1. Introdução. 1 Foi aprovada, no 37º Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em Brasília/DF, no período de
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- Júlio César Miranda Fartaria
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1 1. Introdução O presente trabalho A supervisão de estágio e o processo de trabalho do assistente social corresponde à sistematização dos resultados obtidos na pesquisa que buscou investigar o processo de trabalho do assistente social supervisor na contemporaneidade e seus reflexos na organização e na condução do estágio e da supervisão, bem como suas implicações para a efetivação do Projeto Ético- Político da profissão. Assim, sua centralidade está na reflexão sobre o trabalho do assistente social, em um contexto de transformações no mundo do trabalho, e a configuração da supervisão nesse processo, no qual se considera que o estágio e a supervisão vêm sofrendo os mesmos impactos advindos das mudanças no mundo do trabalho, da mesma forma que a profissão. Para tanto, busquei analisar a situação do estágio e da supervisão no curso de Serviço Social na atualidade, com o objetivo de conhecer e de problematizar suas conseqüências para os alunos estagiários, já que, no processo de formação profissional dos cursos de Serviço Social, a efetivação do estágio e da supervisão atravessam desafios que vêm tentando ser superados com a implementação da Política Nacional de Estágio da ABEPSS 1 e da resolução CFESS Nº O campo empírico escolhido para a realização da pesquisa foram as instituições registradas como campo de estágio do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), no primeiro semestre de 2009 (2009.1). Na escolha desse lócus de estudo, levou-se em consideração a sua localização na cidade do Rio de Janeiro, que tem um conjunto de 23 cursos de Serviço Social 3 ; a sua condição de primeiro curso de 1 Foi aprovada, no 37º Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em Brasília/DF, no período de 25 a 28 de setembro de 2008 a Política Nacional de Estágio, proposta pela ABEPSS Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social, e que ainda encontra-se em processo de construção. Visa subsidiar as Unidades de Ensino na implementação da Resolução CFESS Nº 533, de 29 de setembro de 2008, sobre a regulamentação da supervisão direta de estágio em Serviço Social. 2 Resolução que regulamenta a supervisão direta de estágio no Serviço Social. O documento, publicado no Diário Oficial da União do dia 1 de outubro de 2008, foi aprovado durante o último Encontro Nacional CFESS/CRESS, realizado em Brasília em setembro de Informação obtida no site da ABEPSS: (acesso em 02/12/2009). Contudo, de acordo com a listagem obtida junto à secretaria do CRESS (Conselho Regional de Serviço Social) 7ª região RJ, no dia 27 de abril de 2009, o Rio de Janeiro possui 15 unidades de ensino de Serviço Social.
2 15 Serviço Social do Rio de Janeiro e segundo do Brasil; a sua filiação a ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social); bem como o fato de já ter realizado pesquisa em outra universidade, com tema semelhante 4. Nesse sentido, foi realizado contato com a coordenação de estágio do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio para conhecer a sua política de estágio, as instituições campos de estágio e, ainda, como se dá a sua relação com os supervisores dos alunos estagiários, visando verificar se as ações realizadas vêm contribuindo para que os desafios sejam superados, no sentido de reverter problemas referentes à organização do estágio e da supervisão nesses espaços 5. Ao abordar a temática supervisão de estágio, foi levada em consideração a própria trajetória da profissão, que tem o seu exercício como atividade privativa do assistente social, problema fundamental para compreender como se configurou e como se configura a formação profissional do assistente social e, conseqüentemente, as questões enfrentadas pelos cursos de Serviço Social no decorrer desse processo, uma vez que, sem estágio e sem supervisão, não há formação de assistentes sociais. Assim, conhecer e refletir sobre as formas de enfrentamento dos desafios postos para os cursos de Serviço Social, no que se refere à efetivação da supervisão nas instituições campo de estágio e na implementação da nova legislação e resolução sobre estágio pela categoria profissional e, em particular, conhecer como a supervisão se insere no processo de trabalho dos assistentes sociais supervisores constituem os elementos norteadores desse estudo. Por essas razões, e com o objetivo de verificar como os supervisores das instituições campo de estágio vêm tratando a mediação entre teoria e prática, foi necessário observar se a supervisão vem se operacionalizando de acordo com as diretrizes curriculares. Para tanto, foi realizada uma pesquisa de campo junto aos supervisores das instituições campo de estágio dos alunos estagiários do curso de Serviço Social da PUC-Rio, no período , num total de trinta e cinco (35) supervisores. No entanto, por conta do tempo previsto para a sistematização dos 4 Estudo realizado em 2007, para trabalho de conclusão de curso em Serviço Social, cujo foco analítico centrou-se nos supervisores de campo das instituições campo de estágio conveniadas com a Escola de Serviço Social da UNIGRANRIO (Universidade do Grande Rio), no segundo semestre de Cabe ressaltar que nesse período (2009.1) a coordenação de estágio do curso de Serviço Social da PUC-Rio passava por mudança de coordenador(a).
