Livraria Nobel: Os Dilemas do Crescimento



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Transcrição:

Livraria Nobel: Os Dilemas do Crescimento Autoria: Gilberto Figueira da Silva, Renato Cotta de Mello Resumo Este caso de ensino analisa a trajetória de uma empresa do ramo de livrarias, fundada na década de 1940, que a partir dos anos 1990 mostrou expressivo crescimento, utilizando o sistema de franquias. Em 2010, a empresa operava mais de 200 franquias, localizadas em sua maioria no Brasil, e 25 franquias em Portugal, Espanha (Galícia), México, Colômbia e Angola. O caso se propõe a discutir o potencial de expansão internacional da empresa e sua importância para o crescimento futuro da empresa vis-à-vis as operações domésticas. Introdução A direção da rede de livrarias Nobel podia comemorar os excelentes resultados obtidos em seu negócio. O mercado brasileiro de livros vinha se expandindo nos últimos anos, graças à ascensão de um novo segmento da população à classe média, que começava a valorizar a leitura como símbolo de status social. Outros mercados relacionados, como o de educação e o de jornais, também viviam um período de forte expansão no Brasil. De forma geral, podia-se dizer que havia excelentes perspectivas de expansão no mercado doméstico, mas que se impunha especial atenção ao mesmo nesse momento, pois se a Nobel não aproveitasse o momento favorável, outras empresas e outros canais de venda de livros poderiam ocupar o espaço existente. Por exemplo, a empresa enfrentava a concorrência das megastores, como a rede Saraiva, do comércio eletrônico de livros, e, ainda, da venda direta, porta-a-porta, que começava a se fortalecer, atendendo ao mesmo segmento, particularmente em regiões que não estavam bem atendidas por livrarias. A direção da empresa via a operação internacional como importante para o futuro, mas, ao mesmo tempo, preocupava-se em desviar recursos gerenciais e financeiros do mercado doméstico, em franco crescimento, para mercados que enfrentavam crise econômica, como Portugal e Espanha. Contexto O setor brasileiro de franquias encontrava-se em expansão, tanto no mercado doméstico, quanto no mercado externo. O crescimento do número de franquias no mercado brasileiro e a estabilidade e a força demonstradas por esses negócios podiam ser considerados indicadores de seu potencial de expansão para o mercado internacional. O Brasil se encontrava em quarto lugar no ranking de países em relação ao total de redes franqueadoras, ficando atrás apenas da Coréia do Sul, Estados Unidos e China. Além disto, ocupava a sexta posição em relação ao total de unidades franqueadas, seguindo-se a Estados Unidos, Coréia do Sul, Japão, China e Índia. Segundo a Associação Brasileira de Franchising, no ano de 2010, havia 69 redes brasileiras atuando em 49 países, enquanto em 2008 esse número era de 59 redes em 43 países e em 2006 de 35 redes, o que indica praticamente uma duplicação do número de redes brasileiras atuantes no mercado internacional em quatro anos (Tabela 1). O país com o maior número de redes brasileiras era Portugal (33 redes), seguido por Estados Unidos (20), Angola (17) e Paraguai (16). 1

Tabela 1: Evolução do Número de Franquias no Brasil Ano Número de Redes de Franquias no País Dispersão Internacional (número de países) 2006 35 N.D. 2008 59 43 2010 69 49 No entanto, apesar do grande número de países em que já se encontravam instaladas as franquias brasileiras, era ainda muito pequeno o número de franquias em cada país, o que tornava mais difícil a operação no exterior, devido à falta de escala nas operações. De fato, informações disponíveis na imprensa (Simões, 2011) dão conta de que a participação média do faturamento proveniente do exterior nas empresas franqueadoras não chegava a 5% do total, em 80% das franquias. No que se refere ao mercado brasileiro de livros, este vinha apresentando grandes transformações. Tradicionalmente, o Brasil sofria de uma carência de livrarias, com menos de 2.000 livrarias para mais de 5.000 municípios em 2009. Grande parte da população, principalmente aquela de cidades pequenas e regiões rurais e semi-rurais, tinha grande dificuldade de acesso ao produto. Essa dificuldade era contornada pela organização de círculos de leitura, pela venda de livros de teor religioso nas igrejas, principalmente evangélicas, e pela venda direta, além de canais de distribuição não ortodoxos, tais como quiosques de vendas de jornais, papelarias e supermercados, entre outros. Com o aumento da renda da população, o segmento de venda direta porta-a-porta de livros, que tinha apenas uma participação de 9% no mercado editorial, aumentou entre 2007 e 2010, para quase 22%. i A ênfase do segmento de venda direta é em best-sellers, livros religiosos, pedagógicos e infantis. Além de livrarias e atacadistas, empresas como a Avon, aproveitandose de sua capilaridade, com mais de um milhão de revendedoras atuando em todo o Brasil, também passaram a atuar no segmento. Em 2010, a Avon liderava o segmento, com um faturamento de 400 milhões de reais, estimando-se que as vendas totais do segmento atingissem 1,2 bilhão de reais naquele ano. ii Estimava-se que a venda de livros no Brasil crescesse 10% em 2011. Havia ainda uma tendência de concentração no setor de livrarias. As grandes redes que comercializavam mais de 250 mil exemplares, respondiam por 41% do número de livrarias; as redes de tamanho médio, com vendas de 50 a 250 mil exemplares, representavam 25% do número de livrarias, e as pequenas livrarias respondiam pelos outros 34%. Analistas do setor julgavam que a tendência era de cada vez maior concentração do setor, com a aquisição de livrarias de médio porte pelas grandes. iii Histórico da Empresa A rede de livrarias Nobel foi fundada em 1943. No entanto, seu crescimento só se tornou expressivo a partir de 1992, quando a empresa adotou o sistema de franquia. Segundo fontes da empresa, era uma decisão pioneira não só no Brasil, mas na América Latina, onde não havia, até então, outra rede de livrarias que utilizasse esse sistema. A oportunidade para criar um sistema de franquia de livrarias derivava de aspectos peculiares desse tipo de comércio no país, que foram detectados pela direção da Nobel. No Brasil, o número de livrarias era 2

