UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO O INSTITUTO DA INDIGNIDADE NO DIREITO BRASILEIRO



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Transcrição:

UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO Daniela Natale Nasser R.A: 003200500841 O INSTITUTO DA INDIGNIDADE NO DIREITO BRASILEIRO São Paulo 2008

Daniela Natale Nasser R.A.: 003200500841 O INSTITUTO DA INDIGNIDADE NO DIREITO BRASILEIRO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação do Curso de Direito da Universidade São Francisco, como requisito parcial para a obtenção do Título de Bacharel em Direito, orientado pelo Professor Henrique Antonio Esteves Margy. São Paulo 2008

Daniela Natale Nasser R.A.: 003200500841 O INSTITUTO DA INDIGNIDADE NO DIREITO BRASILEIRO Trabalho de Conclusão de Curso aprovado em.../.../..., na Universidade São Francisco, pela Banca Examinadora constituída pelos professores: Orientador: Profº Especialista Henrique Antonio Esteves Margy USF Examinador: Profª Mestre Silmara Faro Ribeiro USF Examinador: Profª Mestre Simone Guimarães Lambert USF

Ao estimado professor Henrique Antonio Esteves Margy, pelo carinho, auxílio e dedicação sempre presentes.

Agradecimentos: Agradeço a Deus por mais esta vitória em minha vida. Aos meus pais, José Carlos e Elisabeth por todo amor e por estarem sempre ao meu lado. À minha irmã Tatiane, por sua amizade. E ao meu namorado Rafael, pelo incentivo, paciência e compreensão.

A moralidade é a melhor de todas as regras para orientar a humanidade. (Friedrich Nietsche)

NASSER, Daniela Natale. O instituto da indignidade no Direito Brasileiro, TCC, Curso de Direito, São Paulo: USF, 2008. RESUMO O presente trabalho visa, por meio de pesquisa bibliográfica, trazer uma análise reflexiva sobre o Instituto da Indignidade no Direito Brasileiro. A Indignidade é considerada uma pena civil que priva o herdeiro ou legatário de receber a herança a que teria direito por ter cometido atos reprováveis, estabelecidos expressamente no artigo 1814 do Código Civil, contra a vida, a honra e a liberdade de testar do autor da herança ou seus familiares. A importância deste Instituto se dá pelo fato de que, além de proteger os bens do falecido, também tem a preocupação com o aspecto moral, o que é muito relevante, afinal não é justo que alguém cometa atos desrespeitosos e criminosos contra aquele que deveria respeitar e amar, e ainda se beneficie herdando os bens daquele que ofendeu. A indignidade, portanto, trata-se de uma forma legal de excluir o herdeiro ou legatário da herança do ofendido. Palavras-chave: pena civil, exclusão do herdeiro/legatário da sucessão, atos ofensivos e criminosos, autor da herança, aspecto moral e patrimonial.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO... 9 SEÇÃO 1 SUCESSÃO... 11 1.1. Conceito... 11 1.2. Evolução Histórica do Direito das Sucessões... 14 1.3. Capacidade Civil e Capacidade Sucessória... 16 1.4. Espécies de Sucessão... 19 1.5. Efeitos da sucessão mortis causa... 24 1.6. Herdeiros e Legatários... 25 SEÇÃO 2 - INDIGNIDADE... 26 2.1. Conceito... 26 2.2. Hipóteses de Indignidade... 28 2.2.1. Homicídio... 29 2.2.2. Denunciação caluniosa e crimes contra a honra... 31 2.2.3. Da liberdade de testar... 32 2.3. Efeitos da declaração de indignidade... 32 2.4. Julgamento do Indigno pelo juízo criminal... 35 2.5. Reabilitação do Indigno... 36 SEÇÃO 3 INDIGNIDADE E INSTITUTOS JURÍDICOS CORRELATOS... 39 3.1. Herdeiro Aparente... 39 3.2. Incapacidade Sucessória X Indignidade... 40 3.3. Deserdação X Indignidade... 42 CONCLUSÃO... 45 REFERÊNCIAS... 47 ANEXO - JURISPRUDÊNCIA... 49

9 INTRODUÇÃO O presente trabalho visa discorrer sobre o instituto da indignidade, um dos mais importantes assuntos pertencentes ao ramo do Direito das Sucessões. Tal importância se dá, principalmente, pelo fato do instituto ter como foco principal a proteção da família, cujo valor no âmbito das sociedades contemporâneas assume cada vez maior relevância. A Carta Política de 1988, em seu capítulo VII do Título Da Ordem Social, mais precisamente no artigo 226, estabelece que a família é a base da sociedade e, por isso, tem especial atenção do Estado. De acordo com o ordenamento jurídico-constitucional vigente, a família assume posição estrutural na sociedade, ou seja, ocupa um dos alicerces da coletividade e, por essa razão, merece absoluto zelo do Estado em todos os seus aspectos. Dessa forma, não há dúvida que o direito brasileiro reconhece a importância da família e a protege incondicionalmente. No entanto, ao lado da família propriamente dita, é importante reconhecer a preocupação da atual ordem jurídica com a esfera patrimonial da entidade familiar, assunto que ultrapassa a esfera do direito de família para adentrar, com especial particularidade, no ramo do direito das sucessões. Nesse contexto, um assunto merece nossa especial atenção, notadamente por interferir de forma direta na questão da preservação da entidade familiar resguardada pelo ordenamento jurídico brasileiro. Trata-se da declaração de indignidade do sucessor, assunto bastante relevante e delicado na medida em que pressupõe o cometimento de algum ato realmente grave contra o autor da herança capaz de resultar na exclusão do ofensor da cadeia sucessória. Consciente da importância desse tema, a presente pesquisa pretenderá identificar, num primeiro momento (Seção 1), o conceito de Sucessão e a evolução histórica do Direito das Sucessões, com especial atenção para assuntos introdutórios, como a distinção entre capacidade civil e capacidade sucessória; a descrição e detalhamento das espécies de sucessão; os efeitos da sucessão mortis causa; bem como as diferenças existentes entre os conceitos de herdeiros e legatários, tudo isso visando preparar o caminho para a melhor compreensão do tema abordado nos próximos capítulos do trabalho.