3 16 dados e para a entrega da presente dissertação e, ainda, da disponibilidade dos supervisores para participarem da pesquisa, foi selecionada uma amostra de oito (8) supervisores. Tal amostra se baseou no perfil das instituições campo de estágio e nas políticas sociais lá desenvolvidas, contemplando tanto instituições públicas, como privadas. Tais critérios visaram dotar a amostra de heterogeneidade, com o objetivo de conhecer melhor o universo no qual está inserido o objeto da pesquisa. Neste estudo, leva-se em conta que o Serviço Social, no Brasil, teve o seu reconhecimento e legitimidade atrelado às instituições públicas e privadas, diante da intervenção do Estado e da sociedade civil frente à questão social 6. Sendo assim, não se pode pensar o assistente social como profissional independente das instituições públicas e privadas nas quais a sua prática se realiza. Aborda-se o questionamento sobre a contradição existente acerca da regulamentação do Serviço Social como profissão liberal 7 e da afirmação de que é uma profissão inserida na divisão social e técnica do trabalho mas que não possui um processo de trabalho próprio. Por essa razão, torna-se necessário buscar reflexões que possam explicar o Serviço Social como trabalho, bem como a configuração do seu processo de trabalho na contemporaneidade. Desse modo, os estudos realizados por Braverman (1977) podem ser considerados uma fonte de inspiração, ao trazer a discussão da influência de Taylor na gerência capitalista 8, com a distinção entre trabalho manual e intelectual e as novas relações de produção a partir da relação entre trabalho produtivo e improdutivo, em conseqüência da grande diversificação da classe trabalhadora na fase do capitalismo monopolista. Partindo da concepção de Marx (2006), de que o trabalho é atividade que só pode ser realizada pelo homem, em razão da sua capacidade teleológica, pois essa atividade pressupõe um planejamento, que não se dá de maneira imediata e instintiva, podemos refletir sobre a própria atuação do Serviço Social que também pressupõe um planejamento, que se pauta em conhecimentos específicos sobre a realidade, na qual a sua ação profissional incide. Assim, percebe-se que o que 6 A profissão se consolida, então, como parte integrante do aparato estatal e de empresas privadas, e o profissional como um assalariado a serviço da mesma (Iamamoto, 2003, p.79). 7 A portaria 35, de 19/04/1949, do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio enquadra o Serviço Social no 14º grupo de profissões liberais (Iamamoto, 2003, p. 80). 8 Taylor ocupava-se dos fundamentos da organização dos processos de trabalho e do controle sobre ele (Braverman, 1977).
4 17 distingue a força de trabalho humana não é sua capacidade de produzir um excedente, mas seu caráter inteligente e proposital (Braverman, 1977). A força de trabalho é uma propriedade humana, mas que, no capitalismo, é mercadoria vendida ao capitalista, que possui os meios de produção. É, portanto, nas suas condições de venda que se inicia o processo de trabalho. Braverman (op. cit.) expõe que o processo de trabalho se dá a partir da inserção dos trabalhadores na divisão social do trabalho 9. Portanto, para analisar o processo de trabalho do assistente social, deve-se primeiramente separar o seu trabalho da produção de mercadorias e os elementos que o constituem, pois, embora o capital se paute no trabalho parcelado para a produção de mercadoria, em sua conclusão só é visualizado o trabalho concreto, e a força de trabalho fica abstrata nesse processo produtivo 10. A partir da análise da categoria trabalho em Marx (2006) e dos sentidos do trabalho no presente e das relações entre capital-trabalho (Antunes, 2000) 11, percebe-se a relevância que o trabalho tem no desenvolvimento socioeconômico da sociedade. O trabalho vem sofrendo mutações em decorrência do progresso científico-tecnológico e, além disso, há quem defenda que está em decadência ou em desaparecimento. Antunes (op.cit.) nos leva a uma reflexão crítica sobre a suposta tese do fim da classe-que-vive-do-trabalho mediante o desemprego estrutural, que tem atingido um grande número de trabalhadores, inclusive nos países mais ricos, além da crescente exploração na era da qualidade total Para Braverman (1977, p.71-72) a divisão social do trabalho é uma característica inerente ao trabalho humano tão logo ele se converte em trabalho social, isto é, é executado na sociedade e através dela. 10 Neste ponto de discussão, cabe refletir sobre o propósito do capitalismo que é o seu processo de obtenção de lucro, mediante a exploração da força de trabalho, cujo foco não é a produção de mercadoria, mas sim de mais-valia. Esta se constitui, a partir do próprio processo de alienação que se encontra a classe trabalhadora, o que acaba por desconsiderar a sua ampla participação no processo de desenvolvimento econômico e social, uma vez que a sua força de trabalho é vista enquanto mercadoria. 11 Antunes (op.cit.) traz a discussão sobre a interação crescente entre trabalho e conhecimento científico e da complexificação que o trabalho social vem tendo na contemporaneidade, que além de combinado é ainda mais intensificado, uma vez que a sociedade capitalista necessita cada vez mais de trabalho estável e cada vez mais das diversificadas formas de trabalho parcial, terceirizado, no qual fica evidente a ampliação do trabalho morto e a redução do trabalho vivo. 12 Estamos nos referindo aqui à qualidade nos processos produtivos, no qual quanto mais qualidade os produtos tiverem, menor deve ser o seu tempo de duração, cujo objetivo para o capital é aumentar a velocidade do circuito produtivo e ampliar a velocidade da produção de valores de troca.