historicamente insuficiente para atender às demandas do mercado. Estima-se haver, à época, cerca de 1.500 livrarias no Brasil, para um potencial projetado de dez mil. Além disso, 89% dos municípios brasileiros não dispunham de livrarias. Dentro dessa perspectiva, havia grande potencial para franquia de livraria, nas regiões desprovidas desse tipo de comércio, utilizando franqueados locais. A franquia permitia aos franqueados em regiões distantes, no interior, ou em áreas de menor densidade populacional, beneficiarem-se de economias de escala e da experiência da franqueadora. À medida que expandia sua rede franqueada, a direção da Nobel detectava novas oportunidades que poderiam ser atendidas por meio de modelos de lojas distintos, voltados para mercados específicos. Assim, a rede adotou três formatos de livrarias: grandes lojas (conhecidas como megastores), lojas tradicionais e quiosques. Além disso, a empresa fez parcerias para estar presente em pontos de venda não tradicionais, como postos de combustíveis, academias, estádios, estações de metrô etc. Expansão Internacional A Livraria Nobel iniciou sua expansão para o mercado internacional, começando por Portugal. A rede anunciou, no início de 2005, a abertura de sua primeira loja franqueada no país. Foi a primeira livraria brasileira a se internacionalizar e uma das primeiras franqueadoras brasileiras a se expandir para fora. Ainda em 2005, a empresa preparou o plano de negócios para entrada no mercado do México, fechando o contrato com o máster franqueado mexicano em meados de 2005. Em 2006, a Nobel tinha um total de 150 lojas e ainda era a única rede de livrarias nacional com operações no exterior. No mesmo ano, a empresa ingressou no mercado de Angola, prosseguindo na ampliação de suas operações internacionais. A empresa também prosseguiu com suas parcerias com outras organizações varejistas no mercado brasileiro. Em 2007, a Nobel dispunha de dez lojas operando na Europa, sendo cinco em Portugal e cinco na Espanha. Foram inauguradas as primeiras unidades do México e de Angola. No mercado brasileiro, a empresa realizou uma diversificação relacionada, entrando no varejo de brinquedos sob a marca Zastrás. Em 2008, a empresa dispunha de 185 lojas, sendo 17 no exterior. Em2009, a Nobel tinha 196 lojas em operação e 205 contratos de franquia, e faturamento de R$ 140 milhões em 2009. Neste ano, a empresa ingressou no mercado da Colômbia, com início de operações para 2010. Ainda em 2009, a empresa desenvolveu um projeto para lançar coleções de livros sob sua própria marca, planejando que os mesmos chegassem a representar 30% das vendas da empresa em um prazo de cinco anos. Os livros infantis já estavam sendo produzidos com a marca da rede de varejo Zastrás, e os de literatura clássica com a marca Nobel. Também tencionava produzir livros em categorias em que a marca não era diferencial, tipo commodity, tais como livros de culinária e educativos. Também pretendia diversificar para produtos de papelaria e informática sob marca própria. Em meados de 2010, a empresa dispunha de 25 franquias internacionais, que representavam 5% de seus negócios. A empresa anunciou o lançamento da rede de papelarias Nobex, para entrada em áreas que não comportavam uma livraria. A papelaria teria uma seção de livros. A Figura 1 apresenta a evolução do número de lojas da Nobel. 3

