UMA AVALIAÇÃO PARA A INCLUSÃO: POSSIBILIDADE OU UTOPIA?
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- Luiz Fernando Carreira Benke
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1 UMA AVALIAÇÃO PARA A INCLUSÃO: POSSIBILIDADE OU UTOPIA? Carla Beatriz Rodrigues Silva; Vanessa Terezinha Bueno Campos A avaliação escolar é tema complexo e se avulta quando pensamos na avaliação escolar de pessoas com deficiência. Nesse sentido, como avaliar a aprendizagem dos alunos sem que essa prática se torne instrumento de exclusão e de fracasso escolar? Um dos grandes desafios da instituição escolar, atualmente, é refletir sobre como criar ações pedagógicas atinentes aos processos avaliativos, inserindo-os em uma perspectiva que favoreça o processo de inclusão. Nesse artigo objetivamos discutir e analisar como as pessoas com deficiência têm sido avaliadas ao longo do processo histórico e como essa avaliação tem repercussão na formação e inclusão das pessoas com deficiência na sociedade. O caminho percorrido para a compreensão da inclusão das pessoas com deficiência e a avaliação escolar foi por intermédio da pesquisa bibliográfica. Os principais autores que subsidiaram a discussão sobre a inclusão foram Franco e Dias (2012), Montoan (2003), Carvalho (2004) e os que balizaram o diálogo sobre a avaliação escolar foram Esteban (1998), Luckesi (2006) e Patto (1996). A cultura do sucesso e ou fracasso têm sido concebida historicamente como um problema individual do aluno frente às exigências escolares. As poucas tentativas de escapar deste julgamento atribuem, em geral, o êxito ou fracasso as condições anteriores e externas à escola, como as desigualdades e perversidades sociais, econômicas e culturais e à lógica da exclusão, que parecem segundo considerações de Carvalho (1997, p. 21), dominar nossas instituições sociais. Evidentemente, estes fatores interferem consideravelmente no processo, porém desconsiderar que as práticas escolares não influem, determinam e contribuem para que este quadro permaneça inalterado é um pressuposto no mínimo ingênuo e equivocado. Estudo realizado por Patto (1996), na década de 80, no século passado, recuperou a trajetória histórica do fracasso escolar. A incompetência do aluno em aprender é justificada, ao longo da história por deficiências genéticas, cognitivas, psicológicas, culturais, socioeconômicas. Para essa autora, as explicações do fracasso baseadas na teoria dos déficits e da diferença cultural precisam ser revistas. De acordo com Franco e Dias (2012), na sociedade greco-romana o deficiente era eliminado, pois comprometia o ideal de perfeição estabelecido. Na antiguidade e idade média as pessoas com deficiência por não corresponderem ao padrão de normalidade eram tratadas com tolerância e apoio ou com menosprezo e eliminadas do convívio social. No século XVII, com a contribuição da ciência, houve uma significativa modificação dos conceitos até então estabelecidos. Pesquisas e estudos sistematizados surgem na área da saúde e a deficiência passa a ser caracterizada como doença.
2 A partir do século XVII, há uma modificação na conduta das pessoas para com a deficiência. Evidentemente que as concepções não mudaram de um dia para outro, mas os conhecimentos científicos contribuíram para ampliar a compreensão das deficiências. Surgem movimentos no cenário mundial, experiências educacionais: como obras impressas sobre a educação de deficientes e até mesmo a primeira escola para deficientes subsidiada pelo estado em 1837, a Ohio School for the Blind, em Nova York. Até então as pessoas com deficiência eram segregadas em instituições nas quais não se podia comprovar se estas obtinham ou não possibilidades educacionais. Anos depois, nos séculos XIX e XX propõe a redução da segregação das pessoas com deficiência em asilos e instituições e a ênfase para que elas pudessem ter acesso a uma escola especial ou até classe especiais em escolas regulares. (FRANCO & DIAS, 2012) No século XIX surge um movimento conhecido como integração social, no qual se propunha o ensinar as pessoas com deficiência e alunos sem deficiência na escola pública. Segundo Franco e Dias (2012) essa proposta ocorreu devido a três fatores: (i) as duas guerras mundiais, onde se deveria inserir novamente os soldados na sociedade, (ii) ao avanço científico e (iii) o fortalecimento legal dos direitos humanos. No século XX, nas décadas de 60 e 70 surgem leis e programas de atendimento educacional, favorecendo a integração da pessoa com deficiência na escola e no mercado de trabalho. Na década