TEMA:Fator acidentário de prevenção e o nexo técnico epidemiológico
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1 1 TEMA:Fator acidentário de prevenção e o nexo técnico epidemiológico AUTORIA: Maria Beatriz Ribeiro Dias 1 RESUMO: O artigo busca analisar o conceito e a aplicação do fator acidentário de prevenção e do nexo técnico epidemiológico dentro do princípio da igualdade. PALAVRAS-CHAVE: acidente, seguro, auxílio, doença, nexo, epidemiológico. Introdução O fator acidentário de prevenção embora previsto na legislação previdenciária desde 2003, com a Lei , apenas no ano de 2009 ganhou a atenção merecida. Isto porque a divulgação do fator acidentário de prevenção apenas ocorreu em setembro de 2009, o que determinou as alterações dos recolhimentos das alíquotas relativas ao seguro acidente do trabalho a partir de janeiro de O fator acidentário de prevenção, sob a ótica do governo, justifica-se no fato de que haverá maior punição dos empregadores que desprestigiam a medicina e a segurança do trabalho e acabam por onerar demasiadamente o Instituto Nacional do Seguro Social em decorrência da incapacidade laborativa de seus empregados. E, por outro lado, as empresas mais responsáveis e comprometidas com o fornecimento do ambiente seguro seriam beneficiadas com a diminuição da alíquota relativa ao seguro acidente do trabalho. No entanto, esta política traz algumas distorções. A principal delas decorre da maneira como foi estruturado o nexo técnico epidemiológico que atinge diretamente a fonte de dados utilizada para o cálculo do fator acidentário de prevenção. Diz-se isso porque o nexo técnico epidemiológico foi determinado com base em estatísticas e não reflete necessariamente a verdadeira relação entre uma doença ocupacional e trabalho desenvolvido. 1 Graduada em Direito pela PUC/SP. Especialista em Direito do Trabalho pela COGEAE (PUC/SP).Pós-graduanda em Direito Previdenciário pela Escola Paulista de Direito. Aluna especial da pós-graduação stricto sensu da USP. Professora Assistente em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho na PUC/SP. Advogada.
2 2 Na prática, a imediata declaração do nexo técnico baseada no mero confronto entre a atividade econômica (CNAE) e o rol de doenças a ela relacionadas (CID) conforme as tabelas contidas nos anexos do Decreto 3.048/1999 repercute negativamente na apuração do fator acidentário de prevenção e, conseqüentemente, aumenta a alíquota relativa ao seguro acidente do trabalho. Diante das imprecisões que norteiam o tema, surgem algumas possibilidades de questionamento acerca da constitucionalidade do nexo técnico epidemiológico que buscaremos esclarecer neste artigo. 1. Fator acidentário de prevenção Para se entender o conceito do fator acidentário de prevenção necessário relembrarmos o conceito do seguro acidente do trabalho. O artigo 1º da Constituição Federal estabelece como um dos princípios do Estado de Direito é o trabalho. O valor social do trabalho é estabelecido sobre pilares estruturados em garantias sociais tais como o direito à saúde, à segurança, à previdência social e ao trabalho. O direito ao trabalho seguro e a obrigação do empregador pelo custeio do seguro de acidente do trabalho com o desenvolvimento histórico passaram a ter proteção constitucional, hoje prevista no artigo 7º, XXVIII 2 A fonte de custeio para a cobertura de eventos advindos dos riscos ambientais do trabalho - acidentes e doenças do trabalho, assim como as aposentadorias especiais - baseia-se na tarifação coletiva das empresas, segundo o enquadramento das atividades preponderantes estabelecido conforme a subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE). As alíquotas aplicáveis, como mencionado acima, estão previstas no artigo 22 da Lei 8.212/1991 que estabelece os índices de 1, 2 e 3% calculados sobre o total das 2 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:xxviii - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