250 200 150 100 93 150 185 196 50 0 2002 2006 2008 2009 Figura 1: Evolução do Número de Lojas da Livraria Nobel (Estimado) Além da expansão internacional, a direção da empresa detectava ainda grande potencial de crescimento no Brasil, considerando que municípios com até 50 mil habitantes comportariam a instalação de uma livraria Nobel. A empresa ganhou vários prêmios em sua trajetória, sendo selecionada como uma das melhores franquias brasileiras nos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009. Além disso, obteve excelentes resultados em sua trajetória. Pertence à Franchising Ventures, holding de franquia que, além da Nobel, é franqueadora das marcas Nobex, Zastras, Sapataria do Futuro e Costura do Futuro, além da Café Donuts. A Franchising Ventures criou um fundo de privateequity para investir no setor de franquias. Estratégia de Internacionalização A Nobel seguiu uma estratégia de internacionalização bem concebida e cuidadosa, respeitando o tempo necessário para que as coisas pudessem acontecer em cada país. A internacionalização era percebida como imperativo estratégico. A direção da empresa via a internacionalização como parte de um processo que conduziria a livraria Nobel para se tornar uma rede globalizada, atraindo os editores de atuação global. Dentro dessa perspectiva de longo prazo, os lucros imediatos não eram considerados importantes, reconhecendo-se a necessidade de investir na construção dessa trajetória internacional. Essa estratégia era visualizada no contexto de um movimento de concentração mundial do setor de varejo de livros, que impunha à empresa um passo rápido para a internacionalização, de modo a construir vantagens competitivas. A intenção era a de controlar o canal de relacionamento com o cliente, tornando-se o negócio ideal para os fornecedores.para os dirigentes da Nobel, o processo de internacionalização deveria ser rápido, para criar fidelização do cliente nos mercados em que entrava. A empresa acreditava que os clientes em outros países, como os brasileiros, tendiam a adotar uma livraria, criando um hábito de visitá-la e tornando-se clientes cativos. Assim, quanto mais cedo a empresa entrasse em mercados onde ainda não se dispunha de livrarias, ou onde o atendimento de livrarias era deficiente, melhor. As vantagens de se mover antes dos concorrentes (ou seja, vantagens de first mover) eram, portanto, fundamentais nesse processo. 4

Desta forma, a franquia máster emergiu como a melhor opção para a empresa, por permitir maior controle, menos investimento e beneficiar-se do know-how local do máster franqueado. O primeiro mercado em que a empresa ingressou foi Portugal. Esta escolha era natural, tendo em vista a similaridade de idioma, um elemento fundamental para o negócio de livrarias, já que o produto brasileiro pode ser vendido nesse mercado. Observe-se que o negócio da Nobel não depende de o livro ser brasileiro, mas a possibilidade de vender livros brasileiros é um diferencial que permite a obtenção de economias de escala em compras. A operação portuguesa ficou a cargo do Grupo Oroana, de Lisboa, e da Livraria e Papelaria Académica, uma das de maior tradição no país, ligadas ao franqueado máster cuidadosamente selecionado pela rede Nobel em Portugal, o empresário Carlos Duarte. Logo após o ingresso no mercado português deu-se a entrada na Espanha. Nesse mercado, a empresa já não desfrutava de vantagens competitivas na aquisição de livros, uma vez que não tinha ainda experiência com as editoras de língua espanhola. Não obstante, essa falta de experiência foi vista como oportunidade, propiciando um aprendizado importante para sua futura expansão na América Latina. O máster franqueado foi a rede Espacio Lector, uma cadeia de livrarias fundada em 1992 na Galícia, associada ao maior grupo distribuidor de livros do noroeste da Espanha. Observe-se que o idioma da Galícia, onde opera a franquia, é o galego, muito semelhante ao português falado em Portugal. Além de seis lojas próprias do máster franqueado, todas localizadas na Galícia, a Espacio Lector já havia vendido 18 franquias em várias partes distintas da Espanha até meados de 2010: Madri, Huelva, Gramada, Málaga, Murcia, Castellon, Valencia, Barcelona, Leida, león, Palencia, Santiago de Compostela, Pontevedra e Almería. Todas essas lojas, próprias e franqueadas, são chamadas Espacio Lector Nobel. Os olhos da direção da Nobel se voltaram então para Angola, um mercado que comunga com o Brasil e Portugal o mesmo idioma. Após o final da guerra civil em Angola, uma parcela de sua população se mostrava sedenta por produtos culturais, e o Brasil é uma referência nesse campo para os países africanos de língua portuguesa. Esse aspecto foi, naturalmente, decisivo para a seleção de Angola como terceiro mercado internacional onde estabelecer uma franquia. A máster franqueada em Angola era uma empresária que não tinha ainda experiência no ramo. De forma a contornar esse obstáculo e aumentar a probabilidade de sucesso da nova operação a ser inaugurada em Luanda, capital de Angola, a empresária veio ao Brasil para se submeter a um treinamento, realizado em São Paulo, juntamente com outros franqueados da rede. A primeira loja foi inaugurada em 2007, com 150 metros quadrados, encontrando-se localizada em um shoppingcenter que acabava de ser inaugurado, o primeiro do país. Devido às limitações do mercado editorial angolano, optou-se pela importação de livros de Portugal e do Brasil, com vistas a abastecer a nova loja. Livros didáticos foram importados de Portugal e livros técnicos do Brasil, além de literatura e outros segmentos editoriais. A rentabilidade obtida na loja angolana foi maior do que a de lojas brasileiras similares em tamanho. Segundo declarações do executivo principal, as margens são maiores, os livros custam mais que no Brasil e o que se coloca nas prateleiras vende-se". Em 2010 havia 17 franquias brasileiras em Angola, que havia se tornado o terceiro maior mercado para franqueadores brasileiros. Dessas 17 franquias, três pertenciam à Franchising Ventures (Livraria Nobel, Sapataria do Futuro e Costura do Futuro). A esses movimentos iniciais seguiu-se rapidamente a escolha do México, uma vez que se tratava do principal mercado latino-americano, além de pertencer ao Nafta e ser próximo do grande mercado norte-americano, um objetivo visado em um futuro mais distante. A expansão 5

