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Transcrição:

- Enquadramento histórico: Direitos Reais Platão e Aristóteles discutiram a ideia de propriedade na sociedade, defendendo o segundo a propriedade privada pois, pensando cada um si, gerar-se-ia uma sociedade próspera e acentuarse-ia a necessidade natural/social do Homem quanto à salvaguarda pelo direito de propriedade. - Definição Direitos Reais: Características Os Direitos Reais são direitos subjectivos com 4 características: > direitos subjectivos: permissão normativa de aproveitamento de um bem (Menezes Cordeiro), ou, para Von Wright, normas permissivas que estabelecem um arbítrio de poder (permissão positiva) ou não fazer (permissão negativa), de acordo com a vontade. Pedro Caetano Nunes discorda da definição de Menezes Cordeiro, entendendo os direitos subjectivos enquanto permissões normativas, a uma noção de liberdade - permissão bilateral de se fazer ou não, de acordo com o livre arbítrio. 1. natureza privada: os Direitos Reais situam-se no Direito Privado, o que convoca a distinção entre Direito Privado e Direito Público - critério da posição do sujeito (ius imperium vs igualdade formal) e o critério do interesse (interesse público vs interesse privado), sendo o Direito Privado limitado pelo Direito Público (ex. autorizações administrativas de construção) - os publicistas ao falarem em Propriedade Pública recorrem aos conceitos de Direito Privado (ex. servidões públicas quanto a cabos eléctricos). 2. caráter absoluto: é um direito oponível a todos, a opunibilidade erga omnes, havendo uma distinção entre direitos absolutos (permissão contra quem quer que seja - ex. posso impedir as pessoas de entrar na minha propriedade) e direitos relativos (permissão perante um sujeito - ex. tenho um crédito ante B, posso cobrá-lo), sendo essa distinção originária do BGB aquela que marca a diferença entre o Direito das Obrigações e os Direitos Reais. Não há uma obrigação passiva universal, perante toda a humanidade, existem sim, delimitações. Menezes Cordeiro questiona essa ideia exemplificando com a aquisição tabular (ex. A vende a B e depois a C, depende do registo predial). Pedro Caetano Nunes discorda, entendendo que os direitos reais desaparecem e surgem com caráter absoluto. 3. patrimonialidade: susceptibilidade de avaliação pecuniária, surgindo esta com o mercado. 4. objecto consistente em coisas corpóreas: as coisas revelam-se aos sentidos e são o objecto das situações jurídicas (artigos 202º e ss), sejam elas imóveis (prédios, águas, árvores ligadas ao solo), sejam móveis. Dentro das coisas incorpóreas temos ex. os direitos de autor ou a propriedade industrial, mas o penhor, direito real de garantia, pode também incorporar coisas incorpóreas, estando assim demonstrada a inconsistência da definição germânica de coisas incorpóreas (artigo 666º) João Bernardo Silva 1 de 104

Numa perspectiva sociológica a relevância dos direitos reais prende-se essencialmente com a apropriação privada de bens. - Concepções de Direito Real: Querelas doutrinárias A tipologia civilistica, associa aos Direitos Reais, o direito das coisas, existindo 3 concepções: > realista ou clássica: entende o Direito Real (ius in re) com uma relação jurídica entre uma pessoa e uma coisa, um vinculo ou um poder de uma pessoa sobre uma coisa, assim, um direito de domínio ou direito de soberania (enquanto a satisfação do direito de crédito envolve cooperação, a satisfação do direito real associa-se a um domínio directo sobre a coisa). Mas, não existem relações com o objecto por a ideia de relação implicar alteridade (Kant). > personalista: caracteriza o Direito Real no seu carácter absoluto, na sua opunibilidade geral ante os outros. Mas, esta corrente desvaloriza os poderes perante a coisa, subvalorizando o conteúdo do direito real, além do que a obrigação passiva universal é artificial (ex. a oposição da minha casa no Alentejo a um cidadão que viva na Austrália não faz sentido). > eclética: divide os direitos reais no seu lado interno - poder directo e imediato sobre a coisa - e no seu lado externo - opunibilidade erga omnes por essa pessoa desse poder. Manuel Henrique Mesquita na sua tese de doutoramento adopta uma perspectiva eclética, privilegiando o lado interno, sendo mais realista que personalista, afirmando que os direitos reais não são direitos contra pessoas, mas sim direitos de soberania sobre as coisas. No sentido oposto, Rui Pinto Duarte, vinca mais o lado externo, seguindo a posição germânica, isto é, o poder sobre a coisa só tem caráter real se houver opunibilidade geral. Acrescenta ainda que a discussão em torno do conceito de direito real acarreta a discussão do próprio conceito de direito subjectivo, o que não existe com certezas actualmente. - Sub-categorias dos Direito Real > direitos reais de gozo: há uma afectação da coisa à retirada de utilidades pelo uso e apropriação dos frutos ao titular do direito real de gozo (frutos naturais - ex. maçãs ou frutos civis - ex. rendas ). Direito de propriedade, usufruto, direito de uso e habitação, direito de superfície, servidão predial, direito real de habitação periódica ou time-sharing (e direito de arrendamento - Menezes Cordeiro) > direitos reais de garantia: há uma afectação da coisa à obtenção do cumprimento de uma obrigação pelo valor da coisa ou pelos seus rendimentos com preferência ante os demais credores dos titulares dessas coisas João Bernardo Silva 2 de 104

