LUXAÇÃO TRAUMÁTICA DA ANCA NA CRIANÇA: CASO CLÍNICO E BREVE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

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Transcrição:

229 SOCIEDADE PORTUGUESA DE ORTOPEDIA E TRAUMATOLOGIA Rev Port Ortop Traum 25(3): 229-235, 2017 CASO CLÍNICO LUXAÇÃO TRAUMÁTICA DA ANCA NA CRIANÇA: CASO CLÍNICO E BREVE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA António Gonçalves, Ricardo Simões, Sara Monteiro, João Gonçalves, Virgilio Paz Ferreira, Fernando Carneiro, António Rebelo Serviço de Ortopedia do Hospital do Divino Espirito Santo, Ponta Delgada, São Miguel, Açores António Gonçalves, Ricardo Simões, João Gonçalves Interno de Formação Específica de Ortopedia Sara Monteiro Interna de Formação Específica de Ortopedia Virgilio Paz Ferreira, Fernando Carneiro Assistente Graduado Sénior de Ortopedia António Rebelo Diretor do Serviço de Ortopedia Submetido em 18 maio 2017 Revisto em 21 junho 2017 Aceite em 19 agosto 2017 Tipo de Estudo: Caso Clínico Nível de Evidência: V Declaração de conflito de interesses: Nada a declarar. Correspondência António Gonçalves Serviço de Ortopedia, Hospital do Divino Espírito Santo Av. D. Manuel I, Matriz 9500-370 PONTA DELGADA Telefone: 963608094; 296203000 lestatmarius1@gmail.com http://www.rpot.pt Volume 25 Fascículo III 2017

230 RESUMO A luxação traumática da anca na criança é uma lesão rara que entre outras complicações, pode resultar numa necrose avascular da cabeça do fémur. É uma emergência médica e o seu rápido diagnóstico e resolução são fundamentais para minimizar o risco de complicações. Os autores apresentam um caso de uma criança do sexo feminino, de 3 anos de idade, que recorreu ao serviço de urgência após uma queda de baixa energia, com um período de cerca de 1h de evolução. Apresentava-se com incapacidade funcional, anca em flexão e ligeira adução e rotação interna, com dor localizada a nível de anca direita, sem aparente lesão neurológica. Fez estudo radiológico que mostrava luxação póstero superior da anca direita. Foi feita redução incruenta imediata no bloco operatório sob anestesia geral e aplicada tração percutânea. Palavras chave: Luxação da anca; traumática; crianças Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

231 ABSTRACT Traumatic dislocation of the hip in the child is a rare lesion that, among other complications, may result in avascular necrosis of the femoral head. It is a medical emergency and its quick diagnosis and resolution are key to minimizing the risk of complications. The authors present a case report of a 3-year-old female child, who went to the emergency department after a low energy fall, with about 1h of evolution. She presented with functional incapacity, hip flexion, slight adduction and internal rotation, with pain located at the level of the right hip, with no apparent neurological lesion. Her x-ray showed posterior-superior dislocation of the right hip. Non-invasive reduction under general anaesthesia was performed in the operating room and immobilization with percutaneous traction was applied. Key words: Hip dislocation; traumatic; children http://www.rpot.pt Volume 25 Fascículo III 2017

