TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica SOCIEDADES SIMPLES E EMPRESARIAS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ATUAIS. Cácito Augusto Advogado
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1 TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica SOCIEDADES SIMPLES E EMPRESARIAS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ATUAIS Cácito Augusto Advogado I INTRODUÇÃO Após quatro anos de vigência do Novo Código Civil brasileiro, que reformulou quase que por completo a legislação societária (permanecendo inalterada apenas a regulamentação das sociedades anônimas), os tipos societários criados pela nova norma ainda causam dúvidas em vários operadores do direito. Isto porque, até a entrada em vigor da Lei nº /02 (Novo Código Civil), o critério adotado para identificar a natureza das sociedades e conseqüentemente o órgão em que deveriam ser registradas, era a realização ou não de atos de comércio, adotado no sistema francês. Assim, como regra geral, realizando a intermediação de produtos, a sociedade deveria ser registrada no Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial). Por outro lado, quando a sociedade não era destinada à mercancia, mas à prestação de serviços, o órgão competente seria o Registro Civil das Pessoas Jurídicas (Cartórios). Com efeito, a nova sistemática trazida pelo Novo Código Civil afastou o critério da comercialidade (Teoria dos Atos de Comércio), e consagrou o critério da empresariedade (Teoria da Empresa) consubstanciada no Código Civil italiano, de 1942, reformulando os tipos societários existentes que passaram a ser classificadas como sociedades empresárias ou simples. O novo critério de identificação da natureza das sociedades faz com que a diferença entre elas não resida mais no objeto social, pois ambas realizam atividades econômicas. O novo elemento de diferenciação é a organização, a forma como a atividade econômica objeto da sociedade é explorada. Assim, não procedem algumas orientações que surgiram após a edição do Novo Código Civil no sentido de que empresária seria a antiga sociedade civil, enquanto que a sociedade empresária seria a antiga sociedade comercial. (grifo nosso) Sociedade Empresária será aquela que vier a exercer a atividade econômica organizada, por meio da empresa, e não diretamente pelos sócios. Por sua vez, a empresa é uma atividade, e como tal deve ter um sujeito que a exerça, o titular da atividade, que é o
2 62 empresário. Este é quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços. E essa organização deve ser de fundamental importância, assumindo prevalência sobre a atividade pessoal do sujeito. Já a sociedade simples (não empresária), apesar de explorar uma atividade econômica, não o faz de forma organizada, ou seja, não há conjugação de fatores de produção (capital, trabalho, tecnologia e matéria prima), em outras palavras, o modo pelo qual o objeto é explorado não se faz de forma economicamente organizada. Na esteira desse raciocínio, podese afirmar que algumas sociedades consideradas civis, antes do advento do atual Código Civil, atualmente podem ser consideradas como sociedades empresárias, caso o objeto seja desenvolvido de forma organizada, como empresa, conforme leciona o mestre italiano Alberto Asquini. Exemplo claro desta diferença entre sociedade simples e sociedade empresária é dado pelo mestre José Edwaldo Tavares Borba, em sua obra Direito Societário, quando diz: "A casa de saúde ou o hospital seriam uma sociedade empresária porque, não obstante o labor científico dos médicos seja extremamente relevante, é esse labor apenas um componente do objeto social, tanto que um hospital compreende hotelaria, farmácia, equipamentos de alta tecnologia, além de salas de cirurgia e de exames com todo um aparato de meios materiais. Por sua vez, uma clínica médica, ou um laboratório de análises clínicas (uniprofissional ou não), compostos por vários profissionais sócios e contratados, ainda que dotados de uma estrutura organizacional, mas cujo produto fosse o próprio serviço médico, que se exerceria através de consultas, diagnósticos e exames, e que, portanto teria no exercício de profissão de natureza intelectual a base de sua atividade, seria evidentemente uma sociedade simples." (José Edwaldo Tavares Borba, in Direito Societário, 8ª edição, Editora Renovar) A importância da correta identificação da natureza das sociedades, empresária ou não empresária, se deve às conseqüências práticas-jurídicas impostas pelas novas disposições normativas do Direito Societário. Em primeiro lugar, cada sociedade deve arquivar seus atos constitutivos em órgão próprio. As sociedades empresárias, no Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins (art CC/02), que incumbe à Junta Empresarial de cada ente federativo, enquanto que as sociedades não empresárias, em regra, devem ser registradas no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ). Trabalhos Técnicos