3 3 remunerações pagas aos segurados empregados e trabalhadores avulsos, para o financiamento da aposentadoria especial e dos benefícios A alíquota corresponderá a 1% para as empresas cuja atividade econômica principal seja considerada como de risco leve. Será de 2% para as atividades enquadradas como risco médio e de 3% para aquelas atividades enquadradas como risco grave. Atualmente, é o anexo V do Decreto 3048/1999, com redação dada pelo Decreto 6.957/2009, que atribui às atividades econômicas o respectivo grau de risco. A atividade preponderante de cada empresa, é considerada pelo Decreto 3048/1999 como aquela atividade que ocupa o maior número de segurados empregados e trabalhadores avulsos (artigo 202, 3º), critério questionado pelo contribuinte tendo em vista que não há relação direta entre a proteção concedida e os valores creditados à previdência social. As alíquotas indicadas acima poderão ser majoradas em 12%, 9% ou 6% nos casos em que o segurado efetivar suas atividades em ambiente insalubre, periculoso ou nocivo à saúde, que acarrete na concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos. Este percentual é individualizado e atinge apenas os trabalhadores que desenvolvem suas atividades laborais em ambientes insalubres, periculosos ou nocivos à saúde ou integridade física (artigo 202, 1º, Decreto 3.048/1999). Em 2003, com a Lei , o fator acidentário de prevenção (FAP) foi instituído. O artigo 10 do mencionado diploma legal estabelece que a alíquota para custeio da aposentadoria especial e dos benefícios concedidos em razão da incapacidade laboral decorrente dos riscos ambientais do trabalho poderá ser reduzida em até 50% ou aumentada em até 100%, conforme dispuser regulamento, em razão do desempenho da empresa em sua atividade econômica, baseado na apuração de três vetores: índice de freqüência, gravidade e custo, calculados mediante metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social. Isso representaria a possibilidade de estabelecer a tarifação individual das empresas, flexibilizando o valor das alíquotas: reduzindo-as pela metade ou elevando-as ao dobro.
4 4 Assim, o legislador passou privilegiar as empresas que menos oneravam o sistema de previdência social em razão da incapacidade laborativa dos trabalhadores segurados e a punir aquelas que maior ônus traziam ao sistema. Isso porque, a empresa que demonstrar a melhoria das condições de trabalho, com redução dos agravos à saúde do trabalhador, obtida por meio de investimentos em prevenção, poderão ver reduzida em até 50%, a alíquota relativa ao SAT,enquanto que as empresas mais displicentes, poderão ver a mencionada alíquota majorada em 100%. Pela legislação vigente (Decreto 6.957/2009 que modificou a redação dos parágrafos do artigo 202-A do Decreto 3.042/1999), o FAP consiste num multiplicador variável num intervalo contínuo de cinco décimos (0,5000) a dois inteiros (2,0000), aplicado com quatro casas decimais, considerado o critério de arredondamento na quarta casa decimal, a ser aplicado à respectiva alíquota. Para fins da redução ou majoração da alíquota referente ao SAT, proceder-se-á à discriminação do desempenho da empresa, dentro da respectiva atividade econômica, a partir da criação de um índice composto pelos índices de gravidade, de freqüência e de custo que pondera os respectivos percentis com pesos de cinqüenta por cento, de trinta cinco por cento e de quinze por cento, respectivamente. Para o índice de freqüência, serão considerados os registros de acidentes e doenças do trabalho informados ao INSS por meio de Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) e de benefícios acidentários estabelecidos por nexos técnicos pela perícia médica do INSS, ainda que sem CAT a eles vinculados. Para o índice de gravidade, serão analisados todos os casos de auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, todos de natureza acidentária, aos quais são atribuídos pesos diferentes em razão da gravidade da ocorrência, a) pensão por morte: peso de cinqüenta por cento; b) aposentadoria por invalidez: peso de trinta por cento; e c) auxílio-doença e auxílio-acidente: peso de dez por cento para cada um. Para o índice de custo, serão verificados os valores dos benefícios de natureza acidentária pagos ou devidos pela Previdência Social, apurados da seguinte forma:a) nos casos de auxílio-doença, com base no tempo de afastamento do trabalhador, em meses e fração de mês; e b) nos casos de morte ou de invalidez, parcial ou total, mediante