5 18 Além disso, Antunes (op.cit.) traz uma concepção ampliada sobre a classe trabalhadora, considerando-a como constituída por todos aqueles que vendem a sua força de trabalho em troca de salário e são desprovidos de meios de produção: proletariado industrial e rural, os trabalhadores terceirizados, subcontratados, temporários, os assalariados do setor de serviços, além dos desempregados, excluindo somente os gestores do capital e os que vivem de juros e da especulação. Sendo assim, parti da compreensão das formas de constituição da classe trabalhadora no capitalismo e suas transformações na atualidade para entender a relação do trabalho do assistente social com o desenvolvimento do capitalismo, visto que a mais-valia não é extraída apenas do plano material do trabalho, mas também do imaterial 13. Uma das propostas deste estudo centra-se nas mudanças que ocorrem no mundo do trabalho na atualidade. Isso, de certa forma, demanda uma reflexão sobre os fatores determinantes do trabalho do assistente social, que tem como foco de intervenção as expressões da questão social, bem como sobre a sua condição de trabalhador assalariado. O que há de novo em relação ao trabalho do assistente social atualmente? 14 No que se refere ao seu foco de intervenção, esse continua o mesmo, ou seja, as expressões da questão social esta considerada fruto da contradição entre capital e trabalho. No entanto, a atuação do assistente social vem atravessando novas formas de enfrentamento, mediante a redução do Estado e, conseqüentemente, dos serviços públicos, que se reflete no aumento da inserção desse profissional nos novos espaços considerados como terceiro setor 15, oriundos da transferência da parte do papel do Estado para a sociedade civil. 13 A reflexão centra-se aqui na discussão de Antunes (2000, p. 128), que considera que trabalho material e imaterial, na imbricação crescente que existe entre ambos, encontram-se centralmente subordinados à lógica da produção de mercadorias e de capital. 14 Minha atenção esteve focada nas novas diretrizes curriculares da década de 1990 e no Código de Ética de O conceito de terceiro setor é muito abrangente e difuso e não é objeto de discussão deste trabalho. Para efeito de situar meu entendimento sobre o tema, apresento alguns elementos que podem ajudar na sua compreensão. Fernandes (2000), por exemplo, define o Terceiro Setor como "composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental, dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia, do mecenato e expandindo o seu sentido para outros domínios, graças, sobretudo, à incorporação do conceito de cidadania e de suas múltiplas manifestações na sociedade civil" (p.50-51). Contudo, o termo tem sido utilizado com freqüência crescente e por mais que se
6 19 Com o avanço do ideário neoliberal 16, na década de 1990, no Brasil, houve, além dos reflexos da reestruturação do capital na organização e nas condições de trabalho, uma reestruturação também nas políticas sociais, que passaram a se pautar na perspectiva da solidariedade, da focalização e da seletividade, da refilantropização da questão social, redução dos gastos sociais, descentralização e mercantilização dos bens sociais 17. Tais ajustes promoveram o desmonte dos direitos sociais, tão duramente conquistados no Brasil e plasmados na Constituição Federal de O ajuste do Estado à nova ordem capitalista internacional trouxe efeitos danosos à classe trabalhadora, tais como o aprofundamento do desemprego estrutural, a perda salarial, o retrocesso da luta sindical, a dificuldade de organizar-se politicamente, o aumento do trabalho informal e o conseqüente agravamento da pobreza. Tal ajuste veio trazendo o desmonte de parte das conquistas sociais obtidas com a Constituição Federal de 1988, causando impactos na implementação das políticas sociais. De acordo com alguns estudiosos 19, essa reforma do Estado, ainda em curso, vem sendo delineada pela tenha cuidado na sua utilização, não há como negar a evidência social, econômica e política que esse setor tem alcançado no cenário nacional e internacional. Tem se constituído em terreno fértil para a atuação de profissionais das ciências humanas e sociais, dentre os quais têm se destacado os administradores, que têm