ASSUNTO: NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA ESTABELECIDA ENTRE O IPASGO E SEUS USUÁRIOS
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- Ângelo Marroquim Camilo
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1 1 Acolho a informação. Publiquese na internet. Após, arquive-se. Ago/2009. assinado no original marcelo celestino promotor de justiça coordenador do caodc INFORMAÇÃO TÉCNICO-JURÍDICA nº 003/2009 ASSUNTO: NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA ESTABELECIDA ENTRE O IPASGO E SEUS USUÁRIOS A presente informação técnica versa sobre a natureza da relação jurídica estabelecida entre o plano de saúde IPASGO-SAÚDE e seus usuários, de forma a sanar as dúvidas que podem eventualmente surgir no exercício da função ministerial, inclusive, obstando eventuais conflitos de atribuições. 1- Da configuração da relação de consumo Em que pese a eventual existência de entendimento minoritário diverso, a relação jurídica existente entre o IPASGO-SAÚDE e os usuários de seus serviços apresenta claro aspecto consumerista, como veremos adiante. Para que se constitua uma relação de consumo é necessária a observância de três requisitos dispostos na Lei 8.078/90, quais sejam: o consumidor, o fornecedor de produtos e serviços e vínculo de sujeição ligando-os.
2 2 O artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor define consumidor como toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Destinatário final é aquele que usufrui do bem ou serviço até a sua exaustão, encerrando o processo econômico que permeia o consumo. Assim, se o bem ou serviço é adquirido para ingressar em outra cadeia produtiva, o adquirente não pode ser tido como consumidor, pois o Código de Defesa do Consumidor elegeu a caráter econômico ou a teoria finalista 1 para o conceito de consumidor. Neste diapasão, conclui-se que os usuários do IPASGO- SAÚDE subsumem-se perfeitamente ao conceito de consumidores, haja vista que os serviços médicos e correlatos prestados não ingressam em nova cadeia produtiva, exaurindo a cadeia econômica na condição de seus destinatários finais. Fornecedor, por seu turno, é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. Logo, conclui-se que o alcance do conceito de fornecedor independe da natureza jurídica do seu exercente. Não havendo exclusão alguma do tipo de pessoa jurídica, já que o CDC é genérico e busca atingir todo e qualquer modelo. São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quotas de responsabilidade 1 FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual dos Direitos do Consumidor.São Paulo: Atlas, Pág. 31
3 3 limitada, as associações civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta etc. 2 O ponto fulcral do conceito de fornecedor, portanto, fixa-se na atividade por ele desenvolvida e não na natureza da sua constituição. Em resumo: fornecedor é quem, na relação de consumo, se dedica a atividade de prover o mercado, sendo responsável pelo fornecimento do produto ou pela prestação do serviço ao consumidor (destinatário final), 3 ou seja, a produção de bens e serviço deve ser habitual, afastando do seu conceito o exercício eventual de tais atividades. O IPASGO-SAÚDE, por sua vez, subsume-se ao conceito de fornecedor, pois de forma habitual provê o mercado de serviços securitários de saúde, sendo prescindível qualquer discussão sobre a sua condição de autarquia estadual, haja vista restar incluído no elenco de fornecedores do Código do Consumidor as pessoas jurídicas públicas. Por fim, para que se estabeleça a relação de consumo é necessária a conformação de um vínculo de sujeição que una consumidor e fornecedor, configurado pela vulnerabilidade apresentada por aquele que, ante a impossibilidade de controle sobre a produção ou prestação de serviços, seja por incapacidade tecnológica ou econômica, termina por submeter-se às condições do fornecedor. Este requisito, por sua vez, não merece maiores digressões, em virtude da indubitável vulnerabilidade apresentada pelos usuários 2 Idem, pag PRUX, Oscar Ivan, O conceito de fornecedor nas relações de consumo. Disponível em < Acessado em 01º de julho de 2009.
4 4 dos seguros saúde, tanto por incapacidade técnica como econômica, não apresentando condições de confronto que afaste o vínculo de sujeição às condições impostas pelo fornecedor, in casu, IPASGO-SAÚDE. Frise-se, por oportuno, que os serviços securitários são remunerados, perfazendo uma perfeita adequação ao disposto no artigo 3º, 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Desta feita, resta plenamente configurada a relação de consumo que une o seguro saúde IPASGO SAÚDE e seus usuários, sendo, por conseguinte, regida pelo código consumerista. Tal entendimento é corroborado primeiramente pela manifestação do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Consumidor proferida na Análise da Lei Estadual nº , de 26 de fevereiro de 2002, anexa a esta informação, que demonstra o posicionamento daquele órgão auxiliar no sentido da configuração da relação de consumo entre o IPASGO-SAÚDE e seus usuários, conforme sucinta transcrição que se segue: De qualquer modo, tem-se que a desvinculação do sistema previdenciário com relação ao de assistência à saúde, nota-se que o IPASGO SAÚDE passa a gerar relação de consumo entre o instituto e seus segurados. Isso porque temos de um lado o fornecedor IPASGO de outro os consumidores SERVIDORES E DEPENDENTES/AGREGADOS tendo por objeto um SERVIÇO (assistência à saúde).
