Aumentar a Procura Qualificar a Oferta

Transcrição

1 Telmo Correia, Ministro do Turismo Aumentar a Procura Qualificar a Oferta Texto de: Paulo Brehm

2 Portugal pode aspirar ao top ten mundial das receitas turísticas e o peso do Turismo no PIB nacional, num prazo de 10 anos, poderá atingir 16%. Estas são convicções do Ministro do Turismo, que está determinado a implementar uma estratégia que perdure para além da legislatura. Dois meses após a tomada de posse, apesar de todas as incertezas quanto aos recursos de que vai dispor, os principais objectivos de Telmo Correia estão definidos: Aumentar a procura e qualificar a oferta. Em que medida é que a criação do Ministério do Turismo é mesmo uma mais-valia para o sector? Estou convencido que sim. O Turismo ganhou um duplo assento no Governo. Nas reuniões de Secretários de Estado e em Conselho de Ministros. Além disso, quando se discutem questões, por exemplo, entre Turismo e Transportes, a representação no Governo em pé de igualdade permite uma articulação mais eficaz. Qual a mais valia de a SET estar sedeada no Algarve? O Governo entende que a deslocalização é boa para o País e eu estou de acordo. Achamos que permite uma maior proximidade com as populações. Em Lisboa está o Ministério, está o ministro, porque as sedes das principais entidades do Turismo, dos principais grupos do sector e dos outros Ministérios estão em Lisboa. Nesta lógica de deslocalização, ficámos com duas hipóteses para a Secretaria de Estado, o Algarve ou a Madeira, dada a sua importância. Mas a Madeira seria pouco funcional e não faz sentido, até porque já é regionalizada. A escolha óbvia é, assim, o Algarve. E quais serão as competências do SET? Na sequência da Lei Orgânica será feita a delegação de competências e o Secretário de Estado, apesar de baseado em Faro, terá também uma intervenção a nível nacional. Tenho defendido que as principais regiões turísticas do País têm de ter uma atenção particular. Existe um plano de desenvolvimento turístico do Vale do Douro, há, em fase embrionária, um plano para o Alqueva, a Madeira tem o seu próprio planeamento regional e acho que devemos também trabalhar para o desenvolvimento turístico de Lisboa e do Algarve. Nesse sentido, uma das coisas que decidi é que o acompanhamento do Algarve seja feito pelo Secretário de Estado, com a vantagem de aí estar baseado. Não receia assim uma secundarização dos outros destinos? Não vamos secundarizar região nenhuma. As prioridades até 2006 Aumento e diversificação da procura e qualificação da oferta Definição de Regime Jurídico das Áreas de Protecção Turística Revisão do Regime de Licenciamento de Empreendimentos Turísticos Aumento da Formação, lançamento de cinco novas escolas Certificação das profissões Sensibilização da Opinião Pública Planos de Desenvolvimento Turístico de âmbito regional Mecanismos de apoio a projectos turísticos que resultem na recuperação do património Lançamento de novas Rotas de Turismo Desenvolvimento de conselhos próprios para sectores ou nichos de turismo Revisão do Regime Jurídico aplicável ao Jogo Lei Quadro das Regiões de Turismo Campanha de Turismo Interno Captação e manutenção de eventos Criação de evento para promoção do sector de Congressos e Incentivos Realização, no Outono, de encontro com empresários para se preparar o próximo ano turístico No âmbito das competências nacionais que cada um vai ter, vamos estar sempre que possível em todas as regiões. Já pedi ao Secretário Regional de Turismo da Madeira uma reunião, uma visita e um levantamento da situação. Tive já uma reunião de trabalho com o Presidente da Câmara da Covilhã sobre a realidade do Turismo de Montanha e a evolução da Serra da Estrela como destino turístico, que eu acho que pode ter um plano específico. E obviamente também tenciono ir às outras regiões. Mas temos alguns problemas no Algarve e na Madeira e portanto têm de ter uma atenção especial. Neste novo modelo a rede externa da promoção turística vai ficar com uma tripla tutela? A área da promoção externa tem forçosamente uma tripla tutela. A ideia é aproveitar as potencialidades da diplomacia económica, juntá-las ao ITP e à capacidade e experiência do ICEP. Há muito que defendo o modelo que está a ser implementado agora, que separa a promoção turística da promoção global de Portugal. Vender Turismo e a imagem turística não é a mesma coisa que vender cortiça, sapatos ou têxteis. Essa é a ideia. Mas temos que resolver a questão do ITP que, pelo seu actual regime jurídico, não tem rede externa. É uma