5 5 projeção da expectativa de sobrevida do segurado, na data de início do benefício, a partir da tábua de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE para toda a população brasileira, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos. Apurados esses dados, anualmente, o Ministério da Previdência Social publicará, no Diário Oficial da União, os róis dos percentis de freqüência, gravidade e custo por Subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas 3 e divulgará na rede mundial de computadores o fator acidentário de prevenção de cada empresa, com as respectivas ordens de freqüência, gravidade, custo e demais elementos que possibilitem a esta verificar o respectivo desempenho dentro da sua CNAE-Subclasse, nos termos do artigo 202-A, 5º, Decreto 3.048/1999. Para o cálculo anual do fator acidentário de prevenção, serão utilizados os dados de janeiro a dezembro de cada ano, até completar o período de dois anos 4, a partir do qual os dados do ano inicial serão substituídos pelos novos dados anuais incorporados. Para a empresa constituída após janeiro de 2007, o fator acidentário de prevenção será calculado a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao que completar dois anos de constituição. Excepcionalmente, no primeiro processamento do fator acidentário de prevenção serão utilizados os dados de abril de 2007 a dezembro de A metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social indicará a sistemática de cálculo e a forma de aplicação de índices e critérios acessórios à composição do índice composto do fator acidentário de prevenção. 5 O resultado do fator acidentário de prevenção poderá ser contestado perante o Departamento de Políticas de Saúde e Segurança Ocupacional do Ministério da Previdência Social no prazo de trinta dias contado da publicação da portaria interministerial 329, de 10 de dezembro de Nesse contexto, analisa Airton Kwitko 6 : Diminuir freqüências de encaminhamento à Previdência Social, ocasião em que benefícios poderão ser concedidos aos empregados, é agora uma necessidade imperiosa 3 Portaria Interministerial 254, de 24 de setembro de O Decreto anterior previa a utilização do período de cinco anos. 5 Atualmente, a metodologia está prevista nas Resoluções do Conselho Nacional de Previdência Social e de 27 de maio de 2009 e 24 de junho de Revista de Previdência Social nº 329, p. 280.
6 6 para empresas. (...) Assim, o FAP não é um tema que deva ficar exclusivamente a cargo de médicos do trabalho e/ou engenheiros de segurança do trabalho. Esse enfoque, incorreto pelo que vimos de ocorrências de benefícios não-acidentários, enquadra a matéria em um aspecto que muitas vezes não é valorizado pelas empresas SST cujos principais problemas ainda existentes na maioria das empresas, dificultam e, em certas circunstâncias, até mesmo inviabilizam a implementação de programas de melhorias. Importante, ainda, destacar que nem sempre o aumento da alíquota do seguro acidente do trabalho representa o correto tratamento do contribuinte. Isto porque há casos em que o valor revertido pela empresa decorrente da contribuição ao seguro acidente do trabalho já é suficiente para custear os gastos do Instituto Social do Seguro Social com os benefícios concedidos aos empregados da mencionada empresa que decorrem da incapacidade laboral e, pela fórmula aplicada para apuração do fator acidentário de prevenção, tais dados não são considerados. Neste contexto, a empresa que já custeia os benefícios concedidos aos seus empregados que decorrem da incapacidade laboral pode ver majorada a sua alíquota ao seguro acidente do trabalho uma vez que para o cálculo do fator acidentário de prevenção apenas são utilizados os índices de freqüência, gravidade e custo. Assim, entendemos que as empresas que, mediante o recolhimento das alíquotas ao seguro acidente do trabalho, comprovem custear os benefícios por incapacidade decorrentes da atividade profissional não podem ver a mencionada alíquota majorada em razão do resultado do fator acidentário de prevenção, sob pena de recolher em duplicidade tributo originado do mesmo fato gerador (custeio dos acidentes de trabalho/ doenças ocupacionais). 2. Nexo técnico epidemiológico A Previdência Social propôs ao Conselho Nacional de Previdência Social CNPS, órgão de natureza quadripartite com representação do Governo, Empresários, Trabalhadores e Associações de Aposentados e Pensionistas, a adoção de um importante mecanismo auxiliar: o nexo técnico epidemiológico previdenciário (NTEP). O nexo técnico epidemiológico previdenciário aponta a existência de relação entre a lesão ou agravo e a atividade desenvolvida pelo trabalhador a partir do