10 A Seção 2, por sua vez, pretende aprofundar o estudo do instituto da indignidade, descrevendo com cuidado os casos em que a lei determina a privação do indigno de seus direitos sucessórios. Para tanto, o capítulo será abordado em quatro subitens, nos quais serão analisados, de forma detalhada: o conceito de indignidade no Direito brasileiro; as hipóteses de declaração de indignidade trazidas pela legislação civil; os efeitos da declaração de indignidade e suas implicações nas relações familiares; e, por fim, os casos em que é possível a reabilitação da pessoa anteriormente declarada indigna para suceder. O objetivo desse capítulo é fornecer um panorama concreto do instituto da indignidade, bem como detalhar o estudo dos instrumentos normativos nacionais que cuidam da matéria. Por fim, de posse de tais conceitos e informações, a pesquisa não poderia subtrair-se a um exame teórico de institutos jurídicos paralelos ao da indignidade mas que com ele não se confundem, tais como os conceitos de herdeiro aparente, deserdação e incapacidade sucessória, delineando as diferenças existentes entre esses e o conteúdo próprio da declaração de indignidade. Finalmente, ressaltando que o instituto da indignidade não tem apenas a preocupação com o patrimônio, mas também e especialmente com o vínculo de afeto, confiança e amor na relação familiar, o presente trabalho pretende provocar uma reflexão sobre a importância desse instituto no Direito de Família contemporâneo.

11 SEÇÃO 1 SUCESSÃO 1.1. Conceito A origem da palavra sucessão, segundo Eduardo de Oliveira Leite 1, vem do latim succedere, e significa vir no lugar de alguém. O professor Márcio Candido da Silva 2, por sua vez, ensina que sucessão é o fenômeno em que uma pessoa ocupa a posição de outra numa relação jurídica. Igualmente, Caio Mário da Silva Pereira 3 leciona que sucessão é a respectiva seqüência, por meio da qual o sucessor assume a condição própria daquele a quem sucedeu. Na linguagem jurídica obviamente a que mais nos interessa, a expressão tem duplo significado, isto é, pode tanto assumir o sentido amplo, denominada sucessão inter vivos, que ocorre quando uma pessoa toma o lugar de outra substituindo o antigo titular do patrimônio nos direitos que lhe competiam 4, quanto o sentido próprio ou restrito, que designa a transmissão de bens do de cujus para os sucessores (herdeiros ou legatários), denominada sucessão causa mortis. Em sentido amplo, o termo sucessão, segundo Arthur Vasco Itabaiana de Oliveira 5 aplica-se a todos os modos derivados de aquisição do domínio, de maneira que indicaria o ato pelo qual alguém sucede a outrem, investindo-se, no todo ou em parte, nos direitos que lhe pertenciam. Trata-se da sucessão inter vivos, pois o comprador sucede ao vendedor, o donatário ao doador, tomando uns o lugar dos outros em relação ao bem vendido ou doado. Já em sentido restrito, segundo ensinamentos de Maria Helena Diniz 6, sucessão é a transferência, total ou parcial, de herança, por morte de alguém, a um ou mais herdeiros. É a sucessão mortis causa que, no conceito subjetivo, é o direito por força do qual alguém 1 LEITE, Eduardo de Oliveira, Direito Civil Aplicado Direito das Sucessões, vol.6, São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2004, p. 23. 2 SILVA, Márcio Candido, Procedimentos Especiais, Ed. 2, São Paulo: Plêidade, 2007, p. 157. 3 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de direito civil, v. 6:direito das sucessões, Rio de Janeiro:Editora Forense, 2006, p. 40. 4 Em uma compra e venda, por exemplo, o comprador sucede ao vendedor, adquirindo todos os direitos que a este pertenciam. 5 OLIVEIRA, Itabaiana de. Tratado de direito das sucessões, v.1, p.52.-3. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Direito das sucessões, v.6, p.16.

12 recolhe os bens da herança, e, no conceito objetivo, indica a universalidade dos bens do de cujus, que ficaram com seus direitos e encargos. Sob o mesmo enfoque, sucessão para Washington de Barros Monteiro 7 lato sensu inter vivos, significa ato pelo qual uma pessoa toma o lugar de outra, investindo-se a qualquer título, no todo ou em parte, nos direitos que lhe competiam. Já no âmbito do direito sucessório stricto sensu mortis causa designa-se sucessão tão somente a transferência da herança, ou do legado, por morte de alguém, ao herdeiro ou legatário, seja por força de lei, ou em virtude de testamento. No sentido restrito, portanto, sucessão 8 é a transferência dos direitos/obrigações de uma pessoa para outra(s), conforme ordem de vocação hereditária estabelecida pela lei ou através de testamento. A sucessão está constituída legalmente nos artigos 1784 a 1797 do Código Civil. No exato momento da morte, a herança é transmitida aos herdeiros. Tal acontecimento é denominado de Principio do Saisine 9, e assim abre-se a sucessão. O patrimônio do de cujus é então passado a seus sucessores de acordo com a ordem de vocação hereditária, que consiste na relação dos sucessores estabelecida pela lei de acordo com a presunção de afinidade do de cujus ou por vontade própria estabelecida pelo titular da herança através de testamento. Sigifica dizer que, com o advento da morte, o de cujus transmite aos sucessores o domínio e a posse da herança, sendo certo que esta transmissão é regulada pelo Direito das Sucessões, que disciplina a transfereência do patrimônio (ativo e passivo) do de cujus (ou autor da herança) a seus herdeiros e legatários ou sucessores. Essa expressão latina é abreviatura da frase de cujus successione (ou hereditatis agitur ), que significa aquele de cuja sucessão (herança) se trata e cuida. 7 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, v.6, p.1. 8 Segundo o Vocabulário Jurídico De Plácido e Silva, atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho, 25ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 1339, a palavra sucessão, em linguagem técnico-juridica, significa a transmissão de bens e de direitos, a uma ou mais pessoas vivas, integrantes de um patrimônio deixado por uma pessoa falecida. 9 Esse princípio não prevalece em todos os países. Existem alguns países em que só há transmissão da herança após a investidura dos herdeiros nessa condição por uma autoridade, e mesmo assim, após a investigação da real condição de herdeiro. Há outros países, ainda, em que a aquisição da herança só ocorre com a aceitação do herdeiro. No caso do Brasil, a aceitação é mero ato de ratificação da transmissão da herança, que ocorre desde a confirmação da morte.

