AS ABORDAGENS ÉTNICO-RACIAS NA EJA JUVENIL: REFLEXÕES ACERCA DA FORMAÇÃO DE JOVENS NEGROS EM UMA ESCOLA QUILOMBOLA Thiana do Eirado Sena de Souza Benedito G. Eugenio Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Programa de Pós-Graduação em Relações Étnicas e Contemporaneidade Eixo Temático 3: Didática e prática de ensino nas diversidades educacionais Subeixo 2 Didática e prática de ensino na inclusão e no reconhecimento de saberes Resumo Este pôster apresenta algumas conspiderações de uma pesquisa de mestrado em andamento acerca da juventude negra na EJA e tem como objetivos: compreender a identificação da cultura africana na formação dos jovens negros matriculados na EJA Juvenil em uma escola quilombola; identificar de que forma, a partir da percepção desses jovens, as relações étnico-raciais permeiam suas vivências pedagógicas no ambiente escolar efetivado no currículo praticado. A pesquisa tem como aporte teórico os estudos relacionados à juventude articulados à sociologia das relações raciais e em documentos oficias que norteiam a EJA, a saber: Constituição Federal de 1988, Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro- Brasileira e Africana (2004). Para a construção dos dados, o caminho metodológico fundamenta-se na abordagem qualitativa por esta valorizar a relação de historicidade, valores, crenças, representações dos sujeitos envolvidos na pesquisa, proporcionandonos conhecer e compreender a história de vida das pessoas pesquisadas. Nesta perspectiva, a referida pesquisa ancora-se nos princípios da entrevista narrativa, tendo 10 jovens negros como sujeitos investigados. A pesquisa exploratória já efetuada sinaliza o quanto a cultura juvenil é invisibilizada no ambiente escolar, onde as manifestações e interesses dos jovens na instituição investigada, especificamente dos jovens negros, oriundos de uma comunidade de remanescentes quilombolas, se vêem esquecidos em um ambiente educativo que necessita construir um olhar diferenciado para esses sujeitos, bem como de um currículo contextualizado com as questões étnicoraciais, que privilegie a identificação, o reconhecimento e a valorização do pertencimento à cultura afro, suas histórias e ancestralidades. Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; Juventude negra; Relações étnicoraciais. Introdução Historicamente, a Educação de Jovens e Adultos esteve atrelada a uma concepção assistencialista e compensatória de educação. A luta empreendida pelos movimentos sociais, particularmente a partir dos anos 1960, preconizou o 12351
2 reconhecimento do importante valor do seu processo formativo ao pensar uma educação voltada para a libertação e emancipação do homem, em que os conhecimentos científicos, dentre outras formas de conhecimentos, constituem importantes referências para se conhecer o mundo. Definida como modalidade da educação, expressa a conquista do direito à educação e está garantida e regulamentada pela Constituição de 1988, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB nº 9.394/96 e pela Resolução CNE/CEB N o 1, de 05 de julho de 2000 (SOUZA;GONÇALVES;COSTA JUNIOR, 2013). Toda essa legislação faz referência ao perfil dos estudantes da EJA. Contudo, vale salientarmos que o público dessa modalidade de educação é bastante heterogêneo no que se refere às questões geracionais, culturais e étnicas. Os últimos anos, segundo os documentos oficiais, assim como pesquisas no campo da EJA, têm sido marcados, também, por um aumento crescente da presença de jovens, principalmente nas turmas do segundo segmento do ensino fundamental e ensino médio. Ao enfocarmos a juventude, fazemos um recorte especificamente com os jovens negros, que em seu processo de escolaridade possuem em média 2,3 anos de estudos a menos que jovens não-negros da mesma idade (BRASIL, 2011). Estes dados nos revelam os efeitos históricos dos processos de discriminação e racismo enfrentados pela população negra em nosso país, após um perverso regime escravista, em virtude das políticas explícitas e/ou