7 7 cruzamento das informações de código da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e do código da Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE). Para fins legais, considera-se agravo a lesão, doença, transtorno de saúde, distúrbio, disfunção ou síndrome de evolução aguda, subaguda ou crônica, de natureza clínica ou subclínica, inclusive morte, independentemente do tempo de latência. Reconhecidos pela perícia médica do INSS a incapacidade para o trabalho e o nexo entre o trabalho e o agravo, serão devidas as prestações acidentárias a que o beneficiário tenha direito. A empresa poderá requerer ao INSS a não aplicação do nexo técnico epidemiológico ao caso concreto mediante a demonstração de inexistência de correspondente nexo entre o trabalho e o agravo, mediante a apresentação de requerimento com as alegações que entender necessárias e apresentação das provas que possuir demonstrando a ausência de nexo entre o trabalho e o agravo - no prazo de quinze dias da data para a entrega da GFIP que registre a movimentação do trabalhador ou o requerimento poderá ser apresentado no prazo de quinze dias da data em que a empresa tomar ciência da decisão da perícia médica do INSS, sob pena de não conhecimento da alegação em instância administrativa. O INSS informará ao segurado sobre a contestação da empresa para que este, querendo, possa impugná-la, obedecendo, quanto à produção de provas, sempre que a instrução do pedido evidenciar a possibilidade de reconhecimento de inexistência do nexo entre o trabalho e o agravo. Da decisão do requerimento da empresa cabe recurso, com efeito suspensivo, por parte da empresa ou, conforme o caso, do segurado ao Conselho de Recursos da Previdência Social. Todo este procedimento está previsto nos artigos 21-A e 22 da Lei 8.213/1991, bem como no artigo 337 do Decreto 3.048/1999 e pode-se verificar que o nexo técnico epidemiológico previdenciário desincumbiu o empregado acometido pela patologia de comprovar a existência de doença em razão da atividade profissional, cabendo à empresa demonstrar a inexistência de nexo causal entre o labor e o agravo. 3. A inconstitucionalidade do nexo epidemiológico
8 8 Pelo exposto acima, verifica-se a relevância direta no nexo técnico epidemiológico no cálculo do fator acidentário de prevenção para a responsabilização das empresas nas hipóteses em que o resultado do cálculo determinar a majoração da alíquota relativa ao seguro acidente do trabalho. Isto porque, aplicando-se o nexo técnico epidemiológico para determinado agravo relacionado à atividade econômica específica na forma dos quadros previstos nos anexos do Decreto 3.048/1999, caracteriza-se a doença como doença profissional ou do trabalho, que para fins previdenciários são equiparadas ao acidente do trabalho e acabam por onerar as empresas quando tais eventos são lançadas na fórmula matemática para apuração fator acidentário de prevenção. Diante da importância do tema e o seu reflexo no ordenamento jurídico, Ação Direta de Inconstitucionalidade para questionamento da matéria foi ajuizada perante o STF (ADI 3.931), ainda pendente de julgamento. Para os autores da ação, os dispositivos legais que tratam da caracterização do acidente do trabalho pela aplicação do nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo violariam o artigo 201, 1º da Constituição Federal e o artigo 7º, XXVIII da Constituição Federal. Isto porque o parágrafo 1º do artigo 201 e o inciso XXVIII do artigo 7º, ambos da Constituição Federal exigem a prova da causalidade entre o agravo e a doença para que o trabalhador possa ter direito à aposentadoria especial, a benefícios do seguro acidente ou a qualquer outra vantagem que decorra do trabalho em situações insalubre ou perigosas. No entanto, os estudos epidemiológicos (que fundamentam o nexo técnico epidemiológico) são dados empíricos da incidência de certas doenças em determinados locais de que fazem uso os serviços de saúde para adotar políticas preventivas, a fim de se evitar a ocorrência da enfermidade. O exame epidemiológico não comprova a exposição do trabalhador ao agente prejudicial à saúde e nem que a doença desenvolvida tenha tido causa nessa suposta exposição.