13 Suceder, portanto, é substituir, entrar no lugar de outro. Na sucessão, existe uma substituição do titular de um direito, para seus herdeiros, legatários ou sucessores. Esse é o conceito amplo de sucessão no direito. Falecendo uma pessoa, sendo ela titular de bens (patrimônio) há necessidade de se passar esses bens a outro, no caso da sucessão a seus herdeiros legítimos ou testamentários. Já a herança é o patrimônio que alguém deixa causa mortis, para passagem aos herdeiros legítimos, legatários ou sucessores que sobreviveram ao falecido, representando direitos e obrigações, pois os herdeiros também são responsáveis pelas dívidas do espólio no limite e na potência do que herdam (Art. 1792 do Código Civil). Importante ressaltar que, no decorrer deste trabalho, o vocábulo sucessão deverá ser entendido sempre em seu sentido restrito, visando designar tão somente a transferência da herança por morte de alguém a seus herdeiros por força de lei, pois no Brasil só se concebe, segundo o disposto em lei, direito de representação na sucessão legítima, em que pese respeitáveis discordâncias doutrinárias a respeito. Nesse sentido é o ensinamento de Washington de Barros Monteiro 10, falecendo o beneficiado antes do testador, nenhum direito ele transmite aos seus herdeiros, nem mesmo aos próprios descendentes por direito de representação, pois descabe jus repraesentationis na sucessão testamentária, por ser instituto peculiar à sucessão legítima. Em suma, importa compreender que suceder é entrar e ocupar o lugar do outro, afinal o patrimônio do falecido terá que ser transmitido, sendo que com o falecimento dos pais os seus bens e valores deverão passar a seus filhos e demais herdeiros, legatários ou sucessores. Nesse sentido, a transmissão hereditária dos bens faz com que a riqueza (bens e patrimônio) não sofra uma estagnação em sua continuidade, razão pela qual podemos entender que sucessão nada mais é que a substituição do patrimônio de uma pessoa para outra, ou seja, na ocasião da morte os herdeiros ou legatários são chamados para assumir o patrimônio do falecido. 10 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, v.6, p.213.

14 1.2. Evolução Histórica do Direito das Sucessões O direito das sucessões, segundo Silvio Rodrigues 11, foi constituído na antiguidade, através do direito egípcio, hindu, babilônico, entre outros. Todavia, o direito sucessório em suas regras antigas, visava proteger a família e continha causas religiosas, diferentemente do direito atual onde o patrimônio do de cujus é o objeto a ser protegido. No direito Romano, nos ensina Silvio de Salvo Venosa 12, além do herdeiro substituir o falecido nas relações jurídicas, também o fazia nas relações religiosas, que em nada se relacionavam com o patrimônio do morto. A substituição causa mortis era, na verdade, a continuação do de cujus através de seus herdeiros, afinal, deveria haver sempre alguém para dar continuidade ao culto familiar, e assim, não deixar que o culto se extinguisse, pois desta forma os bens estariam protegidos. O testamento tinha uma importância significativa nas civilizações antigas, especialmente em Roma, já que acreditavam que a morte sem sucessor provocaria desgraça aos mortos, e extinção do lar familiar. Fundamental frisar que a sucessão somente era possível através de herdeiros homens, já que as mulheres não podiam dar continuidade ao culto por razões matrimoniais que a fariam assumir a religião do marido, deixando a da família. Além da importância religiosa, existia um grande interesse dos credores do de cujus, que podiam cobrar dos herdeiros as dividas contraídas pelo morto, já que o patrimônio do sucessor se unia ao do falecido. No caso de inexistência de herdeiros, os credores podiam se apropriar de forma universal, ou seja, de todos os bens do defunto. Podemos verificar que a sucessão a titulo universal já era conhecida no direito romano, pois segundo obra de Silvio de Salvo Venosa, o herdeiro recebia todo o patrimônio do falecido e assumia desta maneira, a propriedade dos bens. Não obstante, o Direito das Sucessões sofreu necessárias alterações em razão das mudanças dos padrões culturais, da ética, da escala de valores em virtude das grandes mudanças ocorridas no Direito de Família, enfim foram mudanças que se impunham em nossa sociedade. 11 RODRIGUES, Silvio. Direito das Sucessões. Ed.26, vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 4. 12 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito das Sucessões. Ed. 3, vol. 7, São Paulo: Atlas, 2003, p. 17/18.

15 Tais alterações e inovações aconteceram com o reconhecimento da União Estável, as substituições do regime legal da comunhão universal de bens pelo regime da comunhão parcial de bens, são algumas realidades extraídas da Lei do Divórcio e do texto Constitucional. A própria caracterização do cônjuge como herdeiro necessário, a cessão de direitos na herança, a petição de herança, a concorrência do cônjuge sobrevivente, com os descendentes na herança do cônjuge falecido, dependendo do regime de casamento e outras, essas mudanças pontuaram todos os títulos e capítulos do Direito Sucessório. No Código de 1916, existiam 233 artigos e respectivos incisos e parágrafos ou letras que disciplinavam a matéria. Já no Código Civil atual são 243 artigos, parágrafos, incisos e letras, porém, devemos ressaltar que, foram introduzidos mais 10 novos artigos, sem falar em mais 20 artigos com sua redação parcialmente modificada, e cerca de 170 que tiveram seus textos totalmente ou parcialmente reformulados, perfazendo hoje, como acima já foi mencionado, 243 artigos, seus parágrafos, incisos e letras que devem ser estudados no tocante ao direito sucessório, alem de alguns dispositivos contidos nas Disposições Finais e transitórias, importando em significativas alterações tanto em seu conteúdo como em sua forma. Para se ter uma idéia, com base no reconhecimento da União Estável, hoje considerada Entidade Familiar pelo próprio texto constitucional, foi reconhecida a participação dos companheiros na sucessão e herança do outro em concorrência com descendentes e colaterais (art. 1790 incisos I, II, III e IV- do NCC). Assim, atualmente o Direito das Sucessões consiste no conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, aos herdeiros legítimos ou testamentários, em virtude de lei ou de testamento. Consiste, portanto, no complexo de disposições jurídicas que regem a transmissão do ativo e passivo do de cujus aos herdeiros 13. Enfim, o Direito das Sucessões visa discutir a passagem do patrimônio do falecido a seus herdeiros, legatários ou sucessores, dando ênfase aos efeitos jurídicos decorrentes do fim da personalidade jurídica da pessoa natural, ensejando a abertura do inventário até a partilha dos bens do de cujus, quer por força da Sucessão Legítima, quer pela Sucessão 13 DINIZ, Maria Helena, Direito Civil Brasileiro 6º Volume Edit. Saraiva 19ª edição 2005 Dir. das Sucessões.