matéria que equacionaremos quando fizermos a alteração desse regime. Até lá é preciso assegurar que o ITP tenha capacidade de intervenção, e nesse sentido está a ser feito um protocolo que permitirá o destacamento dos funcionários do ICEP mais ligados à promoção do Turismo, assim como a utilização da rede externa do ICEP. Em termos práticos como vai funcionar? Não posso ainda especificar como vai ser. O que é fundamental assegurar é que o ITP não fique, por assim dizer, de pés e mãos atados nos vários mercados por não dispor dos funcionários das delegações da rede externa que trabalham no Turismo. Mas trata-se de uma matéria que está em aberto, porque há mercados onde acho que faz mais sentido contratualizar com agências locais do que ter uma representação fixa pesada, e outros que admito precisarão de ser reforçados. E qual o papel da diplomacia económica? O conceito é explorar ao máximo as poten- Revista APAVT Nº12 Setembro

3 o ITP tem feito, e que vou pedir reforce, é a promoção de Portugal junto das nossas comunidades, que geram um tipo de turismo que temos de atrair. E essa é uma área onde, por exemplo, o MNE tem uma importante experiência. Foi criada uma equipa de missão para a atracção de equipas de cinema... Defendo muito a relação entre Turismo e Cultura. Por exemplo, Faro Capital da Cultura é uma oportunidade fantástica, até para afirmar que o Algarve não é só Sol e Praia. Quanto a essa equipa de missão, o objectivo Que outras equipas de missão estão na calha? Não posso já anunciar todas, mas uma das ideias que há para avançar brevemente, com o Ministério da Ciência e Ensino Superior, é a criação de uma comissão que faça uma supervisão, como acontece na Saúde, de todo o ensino superior na área do Turismo. Temos que saber se precisamos de mais profissionais nesta ou naquela área, se os curricula devem ter mais ou menos incidência num determinado tema, se temos mais carências numa ou noutra área. Outra iniciativa importante, que não precisa de um protocolo, mas é de grande benefício para este sector, é a articulação com o Ambiente, que é decisiva para sabermos como é que vamos qualificar o Turismo, o que passa também e necessariamente pelo ordenamento e planeamento. Este modelo se calhar não é o ideal, mas temos de partir da realidade actual. Um modelo possível é o ITP ter a sua própria rede externa, mas essa será uma solução a prazo cialidades das nossas Embaixadas e representações diplomáticas. O Embaixador António Monteiro não quer de forma alguma deixar cair esse conceito. Antes pelo contrário, quer procurar a melhor forma de o pôr em funcionamento. É uma matéria que teremos ainda de trabalhar. Durante anos ouvimos que as Embaixadas têm apenas uma representação institucional, cultural e política, que estão divorciadas da realidade económica. É necessário que passem a ser um elemento de ajuda da intervenção económica. Que sejam uma força de apoio à promoção, à captação de investimento e ao investimento português. Estabelecer os canais, e pô-los a funcionar em conjugação com o ITP é fundamental. Mas não receia que três tutelas compliquem os processos? Este modelo se calhar não é o ideal, mas temos de partir da realidade actual. Um modelo possível é o ITP ter a sua própria rede externa, mas essa será uma solução a prazo, que se poderá ir desenvolvendo progressivamente. Qualquer solução ideal que eu possa desenhar a régua e esquadro neste gabinete não nos resolve a promoção de E aliás, ainda nem sequer temos este sistema a funcionar completamente. Vamos pô-lo a funcionar, e depois avaliá-lo. Acresce a isto tudo o trabalho das Embaixadas, e nestas isso é uma questão de cultura. Uma das coisas que 18 é que elabore um plano estratégico para atrairmos produções cinematográficas. É um processo que o ITP lidera, como entidade promotora, e onde participam também o ICEP e o ICAM. O nosso propósito não é criarmos estúdios de Hollywood, até porque hoje em dia as equipas utilizam pré estúdios e depois vão para os grandes estúdios fazer a montagem final. Mas se for necessário e valer a pena, será de equacionar. Não tenho uma visão miserabilista. Temos de investir na imagem. Quanto à Formação, qual o grande objectivo? O ensino das profissões do Turismo. Obviamente precisamos de quadros superiores, mas também é preciso centrar a formação na componente das profissões empregados de mesa, cozinheiros, barman. Outro objectivo é a certificação dessas profissões. Nesse sentido já estamos a fazer um estudo, em colaboração com as organizações empresariais do sector, que não anula o desenvolvimento dum plano estratégico no INFTUR. Quando entramos hoje num restaurante, encontramos uma mão-de-obra volátil e que não é portuguesa. Essas pessoas têm de ter algum tipo de formação e algum tipo de certificação. Não acho possível, nem viável, obrigá- -las. Mas se houver uma certificação e forem as próprias pessoas a aderir, teremos dado um grande passo. Revista APAVT Nº12 Setembro 2004