9 9 Nesse passo, o estudo epidemiológico seria insuficiente para caracterizar a exposição do trabalhador ao risco no trabalho tratado como causador da doença. Assim, os artigos o artigo 21-A da Lei 8.213/1991 e artigo 337 do Decreto 3.048/1999 violariam o artigo 201, 1º da Constituição Federal porque não observam a necessidade de prova do efetivo exercício de atividades em condições insalubres para a obtenção da aposentadoria especial e violariam o artigo 7º, XXVIII da Constituição Federal porque tal mencionado dispositivo legal prevê o custeio, pelo empregador, do seguro por acidente ou doença decorrente de trabalho, e não por acidente ou doença de qualquer outra origem. Ademais, outro fundamento da ação direta de inconstitucionalidade se refere ao fato de que ao se impor à perícia médica o dever de reconhecimento do nexo causal do acidente do trabalho baseado em estudo epidemiológico, o artigo 21-A da Lei 8.213/1991 e artigo 337 do Decreto 3.048/1999 afrontariam a liberdade profissional do médio garantida pelo artigo 5º, XIII, da Constituição Federal. Isso porque se criou uma presunção absoluta de nexo técnico epidemiológico de natureza estatística entre as atividades da empresa e a doença do trabalho ou profissional alegada pelo trabalhador em virtude de vinculá-a a esse critério epidemiológico. Outrossim, o artigo 21-A da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei /2006, prevê que o nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo será divulgado em conformidade com o que dispuser o regulamento. Ao prever que a matéria será regrada por decreto, tal artigo afronta o princípio da separação de poderes e o da legalidade, basilares do ordenamento jurídico brasileiro. Por outro lado, em defesa da aplicação do nexo técnico epidemiológico pesa o seguinte argumento: o nexo técnico epidemiológico estaria em plena consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da Constituição Federal), concretizando os objetivos fundamentais de justiça e solidariedade social (artigos 3º, e 170, caput, da Constituição Federal). Resultaria na preservação dos direitos humanos fundamentais, pois assegura àquele que tiver sido acometido de doença de natureza ocupacional a respectiva
10 10 cobertura previdenciária, atendendo à previsão, entre outros, dos artigos 6º, 7º, XXVIII, e 201 da Constituição Federal. E, não se verificaria, ainda, qualquer violação da liberdade profissional do médico. O artigo 5º, XVIII, da Constituição da República, na realidade, assegura ser livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Jamais se impede que a lei estabeleça e aprimore a sistemática do reconhecimento da natureza ocupacional das doenças. As liberdades devem ser exercidas em conformidade com os limites decorrentes das demais garantias e direitos também assegurados pelo ordenamento jurídico, sabendo-se que o exercício de toda atividade profissional deve respeitar os preceitos e limites legais (artigo 5º, II, da CF). O médico ou a perícia médica poderia deixar de aplicar o nexo técnico epidemiológico quando demonstrada a inexistência do referido nexo (artigo 21-A, 1º, da Lei 8.213/1991). Mas, esta não aplicação do nexo técnico apenas deve ocorrer de modo justificado fundada na efetiva constatação de ausência do mencionado nexo entre o trabalho e o agravo. O nexo técnico epidemiológico apenas geraria presunção relativa da natureza ocupacional da doença, quando presentes os requisitos previstos em lei. Demonstrada a inexistência de nexo causal ente o trabalho e o agravo, a doença não será considerada ocupacional, afastando qualquer alegação de que o nexo técnico epidemiológico acarretaria a natureza acidentária de doenças que assim não o são. Cabe reiterar que o nexo técnico epidemiológico apenas é uma modalidade de nexo causal entre o trabalho e o agravo, para fins de verificação da natureza ocupacional da enfermidade (podendo haver demonstração em sentido contrário pelo interessado), tendo em vista a atividade exercida pela empresa, o que remonta justamente às condições de trabalho do empregado, pois esse labor é desempenhado no âmbito da empresa e de sua atividade.