para a América Latina era, em parte, o resultado da experiência obtida com a operação espanhola, que havia gerado diversos aprendizados. Por exemplo, graças à operação na Espanha, a empresa havia estabelecido bons contatos e relacionamento com as editoras de língua espanhola, o que era considerado um passo fundamental para sua ambição de expansão na América Latina. A escolha do franqueado máster ocorreu em 2005, mas as operações no México só tiveram início em 2007. O máster franqueado mexicano era a rede Librerías Gandhi, fundada em 1971, que já atuava no mercado com 15 livrarias em 2007 e 22 em 2010. A rede Gandhi já tinha a intenção de partir para um sistema de franquias. Assim, a associação com a Nobel foi providencial, dando-lhe os meios para realizar esse objetivo estratégico. Embora o executivo principal e sócio da rede Nobel, Sergio Milano Benclowicz, e o diretor comercial e sócio da rede Gandhi, Leon Achar já se conhecessem há bastante tempo, por meio de contatos em feiras internacionais, a possibilidade de parceira surgiu em uma feira de livros em Chicago, aproximadamente dois anos antes da efetivação da parceria. Os dois empresários se deram conta de que as duas empresas tinham modelos bastante similares. Observou o empresário mexicano a esse respeito: La sociedad consiste en transmisión del conocimiento de Nobel, para contarnos cómo han planteado su estrategia de crecimiento y para trasmitirnos su know-how en las franquicias de librerías. Nosotros les aportamos una marca reconocida, el conocimiento del mercado mexicano y de sus proveedores. Para a Nobel, a entrada no México se via bastante facilitada com um parceiro como Librerías Gandhi, com excelente imagem no mercado e que vinha investindo fortemente em propaganda e desenvolvimento de sua marca no mercado local. O próximo passo da empresa foi para a Colômbia, outro país de língua espanhola. Em 2009, a livraria Nobel celebrou contrato de franquia com um máster franqueado de Bogotá, Colômbia, o empresário Manuel Barragan. Na Colômbia, o mercado potencial também parecia ser muito grande, tendo em vista o pequeno número de livrarias em operação naquele país, que era, além disso, o terceiro maior mercado de livros da América do Sul (após o Brasil e a Argentina). Na ocasião, o presidente da Nobel Franquias, Sérgio Benclowicz, indicou: A Colômbia tem potencial. As poucas redes de livrarias que existem estão concentradas apenas nas grandes cidades, os modelos das concorrentes são antigos e há muitos pólos econômicos regionais a serem desenvolvidos". Além disso, havia pouca concorrência, com apenas duas grandes redes atuantes. A nova loja seria uma operação piloto, com cerca de 100 metros quadrados. A Colômbia vinha sendo considerada um mercado de grandes oportunidades para as franquias brasileiras, por vários motivos. O primeiro deles era o fato de se tratar de um país com alto índice de empreendedorismo, o que levava à procura de negócios de franquia. Em segundo lugar, as franquias brasileiras eram percebidas como acessíveis financeiramente e compatíveis com a cultura e os hábitos dos colombianos. Terceiro, a população colombiana, de forma geram, tem nível cultural mais elevado do que outros povos latino-americanos. E quarto, o país atravessa um período de estabilidade econômica, o que favorece a atração de franqueados. A presença brasileira em feiras e exposições relacionadas a franquias tem apoiado a atitude favorável dos empreendedores colombianos em relação às franquias brasileiras. 6

