PIOMETRITE EM CÃES E GATOS: REVISÃO DE 103 CASOS PYOMETRA IN DOGS AND CATS: REVIEW OF 103 CASES RESUMO

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1 PIOMETRITE EM CÃES E GATOS: REVISÃO DE 103 CASOS PYOMETRA IN DOGS AND CATS: REVIEW OF 103 CASES Saionara Siqueira Lucas 1 ; André Luiz Lima de Oliveira 2 ; João Eduardo Wallau Schossler 3 RESUMO Piometrite constitui o acúmulo de pús no lúmen uterino, secundariamente a hiperplasia endometrial cística induzida pela progesterona. Do Serviço de Arquivo do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Santa Maria foi efetuado levantamento dos pacientes que manifestaram esta afecção no período de janeiro de 1991 a dezembro de Foram descritos 103 casos de piometrite, sendo que destes, 91 eram cães, apresentando uma idade média de seis anos e dois meses, e 12 eram gatos, apresentando uma média de idade de quatro anos e sete meses. Os sinais clínicos encontrados foram descarga vaginal, tensão abdominal, anorexia, apatia, diarréia e vômitos. Dos animais estudados, 26% foram previamente tratados com contraceptivos. Realizaram-se 36 exames radiográficos evidenciando útero distendido com acúmulo de líquido em seu interior e 65 hemogramas, a maioria apresentando leucocitose com desvio para a esquerda. O tratamento de escolha, constituindo 66% dos casos, foi fluido e antibioticoterapia associada a ovariosalpingohisterectomia. Palavras-chave: ovariosalpingohisterectomia, cães, gatos, piometrite, hiperplasia endometrial cística. ABSTRACT Pyometra constitutes the pús accumulation in the uterine lúmen, secondary lesion the hyperplasia cystic endometrial induced by the progesterona. The medicals records of the patient s that manifested this lesion in the Veterinary Teaching Hospital Universidade Federal de santa Maria were revised from january of 1991 to December of Hundred three cases of pyometra were described, and of these, 91 were bitches, presenting an average age 6 year-old and 2 months, and 12 were cats, presenting an average age of 4 year-old and 7 1 Méd. Vet., MSc, Prof. Dpto Clínica/Patologia, PUCRS, Uruguaiana. E mail: saionara@pucrs.campus2.br 2 Acadêmico de Medicina Veterinária da UFSM. 3 Méd. Vet. MSc, Dr, Prof. Dpto de Clínica de Pequenos Animais, UFSM.

2 Lucas, S.S. et al. 124 months. The clinical findings were vaginal discharge, abdominal tension, anorexia, apathy, diarrhea and vomits. 26% of the studied animals was treated previously with contraceptives. Were make 36 radiographics exams evidencing uterus stretched out with liquid accumulation in its interior, and 65 laboratorial exams, most presenting leucocitosys with deviation for the left. The choice treatment, constituting 66% of the cases, it was fluidoterapy and antibioticoterapy associated the ovariosalpingohisterectomy. Key Words: surgery, dogs, cats, piometrite. INTRODUÇÃO Piometrite é uma infecção uterina que pode ter apresentação aguda ou crônica, caracterizada por acúmulo de exsudato purulento (pús) no lúmen uterino (GILBERT, 1992.). A Hiperplasia Endometrial Cística (HEC) precede o desenvolvimento de piometrite em cadelas, sendo causada por uma resposta exagerada e anormal do endométrio à estimulação progesterônica crônica e repetitiva (FELDMAN & NELSON, 1996; JOHNSON, 1994; PRESTES, et al. 1991), com acúmulo de fluido no interior das glândulas endometriais e no lúmen uterino (FELDMAN & NELSON, 1996; JOHNSON, 1994). O distúrbio surge no diestro, fase caracterizada pela ocorrência de secreção ativa de progesterona, geralmente três a seis semanas após o fim do cio, podendo, contudo, aparecer logo no final do estro (GILBERT, 1992; JOHNSON, 1994; SLATTER, 1993). Durante essa fase, a progesterona promove proliferação endometrial, secreção glandular e suprime a atividade miometrial, permitindo assim o acúmulo de secreções uterinas (GILBERT, 1992; JOHNSON, 1994). Isto favorece a invasão bacteriana secundária ascendente a partir da vagina (ETTINGER, 1992). Fatores predisponentes como a duração prolongada do cio na cadela, permite que o colo uterino permaneça muito tempo aberto, sendo possível a contaminação (ETTINGER, 1992). Em gatas, considerando que há necessidade de cópula para que ocorra a ovulação, a piometrite ocorre após cruzamentos ou de forma iatrogênica, pela administração de contraceptivos (JOHNSON, 1994). A utilização de compostos hormonais, como estrogênios, para interromper a gestação, bem como progestágenos com finalidade contraceptiva, são os fatores que podem induzir à piometrite com maior freqüência (FELDMAN & NELSON, 1996; JOHNSON, 1994). A administração de estrógenos, por manter a cérvix relaxada