implícitas referentes ao branqueamento da população e manutenção dos privilégios exclusivos para grupos com poder de governabilidade e influência política, no pós-abolição (BRASIL, 2004). Vale ressaltar que muitos foram os avanços na construção de políticas públicas voltadas para ações afirmativas de reconhecimento e valorização da cultura afrobrasileira e africana nos currículos da educação básica. As lutas do Movimento Negro, militantes sociais, Conselhos e profissionais da área da educação, foram relevantes para impulsionarem o governo federal a sancionar a Lei nº 10.639/03, alterando a LDB e estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2004). Com essas políticas, evidenciamos a questão social sendo colocada em pauta na agenda nacional de afirmação de uma educação referendada na democracia, descentralidade e transversalidade, rompendo os perversos efeitos seculares de 12352
3 preconceito, discriminação e racismo contra o povo negro. É fundamental, por isso, conhecer quem são os jovens negros que frequentam as classes de EJA, sua relação com a escola/conhecimento escolar e seus projetos de futuro. Materiais e método Este pôster apresenta algumas considerações de uma pesquisa de mestrado em andamento acerca da juventude negra na EJA, por meio da qual buscamos: Compreender a identificação da cultura africana na formação dos jovens negros matriculados na EJA Juvenil em uma escola quilombola; Identificar de que forma, a partir da percepção desses jovens, as relações étnico-raciais permeiam suas vivências pedagógicas no ambiente escolar efetivado no currículo praticado. Para a construção dos dados, o caminho metodológico fundamenta-se na abordagem qualitativa por esta valorizar a relação de historicidade, valores, crenças, representações dos sujeitos envolvidos na pesquisa, proporcionando-nos conhecer e compreender a história de vida das pessoas pesquisadas. Nesta perspectiva, a referida pesquisa ancora-se nos princípios da entrevista narrativa, tendo 10 jovens negros da escola investigada como sujeitos investigados. Os resultados serão discutidos à luz dos estudos sobre juventude (PAIS, 1993; SPÓSITO, 2009) articulados à sociologia das relações raciais. A escola, campo desta pesquisa fica localizada no município de Jequié-Ba, contempla o Ensino Fundamental II, o Ensino Médio Regular e EJA Juvenil (Eixo IV 6º e 7º ano e Eixo V 8º e 9º ano). A instituição, de responsabilidade do governo estadual, é considerada de médio porte e, em 2007, recebeu o título, concedido pela Fundação Palmares de Escola Quilombola, devido à comunidade local onde se encontra localizada a escola ser composta majoritariamente por negros descendentes de escravos libertos, onde o sentimento de pertença à cultura africana permeia a práxis pedagógica e a formação dos estudantes jovens da EJA. Resultados e discussão A pesquisa exploratória já efetuada evidenciou que os altos índices de evasão escolar, motivado diversas vezes, como forma de repúdio, indagação e negação do saber formal oferecido pela escola, é citado como um dos desafios a serem vencidos neste ambiente. A tríade escola, sociedade e cultura se faz cada vez mais influentes no processo de formação integral dos jovens que sentem-se excluídos, têm seu direito à educação negados, não são reconhecidos e tampouco compreendidos como sujeitos 12353
4 sócio-culturais, que necessitam serem vistos diante suas diferenças, a partir de um diálogo entre elementos culturais, estruturas sociais, contradições e seu processo formativo (DAYRELL, 1996). Na busca pela articulação de um trabalho pedagógico que relacione o contexto e história dos estudantes, a matriz curricular da instituição foi reconfigurada com o propósito de atender a demanda acerca da cultura local, incluindo as disciplinas Estudos Baianos (Ensino Fundamental I e II) e Cultura Regional (Ensino Médio). Entretanto, os jovens partícipes afirmaram que a proposta curricular da EJA Juvenil não oportuniza a relação desses conhecimentos com a cultura e interesses desta categoria