transferido para as instituições não-governamentais, de assistência social, educação, saúde, lazer, cultura, dentre outras, conhecimentos e técnicas de gestão pautadas na lógica empresarial. Diversos autores que vêm tratando esse conceito partem da explicação inicial de que a sociedade atual está estruturada a partir de três grandes setores: o Estado (primeiro setor), o Mercado (segundo setor) e Organizações da Sociedade Civil, sem finalidade de lucro, com atuação de interesse público (terceiro setor). Sendo assim, o Estado atuaria na esfera pública estatal, o mercado na esfera privada e o terceiro setor na esfera pública não estatal. Entretanto, a realidade social não se configura de forma fragmentada, dividida em três setores, como se fossem fenômenos isolados entre si. Dessa forma, enfatizamos que não podemos desconsiderar que esta realidade precisa ser compreendida em sua totalidade social. Isto é, o político, o econômico e o social articulam-se indissociavelmente. Portanto, ao pontuarmos esses três setores de forma separada é tão somente para fins didáticos, pois eles, na realidade, estão profundamente interligados, compondo uma realidade social dialética e em constante processo de mudança. 16 Sua concepção partiu do economista norte americano John Williamson, no Consenso de Washington, em novembro de 1989, se tornando política oficial do Fundo Monetário Internacional em Política definida como integrante de um movimento de ajuste global, que se desenvolve num contexto de globalização financeira e produtiva, visando obter o apoio político e econômico dos governos centrais e dos organismos internacionais. 17 Yasbek discute esta questão no seguinte artigo: A Política Social Brasileira nos anos 90: Refilantropização da Questão Social. Cadernos ABONG, out Entende-se por política social as formas de intervenção e regulamentação do Estado nas expressões da questão social, envolvendo o poder de pressão e a mobilização dos movimentos sociais, com perspectivas de problematizar as demandas e necessidades dos cidadãos, para que ganhem visibilidade e reconhecimento público (Pereira, 2004). 19 Refiro-me especificamente a Elaine Rosseti Behring (2003).
7 20 tensão entre as conquistas constitucionais asseguradas pelo forte movimento social da redemocratização e a contra-reforma neoliberal. Diante do exposto, percebe-se que a recomposição do sistema capitalista, em andamento desde a década de 1970 e, no caso do Brasil, mais especificamente desde os anos de 1990, trouxe mudanças nas relações sociais, ou seja, as mudanças vão muito além da esfera produtiva e da gestão do trabalho. Assim, tendo como marco inicial a particularidade da profissão e considerando os avanços e amadurecimento obtidos pela categoria, cujo Projeto Ético-Político requer do profissional uma intervenção sistemática, que busque respostas para além das questões imediatas que se expressam na prática profissional 20, acredito que a compreensão do seu processo de trabalho exige que se considere, em sua análise, tais questões. Contudo, parto do entendimento e da compreensão do assistente social como um profissional assalariado, inserido na divisão social do trabalho, que vende a sua força de trabalho. Desse ponto de vista, percebe-se que o assistente social também vem sofrendo impactos semelhantes aos que são enfrentados pela população usuária dos serviços sociais onde desenvolve sua ação. Tais impactos se refletem tanto nas suas condições de trabalho como nos instrumentais necessários para o atendimento e a efetivação do seu compromisso ético-político profissional 21. Considero, portanto, que as mudanças que vêm ocorrendo no mundo do trabalho são vivenciadas duplamente pelo assistente social que, sob este prisma, enquadra-se como trabalhador, devendo ser possuidor das qualidades de empregabilidade exigida pelo mercado. Por outro lado, esse mesmo profissional, no exercício da sua profissão, como prestador de serviços sociais, estará recebendo no seu local de trabalho, nas diversas áreas de atuação do Serviço 20 Encontra-se aqui a importância da instrumentalidade no processo de trabalho do assistente social. A instrumentalidade não se restringe aos instrumentos necessários para o agir profissional do assistente social, ela é uma propriedade e/ou capacidade que a profissão vai adquirindo na medida em que concretiza objetivos. Ela possibilita que os profissionais objetivem sua intencionalidade em respostas profissionais. É por meio desta capacidade, adquirida no exercício profissional, que os assistentes sociais modificam, transformam, alteram as condições objetivas e subjetivas e as relações interpessoais e sociais existentes num determinado nível da realidade social: no nível do cotidiano (Guerra, 2002). 21 Projeto este que se iniciou na década de 1970, foi amplamente discutido na década de 1990 e ainda se encontra em construção, em meio à tensão provocada pelo ideário neoliberal e pela reação conservadora existente no seio da profissão, nesse contexto.
