Análise baseada num inquérito online em 16 países (primeiro semestre de 2013) - estudo coordenado por Gustavo Cardoso, CIES-IUL.

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Transcrição:

A Leitura Digital Análise baseada num inquérito online em 16 países (primeiro semestre de 2013) - estudo coordenado por Gustavo Cardoso, CIES-IUL. O que significa ler em 2013? Ontem lia-se apenas no papel, hoje no papel e no digital? Como é que a utilização da Internet e a multiplicação de ecrãs está a mudar a nossa relação com a leitura, quer do ponto de vista dos conteúdos lidos quer relativamente ao modo como lemos? I - Alguns dados gerais do estudo A maioria da amostra global de utilizadores de Internet já leu livros em formato digital (58% dos indivíduos inquiridos afirmam-no contra 42% que afirmam o contrário). Gráfico 1 Proporcionalmente, lê-se menos livros digitalmente no contexto europeu do que nos BRICS. No bloco constituído pelos países BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a percentagem de indivíduos que afirma que já leu livros em formato digital é proporcionalmente superior à que se verifica para o bloco constituído pelos 6 países europeus analisados (Alemanha, França, Itália, Espanha, Reino Unido e Portugal). Gráfico 2 A relação entre idade e leitura digital de livros é inversa, ou seja, à medida que se avança na idade a percentagem dos indivíduos que afirmam já ter lido livros em formato digital diminui. Gráfico 3 Em consonância com os resultados apurados numa década de estudos da Internet i.e. que a escolaridade determina a probabilidade de uso da Internet, ou seja, quanto maior a escolaridade maior o uso de Internet também, no que diz respeito à leitura de livros em formato digital, quanto maior o nível de escolaridade, maior a percentagem dos que afirmam já ter lido livros em formato digital. 1

Gráfico 1 Gráfico 2 2

Gráfico 3 Gráfico 4 3

II A leitura de livros nos formatos papel e digital Ler muitos livros em formato papel não implica directamente ler muito em digital digital e outros que, embora leiam muito em papel, lêem muito pouco em formato digital. Não há uma relação directa entre ler-se muitos livros ("grande" leitor) em formato papel e fazê-lo em formato digital. Quando se afirma não ter lido nenhum livro em formato impresso no último ano também é mais provável que não se leia nenhum livro em formato digital no último ano. É importante salientar que, ao contrário de um receio várias vezes expresso na opinião pública, os dados indicam que a leitura de livros em formato digital não substituiu a leitura de livros em formato papel. Constata-se que quem mais lê livros em digital é também quem mais lê livros em suporte impresso. Entre os portugueses inquiridos, o conjunto dos que afirmam ter lido no último ano mais de 8 livros em formato digital atinge os 10%. No caso da amostra global esse mesmo conjunto de indivíduos atinge um valor que é o triplo, ou seja, 30%. Quando comparado com a maioria dos restantes quinze países analisados, Portugal possuí ainda um segmento de grandes leitores em formato digital incipiente. Gráfico 5 4

III - Leitura de jornais online e em formato impresso Metade dos leitores diários de jornais digitais acumula essa leitura com a leitura em papel. Gráfico 8 Na amostra global de dezasseis países, 50% dos indivíduos que afirmam ler diariamente, ou várias vezes ao dia, um jornal em formato digital são ao mesmo tempo também leitores diários de jornais em formato papel. Esta mesma tendência também se verifica no caso dos portugueses utilizadores de internet. Gráfico 8 IV - Aspectos mais e menos valorizados na(s) leitura(s) digitais de livros e jornais Importa salientar que embora a leitura seja feita em formato digital, tal não revoluciona o entendimento do que se valoriza na leitura. Ler livros e jornais em digital continua a ser muito similar a ler em papel, isto é uma actividade individualizada. Embora sejam valorizadas as funções de arquivo digital ou pesquisa de informação associada ao texto, questões como a partilha ou associação de comentários ao texto e saber quem já leu o que estamos a ler não são muito valorizados pela maioria dos leitores digitais. De entre os aspectos mais valorizados na leitura digital de jornais e livros pelos inquiridos está o recurso a um motor de busca, para poder saber de imediato algo 5

sobre o autor/tema do texto; ter acesso a outros textos/links associados; gravar instantaneamente num ficheiro todo o texto ou as suas partes mais relevantes. Quanto aos aspectos menos valorizados pelos inquiridos na leitura digital de jornais e livros, encontram-se: o associar um comentário ao texto que se leu; partilhar em tempo real o texto que se está a ler; e saber quem já leu o texto. Gráficos 9 e 10. Gráfico 9 6