3 63 Segundo, em caso de insolvência, a sociedade empresária fica sujeita, em regra, às Recuperações Judicial e Extrajudicial e à falência, previstas em legislação especial (Lei nº /2003), com tratamento peculiar, enquanto que as sociedades não empresárias sujeitamse à insolvência processual civil, prevista no artigo 748 e seguintes, do Código de Processo Civil, que é um sistema de insolvência menos gravoso que o falimentar, face aos inúmeros efeitos da sentença decretatória de falência. Em terceiro, a escrituração do empresário de suas operações nos livros fica sujeita à regras próprias e mais rígidas do que propriamente aos das sociedades não empresárias (artigos ao CC/02), vez que nosso ordenamento jurídico adotou o sistema francês quanto à escrituração, em que exige livros comuns e especiais e determina os requisitos extrínsecos e intrínsecos dos mesmos, não conferindo liberdade alguma. Por fim, o empresário individual e a sociedade empresária, quando a falência é decretada judicialmente, pode haver responsabilização pela prática de crimes falimentares, o que não ocorre com o não empresário. Deve-se ressaltar que, no caso das sociedades empresárias, são os administradores que poderão ser responsabilizados criminalmente, pois são estes que sentem os efeitos penais da falência, não sendo considerados falidos tecnicamente, mas sim a sociedade empresária. II OS SENTIDOS DA EXPRESSÃO SIMPLES Identificado o elemento diferenciador das sociedades empresárias e não empresárias, cabe analisar os sentidos da expressão Simples utilizadas no novo Código Civil. Isto porque, tendo em vista a imprecisão do legislador, podemos identificar 2 (dois) sentidos para tal expressão. No capítulo I, do subtítulo II, do Código Civil, o legislador usou a expressão Da Sociedade Simples, passando a discipliná-la nos artigos 997 ao 1038, que, inclusive, acaba servindo como fonte supletiva para os demais tipos societários. Neste caso, o legislador considerou a sociedade simples como um tipo societário, da mesma forma como ocorre com as sociedades em nome coletivo, em comandita simples, limitada, anônima e em comandita por ações. É um tipo autônomo, com disciplina própria, importado do direito italiano, e que serve como fonte supletiva para os demais tipos societários, caso seus respectivos capítulos sejam omissos. (grifo nosso) abrangente: Com efeito, já no artigo 983, o termo simples é empregado de forma mais Trabalhos Técnicos
4 64 A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. (grifo nosso) A primeira parte do dispositivo impõe que a sociedade empresária, aquela que explora a atividade econômica de forma organizada, tem o dever de adotar a forma de sociedade em nome coletivo (arts.1.039/1044), em comandita simples (arts.1.045/1051), limitada (arts.1.052/1087), anônima (arts.1.088/1089) ou em comandita por ações (arts.1.090/1092). A contrario sensu, não pode a sociedade empresária adotar o tipo sociedade simples, haja vista que esta sociedade encontra-se regulada nos artigos 997 ao 1.038, do CC/2002, sendo que o artigo 983 deste diploma apenas fez menção aos artigos ao 1.092, afastando aquele tipo societário. Assim, a sociedade empresária não pode ser sociedade simples em sentido estrito, ou seja, não adotar o tipo societário previsto nos artigos 997 ao do CC, de forma que o tipo sociedade simples em sentido estrito só pode ser utilizado se a sociedade for não empresária. Todavia, na segunda parte do artigo 983, o legislador usou a expressão sociedade simples, em seu sentido amplo, como sinônimo de sociedade não empresária (que explora uma atividade econômica, mas não de forma organizada). Neste sentido, pode-se afirmar que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) configura o gênero, sendo a sociedade simples em sentido estrito, regulada nos artigos 997 ao 1.038, uma espécie, mas não a única. Assim, no caso da sociedade simples em sentido estrito, pode-se afirmar que ela configura sempre uma sociedade não empresária (simples em sentido amplo), porém nem toda sociedade não empresária (simples em sentido amplo) pode ser considerada sociedade simples em sentido estrito, pois de acordo com a segunda parte do artigo 983 do CC, pode a sociedade não empresária adotar a forma de sociedade em nome coletivo, em comandita simples ou limitada. Com efeito, cabe uma observação em razão do que dispõe o artigo Isto porque, apesar da impossibilidade de uma sociedade empresária optar pelo tipo societário simples (sentido estrito), a lei impõe a utilização supletiva das regras deste tipo societário às sociedades limitadas, caso o contrato social não preveja expressamente a aplicação das normas de regência das sociedades anônimas. Portanto, apesar de a sociedade simples em sentido estrito ser um tipo não empresário, de toda sorte, suas regras podem ser aplicadas supletivamente aos demais tipos societários, independentemente da natureza empresária ou não destes. Trabalhos Técnicos
5 65 O fato é que as profundas modificações operadas pelo Novo Código Civil, aliadas à imprecisão do legislador na utilização de expressões revestidas de conteúdo jurídico, fizeram que a nova sistemática do direito societário brasileiro nascesse com dúvidas e aparentes contradições, que vêm sendo enfrentadas pela doutrina, mas que somente serão dissipadas quando os tribunais sedimentarem a matéria. Trabalhos Técnicos
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