5 5 Desta feita, entendendo tal relação como de CONSUMO, conclue-se pela plena aplicação do Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº8.078, de ). Idêntico raciocínio foi desenvolvido nos autos da ação civil pública nº , onde é discutida a legalidade do sistema de cotas imposto pelo IPASGO SAÚDE. Surgem como signatários da petição inicial os promotores Goiamilton Antônio Machado, Murilo de Morais e Miranda, titulares, respectivamente, da 70ª e 12ª Promotorias de Justiça que, nos ternos da RESOLUÇÃO n. 014/2007 CPJ, têm como atribuição a atuação em defesa e proteção ao consumidor, em casos de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos; e Ivana Farina Navarrete Pena e Isaac Benchimol Ferreira, à época do ajuizamento, titulares, respectivamente, das 88ª e 82ª Promotorias de Justiça que, nos ternos da mesma resolução, têm como atribuição a atuação plena na Cidadania, incluindo as questões referentes à defesa do direito à saúde e consectários. Do excerto da petição inicial que inaugurou a referida Ação Civil Pública, abaixo transcrito, percebe-se o alinhamento doutrinário apresentado pelos Órgãos Ministeriais supra citados com as razões expedidas nesta informação, corroborando o entendimento que o IPASGO SAÚDE submete-se às normas consumeristas: Partindo de tais premissas, é hora de enfrentarmos o ponto capital deste tópico: a relação jurídica existente entre o
6 6 IPASGO SAÚDE e seus segurados, deve ser considerada como uma relação de consumo? Certamente que sim. Vejamos os motivos. Os segurados enquadram-se perfeitamente no conceito de consumidor previsto no art. 2 do CDC, uma vez que são pessoas físicas que adquirem, em proveito próprio ou de sua família, um serviço de plano de saúde colocado a sua disposição no mercado de consumo. O IPASGO SAÚDE também se encaixa no conceito de fornecedor. Isso porque é uma pessoa jurídica de direito público, que habitualmente presta um serviço de plano de saúde, mediante contribuição mensal dos segurados facultativos. Por fim, o serviço de plano de saúde oferecido pelo IPASGO também sujeita-se ao regramento do CDC, pois é uma atividade profissional fornecida no mercado mediante remuneração. Registra-se que a própria lei traz os serviços securitários - o que inclui seguros de vida, de propriedade e seguros de saúde, pois não há qualquer razão para diferenciá-los, como um dos exemplos de serviços que se submetem ao CDC. De acordo com o entendimento unânime da doutrina, a remuneração a que se refere o parágrafo 2, do art. 3, acima transcrito, pode ser direta ou indireta,
7 7 isto é, abrange aquela situação onde há um efetivo repasse de valores (= remuneração direta), e também aquela onde não há esse repasse, porém, seu custo está embutido em outros produtos ou serviços, pagos pelo próprio ou até outros consumidores (= remuneração indireta). Na relação entre IPASGO SAÚDE e segurados, há uma remuneração direta, vale dizer, mensalmente os consumidores pagam àquela autarquia uma quantia percentual ou determinada, fixada na tabela, além da coparticipação. 2- Titulares, dependentes e agregados Exauridas as considerações a respeito da natureza consumerista das relações firmadas entre o IPASGO SAÚDE e seus titulares, merecem ser tecidas algumas digressões a respeito dos dependentes e agregados. São considerados consumidores tantos os titulares do seguro saúde, como os dependentes e os considerados agregados, não havendo elementos legais que autorizem qualquer interpretação divergente. O mero fato de, em regra, os dependentes/agregados não participarem direta ou pessoalmente da contratação, bastando a mera indicação pelo titular, não afasta a sua condição de consumidores, pois integram a categoria de terceiros beneficiários, seguindo a sua relação jurídica com o fornecedor a sorte da relação principal, qual seja, relação de consumo.
