Aspectos microbiológicos de panos de limpeza provenientes de uma Unidade de Alimentação e Nutrição hospitalar M.D. Rosolen 1, F.W. Bordini 2, T.G. Blumberg 3, A.P. Almeida 4, J. Bairros 5, S. Pieniz 6 1-Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-900 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3275-7284 e-mail: michele.dutra@gmail.com 2- Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-900 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3275-7284 e-mail: fernandawbordini@gmail.com 3- Departamento de Nutrição Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-610 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3284-8000 e-mail: thayaneblumberg@hotmail.com 4- Departamento de Nutrição Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-610 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3284-8000 e-mail: anapaula_almeida@hotmail.com 5- Departamento de Nutrição Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-610 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3284-8000 e-mail: jakkebairros@hotmail.com 6- Departamento de Nutrição Universidade Federal de Pelotas CEP: 96010-610 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3284-8000 e-mail: nutrisimone@yahoo.com.br RESUMO O uso indevido de panos de limpeza e panos multiuso descartáveis em uma Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN), combinado com a higienização inadequada, pode causar doenças transmitidas por alimentos (DTA). Assim, o objetivo deste estudo foi analisar os aspectos microbiológicos de panos de limpeza e de panos multiuso descartáveis utilizados em uma UAN hospitalar, bem como a eficácia de dois métodos distintos de higienização para os panos de limpeza. Por meio dos resultados obtidos observou-se a presença de coliformes totais e fecais nos panos de limpeza quando higienizados pela UAN e após o uso na jornada de trabalho. Quando analisada a eficiência da fervura e da higienização com hipoclorito de sódio nos panos de limpeza, não foi observada a presença de nenhum dos micro-organismos testados. Portanto, medidas simples como capacitação dos manipuladores de alimentos e adequação dos procedimentos operacionais padrão podem prevenir a contaminação e o risco de DTA no serviço de alimentação. ABSTRACT The improper use of cleaning and multipurpose cloths in a Food and Nutrition Unit (FNU), combined with inadequate sanitation, can cause foodborne illness (FBI). Thus, the objective of this study was to analyze the microbiological aspects of disposable cleaning cloths and multipurpose cloths used in a hospital FNU, as well as the efficacy of two distinct cleaning methods for cleaning cloths. By means of the results obtained, the presence of total and fecal coliforms was observed in the cleaning cloths when sanitized by the FNU and after the use in the shift. When the efficiency of boiling and sanitizing with sodium hypochlorite in the cleaning cloths was analyzed, none of the microorganisms tested were observed. Therefore, simple measures such as training of food handlers and the adequacy of standard operating procedures can prevent contamination and the risk of FBI in the food service. PALAVRAS-CHAVE: contaminação cruzada; doença transmitida por alimento; serviço de alimentação KEYWORDS: cross contamination; foodborne disease; food service
1. INTRODUÇÃO O uso dos panos de limpeza em Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) ainda é uma prática comum, mesmo sabendo que esses panos são a principal fonte de disseminação de bactérias patogênicas nestes locais. Além disso, o material dos panos de limpeza, na maioria das vezes, é constituído de 100% de algodão, o que permite que restos de alimentos e, consequentemente, microorganismos se fixem aos mesmos, levando à altos níveis de contaminação (Kusumaningrum et al., 2003). O controle de higienização dentro de uma UAN deve ser rigoroso, levando em conta que grande parte dos surtos por doenças transmitidas por alimentos (DTA) são causados pela má higienização dos alimentos, utensílios e equipamentos utilizados na produção. É importante destacar o fato de que muitas vezes os colaboradores dos serviços de alimentação e nutrição não executam o treinamento recebido, favorecendo a