Hipoteca, penhor, consignação de rendimentos, privilégios creditórios, direito de retenção, penhora e arresto (e ainda, na prática, a propriedade com função de garantia). > direitos reais de aquisição: há uma possibilidade de aquisição da coisa com preferência ante terceiros, impedindo que outros a adquiram. Preferência real, promessa real de alienação (existindo outras figuras próximas como a reserva de propriedade e a posição do locatário na locação financeira). - Direito de propriedade vs Direitos reais menores É frequente a contraposição entre o direito de propriedade, enquanto direito máximo, e outros tidos como direitos de propriedades menores (de gozo, garantia ou aquisição), estes tidos como figuras parcelares que coexistem com a propriedade, comprimindo-a (ex. apesar de ser o proprietário, existe um usufrutuário). Ainda assim, os direitos reais menores são figuras autónomas do direito de propriedade, nomeadamente na sua base social e função jurídica. - Obrigações reais (propter rem) e Ónus Reais - Obrigações Reais São situações jurídicas passivas com uma estrutura obrigacional (ex. artigo 1424º e dever de contribuir para as despesas do condomínio), enquadrando-se, por regra, num enquadramento jurídico relacional - um débito e um crédito -, não sendo um direito real. A escola de Coimbra rejeita as relações jurídicas como a proibição de fazer escavações (1348º), entendendo que a proibição incide sobre o proprietário, não havendo um credor no lado oposto - embora o nº2 aponte o dever de indemnizar. As obrigações reais não têm correspondência legal, são, sim uma pura teorização académica alvo de querelas doutrinárias: Henrique Mesquita reconhece a sua existência enquanto dever de carácter positivo, mas não no seu caráter negativo, falando, sim, em imposições (ex. deveres próprios de relações de vizinhança). - Distinção entre obrigações reais ambulatórias e obrigações reais não ambulatórias As obrigações reais dizem-se ambulatórias quando se transmitem automaticamente com o direito real, dizem-se não ambulatórias quando isso não acontece, isto é, associa-se em saber se, a transmissão do direito real envolve também a transmissão da divida (ex. A vende prédio a B, mas deve 2 prestações, há a transmissão dessa dívida a B?) e a lei não apresenta um critério geral, existindo flutuações doutrinárias e jurisprudências: Manuel Henrique Mesquita distingue: João Bernardo Silva 3 de 104

as obrigações de facere que impõem actos materiais da coisa (ambulatórias - ex. dever de realizar iras de reparação ordinária pelo usufrutuário, artigo 1472º) as obrigações pecuniárias (não ambulatórias). Rui Pinto Duarte aceita os critérios de Henrique Mesquita, assim, são tendencialmente ambulatórias as obrigações cujo cumprimento implique a titularidade do direito real (ex. destruir obras ilícitas) e são tendencialmente não ambulatórias aquelas cujo cumprimento não implique essa titularidade (ex. dívidas resultantes de despesas de serviços de interesse comum). - Ónus Reais Um ónus associa-se à prática de uma conduta necessária à obtenção de uma utilidade, isto é, para obter uma vantagem ou evitar uma desvantagem. Ónus real é uma situação jurídica real em que uma coisa responde por uma obrigação mesmo após a sua transmissão para um sujeito diferente daquele, isto é, não cumprindo o novo titular a obrigação, será a coisa de que ele é o novo titular a responder. ex. artigo 744º (privilégios creditórios): são direitos reais de garantia, atribuindo a possibilidade de se obter a satisfação do crédito com preferência sobre os demais credores - geralmente previstos legalmente a favor do Estado e Entidades Públicas -, como os créditos por contribuição predial, onde o Estado iria obter a satisfação do crédito de imposto executando o imóvel - A, que não paga o IMI de 2015, vende a fracção autónoma a B, Estado ordena venda judicial do bem para obter a satisfação do crédito, pelo que, ou B paga os 1000 em falta ou vê o seu bem a ir a venda judicial. ex 2. artigo 2118º (capacidade testamentária): quem morre pode dispor de parte da sua herança (1/3), podendo essa quota ser afecta por duas formas: testamento ou doação inter-vivos (ex. A doa, em vida, todo o seu património a B, afectando - afectando a quota de 1/3 é uma doação inoficiosa, pelo que, após a morte de A, pede C, o irmão prejudicado, a redução da doação), ora, a doação de um bem sujeito a registo fica marcada pelo ónus real de coacção, onde, aquando da morte de A poderá esse vem ser reduzido inofeciosamente, isto é, sendo necessário preencher a quota de C, o bem de B, mesmo que vendido a D, poderá ser captado por C pelo seu caráter absoluto. - Direitos Reais vs Direitos de Crédito Recorde-se a querela doutrinária quanto à concepção de direito real: > concepção eclética e carácter absoluto dos direitos reais: reconhece a existência de um lado interno e de um lado externo nos direitos reais, marcando a diferença entre os direitos reais (absolutos) e os de crédito (relativos - deveres de pessoas determinadas). > concepção eclética e imediação dos direitos reais: nos direitos reais existem poderes imediatos quanto à coisa, já nos direitos de créditos os poderes são mediatos, convocando a colaboração de outra pessoa na satisfação de utilidades. João Bernardo Silva 4 de 104

Mas existem direitos absolutos - direitos de personalidade ou de autor - que não incidem sobre coisas corpóreas, pelo que esta distinção a nada releva. > concepção monista (ideia infeliz): desconsidera a distinção entre direitos reais e os de crédito, entendendo que os direitos reais têm também uma estrutura relacional comum que assenta numa ideia de obrigação passiva universal e que os direitos de crédito têm um caráter real, pois, em caso de incumprimento, há a agressão do património do devedor Como vimos, a divisão entre direitos reais e obrigacionais não assenta em nenhum critério classificatório, resultando da evolução histórica da Doutrina, tal como comprovam as figuras intermédias entre direitos de crédito e os direitos reais - os direitos pessoais de gozo - regulados no Direito das Obrigações e Comunitário: ex. direito de arrendamento: o arrendatário para a sua habitação tem o gozo da coisa, mas tem um direito real - por precipitado histórico: em Roma, faziase a distinção entre acções judiciais relativas a pessoas e as relativas às coisas, estando os direitos reais associados à coisa e o arrendamento incorporado no relativo às pessoas, sendo um direito de crédito, embora do ponto de vista estrutural esteja próximo dos direitos reais por atribuir poderes imediatos sobre a coisa com tutela erga omnes. - Assento legal dos Direitos Reais > Livro II das Obrigações: Capítulo VI (garantias especiais das obrigações): artigos 623º e ss. com destaque para as garantias reais: artigo 656º e ss > Livro I Parte Geral: no seu subtítulo II: Das Coisas : artigos 202º e ss. > Livro III das Coisas: exigindo-se a analise do regime do direito de propriedade para que se o aplique, por analogia aos direitos de propriedade > Legislação extravagante: Código do Registo Predial, DL Direito Real de Habitação Periódica, Águas, Penhor financeiro PRINCÍPIOS FORMAIS DOS DIREITOS REAIS > caráter absoluto: por serem oponíveis erga omnes. > sequela (artigos 1311º e 1315º): estão associados ao poder de seguir a coisa onde quer que ela se encontre, isto é, independentemente das suas vicissitudes materiais, ou seja, é a susceptibilidade de invocar um direito contra qualquer detentor da coisa, o que, em contraposição com os direitos de créditos - inatingíveis aquando da sua saída do património do devedor -, permite que se siga a coisa mesmo depois da sua saída da esfera patrimonial. > publicidade: a existência do direito real é facilmente cognoscível, seja por força do registo (ex. registo predial, automóvel, de aeronaves ou embarcações), seja pela posse - associado a bens de menor valor. É a opunibilidade erga omnes que justifica a publicidade, pois os terceiros, que não são ainda proprietários, querem saber quem é o real proprietário. > tipicidade ou taxatividade: associado ao elenco fechado de direitos reais, um numerus clausus, isto é, só são direitos reais os previstos na lei, não podendo criar figuras distintas às João Bernardo Silva 5 de 104