16 Testamentária; proporcionando aos operadores do direito elementos que permitam a reflexão sobre as normas jurídicas que regulam a vocação hereditária e a sua transmissão. 1.3. Capacidade Civil e Capacidade Sucessória O Código Civil, em seu artigo 1º, dispõe sobre capacidade afirmando que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. A partir desse dispositivo legal, vislumbra-se que toda pessoa é sujeito de direitos e obrigações, e, portanto, possui capacidade jurídica ou de direito, sem discriminação de qualquer natureza (cf. art. 5º da Constituição Federal). Entretanto, isto não significa dizer que todas as pessoas que são sujeitos de direitos e obrigações possuem capacidade de exercício de todos os atos da vida civil, uma vez que esta capacidade de fato encontra restrições na própria lei, ao relacionar, nos artigos 3º e 4º do referido diploma, os absolutamente incapazes 14 de exercer pessoalmente os atos da vida civil, e os considerados relativamente incapazes para exercer determinados atos 15. Com isso, tem-se a seguinte classificação da capacidade de exercício ou capacidade de fato: absolutamente incapazes de exercer pessoalmente, necessitam ser representados (artigo 3º e incisos do Código Civil); relativamente incapazes a certos atos ou à maneira de os exercerem, necessitam ser assistidos (artigo 4º e incisos do Código Civil); e, por fim, absolutamente capazes de exercerem pessoalmente, sem necessidade de serem representados ou assistidos, os atos da vida civil (artigo 5º do Código Civil). Nesse sentido, segundo entendimento do professor Sebastião José Roque 16, capacidade civil é a competência que uma pessoa possui para praticar todos os atos da vida civil. Não obstante, o artigo 1798 do Código Civil prevê que para a pessoa ter legitimidade para suceder basta estar viva ou já concebida no momento da sucessão, adquirindo, assim, o que se chama de capacidade sucessória. Conforme lição de Sílvio de Salvo Venosa 17, 14 Artigo 3º Código Civil São absolutamente incapazes de exercer os atos da vida civil: I os menores de 16 (dezesseis anos); II os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. 15 Artigo 4º do Código Civil São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I os maiores de 16 (dezesseis) anos e menores de 18 (dezoito) anos; II os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo. 16 ROQUE, Sebastião José. Direito das Sucessões. ed.2ª., São Paulo: Ícone, 2003, p. 47. 17 VENOSA, Sílvio de Salvo, Direito das Sucessões, ed. 3, vol. 7, São Paulo: Atlas, 2003, p. 55/56.

17 capacidade sucessória é aquela em que a pessoa deve estar viva ou já concebida na ocasião da morte do dono da herança, além de ter competência para receber o patrimônio de determinada herança e não ser considerada indigna. A priori, cumpre editar a regra geral sobre capacidade para suceder, que está disposta no artigo 1798 do Código Civil Brasileiro. Art. 1.798.Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão. A partir da leitura do dispositivo legal acima transcrito, é possível perceber a diferença existente entre a capacidade civil e a capacidade sucessória, a primeira consistindo na aptidão que tem uma pessoa para exercer pessoalmente os atos da vida civil, e a segunda repousando sobre a questão de determinada pessoa ser ou não hábil para adquirir bens deixados causa mortis. Nesse sentido, capacidade sucessória é a aptidão da pessoa natural ou jurídica de receber direitos e obrigações, bem como deveres deixados pelo autor da herança. É a capacidade de receber e exercer direito, seja por parentesco, seja por testamento. O fundamento jurídico do direito do herdeiro, que consiste na demonstração de que se enquadra como herdeiro em virtude de lei, encontra-se no artigo 1.786 do Código Civil, primeira parte, combinado com os artigos 1.829 e 1.844. Oportuno se torna dizer que a capacidade sucessória do herdeiro será apurada observando a lei vigente ao tempo da abertura da sucessão, ou seja, a do momento do óbito do autor da herança, conforme explicitado no artigo 1.787 do Código Civil, devendo ser observados, nessa ocasião, os pressupostos necessários para apuração da capacidade sucessória dos herdeiros. Primeiramente é imprescindível que o autor da herança tenha falecido em momento anterior ao sucessor, ainda que por fração irrisória de tempo, visto que só com a abertura da sucessão é que se transmite a propriedade e a posse da herança aos herdeiros, bem como somente terá capacidade para adquirir esta herança àquele herdeiro existente à época do óbito do de cujus ou pelo menos concebido.