8 8 3- Das atribuições ministeriais Dirimidas as dúvidas a respeito da natureza da relação jurídica existente entre o IPASGO SAÚDE e seus usuários, passemos a algumas considerações referente às questões relacionadas ao exercício das atribuições pelos órgãos ministeriais. O cerne da questão que se descortina gravita em torno de qual órgão ministerial apresenta atribuição para atuar em causas que tratem de planos de saúde, neles incluídos o IPASGO SAÚDE. A defesa do direito à saúde é, em regra, atribuída às Promotorias afetas à proteção da cidadania, podendo levar à equivocada conclusão de que a elas teria sido conferida, igualmente, atribuição para os feitos relacionados aos planos de saúde. Contudo, esta não é a melhor exegese. Quando vinculado ao exercício da cidadania, o direito à saúde não apresenta caracteres contratuais, ao contrário, estabelece-se com direito público subjetivo, dotado de universalidade, integralidade e isonomia. O princípio constitucional da universalidade nas políticas públicas de saúde requer que a prestação de serviço público de saúde alcance a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país (artigo 5º, caput da CF/88), titulares de direitos fundamentais sociais, dentre os quais se insere o direito à saúde (artigo 6º). (...) Objetiva chamar a atenção para a compreensão da integralidade tanto como evitar-se uma atitude
9 9 médica fragmentada diante dos pacientes, como a coordenação dos diversos serviços médicos, assistenciais e sociais, sem esquecer da organização administrativa e da cooperação entre as diversas esferas de ação governamental envolvidas no desenvolvimento do sistema único de saúde. 4 Quanto à isonomia, O objetivo principal é minimizar as desigualdades. Significa tratar desigualmente os desiguais proporcionando um maior investimento onde a carência é maior. Todo cidadão é igual perante o Sistema Único de Saúde, e o mesmo será atendido conforme as suas necessidades. Com base nesse princípio o SUS tem por objetivo orientar as políticas de saúde de forma satisfatória a toda população. 5 Por outro lado, quando o particular prefere não submeter-se ao serviço público de saúde, mas opta por contratar seguro saúde afasta as questões a ele referentes e passa a submeter-se às prescrições do Código de Defesa do Consumidor, por não estar regido por estes caracteres. Neste contexto, caberá às Promotorias afetas à cidadania a defesa do direito à saúde quando este for um reflexo daquela, ou seja, manejado contra o Estado na condição de direito público subjetivo e regido pelos primados que lhe são próprios - universalidade, integralidade e isonomia, previsto no artigo 196 da Constituição Federal. De outro turno, uma vez transfigurado o direito, ora em comento, não mais em direito público subjetivo, mas em relação jurídica contratual, de natureza consumerista, não há proteção ao direito à saúde a ser exercida pelo Ministério, mas sim proteção ao consumidor, nos casos de 4 RIOS, Roger Raupp.DIREITO À SAÚDE, UNIVERSALIDADE, INTEGRALIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS: PRINCÍPIOS E REQUISITOS EM DEMANDAS JUDICIAIS POR MEDICAMENTOS. < %20sanitrio/Direito sade_universalidade_integralidade.doc> Acesso em 22 de julho de REVISTA ÂMBITO JURÍDICO, A saúde pública e o Direito Constitucional brasileiro, em < > Acesso em 22 de julho de 2009.
10 10 interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, atribuição conferida às Promotorias especializadas na matéria, atualmente, na capital as, 12ª e 70ª Promotorias. CONSIDERAÇÕES FINAIS Rememorando os argumentos anteriormente dispendidos, conclui-se que a relação jurídica estabelecida entre o seguro saúde IPASGO SAÚDE e seus usuários titulares, dependentes e agregados tem natureza consumerista, regendo-se pelo Código de Defesa do Consumidor, em que pese a condição de autarquia estadual ostentada pelo fornecedor do serviço securitário. Como consectário lógico desta conclusão tem-se que a atribuição ministerial para atuar nas causas, seja como autor ou interveniente, em que a pretensão verse sobre IPASGO SAÚDE, bem como a qualquer outro ente público ou privado, na condição de fornecedor de serviços securitários é atribuída aos Órgãos Ministeriais com atribuição especializada em direito do consumidor. Às Promotorias especializadas na cidadania, portanto, ficam reservadas as demandas que envolvam a defesa do direito à saúde quando manejado contra o Estado na condição de direito público subjetivo, regido pelos primados que lhe são próprios - universalidade, integralidade e isonomia, previsto no artigo 196 da Constituição Federal, em regra, no que pertine ao Sistema Único de Saúde. Era o que tinha para informar. assinado no original Lucianna Fernanda de Castro Barbosa Técnica Jurídica CAOCIDADÃO
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