taxativamente previstas na lei - pelo que seria lesivo ante terceiros quanto à opunibilidade erga omnes e falta de publicidade. Numa outra dimensão, consiste em cada direito real estar organizada por lei como um tipo, assente num conjunto de traços identificadores. Tipicidade é uma palavra polissémica, pelo que, em Teoria do Direito, quando os conceitos são muito fechados dizem-se tipificados (ex. menoridade), podendo ser conceitos abertos (ex. conceito legal de jogo). > elasticidade ou consolidação: não é um corolário de caráter absoluto, mas é uma característica geral dos direitos reais: os direitos reais tendem a expandir-se até ao máximo das faculdades que abstractamente podem comportar, isto é, a propriedade contrai quando surgem direitos reais menores e com o seu desaparecimento, volta a sua dimensão a se expandir. O mesmo acontece com outros direitos reais menores (ex. direito de propriedade contraído com o usufruto e direito de passagem). > especialidade ou individualização: os direitos reais incidem sobre coisas específicas e não coisas genéricas (ex. penhor: artigo 666º: certa coisa imóvel ou hipoteca: certas coisas imóveis ), o que não invalida que a coisa seja complexa, isto é, constituída por várias pequenas coisas (ex. estabelecimento comercial: é uma empresa, com mercadorias, o dinheiro na loja, contrato de locação ou propriedade sobre a fracção autónoma). Tem é de ser uma coisa certa e actual, logo não incide sobre coisas juridicamente futuras (ex. apesar de o edifício estar já construído, por não estar constituída a propriedade horizontal, não há autonomização das fracções autónomas, não podendo constituir direitos reais sobre aquelas). > imediação e actualidade: é um poder material jurídico de aceder directa e imediatamente à coisa, estando relacionada com o lado interno dos direitos reais, tendo esta, como vimos, de ser uma coisa presente e não uma coisa futura. Não é uma característica exclusiva dos direitos reais: ex. direito de personalidade > compatibilidade ou exclusão: só se pode constitui direitos reais sobre coisas que sejam compatíveis com esse direito (ex. não posso ter dois proprietários exclusivos sobre a mesma coisa). > prevalência (Paulo Cunha): é o poder de o titular do direito real impor o seu direito a quem não tenha direito anterior incompatível, associando-se à vertente externa do direito real e à sua opunibilidade. > consensualidade ou eficácia real: a transmissão de direitos reais é um efeito automático do negócio jurídico (artigo 408º) - sistema do título. A eficácia real dos contratos é um tema polémico, havendo outros modelos de transmissão dos direitos reais sem ser por mero efeito do tipo do contrato: ex. modelo de modo, segundo o qual, o bem só se transmite por inscrição ou registo da coisa / transmissão da coisa por efeito da traditio, isto é, pela entrega da coisa. João Bernardo Silva 6 de 104

O sistema português parece assumir um modelo de tipo no Código Civil (artigo 408º), mas conjugando-o com outras normas, é o sistema português um sistema misto (ex. sistema do modo no Código Comercial). Veja-se aliás o artigo 5º do Código do Registo Predial, segundo o qual, os direitos reais só são plenamente transmitidos por força do seu registo João Bernardo Silva 7 de 104

DIREITOS REAIS DE GOZO - Direito de Propriedade - Noção de Propriedade A propriedade, além da sua noção jurídica, assume relevância sócio-ideológica e política, mas também no âmbito da Análise Económica de Direito - que direito deve constituir a base das vantagens ou desvantagens do direito vigente - ou na Filosofia do Direito. O Código Civil e a CRP olham para a propriedade privada de acordo com o consenso político-ideológico que os sustentou. No discurso jurídico, o termo propriedade tem 4 sentidos: é um tipo de direito real (ex. a propriedade é o direito real de gozo prototípico) é o objecto de um direito real (ex. A tem uma propriedade na Beira Alta) é um direito real de gozo ex. reserva de propriedade (artigo 409º): para a doutrina dominante só com o pagamento final das prestações é que há a transferência integral da propriedade para o alienante, durante o período de pagamento pertence o direito ao alienante; para outros autores a propriedade transfere-se para o adquirente, mas o alienante fica na expectativa de o retomar no caso de incumprimento. conceito constitucional de propriedade (artigo 62º CRP): é um direito análogo e não um DLG, sendo distinto dos sentidos civilistas, abarcando todas as formas de apropriação privada de valor económico, mesmo aquelas que não incidem directamente sobre coisas corpóreas ou incorpóreas (ex. propriedade colectiva) O artigo 1305º classifica o direito de propriedade como um direito pleno e exclusivo de uso, fruição e disposição sem o definir legalmente em sentido estrito, sendo este um domínio - um poder sobre uma coisa (utilizar, recolher os fritos, dispor) - ilimitado e exclusivo de uma pessoa sobre uma coisa. Ainda assim, existem limites (ex. a edificação de um edifício está dependente de autorização camarária). É aliás impossível construir-se um conceito único de propriedade, apesar de ser, a partir do direito de propriedade que todos os outros direitos reais se constroem. - Características do Direito de Propriedade plenitude: abrange todos os poderes que podem existir sobre uma coisa (artigo 1305º) elasticidade: o seu conteúdo pode expandir-se ou contrair consoante o desaparecimento ou a existência de direitos reais menores, tendendo a se expandir até ao máximo das faculdades que pode comportar perpetuidade: não está sujeito a prazo, tendo duração ilimitada, isto é, não cessa com o tempo (não obstante excepções legais - ex. artigo 1307º.2) João Bernardo Silva 8 de 104