4 Essa certificação vai passar pelas estruturas associativas empresariais? Necessariamente. A rede de escolas de turismo e de hotelaria sob a tutela deste Ministério vai aumentar. O nosso objectivo, talvez fazendo algumas alterações ao plano anterior, é termos mais cinco escolas claramente em desenvolvimento ou, pelo menos, próximas a funcionar até 2006, no prazo deste mandato. Mas não é só com essas escolas que chegaremos a toda a gente. Teremos de utilizar a capacidade empresarial para conseguir fazer essa articulação e essa certificação das profissões. exemplo, como poderemos atrair mais low cost ou como é que poderemos coordenar esforços nos mercados em que estamos a perder. O que entende necessário mudar na gestão aeroportuária? Uma das questões que temos de abordar seriamente, na lógica de desenvolvimento do nosso Turismo, é como chegar a novos mercados e conseguir alguma diversificação. Isto não passa só pelo transporte aéreo, mas em larga medida pela sua capacitação. Sei que seremos ouvidos e tenho Quero uma colaboração muito activa do sector, e sobretudo da APAVT, no sentido de sabermos como é que em Portugal poderemos fomentar as low cost. Esse é o objectivo central. Ainda não foi desta que o Transporte Aéreo e a gestão aeroportuária ficam na tutela do Turismo... Entre 30 países europeus, o modelo da integração do transporte aéreo no Turismo só existe em dois, e nenhum deles é referência turística. O que é necessário é articulação e influência, e essa questão já foi abordada entre mim e o Ministro das Obras Públicas. O compromisso que temos é que, na definição de tudo quanto forem linhas estratégicas, existirão reuniões de coordenação entre ambos, envolvendo inclusivamente os principais responsáveis do sector. Havendo organismos de coordenação estratégica, como para a realidade aeroportuária, é importante que nesses organismos o Turismo passe a ter uma voz para apontar o caminho do seu ponto de vista. Por essa garantia da parte do Ministro dos Transportes. O transporte aéreo é um negócio e tem de ser visto como tal. Tenho uma leitura positiva do que foi feito na TAP que, com as opções que fez, mesmo em contra-ciclo, conseguiu bons resultados pós 11 de Setembro. Na questão aeroportuária, o que é preciso é sermos ouvidos na definição do desenvolvimento estratégico global. Quero uma colaboração muito activa do sector, e sobretudo da APAVT, no sentido de sabermos como é que em Portugal poderemos fomentar as low cost. Esse é o objectivo central. Se chegarmos à conclusão que em Portugal há capacidade aeroportuária não completamente explorada, que nos permita no futuro utilizar um segundo aeroporto para esse segmento, considero que é de perspectivá-lo. E quanto ao aeroporto de Lisboa, há condições para alargar? Esse é um dos argumentos favoráveis à Ota. Um aeroporto feito agora, de raiz, com parâmetros dos nossos dias, que não sofreu não sei quantas adaptações, terá certamente maior e melhor capacidade do que Lisboa. Com esse investimento programado a prazo, acho que os contribuintes dificilmente compreenderiam investimentos ilimitados em Lisboa. O que penso ser de destacar é que os números que temos são recorde, designadamente durante o Euro 2004, e a capacidade de resposta dos nossos aeroportos foi extremamente positiva. Quem conhece aeroportos por esse mundo fora, sendo certo que é mais confortável ter mangas, sabe que, globalmente, e comparando com destinos bem populares, os nossos têm parâmetros muito bons. Qualidade ou quantidade? Qual o top ten que pretende para Portugal? Acho que o ponto de partida nos permite pensar que podermos chegar ao top ten em termos de receitas. Este é o modelo de desenvolvimento que pretendemos para o nosso Turismo, com a acção mais orientada para a receita do que para o número de visitantes. Não quero a continuação da massificação, o nosso objectivo deve ser a receita e isso passa essencialmente pela qualificação da oferta. Mas o aumento do número de turistas Revista APAVT Nº12 Setembro