3 125 Piometrite em cães... por um período maior, aumenta o risco de aparecimento de piometrite em cadelas com mais de quatro anos de idade (NISKANEN & THRUSFIELD, 1998). Vários trabalhos relacionam, no entanto, a administração de progestágenos à maior incidência de piometrite, principalmente em cadelas jovens (FELDMAN & NELSON, 1996; JOHNSON, 1994; PRESTES et al., 1991). Relatam-se também os efeitos carcinogênicos dos hormônios (BRODEY & FIDLER, 1966). A piometrite ocorre com maior freqüência em cadelas de 8 a 10 anos de idade ou em cadelas jovens que foram tratadas com progestágenos contra coberturas indesejadas (BOJRAB, 1996). Em gatas, a média fica em torno de sete anos e dois meses de idade (FENNER, 1985). A piometrite é classificada como aberta, quando a cérvix está quase completamente aberta e há presença de secreção vaginal, ou fechada, quando não há abertura da cérvix, havendo acúmulo de material no útero, não ocorrendo, portanto, secreção vaginal (PRESTES et al., 1991). Na cadela ou gata com cérvix fechada, a sintomatologia tende a ser mais grave do que, quando a cérvix é aberta, ocorrendo neste último tipo um corrimento vulvar purulento, geralmente com traços de sangue (KENNEY et al., 1987). A Escherichia coli, representa o microorganismo mais comumente isolado no lúmen uterino de cadelas e gatas afectadas (BRODEY & FIDLER, 1966; DHALIWAL et al., 1998; FELDMAN & NELSON, 1996) Outros autores, encontraram coliaerógenes como os principais microorganismos causadores da doença, seguido de Streptococcus betahemolítico (REPETTI et al., 1995). Os sinais clínicos encontrados são depressão, anorexia, vômito, polidipsia, poliúria e perda de peso. Raramente ocorre febre, estando está presente em 20% dos casos. O corrimento vaginal purulento está presente em 75% das cadelas com piometrite (BRODEY & FIDLER, 1966). A desidratação constitui um achado comum. O útero em geral se encontra palpavelmente dilatado, especialmente se a cérvix estiver fechada, dificultando a drenagem do conteúdo uterino, se não tratada pode levar à septicemia e endotoxemia (KENNEY et al., 1987). São comuns as lesões exteriores ao trato genital, como depressão da medula óssea e glomerulonefrite por deposição de imunocomplexos (THOMSON, 1990). O diagnóstico baseia-se nos sinais clínicos e exames complementares, tais como radiografias abdominais e ultrasonografias, evidenciando distensão uterina em decorrência da grande quantidade de líquido em seu interior (FENNER, 1985;