transmissibilidade: o direito de propriedade é, regra geral, um direito transmissível e abrange a generalidade dos direitos privados patrimoniais (o direito de uso e habitação é intransmissível) - Modos de Aquisição da Propriedade (artigos 1316º e ss) por contrato por sucessão por usucapião: é a aquisição resultante da manutenção da posse durante certo tempo, tendo dois elementos: a posse - instituto jurídico que assenta na detenção da coisa como se fosse proprietário - e o tempo. por ocupação (e achamento): é a aquisição resultante da apreensão material de uma coisa sem dono com a intenção de a adquirir, sendo o regime estrito às coisas móveis (artigo 1318º), já que as coisas imóveis sem dono conhecido considera-se património do Estado (artigo 1345º). Historicamente a ocupação teve um papel central. O Código Civil na sua regulação utiliza uma proposição geral (artigo 1318º) acompanhada de várias proposições para casos específicos (caça e pesca e demais animais - artigos 1319º a 1322º). O artigo 1318º inclui ainda as coisas perdidas ou escondidas - os tesouros (artigos 1323º e 1324º). por acessão: traduz-se na aquisição por incorporação de coisa pertencente a terceiro em coisa própria, tendo como requisitos a incorporação e a diversidade de titulares. Podendo esta ser natural (por factos naturais - ex. acréscimo de terreno movimentado pela água) ou industrial (por factos humanos: ex. A constrói no seu prédio com pedras do terreno de B). Fala-se ainda em acessão mobiliária ou acessão imobiliária (ex. incorporação de coisas móveis num imóvel) - Modos de Extinção do Direito de Propriedade - Extinção Absoluta perda da coisa: por perecimento físico da coisa,, o que a coisa destruindo-se, o direito real extingue-se (artigo 1480º: apesar da perda da coisa gerar efeitos indemnizatiórios) abandono (artigos 1318º e 1397º): é uma modalidade de renúncia especializada por o negócio consistir não num texto, mas numa conduta (ex. lançamento de um objecto para uma lixeira) renúncia: é um negócio jurídico unilateral de extinção de um direito, tendo duas modalidades: a renúncia abdicativa onde a extinção do direito é pura e simples (ex. abandono como mera conduta) e a renúncia liberatória em que a extinção é feita a favor de alguém, não gratuitamente (meio de exoneração de uma obrigação: ex: artigo 1567º.4 e renúncia ao direito de propriedade na parte do prédio onerada com a servidão para não pagar as obras). João Bernardo Silva 9 de 104

Existe uma querela doutrinária relativa à renúncia, nomeadamente quanto à renúncia abdicativa da propriedade sobre imóveis, entendendo parte da doutrina que a renúncia só é possível para bens móveis, dadas as consequências sociais do abandono de imóveis, embora Pedro Caetano Nunes entenda que, renunciando a bens imóveis, ficam esses sem dono e, neste caso, fica o Estado como proprietário (artigo 1345º), pelo que parece já admissível a sua renúncia. - Transmissão inter-vivos da Propriedade Do ponto de vista sociológico, o principal meio de transmissão inter vivos do direito de propriedade é o contrato, no entanto, o Direito Comparado mostra existir 3 paradigmas de relação entre o contrato e a transmissão inter vivos do direito de propriedade: sistema do título: o efeito transmissivo da propriedade resulta do mero efeito do contrato sistema do modo: o efeito transmissivo resulta de um acto autónomo face ao contrato - ex. a tradição ou a inscrição registral da coisa. É predominante na Alemanha, tendo o contrato de compra e venda efeitos meramente obrigacionais havendo, a par desse, um contrato real que funciona num regime de abstracção (o negócio jurídico não é afectados pelos vícios de outros negócios jurídicos) - por oposição ao regime da causalidade - a dependência da transmissão dos direitos do negócio jurídico que serve de base à operação - ex. não se reflectindo os vícios do contrato obrigacional no contrato real. sistema do título e do modo: o efeito transmissivo resulta da conjugação do contrato que ser de base à operação económica com um acto autónomo desse contrato - ex. é a soma do contrato com a inscrição registral que opera a transmissão da propriedade. Em Portugal, o artigo 408º.1 (e o 1317º.1.a) aponta para o sistema do título, isto é, que a transferência de direitos reais sobre coisa determinada se dá por mero efeito do contrato, não sendo esta uma regra imperativa, mas dispositiva, pelo que, é possível estipular que a transmissão da propriedade se dá num momento posterior à celebração do contrato, devendo este artigo ser interpretado em conjunto com o artigo 5º do Código do Registo Predial de forma a se obter o lado externo do direito real. Existem então excepções ao artigo 408º.1 - ex. artigo 687º dita que a hipoteca só se constitui com a inscrição no registo / artigo 669º dita que o penhor só se constitui com a entrega da coisa. - Considerações de Análise Económica O principio da consensualidade, isto é, de que a propriedade se transmite por força da vontade dos homens é um produto do racionalismo jusnaturalista, pois facilita as relações contratuais e numa primeira fase, as transacções económicas. Pode no entanto, trazer custos económicos, pois a sua não publicidade torna as transacções económicas inseguras e enfraquece a posição dos credores, pelo que, quando a titularidade dependa de algo mais que um contrato (ex. entrega ou registo), a certeza é acrescida e os interesses dos credores salvaguardados. João Bernardo Silva 10 de 104