232 INTRODUÇÃO A luxação traumática da anca nas crianças é uma lesão rara com uma incidência de 0,8 casos por milhão/ ano, sendo uma emergência ortopédica. Constitui menos de 10% de todas luxações traumáticas da anca e apenas 5% de todas as luxações de anca ocorrem abaixo dos 14 anos de idade. É extremamente rara em crianças menores de 5 anos de idade 1,2,3,4,6,7,8,9,10. A luxação posterior correspondente a 80% dos casos 3,5,6,7,9,11, sendo mais comum no sexo masculino (4:1) podendo ocorrer em qualquer faixa etária, com picos de incidência entre os quatro e sete anos e entre os onze e quinze anos 1,2,3,5,6,7,8,10,11. A luxação traumática da anca em idade pediátrica pode resultar de traumas de baixa energia, estando associados à flexibilidade acetabular e laxidão ligamentar, fato observado nas crianças mais jovens 4,5,8,9,10,11. Nas crianças maiores ou adolescentes, por calcificação da cartilagem triradiada e diminuição de laxidão, torna-se necessária maior energia para a luxação. Nesses casos podem ocorrer concomitantemente fraturas femorais 1, 2,5,11. Clinicamente a luxação posterior apresenta incapacidade para marcha e deformidade típica em flexão, adução e rotação interna da coxa 1,7,11. A avaliação radiográfica é essencial para confirmar o diagnóstico, revelar o tipo de luxação e descartar fraturas associadas 1,2,5,7,9,11. Torna-se importante uma rápida resolução com recurso a redução incruenta sob anestesia, minimizando as potenciais complicações, nomeadamente as precoces como fraturas associadas ( 40%), a lesão neurológica ou vascular ( 25%) 2,5,6,7,8,9,10,11 e complicações tardias como episódios de reluxação, condrólise, necrose avascular (incidência de 8% a 10%), e coxartrose degenerativa (identificadas alterações clínicas ou radiológicas em follow-up até idade adulta em cerca de 36%) 1,2,6,7,8,10. As complicações tardias estão associadas ao atraso da redução sendo fatores de mau prognóstico a permanência da luxação por mais de seis horas, o atraso na redução (aumenta em 20 vezes o risco), crianças maiores de cinco anos ou perto da maturidade esquelética, lesão articular grave e presença de traumas múltiplos associados 1,2,4,5, 6,7,9,10,11. É recomendado por alguns autores a drenagem da hematrose por forma a melhorar a vascularização para a cabeça femoral 1,11. Após a redução, devese avaliar a congruência articular, comparando o espaço articular, a lateralização da cabeça e a quebra na linha de Shenton com o lado contra lateral 2,9. A função do nervo ciático deve ser registrada antes e após a redução (lesão nervosa com incidência aproximada de 5% em crianças). O ramo peroneal é o mais afetado nas luxações posteriores (compressão direta). A redução aberta está indicada quando ocorre fracasso na redução fechada, lesão do nervo ciático (ausência de melhoria com estudo eletromiográfico em quatro a seis semanas) 1 e fratura acetabular, do colo ou da cabeça femoral que exijam tratamento cirúrgico 1,2. O tratamento após a redução permanece sem consenso 1,2,7,8,9. Alguns autores sugerem gesso pelvipodálico por quatro a seis semanas para permitir cicatrização da cápsula. Outros indicam repouso no leito até alívio da dor, seguido de marcha com canadianas por quatro semanas 1,2,5. Há referência noutro estudo a um período de repouso entre 3 a 8 semanas, necessário para resolução de sinovite e cicatrização de tecidos moles periarticulares 1,8. Outro estudo indica tração cutânea e repouso estrito no leito três semanas seguido de mais 3 semanas de carga parcial 1,5,8. No caso de luxações tardias ou negligenciadas pode ser necessária tração esquelética prévia à redução, seguida de tração cutânea por mais duas a três semanas 1,4,8. É recomendável que a anca seja avaliada por radiografias seriadas, durante pelo menos dois anos após a luxação 1,9,11. A reluxação é rara e associada a crianças abaixo de oito anos e crianças com laxidão ligamentar, especialmente em síndrome de Down 1,10. As causas de reluxação estão associadas a rutura capsular ou falência da mesma, rutura de labrum ou fragmento osteocondrais intraarticular 1,6. A ressonância magnética é um exame sensível e específico que permite avaliar as causas de instabilidade ou da reluxação e possibilita um adequado planeamento da abordagem cirúrgica 1,2,6,7,9. O prognóstico de luxações traumáticas da anca é apesar de tudo melhor em crianças do que em adultos 3,8,10. Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