4 Lucas, S.S. et al. 126 KENNEY et al., 1987). Para detectarem-se anormalidades associadas à sepse e para avaliar a função renal, são necessários hemogramas, perfil bioquímico sérico e urinálise (FENNER, 1985). O hemograma mostra, em geral, neutrofilia com desvio à esquerda, contudo, as contagens leucocitárias total e diferencial são extremamente variáveis. A bioquímica sérica evidencia aumento da fosfatase alcalina, hiperproteinemia e azotemia pré renal. O exame de urina revela comumente isostenúria e, ocasionalmente, proteinúria. O diagnóstico diferencial mais importante a ser realizado é o da gestação (MIALOT, 1987). A aparência radiológica do útero gravídico antes da calcificação fetal (cerca de 42 dias) é indistinguível da obtida quando há piometrite, por isso tornase importante a associação aos demais sinais clínicos para estabelecer o diagnóstico preciso (KIRK & BISTNER, 1987). A piometrite pode ser tratada clínica ou cirurgicamente, dependendo principalmente do estado clínico do paciente. O tratamento deve ser rápido e agressivo porque podem desenvolver-se septicemia e endotoxemia (JOHNSON, 1994). O tratamento para HCE-Piometrite baseia-se na antibioticoterapia, baseada no antibiograma, e terapia hidroeletrolítica de suporte, para manutenção da perfusão tecidual adequada, com melhora na função renal, pois vários estudos demonstram que o prognóstico piora quando não se corrige a azotemia (FELDMAN & NELSON, 1996), (JOHNSON, 1994) Altas doses de corticóides via intravenosa, de uma só vez ou repetidos em intervalos de quatro a seis horas, constituem uma medida muito útil para animais em choque séptico ou endotóxico. Na seqüência, pode-se iniciar o tratamento definitivo para piometrite, sendo a ovariosalpingohisterectomia o tratamento de eleição para resolver esta afecção, em fêmeas caninas e felinas que não serão utilizadas na reprodução. (JOHNSON, 1994) Quando o proprietário recusar a cirurgia, devido ao grande valor reprodutivo da fêmea, ou quando existir uma contraindicação válida para a anestesia geral, o controle terapêutico poderá ser tentado, através da desobstrução da cérvix para drenagem uterina. Os resultados com terapia medicamentosa utilizando estrógenos, andrógenos, prostaglandinas (cininas) e ocitocina não se mostraram consistentes nem tiveram sucesso (FELDMAN & NELSON, 1996). O uso de estrógenos para provocar relaxamento, não é recomendado porque aumentam os efeitos da progesterona no útero (JOHNSON, 1994).

5 127 Piometrite em cães... O objetivo deste trabalho foi realizar um levantamento da casuística de piometrites diagnosticadas e tratadas no Hospital Veterinário da Universidade Federal de Santa Maria ao longo de oito anos, visando obter uma relação entre o uso de contraceptivos e a ocorrência de casos de piometrite. MATERIAL E MÉTODOS Do Serviço de Arquivo e Estatística do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Santa Maria, foram levantados 103 casos de piometrite em pequenos animais, no período de 1991 a Os dados foram obtidos e analisados quanto a espécie, peso, idade, utilização ou não de contraceptivos, exames complementares e tratamento. Ao serem recepcionados, os animais foram submetidos à anamnese, exame clínico detalhado e, algumas vezes, eram encaminhados a exames complementares, como raios-x e hemograma, para confirmação do diagnóstico. RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram analisados 103 casos de piometrite, sendo que em relação a espécie, 91 eram caninos e 12 felinos. Esta proporção está de acordo com o relatado em outros trabalhos e é explicada pelo fato do gato ovular somente quando ocorre a cópula. (ODENDAAL, 1993). Os casos encontrados em gatos corresponderam ao período de anestro, entre setembro a dezembro, vindo ao encontro do descrito pela literatura (JOHNSON, 1994). A média de idade dos cães acometidos foi de seis anos e dois meses, variando de 10 meses a 15 anos, dados que estão de acordo com alguns autores (KIRK & BISTNER, 1987; ODENDAAL, 1993), porém discordam de outros (BOJRAB, 1996; NISKANEN & THRUSFIELD, 1998), que citam uma idade média entre oito a dez anos. Isto varia porque existem duas síndromes de piometrite, a da cadela idosa, resultado de exposições sucessivas à progesterona durante sua vida, pelos vários ciclos estrais e a síndrome da piometrite da cadela jovem, relacionada a administração exógena de estrógenos para prevenir a gestação. A idade média encontrada para os gatos foi de quatro anos e sete meses, contrariando os achados de literatura (JOHNSON, 1994), que citam uma média de idade para esta espécie de sete anos e dois meses. Observou-se que 27 animais haviam sido tratados previamente com contraceptivos, constituindo 26,2% dos animais estudados. Estes dados estão de acordo com alguns autores (ALLEN, 1995 e FENNER, 1985) que citam o uso de progestágenos como um dos fatores