A aquisição a non domino é de tradição francesa e respeita aos bens móveis: valora o peso da entrega da coisa, isto é, A que não é o proprietário de x, vende a B, adquirindo este a sua propriedade pelo peso da publicidade associada à posse, ao domínio da coisa que transparece ao outro a sua posse, logo a ideia de opunibilidade erga omnes, protegendo a tutela da aparência. Em Portugal, protege-se, pelo contrário, o verdadeiro proprietário e não esse princípio de protecção de confiança na aparecia de titularidade. - Compropriedade - Aspectos gerais da Compropriedade (artigos 1403º e ss) É uma situação de titularidade plural de direito de propriedade sobre uma coisa (artigo 1403º), atribuindo-se faculdades sobre a coisa, aos comproprietários no seu todo, mas não sobre partes especificadas da coisa (artigo 1408º - a propriedade é de 100% de todos), sendo os seus direitos qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes, apesar de se presumir que as quotas são qualitativamente iguais (artigo 1403º.2), isto é, não tem o comproprietário direito a uma parcela em avos, mas sim um direito a todo o direito de propriedade, embora esse seja partilhado com mais que um titular. Existem três concepções doutrinárias relativas à natureza jurídica da compropriedade: i. pluralidade de direitos sobre partes iguais (ou intelectuais) sobre o mesmo objecto: Mota Pinto ii. vários direitos sobre o mesmo objecto: Pinto Coelho iii. vários titulares de um único direito, inserindo-se a compropriedade na figura geral da contitularidade ou comunhão de direitos - artigos 1403º.1, 1405º.2 e 1404º: Henrique Mesquita, Rui Pinto Duarte, Pedro Caetano Nunes - a que melhor se conjuga com a letra da lei - Outras situações de contitularidade contitularidade de créditos (artigos 512º e 528º e ss): associada à situação de titularidade plural de um direito de crédito, isto é, de vários credores sobre o mesmo crédito. comunhão conjugal (artigo 1721º e ss): são vários os regimes de comunhão de bens: com destaque para a comunhão de adquiridos onde todos os bens e rendimentos adquiridos pertencem a ambos os cônjuges, mas também quanto às dividas contraídas, envolvendo o outro cônjuge que não as contraiu; a comunhão de bens, onde o património anterior e o simultâneo do casamento é de ambos os cônjuges; e separação de bens, esta sem comunhão. comunhão hereditária (artigos 2079º e ss): é um fenómeno sucessório, pertencendo os bens, em comum, a todos os herdeiros até que os bens sejam-lhes atribuídos, embora o cabeça de casal (artigo 2079º) os administre até à sua liquidação e partilha. comunhão societária: associa-se aos contratos de sociedade onde há bens pertencentes, em contitularidade para com todos os sócios, logo à esfera patrimonial da sociedade, que responde, João Bernardo Silva 11 de 104

em primeiro lugar, pelas dívidas da sociedade e, apenas se insuficientes é que há a responsabilização pessoal e solidária dos bens do património social de cada um dos sócios. baldios: são terrenos possuídos e geridos por comunidades locais (ex. para alimentação de gado ou recolha de lenha), pertencente em contitularidade a toda a comunidade local. A compropriedade é a forma paradigmática da comunhão de direitos, já que a lei não contém regras sobre a contitularidade de direitos em geral, mandando aplicar subsidiariamente as regras sobre compropriedade (artigo 1404º). - Principais aspectos do regime uso da coisa comum (artigo 1406º): permite que os comproprietários regulem, quer por escrito, quer por outra forma, o uso da coisa comum. Na falta de regulação, persistem dois limites: não podem usá-la para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não podem privar os demais comproprietários do uso da coisa. obrigação de comparticipar nas benfeitorias necessárias (artigo 1411º): é a obrigação dos comproprietários em contribuir, na proporção das suas quotas para as despesas das benfeitorias necessárias - aquelas necessárias à conservação da coisa ou fruição da coisa: ex. problemas do telhado (havendo ainda benfeitorias úteis, isto é, aquelas que valorizam a coisa e as benfeitorias voluptuárias - que não são sequer necessárias) administração da coisa comum (artigo 1407º): remete para o artigo 985º relativo às sociedades comerciais pelo que, salvo acordo em contrário, há igual poder de administração para todos os comproprietários e, havendo divergência, é a questão colocada a deliberação, exigindo-se uma maioria de comproprietários e uma maioria de quotas (ex. A - 60%, B - 20% e C - 20%: se B e C votarem a favor não têm metade das quotas, apesar de serem a maioria dos comproprietários). direito à divisão (artigos 1412º e 1413º): é possível convencionar a indiviso, mas só no prazo de 5 anos, devendo essa, se sobre coisa imóvel ser registada (artigo 1412º.2 e.3); não vigorando tal convenção, qualquer comproprietário pode pedir a divisão da coisa, isto é, fazer cessar essa compropriedade e proceder à divisão da coisa - de forma amigável, estando todos de acordo ou processualmente, pelo direito administrativo. O que implica que a compropriedade seja uma situação tendencialmente temporária, o que não acontece com outras formas de contitularidade. alienação da quota na comunhão (artigos 1408º, 1409º e 1410º): o comproprietário não pode alienar toda a coisa (artigo 1408º), mas pode alienar a sua quota em relação à coisa em compropriedade, se o fizer, têm os demais comproprietários um direito legal de preferência (artigo 1408º - direito real de aquisição, logo com carácter erga omnes). João Bernardo Silva 12 de 104

Certos autores dizem que o regime da compropriedade português obedece à matriz da comunhão no Direito Romano sendo uma situação jurídica activa que pode ser divisível, enquanto que outras formas de contitularidade se aproximariam da ideia de comunhão do Direito Germânico, a contitularidade em mão comum, adstrita a um fim comum, permitindo um vinculo pessoal anterior, isto é, um substracto que o fomente Assim, enquanto que a compropriedade e a contitularidade de créditos são situações jurídicas activas isoladas, a comunhão conjugal, hereditária e societária são conjuntos de situações jurídicas activas e passivas afectas a uma finalidade especial. - Defesa da Propriedade (artigo 1311º e ss). acção de reivindicação (artigo 131ºº e ss): esta judicial, em que a finalidade é a obtenção da restituição da coisa (artigo 1311º), exigindo o proprietário o reconhecimento do seu direito de propriedade e a respectiva devolução. Tradicionalmente, entendia-se existir dois pedidos: o de reconhecimento e cumulativamente o de restituição. Hoje, é harmonioso a concepção pela qual, a causa da acção é a restituição, vigorando em Portugal a teoria da especificação, exigindo-se que, na acção de reivindicação, esse prove ser o real proprietário - por via de uma presunção de propriedade ou provando uma aquisição originária. acção directa (artigos 1314º e 336º): o proprietário reage sem a intervenção judicial, embora limitado ao sacrifício de interesses superiores aos que o agente visa realizar ou assegurar" (ex. A impede B de entrar na sua propriedade). outras acções judiciais: podem existir acções meramente declarativas. O artigo 1315º aplica estas normas, com as necessárias adaptações aos direitos reais menores. - Expropriação, confisco, nacionalização e requisição expropriação: tem enquadramento constitucional (artigo 62º CRP), fazendo o seu nº1 uma referência positiva ao direito de propriedade e o nº2, estabelecendo a regra segundo a qual ninguém pode ser expropriado sem a devida ( justa ) compensação (nesse sentido, artigos 1308º e 1310º). Existe um conceito amplo, em que a expropriação é um qualquer modo de privação de um direito patrimonial abarcando: expropriação propriamente dita: um ato administrativo pelo qual o Estado, para a realização de um fim de utilidade pública, extingue um direito sobre um imóvel e simultaneamente constitui (ou modifica), a seu favor ou de outra entidade, um direito de igual conteúdo (ex. estrada construída pela CML: extingue-se o direito de propriedade de A sobre o terreno e constitui-se-lhe a favor da Câmara de Lisboa). João Bernardo Silva 13 de 104