social. A discussão acerca da história, valorização, pertencimento à cultura africana acontece, esporadicamente, nessa modalidade, em projetos e eventos da escola, não existe um diálogo articulado acerca dessa temática com as disciplinas ofertadas, quase sempre descontextualizadas da história local. Talvez, por em seu percurso formativo, a Educação de Jovens e Adultos está atrelada a uma rápida certificação com a socialização de conhecimentos muito mais voltados à preparação para o mundo do trabalho, do que para uma educação que contemple o sujeito, que compreenda os aspectos críticos que estão envolvidos em sua vida social e o oportunize a uma vivência mais ativa em sua comunidade local. A contextualização do currículo da EJA Juvenil com as questões étnico-raciais presentes na realidade dos jovens negros está associado à proposição de atividades diversificadas que privilegiam a identificação, reconhecimento e valorização do pertencimento à cultura afro, suas histórias, ancestralidades. Essa vivência, mesmo que esporadicamente, insere os estudantes no conhecimento do processo histórico de sua comunidade, (re)descobrindo elementos culturais africanos presente em seus cotidianos como o candomblé, a capoeira e o samba de roda, como nos relata uma jovem aluna, que ainda destaca a necessidade dessas temáticas serem debatidas e firmadas em ações mais frequentes na sala de aula da EJA Juvenil. Evidenciamos que apesar das questões étnico-raciais fazerem parte do cenário social da EJA Juvenil, seja por conta desses jovens estarem inseridos em uma comunidade onde a cultura africana faz parte do seu percurso histórico, ou por constatarmos que o perfil dos jovens matriculados nessa modalidade ser de negros, oriundos das camadas populares periféricas, as questões raciais ainda necessitam ser exploradas ainda mais no ambiente escolar, no fazer pedagógico e na formação desses 12354
5 sujeitos. A cultura juvenil é quase sempre invisibilizada no contexto escolar, onde as manifestações e interesses dos jovens, nessa instituição, especificamente dos jovens negros, oriundos de uma comunidade de remanescentes quilombolas, se vêem esquecidos em um ambiente educativo que necessita construir um olhar diferenciado para esses sujeitos. Entender a cultura juvenil, a relação desta com as relações étnico-raciais, o dinamismo e a complexidade da vida escolar e social desses jovens matriculados em uma modalidade de educação pensada para um público geracional tão diverso, preconiza a construção e efetivação de práticas pedagógicas que privilegie as vivências humanas, as trocas, os saberes, valores e a cultura desses sujeitos com especificidades e tempos de vida singulares. Referências BRASIL. Ministério da Educação. Jovens de 15 a 17 Anos no Ensino Fundamental. Caderno de Reflexões. Brasília: 2011..Orientações e Ações para a educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2004. DAYRELL, Juarez. A escola como espaço sócio-cultural. In: DAYRELL, Juarez (Org.). Múltiplos Olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1996. LIMA, I. C. As propostas pedagógicas do Movimento Negro no Brasil: Pedagogia Interétnica, uma ação de combate ao racismo. Anais II Seminário Internacional Educação Intercultural, Gênero e Movimentos Sociais. Florianópolis, 2003. PAIS, J.M. Culturas juvenis. Lisboa: Imprensa Nacional, 1993. SOUZA, T. DO E. S. DE; GONÇAVES, M. DE C. P. B; JUNIOR, A.S.C. O processo histórico de consolidação da Educação de Jovens e Adultos: as políticas públicas voltadas para EJA e a luta dos movimentos sociais para a efetivação do direito a educação. Cadernos ANPAE. Recife-Pernambuco, nº 17, 2013. SPÓSITO, M.P. (Org.). O estado da arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: educação, ciências sociais e serviço social (1999-2006). Belo Horizonte: Argvmentvn, 2009. Vol.1 SPÓSITO, M.P. (Org.). O estado da arte sobre juventude na pós-graduação brasileira: educação, ciências sociais e serviço social (1999-2006). Belo Horizonte: Argvmentvn, 2009. Vol.2 12355