contaminação dos materiais utilizados como os panos de limpeza, promovendo a contaminação cruzada. Aliado a isso, também existe o fato de que em muitas unidades não usam um Procedimento Operacional Padrão (POP) para a troca dos panos, sendo estes usados frequentemente, em tempo indeterminado e sem o correto processo de higienização (Bartz, 2008). Segundo Dantas (2014) estima-se que 60% dos casos de DTA estejam relacionados às práticas inadequadas, como a contaminação cruzada. Os principais micro-organismos causadores de doenças alimentares, são Salmonella spp. e Salmonella Enteritidis, estes por sua vez, são encontrados na maioria dos casos de infecções humanas, os quais tem capacidade de se incorporar, colonizar e formar biofilme em locais de contato com alimentos. Higienização é o processo de redução por agente químico ou físico, de micro-organismos em um padrão que não interfira ao alimento a sua qualidade higiênico-sanitária (Brasil, 2004; Rossi, 2010). A higienização de panos de limpezas são extremamente importantes para que não ocorra contaminação dos alimentos, porém os métodos de higienização precisam ser acessíveis às UAN. A higienização realizada de forma errônea dos utensílios, associada ou não a outros aspectos, tem sido responsável pelas DTA (Doménech-Sánchez et al., 2011). No Brasil, recomenda-se a utilização de solução de hipoclorito a 200 ppm, por 15 minutos, para desinfecção de equipamentos, utensílios, frutas e hortaliças (Silva Junior, 2005), porém para higienização de panos não há uma recomendação específica (Bloomfield & Scott, 1997). De acordo com Bartz (2008) tanto a utilização de solução de hipoclorito de sódio como a fervura de panos em água potável são procedimentos adequados e possíveis para serem executados em serviços de alimentação com eliminação significativa de micro-organismos patogênicos. Desta forma, este estudo teve por objetivo analisar os aspectos microbiológicos de panos de limpeza multiuso descartáveis utilizados em uma UAN hospitalar, bem como a eficácia de dois métodos distintos de higienização para os panos de limpeza. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Caracterização das amostras e procedimentos de coleta Panos de limpeza e panos multiuso descartáveis foram coletados de uma UAN hospitalar localizada na cidade de Pelotas-RS. O projeto foi aprovado pela administração da mesma. Os panos foram coletados na UAN hospitalar e transportados ao Laboratório de Microbiologia da Faculdade de Nutrição - UFPEL sob condições de temperatura controlada e em saco plástico estéril, sendo
imediatamente analisados. Os panos de limpeza e multiuso descartáveis utilizados na UAN eram divididos em: paciente (utilizado por funcionários para a higienização da louça de pacientes) e funcionários (utilizados por funcionários para a higienização da louça dos mesmos). A coleta das amostras e análises foram realizadas durante o período de outubro a dezembro de 2017. 2.2 Quantificação microbiana Para análise da quantificação microbiana nos panos de limpeza e multiuso descartáveis foram realizadas duas coletas na UAN hospitalar: a primeira realizada após higienização de acordo com os POP da própria UAN, e a segunda coleta após o período de utilização dos panos no final da jornada de trabalho. Foram realizadas as análises microbiológicas dos panos multiuso descartáveis e panos de limpeza higienizados pela própria UAN, sendo que estes foram destinados separadamente à higienização de louças para pacientes e funcionários. Para isso, foi coletada uma amostra de cada um dos panos (17,5 x 35 cm) usando uma tesoura desinfectada e mãos enluvadas e, posteriormente, realizadas as análises de coliformes totais e fecais; higienização com hipoclorito de sódio (200 ppm) e fervura realizadas de acordo com a portaria nº. 78/2009 (Rio Grande do Sul, 2009). Para as análises de coliformes totais e fecais, uma peça de cada amostra de pano (funcionários e paciente) foi adicionada em 225 ml de água peptonada (0,1%) e agitada em stomacher durante 1 minuto. Após, 1 ml do homogeneizado foi adicionado em 9 ml de água peptonada 0,1% para a obtenção da diluição de 10-1, sendo realizadas diluições consecutivas até 10-5. O experimento foi realizado em duplicata e os