Tabela 2: Ano de Abertura da Primeira Loja em Cada País e Rede de Livrarias Máster Franqueada País Ano de Abertura da Primeira Loja Rede Local de Livrarias (Franqueado-Máster) Portugal 2005 Livraria e Papelaria Académica Espanha (Galícia) 2005 Espacio Lector Angola 2007 México 2007 Librerías Gandhi Colômbia 2009 Em 2010, a Nobel visualizava outros mercados como alternativas futuras de internacionalização. Um mercado extremamente atraente, mas que exigia preparação da empresa era o norte-americano. Em 2008, a empresa já havia iniciado os estudos para entrada nos Estados Unidos, embora não tencionasse fazê-lo de imediato. Só posteriormente seriam iniciados os planos e negociações para a abertura de lojas nos Estados Unidos. A idéia central era abrir uma livraria étnica nos Estados Unidos, voltada para o atendimento do grande mercado latino-americano. A América Latina permanecia como principal mercado de interesse da empresa, pelas várias sinergias que poderia proporcionar com as operações já em andamento no exterior. A direção da empresa tinha grande interesse no mercado da Argentina, já tendo dado os passos iniciais de estudo do mercado, mas ainda não havia encontrado um máster franqueado com o perfil desejado. Outra possibilidade era o Peru, que também estava sendo cogitado. A empresa pretendia dispor de aproximadamente 600 lojas em toda a América Latina no prazo de dez anos. Para a conquista de máster franqueados, a Livraria Nobel utilizou fundamentalmente a participação em feiras, como forma de entrar em contato com potenciais investidores e interessá-los no negócio. Essa participação foi facilitada, em boa parte, pelas ações promocionais desenvolvidas pela Apex-Brasil e pela Associação Brasileira de Franchising. Outros fatores influenciaram, como a crescente boa aceitação das franquias brasileiras no exterior, particularmente em países da América Latina, da Europa Mediterrânea e da África Portuguesa, onde o Brasil é mais conhecido. Além disso, em mercados já saturados por ofertas convencionais de franquia, como as de fast-food norte-americanas, novas opções são muitas vezes bem recebidas. Uma vez estabelecidos os contatos, a Nobel se preocupava em montar as parcerias e nomear franqueados máster para cada país. Não havia uma preocupação de desenvolver uma rede de lojas próprias. Isso ocorria tanto pela dimensão do investimento envolvido, como pelo fato de que a existência de um parceiro local é uma garantia de que não seriam cometidos erros culturais, à hora de criar e desenvolver o negócio. Como observou Eduardo Pires, gerente de expansão de franquia da Livraria Nobel, em entrevista: "Nossa estratégia é contar com sócios locais nos países em que chegamos. Nós temos o know-how do negócio e eles o conhecimento da cultura, da legislação e do mercado. 7

O sistema de franquia máster da Nobel funcionava da seguinte forma: A Nobel dava os direitos ao uso da marca e do formato de negócio, apoiados pelo know-how operacional da empresa. A Nobel também se responsabilizava pelo treinamento e pelo material promocional. O empresário local trazia seu conhecimento do mercado local e se responsabilizava pela expansão posterior da operação em seu país, vendendo a franquia a novos franqueados a ele subordinados. Ele era também responsável pelo controle desses franqueados. O empresário local pagava royalties e uma taxa de franquia à Nobel. O papel do franqueado máster era fundamentalmente o de ampliar as operações no país, e dos franqueados locais, por ele estabelecidos, o de conduzir as operações das lojas. A Nobel utilizou ainda suporte de organizações como a Apex, dedicada à expansão internacional de empresas brasileiras e ABF, Associação Brasileira de Franchising. Uma dessas campanhas merece especial menção. A campanha foi realizada nos Estados Unidos, México, Portugal e Espanha, com a participação, além da Nobel, de mais cinco franquias de alimentação, uma de cosméticos, uma de calçados, uma de vestuário, uma de cosméticos, uma de produtos naturais, uma de serviços de conservação e duas do setor de treinamento. Os gastos foram divididos da seguinte forma: 50% pelo governo federal, 25% pela ABF e 25% pelas empresas beneficiadas. A intenção era fazer três a quatro inserções diárias na programação da Globo Internacional nesses países no decorrer do mês anterior à realização de feiras. O executivo principal da Nobel deu o seguinte depoimento a uma revista de negócios brasileiras, sobre o impacto positivo dessas ações: Começamos nosso processo por conta própria em 2005, entrando em Portugal. Mas, quando passamos a fazer parte do projeto, conseguimos expandir para mais mercados e consolidar nossa internacionalização. Perspectivas Futuras Os cenário doméstico e internacional haviam sofrido grandes mudanças, que forçavam a direção da Nobel a continuamente rever suas estratégias. Em particular, a grande expansão do mercado brasileiro de livros em papel uma tendência comum aos mercados emergentes, mas contrária à dos mercados desenvolvidos, onde as livrarias diminuíam e o livro eletrônico substituía o livro em papel criava novas oportunidades que exigiam rápida resposta da Nobel. Paralelamente, a crise econômica que afligia os países europeus, entre os quais eram particularmente afetados os dois mercados da empresa Portugal e Espanha com desemprego crescente e queda da renda dos trabalhadores, fazia prever grandes dificuldades para os empreendimentos locais. Como toda empresa, a Nobel tinha que gerenciar recursos gerenciais e financeiros limitados para a expansão. Deveria a empresa deixar os mercados europeus? Deveria concentrar sua atenção nos mercados latinoamericanos, que passavam por fenômeno similar ao do Brasil? Ou deveria focar seus esforços no mercado doméstico e aproveitar a oportunidade de crescimento que ali se oferecia? 8