8 21 Social, essa nova leva de usuários pertencentes à classe-que-vive-do-trabalho (Antunes, 2000), mas que não encontram espaço para a sua ocupação profissional, tendo em vista o desemprego estrutural e a precarização das relações de trabalho presentes em nossa sociedade. Os problemas advindos e aprofundados com esta realidade são recorrentes nos diversos espaços de trabalho do assistente social. Um dos fatores que mostram o amadurecimento das reflexões sobre o Serviço Social tem como referência o atual debate acerca da relação entre trabalho e a prática profissional. Essa é uma discussão que surgiu no interior da profissão, com o processo de reforma do currículo de seus cursos universitários, na década de 1990, e com a implementação da nova diretriz curricular, em Assim, pensar o Serviço Social como trabalho implica delimitar sua peculiaridade e, portanto, definir sua identidade, na relação com o sistema produtivo. Para tanto, cabe situá-lo como profissão inserida na divisão social do trabalho, abordar a caracterização da sua prática anterior ao Projeto Ético-Político profissional, observando aspectos de sua continuidade e ruptura. Por essas razões, considerar a supervisão de estágio como parte do processo de trabalho do assistente social trouxe a necessidade de verificar qual o entendimento que os profissionais possuem acerca da temática processo de trabalho e supervisão, tanto no que tange ao espaço acadêmico como nos espaços onde se realiza a prática do Serviço Social. Essa postura se expressa na presente pesquisa, que tomou como base o relato dos assistentes sociais supervisores das instituições campo de estágio do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio, bem como o estudo do Projeto Político Pedagógico do curso de Serviço Social da referida unidade acadêmica. Com base nisso, parto do entendimento que para pensar a supervisão de estágio como parte do processo de trabalho do assistente social é necessário, antes, verificar como o Serviço Social se insere na instituição campo de estágio. Como está organizado o seu processo de trabalho? Como a supervisão de estágio se introduz neste espaço profissional e no processo de trabalho do assistente social? Tais inquietações pautam-se no pressuposto de que as mudanças ocorridas no mundo do trabalho vêm trazendo diversos desafios para o exercício da profissão. Diante disso, pressupõe-se, também, que, de uma forma geral, a
9 22 supervisão vem sofrendo os mesmos reflexos que a profissão, diante das mudanças ocorridas no mundo do trabalho na atualidade. Sendo assim, acredito que o principal desafio para o assistente social, nessa nova configuração da realidade, consiste em se apresentar como uma profissão qualificada para contribuir com respostas às questões imediatas que se apresentam, mas que, ao mesmo tempo, não perca o seu caráter propositivo, a sua visão crítica, no sentido de romper com o imediatismo, estabelecendo ações consistentes com base em princípios éticos que tenham como perspectiva a defesa dos direitos sociais e a promoção da cidadania. Partindo desse princípio, se faz necessária uma formação profissional consistente, que busque articular o processo de ensino-aprendizagem com os princípios norteadores do Código de Ética profissional de 1993 e das Diretrizes Curriculares da ABEPSS de 1996 e de Para tanto, é necessário repensar suas referências tradicionais, que estavam condicionadas somente ao ensino da prática, ao saber fazer da profissão, tomando como base as referidas diretrizes curriculares que trazem, justamente, a consolidação do rompimento com a formação profissional tradicional, mediante a consolidação da articulação entre teoria e prática, para responder aos novos desafios. Esses têm sua origem condicionada às políticas de corte