confisco: expropriação em sentido amplo de carácter sancionatório com ausência de compensação - censurando o comportamento do agente nacionalização: expropriação, idealmente determinada por um ato legislativo, sendo a privação do direito sobre uma empresa, ou seja, uma expropriação de empresas (ex. ocorridas durante o PREC) requisição (artigo 1309º): não implica a perda da titularidade do direito real, o que há é uma privação temporária do bem, ponderando o interesse público (ex. A persegue o ladrão com a mota de B). perda em beneficio do Estado por efeitos de condenação penal: há a apreensão de bens em beneficio do Estado no âmbito de sanções penais, prevenindo decisões posteriores que impliquem a sua perda em beneficio do Estado (ex. escândalo BES) - Direito da Propriedade sobre Imóveis O artigo 204º discrimina que coisas são tidas como imóveis. Importam alguns esclarecimentos, nomeadamente quanto à distinção entre: > prédios rústicos: parte deleitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, logo, um edifício sem autonomia económica é rústico. Logo, um terreno para construção é juridicamente um prédio rústico > prédios urbanos: qualquer edifício incorporado no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro, ou seja, um edifício com autonomia económica é um prédio urbano. Conjugando as duas ideias, prédio é a parte delimitada do solo com todas as suas construções. - Direito de Propriedade e Legislação Fiscal A noção de prédio do Código Civil é distinta da dada pela legislação fiscal: > o terreno para construção é considerado prédio urbano > há a referência a prédios mistos, isto é, prédios em que existe parte rústica e urbana sem que uma seja a principal > as caravanas de campismo são prédios urbanos, desde que tenham permanência no solo > a matriz fiscal é um registo de titularidade predial para efeitos de cobrança de impostos - Extensão espacial dos Prédios Na Idade Média entendia-se que o direito do dono do solo tinha como limites o céu e o inferno, mas o espaço aéreo, enquanto tal, não seria susceptível de apropriação, apenas de preenchimento. Existem ainda limites constitucionais ao direito de propriedade (artigo 84º), nomeadamente João Bernardo Silva 14 de 104

quanto ao domínio público aéreo e o domínio público do sub-solo (ex. jazigos minerais), superando o artigo 1344º do Código Civil de inspirado na tradição medieval, segundo o qual, a propriedade abrange o espaço aéreo e o subsolo correspondentes à superfície com tudo o que neles se contém. - Ius Aedificandi O Ius Aedificandi abarca duas faculdades: a de construir e a de praticar os actos jurídicos e operações materiais prévias à construção (ex. obtenção de licenças, actos de alisamento do terreno). O Direito Administrativo limita esta faculdade pela via do ordenamento do território associada ao Direito do Urbanismo - conjunto de regras de direito administrativo que protegem o ordenamento do território e limitam a construção pelos particulares. A doutrina por seu lado divide-se: > as licenças administrativas de construção geram o ius aedificandi (Rogério Soares, Sérvulo Correia, Gomes Canutilho e Vital Moreira, Bacelar Gouveia): o direito de construir (ius aedificandi) não existe por si só, não é um direito natural privado de construir, é sim, constituído pelo direito público, prevalecendo o interesse público. > as licenças administrativas de construção limitam o ius aedificandi (Freitas do Amaral, Marcelo Rebelo de Sousa, Rui Medeiros, João Caupers): o direito de propriedade inclui o direito de construir (ius aedificandi), ainda que limitado pelo Direito Público Rui Pinto Duarte adopta uma posição intermédia, fazendo uma diferenciação tipológica, isto é, faz depender o interesse público ante o direito natural de propriedade das situações típicas (ex. casa num monte no Alentejo ou na Avenida da Liberdade), recusando que se tente tratar todas da situações mesma maneira. - Relações de vizinhança Associa-se às relações de contiguidade e de proximidade (ex. emissão de fumo), não se limitando aos limites físicos dos prédios, mas também às actividades desenvolvidas nestes, pelo que, o direito de propriedade não é ilimitado. Há uma ligação dessas relações com os regimes dos atos emulativos - aquele que não trazem beneficio para o seu autor e que são lesivos para os terceiros - e do abuso de direito - exercício ilegítimo de uma situação jurídica activa que o Ordenamento jurídico intervêm se excessivamente manifestado contrário a 3 cláusulas gerais: a boa fé (imposições éticas aplicadas tipicamente em situações pré-pós e contratuais), os bons costumes (posições éticas mínimas no âmbito das relações judicias entre sujeitos indeterminados) e o fim social e económica do direito. Implicam, as relações de vizinhança a referência ao conceito de relações jurídicas reais (Oliveira Ascensão), quanto a situações jurídicas activas e passivas entre titulares de direitos reais. Importa uma primeira referência às servidões prediais, estas direitos reais de gozo, autónomos que não se cruzam com as relações de vizinhança que são simples limites às relações prediais. João Bernardo Silva 15 de 104