resultados expressos em Unidades Formadoras de Colônia (UFC)/cm 2 de pano. Determinação de coliformes totais e fecais: Para a contagem de coliformes totais foi utilizado o método proposto pelo UFSDA (2002) com algumas modificações. Alíquotas de 1 ml das diluições, citadas acima foram colocadas em placa de petri estéreis contendo 20 ml de ágar Vermelho Violeta Bile Lactose (Violet Re Bile Lactose Agar - VRBA Merck- Alemanha). Após foi adicionada uma sobrecamada de 5 ml do mesmo meio, semi-sólido a 45ºC. As placas foram incubadas a 37 ºC por 48 h. Após foi realizada a contagem de colônias características de coliformes totais e para a confirmação dos mesmos, foram retiradas de três a cinco colônias de cada placa, e inoculadas em tubos contendo Caldo Verde Brilhante (Bile 2%) (Biobrás-Brasil). Os tubos permaneceram durante 24 h em banho a 37 ºC, sendo considerados positivos os que apresentaram presença de gás no tubo de Durhan e turvação. A contagem de coliformes totais foi determinada multiplicando-se o número de colônias típicas pelo inverso da diluição, sendo o resultado expresso em Log UFC/cm 2 de pano. A contagem de coliformes fecais foi realizada semeando cinco colônias características, proveniente das placas com ágar VRBA, em tubos contendo 10 ml de caldo Escherichia coli (EC) (Difco EUA). Foram considerados positivos os tubos que apresentaram turvação e presença de gás no tubo de Durhan após 48 h em banho maria a 45 ºC. 2.3 Avaliação dos métodos de desinfecção Para a avaliação dos métodos de desinfecção dos panos foi considerado como parâmetros a higienização com hipoclorito de sódio (200 ppm) e fervura (15 minutos em forno micro-ondas). Para isto, foi utilizado um pedaço de pano para cada método (17,5 x 35 cm). Os panos foram lavados à mão por 10 minutos, pela mesma pessoa, usando detergente neutro comercial comprado em supermercado de varejo. Depois de lavados, os panos foram enxaguados em água potável, e após uma das peças foi fervida em água por 15 minutos (micro-ondas) e a outra peça colocada em uma solução de hipoclorito de sódio (200 ppm) por 15 minutos, seguido de enxágue em água potável.
Após a higienização, os panos foram colocados em 225 ml de água peptonada 0,1% e vigorosamente agitado. Um volume de 1 ml do homogeneizado foi inoculado diretamente em placas de Petry VRBA, e após incubação em tubos contendo VB e EC. As placas e/ou tubos foram incubados na temperatura ideal para cada um dos micro-organismos investigados, durante 48 h. O experimento foi realizado em duplicata e os resultados expressos em Log UFC/cm 2 de pano. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Tendo em vista que não há uma legislação brasileira específica para panos de limpeza e multiuso descartáveis, e mesmo que algumas legislações brasileiras não recomendem o seu uso em serviços de alimentação, o seu uso ainda é uma realidade em UAN (Brasil, 2004; Dantas, 2014). A Tabela 1 apresenta o resultado da contagem de coliformes totais e fecais em panos de limpezas e multiuso descartáveis utilizados na produção (funcionário e pacientes). Tabela 1- Contagem de coliformes totais e fecais em panos de limpezas e multiuso descartáveis utilizados na produção (funcionários e pacientes) em uma UAN hospitalar da cidade de Pelotas-RS Amostra Panos após o uso Panos higienizados pela UAN CT CF CT CF Log UFC/cm 2 ±(DP) PF* 5,56x10 2 ±0,00 5,73x10 2 ±0,00 0,00±0,00 0,00±0,00 PP 5,97x10 2 ±0,00 5,79x10 2 ±0,00 3,78x10 2 ±0,05 5,14x10 2 ±0,00 PMDF 5,98x10 2 ±0,00 0,00±0,00 NC** NC** PMDP 5,98x10 2 ±0,00 0,00±0,00 NC** NC** Os dados foram expressos em média de Log UFC/cm 2 ± desvio padrão. *PF: pano de limpeza funcionário; PP: pano de limpeza paciente; PMDF: pano multiuso descartável funcionário e PMDP: pano multiuso descartável paciente. **NC: não coletado por ser um item descartável na UAN. De acordo com os resultados obtidos pode-se verificar que os panos de limpeza utilizados para pacientes e funcionários, apresentaram coliformes fecais e totais nas amostras, com exceção dos panos multiuso descartáveis, os quais não demonstraram presença de coliformes fecais. Bartz (2008) ao analisar a contaminação microbiológica de panos de limpeza utilizados em uma UAN verificou que a contagem