neoliberal, especialmente na década de 1990, no que se refere ao Brasil, quando o mesmo passa a vivenciar a privatização dos principais serviços sociais antes subsidiados pelo Estado. Além das razões já expostas, a opção pelo estudo da supervisão de estágio nas referidas instituições de campo de estágio, deve-se aos questionamentos dos relatos de profissionais 23 que expressavam dificuldades em visualizar a supervisão como parte do seu processo de trabalho, encontrando-se aí uma das expressões do seu caráter contraditório, antes referido, uma vez que a supervisão de estágio em Serviço Social é atribuição privativa do assistente social. Somou-se a esses 22 A diretriz curricular de 1999 da ABEPSS (Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social) vem complementando o direcionamento dado para formação profissional do assistente social pela diretriz curricular de Esta demarca o perfil profissional, as competências e habilidades, os princípios da formação profissional, a nova lógica curricular com os tópicos de estudo, aspectos sobre o estágio supervisionado e o trabalho de conclusão de curso (TCC), as atividades complementares e a duração do curso. 23 Estes foram ouvidos no decorrer da minha formação profissional. Especificamente, no momento de procura de campo estágio, realizado tanto por mim como pelas (os) alunas (os) que se encontravam no mesmo processo de formação profissional, no período de a
10 23 questionamentos a pesquisa que realizei em 2007, com a mesma temática, para o trabalho de conclusão de curso em Serviço Social, cujo foco analítico centrou-se nos supervisores de campo das instituições de estágio conveniadas, no segundo semestre de 2006, com a Escola de Serviço Social da Unigranrio (Universidade do Grande Rio). Daquela pesquisa cabe destacar algumas questões: a dicotomia entre teoria e prática no fazer profissional dos assistentes sociais, as dificuldades para o exercício da supervisão de estágio dentro do campo institucional, a partir da utilização do estagiário como mão-de-obra barata e do não entendimento do empregador sobre as atribuições do Serviço Social frente ao estágio e à supervisão. Além disso, outra motivação encontra-se na pouca produção bibliográfica acerca da temática supervisão de estágio na trajetória da profissão, bem como na escassez de literatura que a trate como parte do processo de trabalho do assistente social 24. As razões apresentadas me levaram a optar pelo estudo sobre a supervisão de estágio em Serviço Social e suas implicações para o Projeto Ético-Político da profissão, tendo como eixo de análise o processo de trabalho dos assistentes sociais na contemporaneidade. Para a condução do estudo, que se deu no sentido de analisar a supervisão de estágio como parte do processo de trabalho do assistente social na contemporaneidade, levando em conta as transformações que vêm ocorrendo no mundo do trabalho e os impactos que estas vêm trazendo para a profissão, tanto no sentido da sua atuação como na sua formação profissional, a minha atenção esteve voltada para a compreensão desses processos e suas implicações para a efetivação do estágio e da supervisão nos moldes defendidos pelas diretrizes curriculares da ABEPSS e pelo Projeto Ético-Político da profissão. Assim, realizei revisão de literatura sobre o tema, algo que já havia iniciado no meu projeto de dissertação de mestrado. Nessa fase, procurei consolidar as aproximações com as categorias analíticas principais, como a de 24 Na pesquisa bibliográfica realizada encontrei Necilda de Moura Santana (mestre em Serviço Social pela PUC-Rio) e Alzira Maria Baptista Lewgoy (doutora em Serviço Social pela PUC-Rs) que trazem na em seus estudos a discussão da supervisão de estágio inserida no processo de trabalho do assistente social.