6 Lucas, S.S. et al. 128 desencadeantes da piometrite. Porém outros autores (NISKANEN & THRUSFIELD, 1998), não encontraram relação entre a terapia hormonal para supressão do ciclo estral com a ocorrência de piometrite. Hormônios não devem ser utilizados para prevenir a gestação uma vez que predispõe à piometrite e possui eficácia restrita na prevenção da gestação (BRODEY & FIDLER, 1966). Quatro das doze gatas com piometrite haviam sido tratadas com progestágenos. Sugere-se que fêmeas nulíparas, que apresentem ciclo estral anormal ou falsa gestação, terão maiores risco de desenvolverem piometrite (NISKANEN & THRUSFIELD, 1998). No presente trabalho não foi verificada esta correlação. Em relação à anamnese, 20,38% dos animais tiveram história de cio, aborto (2,91%) ou parto prévio (1,94%). Quanto aos sinais clínicos apresentados pelos 103 animais revisados, 70 (67,9%) deles, apresentaram corrimento vaginal purulento ou sanguinolento, estando de acordo com a maioria dos achados de literatura (ALLEN, 1995; BOJRAB, 1996; FENNER, 1985; MIALOT, 1987; SLATTER, 1993) que indicam ser este o sinal clínico mais comum, o qual facilita extremamente a realização do diagnóstico pelo clínico. Os demais sinais clínicos foram apatia (13,59%), anorexia (17,47%), vômitos (11,65%), distensão e tensão abdominal (9,70%) e diarréia (3,88%) (ETTINGER, 1992; GILBERT, 1992; KENNEY et al. 1987), apenas cinco animais apresentaram febre, constituindo 4,8%, porém a literatura cita que o estado febril ocorre em 20% dos animais acometidos. A maior proporção de casos de piometrite encontrados após o cio confirma que a afecção ocorre na fase diestral do ciclo, com aumento da secreção de progesterona (BRODEY & FIDLER, 1966). Quando os sinais clínicos não eram totalmente elucidativos realizava-se exames complementares, conforme sugerido pela literatura (FENNER, 1985). Foram realizados 36 exames radiográficos, todos evidenciando útero distendido com acúmulo de líquido em seu interior. O mais importante diagnóstico diferencial é o de gestação antes dos 45 dias, o qual era realizado associando aos demais sinais clínicos e exames complementares (KIRK & BISTNER, 1987). Dos 103 casos atendidos foram realizados 65 hemogramas. A contagem de leucócitos totais variou de a /mm³, apresentando uma média de /mm³, sendo que a maioria dos animais apresentava leucocitose com desvio à esquerda (93%). Estes dados vêm ao encontro com o citado pela literatura (ODENDAAL,1993), em que a contagem

7 129 Piometrite em cães... de leucócitos totais é geralmente maior que /mm³, embora alguns animais possam apresentar leucopenia, (como encontrado nesta revisão em que três animais apresentaram contagem leucocitária total abaixo de /mm³). Dos 65 animais em que foram realizados exames laboratoriais, 61 deles apresentaram leucocitose com desvio a esquerda, este quantidade está de acordo com os valores encontrados por alguns autores (JOHNSON, 1994). Em 68 animais, constituindo 66% dos casos, foi realizada a castração por ovariosalpingohisterectomia, o que constitui o tratamento preferencial para a piometrite (FELDMAN & NELSON, 1996; GILBERT, 1992; JOHNSON, 1994; PRESTES et al., 1991; SEVELIUS et al., 1990). Todos os animais receberam fluidoterapia e antibióticos ainda no pré operatório, conforme indica a literatura (JOHNSON, 1994). Os diagnósticos foram confirmados após a cirurgia, com a visualização da distensão uterina e do conteúdo mucopurulento em seu interior. Seis dos 68 animais operados, haviam sido previamente tratados com prostaglandinas, sem obtenção de sucesso (FELDMAN & NELSON, 1996). CONCLUSÕES Baseado nos dados obtidos neste trabalho, conclui-se que: - Piometrite ocorre mais em caninos que felinos sendo o sinal clínico mais característico, a descarga vaginal purulenta e/ou sanguinolenta; - o uso de contraceptivos propicia a ocorrência de Hiperplasia Endometrial Cística-Piometrite; - não se deve apoiar o diagnóstico unicamente no exame laboratorial, pois apesar de 93% dos animais apresentarem leucocitose, podem ocorrer casos de leucopenia; - O tratamento deve ser rápido e agressivo para prevenir sepse, sendo a fluido e antibioticoterapia associada a ovariosalpincohisterectomia, o protocolo de eleição para obtenção de êxito no tratamento de piometrite. REFERÊNCIAS ALLEN, W.E. Fertilidade e obstetrícia no cão. São Paulo: Varela, p. BOJRAB, M.J. Mecanismos da moléstia na cirurgia dos pequenos animais. 2 ed. São Paulo: Manole, p. BRODEY, R.S. & FIDLER, I.J. Clinical and pathologic findings in bitches treated with progestational compounds. Jounal

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