microbiana variou entre 10 4 a 10 8 UFC/cm² de pano, considerando uma média de contaminação elevada (9,1 x 10 6 UFC/cm²). A presença de coliformes nas amostras de panos analisados deve ser destacada na amostra de pano de limpeza dos pacientes (PP) higienizado pela UAN, considerando que a sua presença não é esperada em panos de limpeza adequadamente higienizados e, a mesma pode trazer inúmeros riscos para a saúde dos pacientes, principalmente os imunodeprimidos. Além disso, considerando o grande potencial de multiplicação e contaminação microbiana cruzada desses materiais foi avaliado o método de higienização dos panos de limpezas utilizados na UAN, tanto os que foram submetidos à fervura quanto aqueles que foram higienizados de acordo com
a legislação (Portaria nº 78/2009) (Rio Grande do Sul, 2009), não sendo observada a presença de nenhum dos micro-organismos analisados. Cabe salientar que o processo de higienização é um passo importante para reduzir a contaminação de superfícies devido à remoção mecânica das sujidades e micro-organismos, embora a limpeza isolada não seja insuficiente para evitar contaminação cruzada e garantir a desinfecção (Jackson, et al., 2007). A presença de coliformes totais e fecais em panos, pode ser causada por diversos fatores como manuseio errôneo desses panos pelos colaboradores durante a preparação dos alimentos, ausência ou ineficiência de procedimentos de higienização adequados e conservação dos panos sob umidade e temperatura ambiente (Bartz, 2008). 4. CONCLUSÕES No presente estudo, observou-se a presença de coliformes totais e fecais para os panos de limpeza e coliformes totais para os panos multiuso descartáveis. Além disso, quando analisado o processo de higienização realizada pela UAN, verificou-se a presença dos micro-organismos analisados, evidenciando falhas importantes no processo. Portanto, medidas simples como capacitação dos manipuladores de alimentos e adequação dos procedimentos operacionais padrão podem prevenir a contaminação e o risco de DTA no serviço de alimentação. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bartz, S. (2008). Contaminação microbiológica e avaliação de métodos de higienização de panos de limpeza utilizados em serviços de alimentação. (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Brasil. (2004). Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) RDC nº. 216, 15 de setembro de 2004. Dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Dantas, S. (2014). Transferência de Salmonella Enteritidis por contaminação cruzada e formação de biofilme em diferentes superfícies de corte. (Dissertação de Mestrado). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Botucatu-São Paulo. Doménech-Sánchez, A., Laso, E., Pérez, M. J., & Berrocal, C.I. (2011). Microbiological Levels of Randomly Selected Food Contact Surfaces in Hotels Located in Spain During 2007-2009. Foodborne Pathogens and Disease, 8(9), 1025-1029. Jackson, V., I.S. Blair, D. A. McDowell, J. Kennedy, D.J. Bolton. 2007. The incidence of significant foodborne pathogens in domestic refrigerators. J. Food Contr. 18: 346-351 Kusumaningrum, H.D., Riboldi, G., Hazeleger, W.C., & Beumer, R.R. (2003). Survival of foodborne pathogens on satainless steel surfaces cross-contamination to foods. International Journal of Food Microbiology, 25(03), 227-236. Rio Grande do Sul. (2009). Secretaria da Saúde. Portaria nº 78, 30 de janeiro de 2009. Aprova a Lista de Verificação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Rossi, E. (2010). Avaliação da contaminação microbiológica e de procedimentos de desinfecção de esponjas utilizadas em serviços de alimentação. (Dissertação de Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
Scott, E., & Bloomfield, S.F. (1990a). The survival and transfer of microbial contamination via cloths, hands and utensils. Journal of Applied Bacteriology, 68, 271-278. Silva, JR., E.A. (2005). Manual de controle higiênico-sanitário em serviços de alimentação. Varela, São Paulo. U.S.Food & Drug Administration. (2002). Center for Food safety & Applied Nutrition. Bacteriological analytical manual online. Enumeration of Escherichia coli and the coliform bacteria. Rockville. Disponível em: http:// www.cfsan.fda.gov.