233 CASO CLÍNICO Apresentamos o caso de uma criança de sexo feminino, 3 anos de idade com história de queda da cama, cerca de 50cm, correspondente a um trauma minor. Apresentava incapacidade funcional e dor localizada à anca direita, sem alterações neurovasculares. O membro inferior estava em flexão, rotação interna e adução de anca direita (Figura 1). O trauma teria ocorrido cerca de uma hora antes da chegada ao serviço de urgência. Foram pedidos exames radiológicos da bacia e anca (Figura 2), tendo-se constatado uma luxação póstero superior da anca direita, de causa traumática. Foi encaminhada de imediato para o bloco operatório para redução incruenta da luxação, sob anestesia geral (Figura 3). A criança manteve-se sem alterações neurovasculares no membro. Foi internada com tração percutânea no membro inferior direito que manteve durante 10 dias. Durante o internamento foi realizada uma RMN para avaliação de eventuais lesões associadas, constatando-se apenas imagens sugestivas de rotura muscular no tendão do obturador interno, grande adductor, quadrado femoral (Figura 4). Na avaliação clinica no internamento, não foram detetados outros sinais sugestivos de hiperlaxidão noutras articulações. Ao 11º foi aplicado gesso pélvico-podálico que manteve por um período de 8 semanas. À data da última observação em consulta (cerca dos 2 anos após a luxação), apresentava-se sem alteração do padrão de marcha, sem limitação das mobilidades, sem dores e sem alterações radiológicas aparentes (Figura 5). Figura 2: Rx de entrada SU Figura 3: Imagens de intensificador de imagem intraoperatório DISCUSSÃO Figura 4: Imagens de RMN Figura 1: Posição da anca http://www.rpot.pt Volume 25 Fascículo III 2017

234 Figura 5: Reavaliação em consulta externa cerca de 2 anos pós luxação. A luxação traumática da anca nas crianças é rara e extremamente rara se menores de 5 anos de idade. No nosso caso tratou-se de uma luxação posterior que precedia os picos de incidência descritos na bibliografia. O género deste caso também não é concordante com a maioria da bibliografia existente. É consensual a necessidade de redução imediata de modo a evitar potenciais complicações. No caso relatado o fato de não estar associado a traumas major, não apresentar lesões associadas no estudo por RMN e, sobretudo o fato de ter sido feita redução atempadamente, terão certamente contribuído para a boa evolução clínica e radiológica. Devem ser utilizadas as mesmas manobras de redução dos adultos. CONCLUSÃO As luxações traumáticas da anca são verdadeiras emergências ortopédicas, sendo mandatória a sua rápida redução de modo a evitar as possíveis complicações. As avaliações clínicas e radiológicas periódicas, por um período alargado são fundamentais para deteção precoce das mesmas. Sociedade Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

235 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Brandão GF. Luxação traumática posterior do quadril em crianças: relato de cinco casos. Rev Bras Ortop. 2010; 45 (2): 196-199 2. Monteiro G. Luxação traumática da anca na criança entidade rara a recordar. Rev Port Ortop Traum. 2014; 22 (3): 318-324 3. Gurkan V. Evaluation of pediatric patients with traumatic hip dislocation. Acta Orthop Traumatol Turc. 2006; 40 (5): 392-395 4. Pal CP. Neglected Posterior Dislocation of Hip in Children - A Case Report. Journal of Orthopaedic Case Reports. 2014 Apr; 4 (2): 21-24 5. Zrig M. Traumatic hip dislocation in children. Acta Orthop Belg. 2009; 75: 328-333 6. Mutlu S. Posterior Dislocation of the Hip in a 4-Year- Old Boy. Case Reports in Clinical Medicine. 2015; 4: 23-27 7. Sanjay P. Posterior Dislocation of the Hip in a Child Following Trivial Trauma: A Case Report. The Internet Journal of Emergency Medicine. 2002; 1 (2) 8. Minhas MS. Traumatic hip dislocation in children. J Pak Med Assoc. 2010 Dec; 60 (12): 1019-1022 9. Sprong F. Traumatic hip dislocation in children: The role of MRI. SA ORTHOPAEDIC JOURNAL Summer. 2010; 78-82 10. Salcedo JD. Traumatic hip dislocation in pediatric patients. Report of five cases. Acta Ortopédica Mexicana. 2010; 24 (4): 258-261 11. Bitterman AD. Traumatic Posterior Hip Dislocation in a 5-Year-Old: A Case Report and Review of the Literature. Austin J Orthopade & Rheumatol. 2015; 2 (1): 1013 http://www.rpot.pt Volume 25 Fascículo III 2017