NOTAS DE ENSINO Objetivos de Ensino O caso poderá servir aos seguintes objetivos: Entender o processo de internacionalização de uma rede de livrarias brasileira e como as características específicas do negócio podem influenciar diversos aspectos a serem considerados; Identificar e analisar as vantagens e desvantagens da internacionalização utilizando o modelo de franquias; Discutir os critérios de seleção de mercado em um processo de internacionalização de uma empresa; Avaliar as decisões de estratégia de marketing adotadas ao longo do processo de expansão da empresa. Entender as opções estratégicas com que uma empresa empreendedora se defronta, diante de opções de crescimento no mercado doméstico e no mercado internacional. Sugere-se a formulação das seguintes questões para fomentar a discussão entre os alunos: Quais foram os principais fatores que impulsionaram a expansão internacional da Nobel? A expansão internacional se caracteriza por um processo estratégico planejado, ou emergente e oportunista? Por quê? Qual(is) o(s) modo(s) de entrada escolhido(s) e quais razões justificaram a escolha do(s) mesmo(s)? Que critérios foram utilizados para a escolha dos mercados em que ocorreu a internacionalização? Há alguma razão estratégica específica para a escolha da sequência observada? Como era o processo de seleção dos máster franqueados e que fatores foram considerados? Esse processo deveria mudar? Quais decisões estratégicas de marketing a empresa implementou ao longo de sua expansão? Quais as razões alegadas para a adoção de tais mudanças? Como a empresa deve orientar seu crescimento futuro? Análise do Caso A expansão das franquias brasileiras no exterior é um movimento aparentemente irreversível, estimulado pela expansão da economia brasileira e pelas grandes oportunidades que se apresentam no exterior. Uma modalidade interessante é o uso da franquia máster para ingressar em mercados internacionais, modalidade usada pela Nobel em seu processo de expansão. A empresa é pioneira no Brasil no uso de franquias de livrarias e tem sido capaz de implantar o conceito de franquia máster de livrarias em outros mercados. 9

Fatores Motivadores da Internacionalização A expansão internacional da rede Nobel tem características de processo planejado dentro de uma visão estratégica de negócios, em que o franqueador planeja entrar um mercado internacional e busca ativamente um franqueado. Portanto, na abordagem estratégica a seleção de mercado tende a preceder a seleção de parceiros (Doherty, 2009). A empresa encarava a expansão internacional como um imperativo estratégico, empreendido pelos executivos chefes, que desempenhavam papel fundamental de incentivo a expansão internacional, intencionando tornar a Nobel uma rede internacional globalizada. Em determinado momento foi até criado um fundo de private equity para realizar captações com o objetivo de fomentar o processo de expansão da rede Nobel. Outra vertente estratégica da expansão se baseava na necessidade de construir rapidamente vantagens competitivas em mercados cujo negócio de livrarias ainda estava pouco desenvolvido, mediante (1) o estabelecimento de fortes alianças com editores estratégicos e (2) a construção de forte imagem de marca e relações com os clientes. Isto deveria ser feito antes que os grandes competidores internacionais fechassem a porta de entrada de mercados potenciais, valendo-se do processo de concentração já em andamento nos grandes mercados mundiais. O mercado local não era visto como saturado e, portanto, não foi razão observada para o inicio do processo de internacionalização. Modo de Entrada Escolhido Em todos os casos observados, o modo de entrada escolhido foi a máster franquia. Conforme percepção da empresa, este implicava em menor necessidade de aporte de recursos (Petersen & Welch, 2000), maior rapidez de expansão no mercado local e a terceirização do controle dos franqueados para o máster franqueado (i.e. menor custo de agenciamento). Além disto, o uso de um máster franqueado reduzia risco de erros na adaptação local do negócio, pois este agregava conhecimento da cultura, da legislação e dos mercados locais (Liu, Liu, Lin, & Chiu, 2011). A Seleção de Mercados Como mencionando, a expansão internacional da rede Nobel fez parte de um processo planejado, em que a escolha de mercado precedia a escolha do franqueado. O processo de seleção de mercados e de franqueados máster é essencial para o sucesso de uma operação internacional, sendo realizado de forma quase simultânea pela empresa. Mas há um claro viés na busca de mercados de baixa distância cultural ou (Johanson & Vahlne, 1977). O fator preponderante considerado foi o idioma (Alexander & Rhodes, 2007). Isto ficou evidenciado pela ordem sequencial dos mercados escolhidos: (1) Portugal (português), (2) Galícia (galego, semelhante ao português), (3) outras regiões da Espanha (espanhol), (4) Angola (português), (5) México (espanhol) e (6) Colômbia (espanhol). O peso do idioma na escolha de mercado também se justifica por questões estratégicas, já que o idioma está diretamente relacionado ao negócio. Assim, a expansão primária em países de língua portuguesa era facilitada pelo fato de ser possível vender livros brasileiros, o que era considerado diferencial competitivo. Por outro lado, tão logo quanto possível, a empresa 10