11 24 trabalho, processos de trabalho 25, Serviço Social, supervisão de estágio e formação profissional. No que se refere à temática processos de trabalho, essa atividade envolveu a leitura de autores que se baseiam em Marx, como os estudos de Harry Braverman, David Harvey, Ricardo Antunes, dentre outros. Já para a temática supervisão, utilizei autores como Balbina Ottoni Vieira, referência histórica sobre o assunto e Marta Buriolla, com sua discussão contemporânea acerca da supervisão de estágio, bem como a recente obra de Alzira Baptista Lewgoy sobre os desafios para a formação e o exercício profissional no processo atinente à supervisão de estágio em Serviço Social. Outros autores do Serviço Social que vêm abordando o tema trabalho e processo de trabalho, como Ney Luiz Teixeira de Almeida, Ana Elizabete da Mota e Marilda Villela Iamamoto também foram (re)visitados neste processo. Dando prosseguimento a essa etapa investigativa, foi realizado o levantamento de material empírico, algo que já havia sido iniciado na fase de construção do projeto. Primeiramente entrei em contato telefônico com os supervisores, para verificar a viabilidade e aceitação em participar da pesquisa e marcar a data e horário para a realização das entrevistas. Além disso, foram realizados estudos sobre o Projeto Pedagógico do curso de Serviço Social da PUC-Rio (Anexo II), para conhecer a sua política de estágio, como vem trabalhando com as diretrizes curriculares da ABEPSS de 1996 e 1999, e com a nova Política Nacional de Estágio da ABEPSS, bem como com a Resolução CFESS Nº 533 e da Política Nacional de Estágio (Lei de 2008) Considero processos de trabalho a partir da referência de Iamamoto (2005 p ). Dessa forma, o compreendi como uma matéria-prima ou objeto sobre o qual incide a ação do sujeito, ou seja, o próprio trabalho que requer meios ou instrumentos de trabalho que potenciam a ação do sujeito sobre o objeto. É a própria atividade, ou seja, o trabalho direcionado a um fim, que resulta em um produto. 26 Existem diferenças básicas entre a Política Nacional de Estágio (Lei de 2008) e a Política Nacional de Estágio da ABEPSS. Na primeira, em seu artigo 2º, o estágio poderá ser obrigatório ou não-obrigatório, conforme determinação das diretrizes curriculares da etapa, modalidade e área de ensino e do projeto pedagógico do curso. O estágio obrigatório é aqui definido como tal no projeto do curso, cuja carga horária é requisito para aprovação e obtenção de diploma. Já o estágio não-obrigatório é aquele desenvolvido como atividade opcional, acrescida à carga horária regular e obrigatória. Isso se contradiz com os princípios da Política de Estágio da ABEPSS, uma vez que defende o estágio como uma atividade curricular obrigatória, que deve se configura a partir da inserção do aluno no espaço sócio-institucional para capacitá-lo para o exercício do trabalho profissional, o que pressupõe supervisão sistemática. Esta supervisão deverá ser feita pelo professor supervisor e pelo profissional assistente social do campo de estágio, através da reflexão, acompanhamento e sistematização com base em planos de estágio, elaborados em conjunto entre unidade de ensino e unidade campo de estágio, tendo como referência a Lei 8662/93 (Lei de
12 25 De acordo com os objetivos propostos nesta pesquisa, busquei conhecer a política de estágio do curso de Serviço Social da PUC-Rio; traçar o perfil dos supervisores de estágio das unidades campo de estágio da PUC-Rio; verificar como os supervisores de estágio das referidas instituições vêm tratando a mediação teoria e prática e, neste contexto, observar se a supervisão vem se operacionalizando de acordo com as diretrizes curriculares. Ademais, e de acordo com a proposta deste estudo, identificar o entendimento acerca da temática processo de trabalho e supervisão pelos supervisores das instituições campo de estágio, buscando apreender como a dimensão ético-política se expressa no processo de supervisão. Com essa abordagem, pretende-se contribuir para a construção de estratégias para a efetivação do estágio e da supervisão nos moldes defendidos pelas diretrizes curriculares da ABEPSS e pelo Projeto Ético-Político do Serviço Social. Essas diretrizes se basearam em um fenômeno que atravessa desafios para sua operacionalização. Para tanto, adotei a abordagem quali-quantitativa no processo de investigação. Com esse fim, utilizei instrumentos como o roteiro de perguntas semiestruturadas e a técnica de análise documental. O primeiro procedimento proporcionou o conhecimento do perfil dos supervisores, do seu processo de trabalho, da sua concepção sobre a temática processo de trabalho e supervisão, além da verificação de como vem sendo tratada a mediação teoria e prática nos campos de estágio pesquisados, bem como se a supervisão de estágio vem sendo operacionalizada de acordo com as diretrizes curriculares. Outro fator observado refere-se à relação dos supervisores das instituições de campo de estágio com o Departamento de Serviço Social da PUC-Rio. A pesquisa foi realizada com uma amostra de 8 (oito) dentre os 35 (trinta e cinco) supervisores das unidades campo de estágio de O estudo se pautou tanto no perfil dos campos de estágio, como na operacionalização das políticas sociais nos espaços públicos e privados, sendo as entrevistas gravadas com o consentimento dos assistentes sociais entrevistados. As entrevistas semi-estruturadas foram utilizadas por se constituírem numa conversação informal, a partir de um roteiro prévio (anexo I), buscando proporcionar liberdade ao entrevistado. Além disso, para preservar a identidade dos participantes, não constarão nesta dissertação dados que permitam a Regulamentação da Profissão) e o Código de Ética do Profissional (1993). O estágio supervisionado é concomitante ao período letivo escolar. (ABESS/CEDEPSS, 1997, p. 71).
