Aprendizagem e Neurodiversidade. Por André Luiz de Sousa

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Transcrição:

Aprendizagem e Neurodiversidade Por André Luiz de Sousa

Você provavelmente já se perguntou: o que é a aprendizagem? Como aprendemos? Neste breve texto, falaremos um pouco sobre este assunto. A aprendizagem é um fenômeno ou um processo que está relacionado com o ato ou efeito de aprender ou apreender. Seria o mesmo que assimilar mentalmente, abarcar com profundidade; compreender, captar. A aprendizagem estabelece relações entre certos estímulos e respostas. No geral, ela facilita a nossa adaptação ao meio ambiente, nos auxilia na resolução de problemas e a sobreviver desde muito cedo. A aprendizagem começa a ocorrer quando ainda estamos no útero materno e nos acompanha durante todo o desenvolvimento, ao longo de toda a vida. Dessa forma, é possível observar que o desenvolvimento infantil é uma fase bastante importante, uma vez que é nessa fase que se desenvolvem os processos de aprendizagem pelos quais as crianças passam a adquirir, desenvolver e aprimorar diversas habilidades em diferentes aspectos do desenvolvimento: sensorial, motor, linguagem, cognitivo, emocional e social, que serão importantes para toda vida. Na primeira infância, que ocorre entre os zero e 3 anos de idade, se desenvolvem as bases de habilidades que para certos comportamentos e ações (como, por exemplo, palavra, dar os primeiros passos, dizer a primeira, tentar alcançar um objeto, acompanhar visualmente movimentos, começar a expressar emoções, etc.) que são esperados a partir de determinada idade, processo que vai pouco a pouco tornando a criança cada vez mais independente e autônoma. A segunda pergunta que geralmente muitos de nós também já devem ter feito é: Como isso é possível? Como a aprendizagem ocorre? Principalmente quando nos deparamos com uma situação em que não dominamos um assunto/conteúdo ou processo e evidenciamos essa aquisição acontecer, seja conosco, seja com o outro. A aprendizagem não está apenas relacionada à vida acadêmica, pois estamos interagindo o tempo todo com novos desafios de adaptação. Entretanto, na escola a aprendizagem ocorre por meio de processos sistemáticos e intencionais conforme a organização das atividades. Ou seja, na escola necessitamos de uma aprendizagem específica para os conteúdos que serão apresentados naquele espaço. 2

No ramo da Psicobiologia, a aprendizagem é definida pela fixação e acomodação na memória das impressões ambientais. E assim como ocorrem mudanças no comportamento, também ocorrem modificações em nosso cérebro, que é a matriz do aprendizado. É primeiro nele que as mudanças ocorrem e, posteriormente, estas se expressam em novos comportamentos. A possibilidade ou a disposição de aprendizagem dependem do nível de desenvolvimento do cérebro e é determinada por vários fatores, tais como biológicos, sociais, cognitivos e emocionais. Quase todos os animais podem aprender. Nos animais com um cérebro pequeno, a maior parte dos neurônios (células nervosas) é utilizada no estabelecimento dos circuitos automáticos herdados e poucos ficam disponíveis para a aprendizagem. Por outro lado, nos animais de cérebro grande (por exemplo, nos mamíferos) o número de neurônios é suficiente para permitir a formação de novas redes e circuitos, o que possibilita a aprendizagem. Quando é possível dizer que aprendemos? Tão importante quanto saber como aprendemos é saber o porquê algumas pessoas não aprendem como a maioria das outras. As dificuldades de aprendizagem, assim como a habilidade de aprender, dependem e/ou podem resultar de inúmeros fatores, podendo ser de ordem biológica ou ambiental. Por exemplo, as alterações sensoriais e físicas (visual, auditiva, motora), além de outros fatores, como: ambiente onde a criança vive e/ou onde e estuda, hereditariedade e estímulos ambientais, alimentação em excesso e/ou em falta. Muitos teóricos dedicaram suas vidas na compreensão de como ocorre a aprendizagem. A seguir, veremos brevemente dois teóricos importantes e as suas ideias que associam a aprendizagem a alguns aspectos e contextos sociais. 1. Jean Piaget: diferenciou aprendizagem e desenvolvimento, pois na sua época, ainda eram vistos como o mesmo. Piaget deu nome e contorno a esses elementos: o desenvolvimento está relacionado não só ao crescimento físico, mas também se refere ao sistema nervoso (cérebro) e às funções mentais (cognição). Enquanto isso, a aprendizagem seria mais simples, pois acontece através de um 3

intermediário (pai/mãe/responsável/professor) e sendo um processo limitado a uma estrutura e um dos níveis do desenvolvimento. 2. David Ausubel: teórico que abordou a aprendizagem significativa, um conceito importante na teoria da aprendizagem que implica que os novos conteúdos aprendidos pelo aluno são organizados e formam uma hierarquia de conceitos e se relacionam com o conhecimento previamente interiorizado pelo aluno. Neurodiversidade A Neurodiversidade é um conceito relativamente novo. Assim como somos diferentes do ponto de vista físico, biológico, social e culturalmente, esse conceito aponta para diferenças neurológicas, que existe e devem ser reconhecidas e respeitadas, assim como qualquer outra variação humana. Essas diferenças podem incluir inúmeras formas de ser, fazer e aprender e abrangem os Transtornos do Neurodesenvolvimento, por exemplo, em termos de Transtornos de Aprendizagem (Dislexia, Disortografia e Discalculia), o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade - TDAH, o Transtorno do Espectro do Autismo e a Deficiência Intelectual, entre outros. Entretanto, esse conceito não se aplica apenas em transtornos. Além do conceito Neurodiversidade, diversas áreas têm recebido contribuições das Neurociências e esta nos ajuda a entender como o sistema nervoso se desenvolve, qual a relação do cérebro com o comportamento, como se desenvolve a atividade humana, como são e para que serve as estruturas, quais as funções dos processos psicológicos, como se desenvolve a cognição. Um exemplo dessa influência é a Neuroeducação, uma área recente das Neurociências que traz uma visão transdisciplinar dos processos de ensino-aprendizagem, numa perspectiva das áreas de neurociência, psicologia cognitiva e educação. Compreender e estudar esta abordagem são tarefas fundamentais, pois o ser humano é um ser biopsicossocial, dotado de um cérebro que sem dúvida é a estrutura mais complexa no universo e que a vida acontece em diferentes aspectos, tais como: desenvolvimento físico, cerebral psicológico e socioemocional. - Por fim, hoje sabemos que cada cérebro humano é único, tal como o rosto de cada um de nós. 4

- Sabemos que eles não são iguais, por que nós somos diferentes, vivemos em contextos diferentes e, portanto, vivenciamos os processos de aprendizagem de formas diferentes. - Sabemos que nosso cérebro muda com a nossas experiências/vivências. - Sabemos que nosso cérebro é extremamente plástico, que ele se reorganiza constantemente, para nos ajudar nas nossas atividades diárias. - Que ele, o cérebro conecta informações novas e antigas, a isso chamamos de memória. Portanto, cuide bem do seu cérebro! Neuropsicólogo, Mestre em Psicobiologia e colaborador do instituto ABCD. andrepsiqu@yahoo.com.br 5

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