de 80 a ONU (Organização das Nações Unidas) declara como sendo o ano internacional das pessoas com deficiência. Surgem documentos tais como: Declaração Mundial de Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994), documentos estes que objetivavam proteger e assegurar os direitos das pessoas com deficiência. No Brasil, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) e após a reforma da Constituição Federal Brasileira (1988), surge em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases Educacionais a LDB n º 9.394/96, a qual estabelece que a escolarização das pessoas com deficiência deva acontecer preferencialmente no ensino regular. Entendemos, portanto que o movimento de integração ocorreu até a década de 80, com a luta pela inserção dos deficientes na sociedade, e a partir da década de 90 por meio de leis e declarações surge a ideia da inclusão das pessoas com deficiência. Segundo Sassaki (1997), a inclusão social se define como: [...] processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papeis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo bilateral, no qual as pessoas ainda excluídas, e a sociedade buscam em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar equiparação de oportunidade para todos. (SASSAKI, 1997, p.7) Para diferenciar a integração da inclusão Mantoan (2003), relata que a integração se refere à inserção das pessoas com deficiência na sociedade, e a inclusão prevê uma forma mais radical de inserção, completa e sistemática. Nesse sentido, na proposta de integração escolar, os alunos devem ter garantido o acesso a escola, o direito de ir e vir no que se refere, principalmente, a adaptação do sistema educacional e dos estudantes ao espaço físico; a proposta de inclusão, por sua vez, reivindica o direito dos alunos a participarem efetivamente da formação escolar e respeitados em suas especificidades físicas, psíquicas, emocionais. O acesso à educação, em qualquer nível, é um direito humano inquestionável. Assim, todas as pessoas com deficiência têm o direito a educação escolar em qualquer um de seus níveis. Mas é importante destacar que o Ensino Fundamental é a única etapa considerada obrigatória pela Constituição Federal e, por isso, não pode ser jamais substituído.
3 Na perspectiva de uma educação que possibilite o acesso e a permanência de todos na escola, a revisão dos conceitos que embasam as práticas avaliativas e os interesses que estão envolvidos, quando se pensa e se pratica a avaliação, pode ser uma das alternativas para afrouxar os nós que prendem a escola em uma prática cotidiana mais preocupada com a disciplina e com o controle dos alunos, do que com uma prática pautada no diálogo e na interação entre os sujeitos que constituem o espaço escolar. O vocábulo avaliar origina-se do latim valere, que significa: ser forte, ter valor. No senso comum, avaliar é empregado no sentido de atribuir valor a um objeto. Assim, a avaliação permite diversos significados, tais, como: verificar, calcular, medir, apreciar, classificar, diagnosticar, entre outros. Avaliar, segundo Luckesi (2006), significa: determinar a valia ou o valor de; apreciar ou estimar o merecimento de: avaliar um caráter; avaliar um esforço; etc. Com esta significação, a avaliação se encerra com a determinação de um juízo de valor sobre a realidade. Ao refletirmos sobre os caminhos percorridos para se chegar ao conceito de deficiência, identificamos que os longos períodos de exclusão e a não aceitação das diferenças que condicionaram o conceito de deficiência está intimamente relacionado ao conceito de avaliação. A avaliação historicamente tem sido concebida como uma forma de controle que, através da seleção, incluía poucos e excluía muitos. A avaliação é algo que se processa no espaço social e por isso mesmo é histórica, é cultural e está implicada em relações de poder. Desse modo, a avaliação traduz visões sociais particulares e interessadas, ao mesmo tempo em que contribui para a produção de identidades individuais e sociais. As práticas avaliativas vinculam-se a formas específicas e contingentes de organização tanto da educação como da própria sociedade. As pessoas com deficiência vêm sendo avaliadas desde a antiguidade até a contemporaneidade e essas avaliações se traduzem, em geral, em menosprezo, preconceito, segregação, discriminação. Afastar estigmas ou atitudes que reafirmam um olhar discriminatório às pessoas que fogem do padrão, historicamente construído como adequado ou inadequado, é um grande desafio, talvez, o maior de todos. É possível, pois, afirmar