código Civil), caso não haja previsão contratual lícita em peróiodo inferior. Se a previsão contratual foi considerada abusiva(ilícita), não cabe ao julgador dar ao contrato contornos não admitidos no contrato. Nesse sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, ao contrário de precedentes de nossa Colenda Corte, que tem admitido a substituição por mensal. Vejamos:...impossibilitado o anatocismo diário, não pode ser deferido o pleito de capitalização mensal, porque esta não foi convencionada, não se podendo dar interpretação extensiva ao contrato para tanto. (AgRgno Ag 966398/AL, Rel. Min ALDIR PASSARINHO JUNIOR, j. em 26.08.2008, DJe de 13.10.2008. 9

Com efeito, declarada nula a cláusula que permite a capitalização de juros em período diário, fica o contrato desprovido e a regra legal de um ano é a conclusão que se impõe. A Cédula de Crédito Bancário não perde sua liquidez e certeza se o credor atualizar o débito, afastando os juros capitalizados diariamente. Destarte, deve haver recálculo da dívida, para que a capitalização de juros seja anual. 10