5 também se deve continuar a perseguir. Queremos um Turismo de qualidade, mas não podemos querer só turistas que venham para os cinco estrelas. Subscreve o actual modelo de contratualização? O conceito da contratualização é bom, porque envolve os principais interessados, quem melhor conhece e sabe vender. Felizmente o Turismo é um sector onde o Estado não é um player principal e que se rege por critérios de mercado. É cedo para dar a este modelo uma medalha de mérito turístico ou para o condenar. Teremos de fazer essa avaliação. Houve inúmeras mudanças, há regiões que já tinham experiência anterior, como é o caso de Lisboa, há outras que vão avançar e outras ainda que têm mais atrasos. Temos de avaliar. 20 Vai estar presente no congresso da APAVT este ano? Vou com certeza e com todo o gosto. É para mim uma participação muito especial, uma vez que as primeiras intervenções públicas que efectuei sobre turismo foram nestes encontros, nomeadamente no congresso de Cuba. Tenho bem a noção de que estas reuniões magnas são um grande fórum de debate e discussão do Turismo português, não só pelo número de participantes, como, principalmente, pela qualidade dos debates realizados. Este ano há regiões que não vão atingir os objectivos. Quem se vai responsabilizar? Eu não tenho temperamento para me desresponsabilizar. Mas também tenho alguma dificuldade em ser responsável por um modelo que não criei. Acho que nem eu nem ninguém tem neste momento responsabilidade sobre estes resultados, porque a quebra resulta de factores conjunturais. Há uma situação económica difícil, e nestas situações as famílias mais facilmente cortam nas suas férias do que na alimentação ou despesas escolares. Por outro lado, Portugal tem uma dependência grande dos mercados do Reino Unido e da Alemanha. Ora, no primeiro caso a relação entre a Libra e o Euro foi desfavorável ao nosso turismo e favoreceu destinos concorrentes, fora do espaço Euro, que ficaram mais competitivos. Além disso, temos questões de ordem estrutural no Algarve, que têm de ser revistas. O desenvolvimento do modelo de resort e do turismo de qualidade é essencial nesta região. Nas zonas urbanas onde houve crescimento excessivo há que requalificar. Não falo em destruição, mas tem de haver requalificação. O Sol e Praia já não basta? O modelo Sol e Praia não é o que está a crescer mais, mas ainda está em crescimento. Tem é que ter qualidade. Em tudo, seja a nível de qualidade de vida, saúde, redes viárias, etc, e portanto os planos de desenvolvimento têm que passar pela articulação com outros Ministérios. Se calhar no Algarve faz uma grande diferença ter um bom hospital. Faro Capital da Cultura é também muito importante. O acréscimo de eventos durante o período alto ou a exploração do conceito golfe, mesmo na época mais baixa, fazem todo o sentido. Nas questões da estrutura, investimentos culturais, reabilitação urbana e criação de zonas verdes não vamos ter resultados em 2004 ou 2005, mas na sinalética assumo o compromisso de apresentar resultados já nesta legislatura. A estatística para o sector está já atrasada... É uma matéria que vem do PDT, que está protocolada com o Banco de Portugal, o INE e, em segunda leitura, com a Universidade do Algarve. O que tenho pedido é uma avaliação desse desenvolvimento. Há alguns atrasos, que já vinham de trás, do ponto de vista informático, mas quero que até final do ano haja resultados e não apenas números brutos. É fundamental sabermos tendências, perfis e outros dados dos que nos visitam. Para quando o Portal de Turismo? O portal é uma das medidas prioritárias. Sofreu também alguns atrasos, mas está incluído nas prioridades estratégicas de desenvolvimento e o prazo limite é Fevereiro. O que não quer dizer que não esteja pronto antes. É cedo para dar a este modelo (contratualização) uma medalha de mérito turístico ou para o condenar Defende uma estratégia de marketing mais virada para o consumidor? Consumidor e trade. As duas coisas têm de ser feitas simultaneamente, porque quando falamos em capacidade de actuação nos mercados tradicionais e em procura de novos mercados, não a podemos dirigir exclusivamente ao consumidor ou ao grande público. Quero fazer com as instituições e associações do sector uma leitura desta questão, do trabalho a desenvolver nos mercados tradicionais e das possibilidades de conquista de mercados emergentes, seja a Leste, na Escandinávia, ou na China. Sem prejuízo do trabalho de concepção global que está a ser desenvolvido, no Outono gostaria de fazer um debate que possa ajudar a direccioná-la, actualizá-la e encontrar formas de a potenciar. Revista APAVT Nº12 Setembro 2004