buscou estabelecer contato com editores espanhóis, o que criou bases para a posterior expansão no México. Embora em importância estratégica secundária, a empresa também buscava se certificar de que estava entrando em mercados onde a concorrência era fraca, ou quase inexistente (Alexander & Rhodes, 2007), com potencial de crescimento e com economia estável. A Seleção de Máster Franqueados A seleção do máster franqueado aparentou ser um processo realizado com cuidado e sobriedade. Geralmente, foram escolhidos donos de negócios de livrarias (Choo, Mazzarol, & Soutar, 2007; Clarkin & Swavely, 2006; Doherty, 2009) e de conhecimento prévio dos executivos chefes da Nobel (Doherty & Alexander, 2004). No único caso em que o máster franqueado não tinha conhecimento prévio do negócio, ele recebeu treinamento específico. Experiência em franquias não era, nem podia ser, essencial porque não foi constatada a existência do negócio de franquias de livrarias nos países em ocorreu a internacionalização. Tratáva-se, então, de excelente oportunidade de negócio também para os máster franqueados (Vaishnav & Altinay, 2009). A Nobel se preocupava também em identificar empresas com cultura e modelos de negócio similares. Tal preocupação implica que a distância cultural entre empresa franqueadora e máster franqueado é uma consideração adicional à da simples distância entre países. Aparentemente, portanto, o fenômeno da distância cultural/psicológica ocorre em dois níveis distintos: o do país e o da empresa. Pelo que se viu anteriormente e a direção da Livraria Nobel parece ter isso bastante claro a escolha do máster franqueado em determinado mercado externo é um passo fundamental para o sucesso. Um bom máster franqueado potencializa as competências e a imagem da empresa franqueadora, contribuindo para seu crescimento e fortalecimento no mercado de atuação. Já uma má seleção do máster franqueado pode levar a desastres, desde efeitos negativos sobre a imagem da marca até mesmo problemas legais. A direção da Nobel percebia isso com clareza, tomando o tempo necessário para encontrar um bom parceiro, e adiando a entrada em determinado mercado quando não conseguia encontrar um parceiro com o perfil desejado. A Implementação Local Treinamento continuado de franqueados também era percebido como importante. Isso envolvia, em um primeiro momento, uma estadia do máster franqueado no Brasil, para que tivesse a oportunidade de conhecer a franqueadora, sua filosofia, seus valores e seus procedimentos operacionais. A Nobel preocupava-se muito com esse aspecto, trazendo os máster franqueados para um estágio no Brasil, em que passavam tanto por treinamento formal como por visitas in loco a lojas, para observarem de que forma as coisas funcionavam. Os franqueados estrangeiros também eram colocados em contato com os melhores franqueados brasileiros, que, por sua vez, mostram alguns aspectos da operação de um ponto de vista distinto daquele apresentado pelo franqueador. A Nobel também parecia realizar os esforços necessários para a implementação das franquias. Um aspecto que ressalta no estudo do caso é o tempo dedicado pela empresa à posta em marcha da operação. No caso da Nobel, podia se passar de um a dois anos entre a assinatura 11