As regras relativas às relações de vizinhança remetem para o caráter tradicional das regras em causa, tendo muitos destas sido superadas por regras de direito administrativo (ex. direito do urbanismo e regras de construção: artigo 1346º foi superado por normas de direito público). É comum neste tipo de litígios recorrer-se aos direitos fundamentais e à sua aplicabilidade directa Gambaro agrupa as formas de regulação das relações de vizinhança em: regras sobre emissões, regras sobre distâncias, regras sobre comunhão e em regras proibitivas de abuso de direito. Vejamos alguns direitos: > direito de demarcação (artigos 1353º e ss): o direito de exigir o concurso dos proprietários de prédios confinantes para a demarcação das suas estremas, assentando na colocação de sinais permanentes - marcos ou outros - das linhas divisórios dos prédios contíguos. Não havendo acordo (artigo 1354º) é esta feita judicialmente ou com outros meios de prova (ex. testemunhas de marco), não se resolvendo é procedida a igual divisão pelas partes. > direito de tapagem (artigos 1356º e ss): é o direito de colocar muros, valas, sebes, de criar uma delimitação física, não obstante os limites previstos (ex. artigo 1357º: quem colocar uma vala tem de deixar espaço entre a sua extrema e a vala). Estabelecem-se presunções de comunhão (artigo 1358º: ex. ao fazer uma vala, não demarcando, presume-se essa comum). > direito de plantação (artigos 1366º e ss): o proprietário tem o direito de plantar árvores e arbustos no seu prédio, mas esse direito é limitado pelas relações de vizinhança, permitindo-se ao dono do prédio vizinho, que arranque ou corte as razões que se introduzam no seu terreno ou os ramos que propenderem nela se não o fizer o outro em 3 dias (artigo 1366º.1). Quanto aos frutos caídos no prédio vizinho, podendo esse colhê-los (artigo 1367º). - Outras situações previstas na lei > emissões (artigo 1346º): associa-se às relações de vizinhança na sua vertente de proximidade a eventuais prejuízos substanciais provocados pelas emissões ou resultantes da utilização anormal do prédio de que emanam. Existindo geralmente um conforto entre o direito à saúde e à integridade física e o interesse público (ex. construção de um hospital). > instalações prejudiciais (artigo 1347º): relaciona-se com obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas havendo uma reacção do Ordenamento Jurídico quando o prejuízo se torne efectivo. Parte da doutrina aceita a aplicação deste artigo quando haja fundado receio de dano. Assim, o principio geral é a sua dependência de aprovação de entidade pública, havendo direito à indemnização pelo prejuízo sofrido do prédio vizinho (nº3). > escavações (artigo 1348º): é um limite à propriedade que visa proteger os prédios vizinhos do apoio necessário para evitar os desmoronamentos ou deslocações de terra, havendo responsabilidade civil objectiva (sem culpa) pelos danos daí resultantes, estes pagos pelo proprietário do imóvel e não pelo autor das obras. João Bernardo Silva 16 de 104

> passagem forçada momentânea (artigo 1349º): não é uma servidão predial, o que há é uma obrigação momentânea de permitir o acesso de terceiros aos prédios se for necessário reparar edifício ou construção, bem como recolher coisas suas que acidentalmente se encontrem no seu prédio. > recepção de águas (artigo 1351º e 1352º): tratam de problemas resultantes da recepção de águas naturais: o artigo 1351º trata de permitir a recepção da água que corre dos prédios superiores, bem como o escoamento de águas; já o 1352º regula as obras defensivas de águas. > restrições à abertura de rasgões ou plataformas (artigo 1360º e 1364º): colidem com o regime do direito administrativo do direito do urbanismo, restringindo a abertura de rasgões e de plataformas em edifícios, em função da proximidade de outro prédio. > servidões de vista (artigo 1362º): reunidos os pressupostos de usucapião (posse e tempo) pode haver uma servidão de vista > paredes e muros (artigo 1370º a 1375º): estabelece a lei um conjunto de regras especiais - de comunhão a compropriedade - quanto a paredes e muros divisórios, havendo uma presunção de compropriedade (artigo 1371º.1). > ruínas de construção (artigo 1350º): limita-se, aos donos dos prédios vizinhos, a legitimidade para exigir aos responsáveis por edifícios ou obras em perigo de ruir a tomada de providências necessárias para eliminar o perigo, sendo este um regime próximo ao artigo 492º relativo à responsabilidade por danos causados por edifício ou outra sobras (só exigível a quem seja civilmente responsável pelos potenciais danos resultantes do edifício ou obra em ruína). - Regime da acessão imobiliária (artigos 1339º e ss) É uma forma de aquisição originária de propriedade, tendo dois requisitos: a incorporação e a diversidade de titulares, podendo esta, quanto à sua forma ser: > natural (artigos 1327º a 1332º) - incorporação por aluvião, formação de ilhas ou mudança de leito (ex. acréscimo de terreno pela força natural das águas) > industrial (artigos 1339º a 1343º) O artigo 1339º trata de obras, sementeiras e plantações com materiais alheios em terreno próprio, adquirindo os materiais usados pelo dono do prédio com o pagamento do seu valor respectivo, além da indemnização a que haja eventualmente lugar. Os artigos 1340º e 1341º, tratam, por sua vez, das obras, sementeiras e plantações com materiais próprios em terreno alheio, distinguido-se pela constância em boa ou má fé, vejamos: 1. boa fé (artigo 1340º): pode o construtor de boa fé adquirir a propriedade do prédio. João Bernardo Silva 17 de 104

A letra do nº1 é perturbadora pois, sendo o valor da obra maior do que o terreno, o autor da construção poderia adquirir o terreno (ex. arrendatário, autorizado pelo dono, constrói algo no terreno de valor superior ao do solo, perdendo o dono do prédio a propriedade), contrariando o principio de que o solo cede à superfície. Pelo que, a jurisprudência e a doutrina são unanimes quanto à necessidade de se interpretar restritivamente este número 1, entendo que, a estatuição prevista se cumpridos os 4 elementos da previsão normativa: construção com materiais próprios, em terreno alheio, estar de boa fé (subjectiva: isto é, o agente desconhecer lesar terceiro, mas também quando deveria conhecer e não conhece) e o valor ser superior ao do terreno é injusta, entendendo a doutrina que as situações descritas não são casos de acessão, mas sim de benfeitorias. Existem 3 posições doutrinárias quanto à interpretação restritiva: i. Manuel de Andrade e Manuel Rodrigues: só haverá acessão se a obra inovadora transformar a substância da coisa (ex. por via da obra inovadora, o prédio rústico passou a ser urbano) ii. Antunes Varela e Pires de Lima: só haverá acessão quando as obras forem feitas por quem não tenha uma relação jurídica anterior com a coisa beneficiada, pelo que, sendo a inovação realizada por quem tenha relação jurídica anterior com o proprietário não é a acessão aplicada (ex. o arrendatário não pode adquiri por acessão, sendo a obra tratada como benfeitoria) - opção seguida maioritariamente pela jurisprudência iii. Rui Pinto Duarte: cumula os dois critérios anteriores: para que a acessão tenha lugar, a obra tem de ser transformada e tem de ser imputável a quem não tenha um determinado título para a realizar. Ainda assim, estas interpretações são contra-legam, não tendo o mínimo apoio na letra da lei, sendo necessário encontrar uma base solida para interpretar restritamente este ponto do artigo 1340º, levantando-se ainda outros problemas: a. o objecto da acessão é todo o prédio ou só o terreno onde a obra tiver sido feita? A letra da lei remete para a adquire a propriedade dele - prédio, mas tem a jurisprudência entendido que só se adquire a parcela do terreno em que a obra tiver sido feita, favorecendo ainda a fragmentação dos prédios b. a aquisição é automática ou depende de declaração negociar por parte do autor da obra? Enquanto Pires de Lima e Antunes Varela sustentam a automaticidade (simples incorporação dá origem à aquisição da propriedade); Oliveira Ascensão e Menezes Cordeira acham ser necessário uma declaração (direito potestativo, exigindo um acto de vontade para a sua incorporação) do autor da obra (jurisprudência). Levanta-se ainda a sub-questão de se saber se existe ou não, algum direito em alternativa da sua aquisição (ex. indemnização). c. o valor a pagar pela aquisição é o valor nominal do imóvel anterior à obra, esse valor actualizado ou o valor actual do imóvel? João Bernardo Silva 18 de 104