11 11 Não haveria, portanto, qualquer proibição ou vedação constitucional de que a lei passe a adotar, além do tradicional nexo etiológico, a sistemática fundada em conhecimentos científicos de epidemiologia, para a devida caracterização das doenças ocupacionais, ainda mais por prever e assegurar o direito de demonstração em contrário no caso em concreto. Portanto, a aplicação do nexo técnico epidemiológico é tema delicado que apenas será resolvido com o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade nº 3.931/ Caberá ao Supremo Tribunal Federal resolver os aspectos expostos acima. Conclusão O fator acidentário de prevenção (FAP) foi medida utilizada pelo Governo Federal para estimular a adoção de medidas preventivas no meio ambiente do trabalho que pudessem reduzir o número de incapacidade laborativa convertida em benefícios custeados pela União (INSS). Isto porque com a aplicação da fórmula matemática aprovada pelo Conselho Nacional da Previdência Social, utilizando-se o índice de freqüência, gravidade e custo de cada empresa, considerada a especificidade da sua atividade econômica principal, o fator acidentário de prevenção poderá implicar na majoração de até 100% da alíquota relativa ao seguro acidente do trabalho (SAT) alíquota equivalente 1%,2% ou 3% a depender do grau de risco da atividade empresarial - ou na sua redução em 50%. Diante da representatividade da contribuição ao seguro acidente do trabalho no orçamento de uma empresa, investimentos relativos à impugnação do fator acidentário de prevenção, de seus critérios, base de cálculos, período de apuração ou fonte de dados, bem como ao acompanhamento da saúde de empregados, de seus afastamentos e da manutenção de um meio ambiente do trabalho seguro e sadio deverão aumentar, garantindo-se a capacidade competitiva das empresas no mercado. A intenção do legislador seria louvável, pois viria para auxiliar o trabalhador na caracterização da doença ocupacional, entidade mórbida de difícil constatação, ante a resistência do empregador negligente, que lamentavelmente é uma grande maioria e de peritos tendenciosos, que por vezes, força o trabalhador a retornar ao labor e ele não podendo continuar a exercer sua função, pois, considerado inapto pela empresa,
12 12 permanecendo em uma situação de fragilidade, sem a guarida do Estado ou do empregador. No entanto, com o atual regime legal, o empregador é punido sem que se tenha a efetiva comprovação de sua responsabilidade pela doença caracterizada estatisticamente como doença ocupacional, o que viola o artigo 5º, LIV da Constituição Federal. Desse modo, não restam dúvidas acerca do intuito arrecadatório da União ao instituir o fator acidentário de prevenção e o nexo técnico epidemiológico, tendo em vista que a sistemática atualmente aplicável não estimula as boas empresas a investir em segurança e higiene do trabalho, pois não importa o quanto tenham investido em prevenção de acidentes do trabalho, terão o mesmo tratamento das outras empresas de sua categoria econômica. Ressalte-se, ainda, a possibilidade de cobrança do contribuinte quanto aos valores gastos em benefícios decorrentes da incapacidade gerada pelo trabalho. A perícia médica do INSS, quando constatar indícios de culpa ou dolo por parte do empregador, em relação aos benefícios por incapacidade concedidos, deverá oficiar à Procuradoria Federal Especializada, subsidiando-a com evidências e demais meios de prova colhidos, notadamente quanto aos programas de gerenciamento de riscos ocupacionais, para as providências cabíveis, inclusive para ajuizamento de ação regressiva contra os responsáveis, de modo a possibilitar o ressarcimento à Previdência Social do pagamento de benefícios por morte ou por incapacidade, permanente ou temporária. Apenas após a garantida da arrecadação, a preocupação da União será instruir e fomentar as empresas a criar e a manter as políticas de prevenção de acidentes do trabalho, garantindo-se condições equânimes para a competitividade entre as empresa no mercado. ABSTRACT: The article explores the concept and application of factor accident prevention and technical epidemiological link within the principle of equality. KEYWORDS: Accident insurance, aid, disease, link, epidemiology. Referências bibliográficas
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