do contrato com um máster franqueado e o início efetivo de operações. Isso ocorria porque muitos aspectos precisavam ser detalhados previamente à inauguração de uma loja. Com isso, a empresa garantia que os problemas associados à implementação ocorreriam antes do início efetivo das operações nos mercados. O Apoio Institucional Outro aspecto marcante do processo de internacionalização examinado decorre de a empresa fazer uso do suporte institucional disponível à internacionalização no Brasil. O sucesso recente de franquias brasileiras no exterior é, em parte, resultado de apoio governamental, por intermédio da ApexBrasil, e da Associação Brasileira de Franchising (ABF), que congrega empresas franqueadoras. Entre as ações promovidas ou apoiadas por essas entidades incluemse a participação em feiras e eventos no exterior e a realização de campanhas promocionais para promover as franquias brasileiras no exterior. Os dirigentes da Nobel freqüentavam feiras e exposições internacionais de franchising para fazer contato com candidatos a franqueados, já que indivíduos interessados com o perfil desejado tendem a estar presentes nessas feiras. Aspectos relacionados à Estratégia de Marketing Ao longo de seu processo de expansão a rede Nobel demonstrou ter uma atenção especial à sua estratégia de marca, buscando estabelecer marcas fortes em nichos distintos de mercado, valendo-se também de elementos característicos de estratégia de redes de varejo, como por exemplo, a criação de marcas próprias, resultado da grande preocupação demonstrada em gerar crescente brand awareness na mente do consumidor. A adoção de uma estratégia de portfólio de marcas, também foi acompanhada pela implantação de distintos formatos de varejo com distintas propostas e segmentações de mercado. O objetivo era estar posicionado com a oferta ideal para os distintos segmentosalvo, em distintos locais de compra. A empresa optou também por uma estratégia bastante agressiva de diversificação relacionada, adquirindo outros negócios de varejo, que acreditava produzirem sinergia com o negócio principal de venda de livros. A estratégia de produto neste negócio tinha um componente interessante: o relacionamento com bons editores. Sabedora deste diferencial competitivo, a empresa norteava seu processo de expansão pela busca do estabelecimento de relações com novos editores, que pudessem agregar essa vantagem competitiva à empresa. Tal fato fica extremamente evidente na lógica de estruturação da empresa para as planejadas expansões para o México e para Angola. Por fim, o único momento em que se pode observar que a empresa gerenciava de perto sua estratégia de preço foi na análise da expansão para o mercado Angolano, onde a empresa pode praticar preços diferenciados e obter maiores margens. Alternativas Estratégicas A grande decisão estratégica a ser enfrentada pela Nobel é se deve prosseguir com sua expansão internacional, reduzir essa presença, ou mantê-la estável, sem maiores investimentos, enquanto explora o crescimento explosivo do mercado de livros no Brasil. Os alunos devem ser convidados a considerar essas características, a examinar cuidadosamente as 12

vantagens e desvantagens de cada alternativa, oferecendo uma recomendação estratégica à direção da empresa. Referências Alexander, N., & Rhodes, M. (2007). International Market Selection: Measuring Actions Instead of Intentions. Journal of Services Marketing, 21(6), 424 434. Aliouche, E. H., & Schlentrich, U. A. (2011). Towards a Strategic Model of Global Franchise Expansion. Journal of Retailing, 87(3), 345 365. Alon, I. (2006). Market Conditions Favoring Master International Franchising. Multinational Business Review, 14(2), 67-82. Altinay, L. (2007). The Internationalization of Hospitality Firms: Factors Influencing a Franchise Decision-Making Process. Journal of Services Marketing, 21(6), 398 409. Baena, V., & Cerviño, J. (2011). Identifying The Factors Driving Market Selection in Latin America. An Insight From The Spanish Franchise Industry. Procedia Social and Behavioral Sciences, 24, 340 350. Brookes, M., & Altinay, L. (2011). Franchise Partner Selection: Perspectives of Franchisors and Franchisees. Journal of Services Marketing, 25(5), 336 348. Choo, S., Mazzarol, T., & Soutar, G. (2007). The Selection of International Retail Franchisees in East Asia. Asia Pacific Journal of Marketing and Logistics, 19(4), 380-397. Clarkin, J. E., & Swavely, S. M. (2006). The Importance of Personal Characteristics in Franchisee Selection. Journal of Retailing and Consumer Services, 13, 133 142. Doherty, A. M. (2007a). The Internationalization of Retailing: Factors Influencing the Choice of Franchising as a Market Entry Strategy. International Journal of Service Industry Management, 18(2), 184-205. Doherty, A. M. (2007b). Support Mechanisms in International Retail Franchise Networks. International Journal of Retail & Distribution Management, 35(10), 781-802. Doherty, A. M. (2009). Market and Partner Selection Processes in International Retail Franchising. Journal of Business Research, 62, 528 534. Doherty, A. M., & Alexander, N. (2004). Relationship Development in International Retail Franchising: Case Study Evidence From UK Fashion Sector. European Journal of Marketing, 38(9/10), 1215-1235. Eroglu, S. (1992). The Internationalization Process of Franchise Systems: a Conceptual Model. International Marketing Review, 9(5), 19-30. 13

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