Gráfico 10 Os três aspectos mais valorizados para a amostra global tendem a ser também os mais valorizados especificamente em Portugal. O mesmo sucede para os aspectos menos valorizados nas leituras de jornais e livros em formato digital. V - Percepções sobre a leitura O estudo realizou um conjunto de análises de opinião comparando a leitura em papel e a leitura digital. Por exemplo, a leitura como fonte de prazer é um traço que os utilizadores de internet associam mais à leitura em papel. São menos os indivíduos que consideram a leitura em papel aborrecida do que os que o afirmam sobre os ecrãs/dispositivos digitais. De igual modo, comparando com a leitura em ecrã ou digital, são mais os indivíduos que reconhecem na leitura em papel uma forma de nos envolvermos com o mundo que nos rodeia do que a leitura em formato digital. Enquanto competência essencial para os indivíduos, a percentagem de inquiridos que associa essa ideia à leitura em papel é significativamente superior à dos que a associam à leitura em ecrã. Gráfico 11 7

Gráfico 11 VI - A leitura em suporte digital no futuro A percentagem mais significativa da amostra (44%) acha que passará no futuro a ler mais textos em suporte digital. Gráfico 12 Em todos os escalões etários é superior a percentagem dos que acham que num futuro próximo lerão mais em formato digital. Essa percentagem tem maior peso no escalão dos 25 aos 34 anos (49%). E menor no escalão dos 55 ou + anos (37%). 8

Gráfico 12 Quando se considera o nível de escolaridade, é nos indivíduos que frequentam ou já concluíram um grau de ensino superior que são mais elevadas as percentagens dos inquiridos que acham que lerão mais em suporte digital num futuro próximo (em ambos os casos, 50% dos indivíduos concordam com esse futuro aumento de leitura). VII - A Multiplicação dos Ecrãs. Novas Formas de Leitura ou de Leitores? A leitura digital é um conceito vago e multidimensional. Pois ler digitalmente pode querer referir- - Kindle ou para outros ereaders, a livros de Manga em formato CBZ ou CBR, a jornais, revistas em apps e blogues em páginas na Web, etc. É no quadro desta contemporaneidade marcada pelo alargamento a cada vez mais indivíduos da Internet, - Writedas tecnologias digitais e dos seus ecrãs, mas também pela progressiva entrada das indústrias de bens impressos na sociedade rede, que importa questionar como se traduz do lado dos sujeitos leitores, das suas práticas e percepções, a suposta terceira revolução da leitura (Cavallo e Chartier, 1997 1 ) que a transmissão electrónica de textos teria ou terá provocado. Através de um conjunto diverso de dados, obtidos em 2013 através da realização de um inquérito por questionário online a indivíduos de 16 países de vários 1 Cavallo, Guglielmo e Chartier, Roger (1997), Histoire de la lecture dans le monde occidental, Paris, Seuil. 9

continentes 2, foram neste estudo mapeadas grandes linhas em torno do fenómeno da leitura digital, sem contudo descurar como algumas das suas dimensões se manifestam na realidade nacional ou inclusivamente variam consoante o conjunto de países tido em consideração, procurando responder à questão: estamos perante novas formas de leitura ou perante novos leitores? A resposta deste estudo é que livros e jornais, agora num formato digital i.e. novos porque alguns que liam em papel passaram a ler agora também em digital e novos também porque alguns não leriam em papel e passaram a fazê-lo bem como de novas formas de leitura que, os quais, embora não necessariamente lendo livros ou jornais, o fazem lendo outros formatos de leitura como blogues, -. Se a leitura se define em função da relevância social e individual não podemos continuar hoje, ao falar de leitura, a referir-nos apenas a leitura de livros, jornais, revistas, ebooks e apps de leitura. A análise dos dados deste inquérito global sugere que falar da leitura, no final da primeira década do século XXI, pressupõe falar de ler em formato digital, mas igualmente implica continuar a falar de leitura em papel. Falar de leitura em 2013 pressupõe igualmente aceitar a possibilidade de identificação de um novo tipo de leitor e de leituras, que moldarão tanto as políticas públicas de apoio à leitura como a valorização social e individual sobre o que pode ser considerado como leitura hoje. Gustavo Cardoso 2 Inglatera, Brasil, Espanha, Alemanha, França, India, Canadá, China, África do Sul, Rússia, Estados Unidos da América, Itália, Turquia, México, Austrália e Portugal. 10