que a avaliação não é algo que se explique ou se justifique em si mesma. Imprescindível que se reconheça, nas propostas e ações avaliativas, privilégio ou marginalização daqueles sobre os quais tais propostas e ações vão recair e a contribuição disso na exclusão educacional. A avaliação é uma criação sociocultural, e por isso não é um elemento que traga, em sua prática e produção, ingenuidade e neutralidade. Não há neutralidade e imparcialidade no ato de selecionar, medir, atribuir conceito ou nota, classificar, eliminar. Ao longo da história do processo de escolarização muitas práticas pedagógicas reafirmaram e reafirmam algumas dessas significações concernentes à avaliação sendo que quase todas estão intimamente relacionadas às ideias de julgamento. Na perspectiva pedagógica inclusiva, esta acepção não é suficiente, pois, segundo Luckesi (2006), a avaliação do aproveitamento escolar precisa ser praticada como uma atribuição de qualidade dos resultados da aprendizagem dos alunos e percebida como um ato dinâmico, que precisa ter como objetivo final uma tomada de decisão que vise a direcionar o aprendizado para o pleno desenvolvimento do educando. Essa visão é ampliada, quando se considera que "avaliar é ser capaz de acompanhar o processo de construção de conhecimento do educando, para ajudar a superar obstáculo". Enquanto a inclusão prevê a diversidade, o acolhimento e a somatória das diferenças para um modelo democrático, as escolas continuam a utilizar práticas do século XVII, onde se previa uma educação para todos, que por sua vez não acolhe a diferença, pois se estabelece regras e tempos para a aprendizagem. Para Luckesi (2006), uma das questões para se pensar
4 em um modelo democrático de avaliação seria fazer do erro uma constante aprendizagem e não um fim em si mesmo. A proposta de educação para todos não vem ocorrendo de forma linear, mas deve ser compreendida enquanto um processo de construção de uma escola que permite que haja a possibilidade de encontros, desencontros, diálogos, resistências, avanços, retrocessos, na tentativa de considerar a diversidade humana tornando-a elemento enriquecedor na constituição de cada sujeito. Diante da heterogeneidade que caracteriza a sala de aula, uma das dificuldades encontradas é a de organizar e possibilitar uma prática pedagógica em que o professor consiga avaliar o aluno tendo-o como parâmetro de si mesmo. Esta tem sido a perspectiva orientadora referente aos processos de avaliação da aprendizagem em consonância com as propostas pedagógicas que visam à inclusão. Falar de avaliação e inclusão possibilita romper com a visão simplificadora do ato pedagógico e reconhecer o outro como um indivíduo imerso em uma diversidade que está imbricada nas diferentes culturas que nos constituem e das quais somos partes construtoras. A diversidade é condição humana, é natural a todas as espécies, é condição sine qua non para que possamos nos desenvolver, nos aprimorar e nos modificar constantemente. Nesse sentido, é importante olharmos para os sujeitos relacionando-os com o ambiente sociocultural do qual participam. O desafio a ser enfrentado ao buscar pontos de interlocução entre avaliação da aprendizagem e inclusão escolar é o de encontrar uma maneira de utilizar os processos avaliativos como potencializadores das aprendizagens, como uma ferramenta pedagógica capaz de auxiliar na (re)construção de conhecimentos, escutar as vozes historicamente silenciadas e fazer emergir as potencialidades de cada sujeito. Referências Bibliográficas: BRASIL. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 Lex: Leis de Diretrizes e Bases da educação Brasileira (LDB), Brasília, CARVALHO, Edler Rosita. Educação Inclusiva: com os pingos nos is. Porto Alegre: Mediação, ESTEBAN, Maria Teresa (org.). Avaliação: uma prática em busca de novos sentidos. Rio de Janeiro: DP & A, FRANCO, R. J & DIAS, S. R. T, A Pessoa Cega no Processo Histórico: Um breve percurso. Disponível em: Acesso em 02/07/2012. LUCKESI, C. C. Avaliação da Aprendizagem Escolar: estudos e proposições. São Paulo: Cortez, LUCKESI, C. C. Prática Escolar: do erro como fonte de castigo ao erro como fonte de virtude. Disponível em: Acesso em 01/05/2012. MANTOAN, Maria Teresa Égler. Inclusão Escolar O que é? Por quê? Como fazer?. São Paulo: Moderna, PATTO, M.H.S. A Produção do Fracasso Escolar. São Paulo: T.A. Queiroz, 1996.
5 SASSAKI, K. R. Inclusão: Construindo uma Sociedade para Todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
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