18 Os nascituros detém capacidade sucessória excepcional, uma vez que estes, por expressa menção do artigo 1.798 do Código Civil, apenas sucederão se nascerem com vida. Trata-se, portanto, de capacidade sucessória sob condição resolutiva, ou seja, nascendo o já concebido ao tempo da morte do autor da herança, com vida, a sucessão terá sido válida e eficaz, porém se nascido morto, ineficaz tornou-se a sucessão. Dessa forma, verifica-se um estado de pendência, recolhendo seu representante legal a herança sob condição resolutiva. Prova-se a concepção por presunção. Este é o modo pelo qual o artigo 2º do Código Civil assegura os direitos sucessórios dos nascituros. Ainda não se pode perder de vista o pressuposto de que o herdeiro, via de regra, deve pertencer à espécie humana para que tenha legitimação para suceder, devendo-se ressaltar, entretanto, a possibilidade de a herança na sucessão legítima ser deferida a um dos entes da Federação (Municípios, Distrito Federal ou União) mencionados no artigo 1.844 do Código Civil. Estes são pessoas jurídicas de Direito Público, e sucedem quando da ausência de descendentes, ascendentes, cônjuge sobrevivente e colaterais até 4º grau do de cujus. Portanto, têm capacidade sucessória todas as pessoas existentes no momento da abertura da sucessão, sejam físicas (naturais) ou jurídicas. As pessoas naturais (físicas) - herdam de acordo com sua vocação hereditária (art. 1829 e incisos do novo Código Civil). As pessoas jurídicas são também para efeito de sucessão, equiparadas as pessoas físicas (naturais), podem com isso as mesmas sucederem e serem chamadas a sucessão. Necessário, porém, a designação em testamento, conforme artigo 1799, 2º do Código Civil. Admitem também alguns doutrinadores, que a sociedade de fato, também é capaz de suceder, pois atuam no mundo jurídico e a qualquer tempo podem tornar-se sociedade regular. No entanto, ressalte-se que nem todas as pessoas físicas são capazes para suceder. Isto acontece com os indignos, mencionados através das causas de indignidade no artigo 1814 do Código Civil e seus incisos, bem como os deserdados, cujas causas de deserdação vêm alencadas no artigo 1961/2 e incisos do Código Civil, ressalvando que a deserdação só se dá através de testamento no qual conste a explicação do testador acerca da Justa Causa. Indignidade é pena civil, enquanto deserdação é ato de vontade.

19 Assim, considera-se indigno o herdeiro que cometeu atos ofensivos à pessoa ou à honra do de cujus, ou atentou contra sua liberdade de testar, reconhecida a indignidade em sentença judicial. A parte do indigno será atribuída aos herdeiros do mesmo, sendo parte legitima para propor a ação judicial quem tenha interesse na declaração de indignidade. Desse modo, fica claro que a capacidade civil se distingue da capacidade sucessória, pois uma pessoa pode ter capacidade civil e ser incapaz de suceder, como pode ocorrer o contrário, isto é, alguém que não goze de plena capacidade para praticar os atos da vida civil pode ter plena capacidade para suceder. 1.4. Espécies de Sucessão Há duas espécies de sucessão: sucessão testamentária e sucessão legítima. A primeira consiste naquela que deriva de testamento ou de última disposição de vontade do de cujus, conforme conceitua Silvio Rodrigues 18. Neste tipo de sucessão, o titular da herança expressa sua vontade de disponibilizar seus bens a pessoas que deseja beneficiar, devendo seguir o previsto nos artigos 1789, 1845, 1846, 1801 e 1850 do Código Civil. Já o segundo tipo de sucessão, sucessão legítima, resulta da própria lei, vale dizer, ocorre quando não há testamento ou quando este é nulo, anulável ou quando advir sua caducidade (perda de sua eficácia), como bem observa Silvio Rodrigues. Trata-se da sucessão ab intestato, é a sucessão daquele que falece sem deixar testamento, defere-se a herança aos herdeiros expressamente indicados pela lei, cuja ordem de vocação hereditária vem através do artigo 1829 do novo Código Civil, bem como do art. 1844 que o complementa com relação aos direitos sucessórios dos companheiros (art. 1790). Na sucessão legítima, os bens do de cujus são transferidos para pessoas indicadas pela lei, conforme ordem de vocação hereditária prevista no artigo 1829 do Código Civil. Com este rol previsto no referido artigo, a lei age como se fosse guardiã do patrimônio do de cujus, transferindo seus bens à pessoas que ele presumidamente teria mais afinidade, ou 18 RODRIGUES, Silvio. Direito das Sucessões. Ed.26, vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 16.

20 seja, seus filhos, pais, cônjuge, enfim as pessoas mais próximas, e provavelmente mais queridas pelo falecido. Veja-se que a sucessão atualmente contempla os descendentes (filhos), em concorrência com o cônjuge sobrevivente. Se não tiver descendentes, aos ascendentes do de cujus, em concorrência com o cônjuge sobrevivente. No caso de não haver descendentes e ascendentes, o cônjuge sobrevivente será herdeiro universal, isso dependendo evidentemente do regime de casamento. Posteriormente a Lei contempla os colaterais até o 4º grau e por fim o Estado (artigo 1844 do Código Civil), deixando claro que os mais próximos excluem os mais remotos. Os bens componentes da herança terão que ser objeto de inventário e serem transmitidos, e os beneficiados com o patrimônio terão que suportar as eventuais dívidas e encargos do espólio no limite do herdado. Por outro lado, a sucessão testamentária é aquela em que a transmissão hereditária se opera por ato de última vontade (testamento), o qual é revestido da solenidade requerida por lei, sendo o testamento feito em vida pelo de cujus, evidentemente, consoante permissão legal, e, em havendo herdeiros necessários (art. 1845 do Código Civil), não poderá ser ferida a legítima dos mesmos. A sucessão testamentária encontra-se do artigo 1857 ao 1911 do Código Civil. Dessa forma, a sucessão testamentária não decorre de Lei, mas sim de testamento válido ou de disposição de última vontade válida. O sistema adotado pelo nosso Código Civil para a liberdade de testar é limitado, de maneira que, tendo o testador herdeiros necessários, ou seja, descendentes, ascendentes e cônjuge sucessíveis, só poderá dispor da metade de seus bens. O testamento deve respeitar e obedecer a lei em vigor no momento de feitura, a capacidade do testador e dos beneficiários, deve respeitar a lei no tocante as disposições de vontade, nunca agredindo a legítima dos herdeiros necessários. É um ato personalíssimo, unilateral, gratuito, solene, revogável, pelo qual alguém, segundo norma jurídica, dispõe, no todo ou em parte, de seu patrimônio para depois de sua morte, ou determina providências de caráter pessoal ou familiar. Na sucessão testamentária no caso do Estado de São Paulo,