13 26 identificação dos mesmos. Com esse objetivo, classifiquei os entrevistados por número: Entrevistado 1, Entrevistado 2, Entrevistado 3 etc. Além disso, a definição dos entrevistados se deu pelo critério da participação desses assistentes sociais no processo de formação profissional dos alunos-estagiários da PUC-Rio, como supervisores de estágio, estejam eles desenvolvendo sua ação profissional em instituições públicas, privadas ou do terceiro setor. Com isso, procurei dotar a amostra de heterogeneidade, por não me restringir à análise dos processos de trabalho dos assistentes a um único espaço de atuação. Com esse procedimento metodológico, tive como objetivo levantar dados que me dessem subsídios para a análise do tema proposto para a dissertação. A técnica de análise documental foi fundamental para a compreensão da política de estágio do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio. Permitiu observar se o Departamento vem contemplando os pressupostos colocados para a formação profissional e condução do estágio e da supervisão, estabelecidos pelas Diretrizes Curriculares da ABEPSS e direcionados pela nova Política Nacional de Estágio e pela Resolução CFESS nº 533. O material coletado foi analisado de acordo com os pressupostos apresentados, considerando a supervisão de estágio em Serviço Social e suas implicações para o Projeto Ético-Político da profissão, tendo como eixo de análise o processo de trabalho dos assistentes sociais na contemporaneidade. O resultado da pesquisa, que será apresentado nos próximos segmentos deste trabalho, encontra-se distribuído em quatro capítulos, que trazem a sistematização e a análise dos dados coletados. No primeiro segmento (segundo capítulo), Trabalho e processos de trabalho no modo de produção capitalista, encontra-se a discussão do trabalho sob a forma das relações capitalistas e as suas modificações nos processos de produção e nas relações sociais. Tal discussão pautou-se na consideração do trabalho como produção de valor. O terceiro capítulo, O Serviço Social na divisão social do trabalho, aborda a inserção do Serviço Social na divisão social do trabalho, fazendo uma relação com as demandas postas pelo capitalismo, desde as origens da profissão até a contemporaneidade, analisando a especificidade do trabalho do assistente social e a participação da profissão no processo de desenvolvimento do capital.
14 27 Contata-se que o assistente social, na contemporaneidade, continua sendo solicitado para dar respostas à questão social, que se agrava com o desenvolvimento do capital, através da execução de políticas sociais implementadas pelas instituições públicas e privadas. No entanto, a sua inserção nestes espaços vem sofrendo mudanças, mediante as modificações das relações entre Estado e sociedade civil. No quarto capítulo, O processo de trabalho do assistente social na contemporaneidade: análise do processo de trabalho dos supervisores de estágio do curso de serviço social da PUC-Rio, destaca-se o processo de trabalho do assistente social, bem como a consideração da profissão como trabalho, inserida no setor de serviços, elemento fundamental para a compreensão do processo de trabalho do assistente social dentro dos espaços institucionais públicos, privados e do terceiro setor na contemporaneidade e para a análise do processo de trabalho dos supervisores de estágio do curso de Serviço Social da PUC-Rio. Evidencia-se que, nos espaços de atuação do assistente social, a sua inserção vem se dando por conta das demandas oriundas da relação entre capital e trabalho, mas a sua atuação enfrenta a contradição entre as perspectivas postas pelo Projeto Ético- Político profissional e as demandas postas pela instituição na qual se insere. O quinto capítulo, A supervisão de estágio no processo de trabalho do assistente social as diretrizes curriculares e a dimensão ético-política no processo de ensino-aprendizagem do curso de Serviço Social da PUC-Rio, busca situar historicamente a supervisão de estágio na formação profissional do assistente social, desde o surgimento da profissão até a contemporaneidade, as Diretrizes Curriculares da ABEPSS de 1996 e 1999, a dimensão ético-política da profissão e a análise do processo de ensino-aprendizagem do curso de Serviço Social da PUC-Rio. Dando prosseguimento à análise dos dados, busco, a partir da constatação de como se dá a inserção dos assistentes sociais supervisores e de como está organizado o seu processo de trabalho dentro das instituições, apresentar como vem se dando a rotina de trabalho dos supervisores no que se refere à supervisão de estágio; o significado da supervisão no processo de trabalho dos supervisores; os aspectos facilitadores, limitadores e os desafios expostos pelos supervisores para a realização da supervisão.
15 28 Por fim, nas considerações finais, retomo alguns pontos observados na análise sobre a supervisão de estágio e o processo de trabalho do assistente social, destacando, nesse contexto, possibilidades e limites para a efetivação do Projeto Ético-Político do Serviço Social.
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