Objecto de querela jurisprudêncial, pelo que, existem opções nos diversos sentidos: > no valor do imóvel anterior à obra > no valor do imóvel anterior à obra, mas actualizado: qual o valor há 10 anos e a sua evolução de acordo com o índice do Consumidor (preferida por Rui Pinto Duarte) > no valor actua do imóvel Assim, agindo de boa fé, há que distinguir consoante o valor acrescentado seja maior, igual ou menor que o valor do terreno antes da incorporação: > valor acrescentado menor: pertencem as obras, sementeiras ou plantações ao dono do território, mediante indemnização ao autor da incorporação pelo valor das mesmas (1340º.3) > valor acrescentado maior: pertencem as obras, sementeiras ou plantações ao autor da incorporação, mediante pagamento do valor do terreno anterior às obras (1340º.1) > valor acrescentado igual: haverá licitação entre o dono e o autor da incorporação (1340º.2) 2. má fé (artigo 1341º) Tendo, o dono da obra direito à escolha entre: > ficar com a obra, sementeira ou plantação, pagando um valor calculado de acordo com o enriquecimento sem causa > exigir que a incorporação seja desfeita e que o terreno seja restituído no seu estado anterior O artigo 1342º por seu lado, trata das obras, sementeiras ou plantações feitas com materiais alheios em terreno alheio, cabendo ao dono dos materiais, sementes ou plantações os direitos do artigo 1340º - quer esteja de boa ou má fé -, havendo culpa do dono dos materiais, o seu direito é apenas o de receber o valor dos mesmos segundo as regras da incorporação; Por fim, o artigo 1343º trata dum caso especial em que há um prolongamento do edifício (de boa fé) por terreno alheio, o que, se decorridos 3 meses ou mais sem que o proprietário da parcela em causa ocupado se oponha, o construtor pode adquirir a propriedade da parcela em causa, pagando o respectivo valor e reparando o prejuízo resultante da desvalorização do resto terreno. - Atravessadouros (artigo 1383º e 1384º) e Caminhos públicos Os atravessadouros são uma limitação ao direito de propriedade sobre prédios, esclarecendo o artigo 1383º que, por regra consideram-se abolidos os atravessadouros que não estejam estabelecidos em proveito de prédios determinados, revestindo estes, a natureza de servidões. Há no entanto excepções quanto a essa abolição, no artigo 1384º, nomeadamente quando: > os atravessadouros sejam dirigidos a ponte ou fonte de manifesta utilidade se não existirem vias públicas destinadas à sua utilização e tiverem estes origem imemorial > os atravessadouros regulados em lei especial João Bernardo Silva 19 de 104

> Para parte da doutrina e jurisprudência existe uma outra limitação: os caminhos públicos - definidos em Assento (STJ) enquanto caminhos que, desde tempos imemoriais (que se perde na memória dos homens), estão no uso directo e imediato do público (embora outra parte da jurisprudência sustente que só podem ser todos como públicos os caminhos que sejam coisas públicas ou pertencem a entidades públicas). A definição de caminhos públicos (direito privado) deve ser contraposta à definição de bens do domínio público, isto é, o conjunto de coisa que, pertencendo a uma pessoa colectiva de direito público de população e território a que se encontrem afectadas, a um regime jurídico especial caracterizado pela sua incomercialidade em ordem a preservar a produção dessa utilidade pública (José Pedro Fernandes), isto é, aqueles bens produzidos ou apropriados pelo Estado, autarquia local ou ente público. O Ministério Público seguiu o Acórdão de uniformização de jurisprudência, discordando Rui Pinto Duarte quanto à necessidade de se alargar o conceito de domínio público para sustentar que há caminhos que são publicou apesar de não pertencerem a nenhuma pessoa colectiva de direito público, fazendo a sua analogia com os baldios, isto é, terrenos geridos por comunidades locais, cuja propriedade privada lhes pertence em regime de comunhão - não pertencendo nem ao Estado, nem a privados, sendo coisa comum. - Fraccionamento e emparcelamento de Prédios Rústicos O fraccionamento da propriedade é uma tendência histórica, originando múltiplos terrenos sem a dimensão mínima adequada à sua afectação à exploração agrícola ou florestal o que é prejudicial do ponto de vista económica. Pelo que, tem o Estado vindo a promover a reconfiguração das propriedades, sobretudo por via do emparcelamento, vejamos algumas: > proibição de fraccionamento dos terrenos aptos para cultura em parcelas de área inferior à fixada como superfície mínima (artigos 1376º, 1377º e 1379º) > atribuição aos proprietários de prédios de área inferior à unidade de cultura de direito de preferência na alienação, a quem não seja titular de prédio confinante, de prédios confiantes de área também inferior à unidade de cultura (artigos 1380º e 1381º) - ex. prédio A e prédio B: o A aliena o prédio a C, passando B e C a ser proprietários de terreno (cada um com 0,5 hectare quando a unidade de cultura é de 1hectare, então B tem direito de preferencia ante C, existindo inversão do ónus da prova) > DL 73/2009 relativo à Reserva Agrícola Nacional que prevê que certas zonas do territórios a unidade de cultura seja a tripa da fixada na lei geral - Outras restrições ao direito de propriedade sobre Prédios O direito de Propriedade sofre restrições impostas pelo Direito Público, tendo no seu máximo a expropriação e outras, muito relevantes como as servidões administrativas ou outras restrições administrativas (ex. militares, aqueduto público, linhas eléctricas e telefónicas). João Bernardo Silva 20 de 104