21 o foro competente será sempre o Foro Central (João Mendes Junior), o que consta da Lei de Organização do Poder Judiciário. A sucessão testamentária regula-se pela lei vigente no momento da disposição de última vontade do testador, com respeito à lei em vigor ao tempo da abertura da sucessão, que rege a capacidade passiva e eficácia jurídica do conteúdo das disposições, devendo o testador respeitar a legítima dos herdeiros necessários se tiver, pois somente pode dispor em testamento da porção disponível de seu patrimônio. O cálculo da porção disponível é feito sobre o total dos bens existentes ao falecer o testador, subtraindo às dívidas e as despesas do funeral. Por isso, herança é somente o que o falecido deixa depois de satisfeitos os seus credores, de maneira que, se as dívidas absorverem todo o patrimônio hereditário, não haverá herança e seus herdeiros responderão pelos débitos até a força de seus quinhões (artigo 1792 do Código Civil). Consoante o Artigo 1857 do atual Código Civil, toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte. O herdeiro necessário pode receber mais que a legítima se no testamento o testador deixar parte da porção disponível (artigo 1849 do Código Civil). Isto acontece porque, se é possível privilegiar um estranho, por que não um herdeiro legítimo? No artigo 1859 há previsão de que extingue-se em 5 (cinco) anos o direito de impugnar a validade do testamento, contado do prazo da data do seu registro. Há, contudo, algumas restrições impostas pelas lei à liberdade de dispor, proibindose, por exemplo, a disposição de mais da metade dos bens do autor da herança, havendo herdeiros necessários (artigo 1846). Para ser capaz de dispor de seu patrimônio por meio de testamento ou ser por ele beneficiado, a pessoa deve apresentar um conjunto de condições juridicamente necessárias. Há hipóteses em que um indivíduo pode ter capacidade para testar, mas não para receber em testamento específico, por exemplo: o Oficial Público que lavrou o testamento, bem como as testemunhas. Consta dos artigos 1860 e 1861 do Código Civil que o testamento feito por incapaz será nulo, mesmo que cesse a incapacidade posteriormente, pois o que vale é o dia de sua feitura. Por isso, se incapaz quando da feitura, o testamento será nulo ainda que o sujeito adquira tal capacidade posteriormente.

22 São incapazes para testar os menores de 16 anos (significa que com 16 anos pode testar); loucos de todo gênero; surdos-mudos que não puderem manifestar sua vontade; os que no momento da elaboração do testamento não se encontrarem em seu perfeito juízo; e os pródigos nos casos da disposição tratar de testamento com conteúdo patrimonial. Cegos e analfabetos somente podem testar por testamento público, uma vez que têm capacidade para testar, mas não liberdade quanto à forma testamentária. No testamento é possível a deserdação de parte dos herdeiros, pois a mesma vem a ser o ato pelo qual o de cujus exclui da sucessão, mediante testamento, com expressa declaração da causa, herdeiro necessário, privando-o de sua legítima, por ter praticado ato taxativamente enumerado nos artigos 1814 ao 1818 e art. 1962 do Código Civil. Com a abertura da sucessão, o translado é apresentado em juízo (CPC art. 1128 e parágrafo único), sendo lido na presença do apresentante e dos interessados que queiram ouvir, oficiando-se logo em seguida o Ministério Público. Não havendo vício, o magistrado ordena o registro e o cumprimento do testamento. Se algum interessado pretender invalidar o testamento, poderá fazê-lo contenciosamente, pela via ordinária, e não em processo de inventário. No testamento em geral nomeia-se um testamenteiro, competindo ao mesmo, em síntese, dar execução ao testamento, exercendo as atribuições conferidas pelo testador. Quando não especificadas no testamento, cumpre-lhe praticar os atos definidos na lei como próprios da testamentária. Deve primeiramente, apresentar em juízo o testamento, para registro. Se estiver em poder de outra pessoa, pode requerer ao Juiz a intimação do detentor para que o exiba, sob pena de busca e apreensão. Compete-lhe ainda dar execução às disposições testamentárias, sustentar a validade do testamento, defender a posse dos bens da herança. Pode ser inventariante também, porém, se for deverá fiscalizar e zelar pelo exato cumprimento das disposições contidas no ato que lhe outorgou tal função. Para que o testador grave a disposição de última vontade, ele necessita de justa causa, ou seja, motivação.nos casos em que o testador já fez o testamento antes da vigência do Código atual, a disposição e o gravame prevalecera 1 (um) ano após a vigência do atual Código, se neste prazo o testador ainda não aditar o referido testamento para declarar a justa

23 causa, colocada na legítima não subsistirá a restrição, ou seja, o gravame (Art. 2042 do Código Civil). As cláusulas que gravam o testamento são as de impenhorabilidade, incomunicabilidade e inalienabilidade, no atual Código Civil, as quais não podem recair sobre a parte da legítima dos herdeiros, somente com justa causa. Importante salientar que o testamento pode ser feito a qualquer tempo e sempre livremente pelo testador, enquanto vivo e capaz, pouco importando se seus motivos sejam justos ou não. Isto porque o fundamento da disposição testamentária é o princípio da autonomia da vontade. É também possível que o testador promova no testamento o reconhecimento de filho; a deserdação de parte (artigos 1961 a 1965 do Código Civil); o perdão do indigno (artigo 1818); a nomeação do testamenteiro (artigo 1976). No caso de deserdação, o testador deve deixar declarado que exclui da sua sucessão herdeiro necessário, privando-o de sua legítima, expressamente declarando a prática de um dos atos taxativamente arrolados nos artigos 1814, 1962 e 1963 do Código Civil. Hoje, pela Lei 11.441 de 04 de janeiro de 2007, temos a sucessão administrativa ou sucessão notarial, ou seja, quando todos os herdeiros forem maiores e capazes, o de cujus não deixou testamento, e se a partilha for amigável (consensual), sendo todos assistidos por advogado, pode-se fazer o inventário por escritura pública em Tabelião de Notas. Essa Lei deu nova redação aos artigos 982 e 983 do Código de Processo Civil, bem como introduziu o artigo 1.124-A ao mesmo, admitindo também a Separação consensual e Divórcio Consensual direto e indireto por escritura pública, atendendo os requisitos acima mencionados. A Sucessão pode ser a Título Universal, quando envolve todo o patrimônio do de cujus, ou uma porcentagem sobre toda sua riqueza, e pode ser a Título Singular, que é aquela que recai sobre bens individualizados da herança, ou seja, se dá pela transferência de bens determinados e certos.

24 1.5. Efeitos da sucessão mortis causa A sucessão mortis causa defere-se, quanto aos seus efeitos, de duas formas: sucessão a título universal, quando gera a transmissão da totalidade do patrimônio deixado pelo de cujus ao sucessor (herdeiro em virtude de lei ou de testamento), o qual se subrrogará na posição do finado como titular da totalidade ou de parte da universitas iuris, bem como se responsabilizará pelo passivo na medida das forças da herança recebida, nos termos do artigo 1.792 do Código Civil Brasileiro, e a outra forma consiste na sucessão a título singular, quando gera a transmissão, ao legatário, de bens individualizados por sua qualidade, quantidade ou situação, em instrumento hábil denominado de testamento deixado pelo de cujus. Neste último caso, diferentemente da sucessão a título universal, o legatário não se responsabilizará pelos encargos da herança. A professora Maria Helena Diniz 19 conceitua a sucessão a título universal e a sucessão a título singular, respectivamente, nos seguintes termos: sucessão a título universal: Quando houver transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança, tanto no seu ativo como no passivo, para o herdeiro do de cujus, que se sub-roga, abstratamente, na posição do falecido, como titular da totalidade ou de parte ideal daquele patrimônio no que concerne ao ativo, assumindo a responsabilidade relativamente ao passivo. sucessão a título singular: Quando o testador transfere ao beneficiário apenas objetos certos e determinados, p. ex.: uma jóia, um cavalo, uma determinada casa na rua " X" etc. Nessa espécie é o legatário que sucede ao de cujus sub-rogando-se concretamente na titularidade jurídica de determinada relação de direito, sem representar o morto, pois não responde pelas dívidas da herança. Salienta ainda que a sucessão legítima será sempre a título universal, ou seja, é transferido aos herdeiros o total do patrimônio do falecido ou somente uma fração deste 20. No caso da sucessão testamentária, será universal se o testador instituir herdeiro que lhe suceda na totalidade ou em quota parte de seus bens, e será singular no caso do testador deixar a um beneficiário um bem individualizado, caso em que ao legatário se transmite aquele bem determinado. 19 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Ed.19, vol. 6, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 22/23. 20 Ibid., p. 24.

25 1.6. Herdeiros e Legatários São chamados de herdeiros aqueles que receberão a herança do de cujus. O herdeiro, conforme nos ensina Silvio Rodrigues, sucede a título universal, já que a herança é uma universalidade e abrange o total do patrimônio do falecido 21. O herdeiro legítimo, também chamado de necessário, é aquele que não pode ser excluído da sucessão pela vontade do testador, afinal, a lei garante a este tipo de herdeiro o direito a metade do patrimônio do finado 22. O rol dos herdeiros necessários está expressamente divulgado no artigo 1845 do Código Civil, e são eles, os descendentes, os ascendentes e o cônjuge. Desta forma, segundo entendimento de Silvio Rodrigues, podemos entender, por exemplo, que se o testador tiver filhos ou for casado, ou ainda, tiver vivo algum de seus ascendentes, ele não poderá dispor livremente de todo seu patrimônio, mas somente da metade deste, esta metade configura-se a legítima, que é a parte reservada por lei aos herdeiros necessários. Esta disposição legal visa consolidar a harmonia da família, assegurando assim a estes herdeiros a garantia legal ao patrimônio do de cujus. O herdeiro necessário é sucessor a título universal 23. No que se refere ao legado, o sucessor recebe um bem individualizado do falecido, normalmente através de testamento. Neste caso o sucessor é chamado de legatário, e recebe um bem específico, determinado, portanto, conforme doutrina de Silvio Salvo Venosa, o legatário é um sucessor a título singular, ou seja, individual. 21 RODRIGUES, Silvio. Direito das Sucessões. ed. 26, vol. 7, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 18. 22 ROQUE, Sebastião José. Direito das Sucessões. ed.2ª., São Paulo: Ícone, 2003, p. 145. 23 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Ed. 3, vol. 7, São Paulo:Altas, 2003, p. 21.

26 SEÇÃO 2 - INDIGNIDADE 2.1. Conceito A palavra indignidade deriva do latim (indignitate), e significa ausência de honra, de respeitabilidade. No que se refere ao tema desta pesquisa, a indignidade pode ser conceituada como uma sanção civil contra aquele que agiu de maneira ofensiva ou ainda, que tenha contribuído de alguma forma para que o dono da herança fosse forçado a alterar de qualquer modo sua última vontade. No Direito Romano, do qual procede este instituto, os bens do herdeiro considerado indigno eram transferidos para a Fazenda Pública, e, apesar da herança lhe ser atribuída, era privado de seu direito hereditário por determinação legal. Para que seja solidificada a existência da indignidade, é imprescindível que o sucessor, seja ele herdeiro ou legatário, cometa ato realmente grave contra o titular da herança. Acentua-se que não basta qualquer ato para considerar o sucessor indigno, pois se trata de uma questão bastante delicada, e, exatamente por esta razão, o legislador inseriu expressamente na lei todos os atos que caracterizam a indignidade. Nesse sentido, excluídos da sucessão estão aqueles que atentam contra a vida dos pais, que os caluniam e cometem injúria contra os mesmos, bem como aqueles que impedem de dispor de seus bens livremente. A indignidade é sempre declarada por sentença judicial. Torna-se evidente que a indignidade somente tem sanção no âmbito civil, e além de extinguir direitos do sucessor, o afasta de toda uma relação jurídica. Assim, a indignidade nada mais é do que a retirada do direito a herança do sucessor que cometeu atos de ingratidão contra a vida, a honra e a liberdade de testar do titular da herança. Reconhecida a indignidade em sentença judicial, a parte do indigno será atribuída aos herdeiros do mesmo. É parte legitima para propor a ação judicial quem tenha interesse na declaração de indignidade. Esse direito de pedir ao Juízo que declare um herdeiro indigno

27 se extingue em 4 (quatro) anos. Se a pessoa que sofreu o ato de indignidade reabilitar o indigno por ato de testamento esse será contemplado na herança. O herdeiro do indigno herda em seu lugar, ao contrário da renúncia de herança que os herdeiros do renunciante não herdam. No caso da indignidade é pessoal o efeito da sentença que a declara, portanto, os herdeiros do indigno recebem a herança por direito de representação, sendo que o indigno não terá direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à sucessão eventual desses bens. A ação de indignidade só pode ser proposta por quem tem interesse na sucessão, isto é, por quem obtém um ganho com a exclusão do indigno. O credor deste herdeiro também pode ajuizar a ação. O Município também pode ajuizar a ação, desde que a herança se torne jacente com a exclusão do indigno. Se ninguém propuser a ação, o indigno herda, sendo vedado no Ministério Público propô-la, uma vez que o interesse é eminentemente privado. A morte do indigno impede a propositura da ação. Se acaso o acusado de indignidade morrer no curso do processo, este deve ser extinto sem julgamento do mérito, pois a indignidade é uma pena e esta não deve passar além do criminoso. Ademais, trata-se de ação personalíssima. A doutrina diz que a sentença de indignidade é meramente declaratória, tendo em vista a retroatividade de seus efeitos (ex-tunc). O prazo para propositura da ação é de quatro anos, a contar da abertura da sucessão. Com o trânsito em julgado da sentença de reconhecimento da indignidade, operam-se desde logo os seguintes efeitos: o primeiro é de que o indigno é excluído da herança; se o indigno for herdeiro legítimo seus descendentes herdarão em seu lugar; se for herdeiro testamentário seus descendentes não herdarão, sua parte irá aos demais herdeiros testamentários por força do direito de acrescer. O art. 1817 do Código Civil considera válida as alienações onerosas de bens da herança, feita pelo indigno a terceiros de boa-fé, antes da sentença de exclusão, subsistindo aos demais herdeiros quando prejudicados por tal alienação, o direito de demandar-lhe perdas e danos. Dessa forma, a indignidade pode ser conceituada como uma sanção civil que extingue o direito sucessório daquele que praticou algum dos atos previstos no artigo 1814 do Código Civil, afastando-o da relação jurídica sucessória.

28 2.2. Hipóteses de Indignidade Os casos que excluem os sucessores considerados indignos estão taxativamente inseridos no Capitulo V, artigo 1814 do Código Civil, inciso I ao III, e, segundo leitura de Silvio Rodrigues 24, a lei somente autoriza a exclusão da herança do sujeito que agir de acordo com qualquer das hipóteses inseridas no referido artigo. Desta forma, só é considerado indigno, o sucessor que atente contra a vida, a honra, ou contra a liberdade de testar do hereditando, conforme disposição expressa do artigo 1814 do Código Civil. Assim, estabelece o referido artigo que será excluído da herança o sucessor que tiver agido como autor, co-autor ou partícipe de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra o titular da herança, além de seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente. Esta previsão encontra-se estabelecida no inciso I do artigo em comento, e, ainda no entendimento de Silvio Rodrigues, não resta dúvida de que o legislador agiu corretamente, pois não teria cabimento o sucessor privar ou tentar privar o titular da herança de seu maior bem, ou seja, de sua própria vida. Importante ressaltar que também é excluído da sucessão o sujeito que tentou ou praticou homicídio doloso contra a vida das pessoas mais próximas do dono da herança, sejam elas o companheiro, o cônjuge, ou ainda, seus ascendentes e descendentes. O inciso II do artigo 1814 do Código Civil, por sua vez, prevê que será excluído da sucessão a pessoa que houver acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou cometer crime contra a sua honra ou de seu cônjuge ou companheiro. O texto contido neste inciso visa punir o sucessor que ingressa judicialmente contra a pessoa do titular da herança ou seus familiares, mesmo ciente da inocência destes. Salientese que a acusação deve ter sido ingressada no juízo criminal, e não no civil, caso em que não configuraria a indignidade. O inciso III do referido diploma legal, por fim, dispõe que é excluído da sucessão por indignidade a pessoa que, por violência ou meios fraudulentos, de alguma forma inibe o 24 SILVIO, Rodrigues. Direito das Sucessões, Ed 26, vol. 7, São Paulo, Saraiva, 2007, p. 67.

29 autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade. Neste caso, a lei procura proteger o titular da herança no sentido de lhe garantir a sua última vontade, e, por conseguinte, punir o sucessor que violar este direito. 2.2.1. Homicídio Homicídio é a destruição da vida de um homem praticada por outro. 25.O crime de homicídio está previsto no artigo 121 do Código Penal e pode ser considerado uma das formas mais grave de indignidade, pois o sucessor visa acabar com a vida do titular da herança. Para que possa ocorrer a exclusão da herança por indignidade deve, obrigatoriamente, existir o dolo do sucessor, ou seja, este deve agir com vontade de matar o hereditando. O código civil de 2002 acrescentou que ocorrerá exclusão por indignidade daquele que praticar ou tentar crime contra o autor da herança, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente. Conforme leciona Washigton de Barros Monteiro 26, a lei é clara ao dizer que somente o homicídio doloso ou sua tentativa excluirá o sucessor da herança, de modo que se o homicídio for culposo, ou seja, se não houver a vontade do sucessor em matar o titular da herança, este não será excluído da sucessão. Assim, aquele que atuar com imperícia, imprudência ou negligência contra a vida do titular da herança, não será considerado indigno já que nestes casos há ausência de dolo, que é elemento essencial para afastar o sucessor da herança. Ensina ainda o professor Washington de Barros Monteiro que, para ser excluído da sucessão, tanto faz se o herdeiro for o autor do homicídio ou se a sua participação no crime foi indireta, como no caso de co-autor ou partícipe, desde que a sua conduta seja considerada dolosa. De acordo com Silvio de Salvo Venosa, os casos de legítima defesa, estado de necessidade ou exercício regular de direito não configura motivo de exclusão por 25 JESUS, Damásio E. de, Direito Penal, 2º vol., parte especial, São Paulo, Saraiva, 2007, p.18. 26 MONTEIRO, Washington de Barros, Curso de Direito Civil, v. 6:direito das sucessões, São Paulo: Saraiva, 2003, p.65.