USO DE POLPA DE BAMBU COMO REFORÇO DE MATRIZES CIMENTÍCIAS
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- Stefany Peixoto da Conceição
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1 USO DE POLPA DE BAMBU COMO REFORÇO DE MATRIZES CIMENTÍCIAS M. A. S. dos Anjos 1, K. Ghavami 2, N. P. Barbosa 3 1 Escola Técnica Federal de Palmas, Palmas, Brasil 2 Departamento de Engenharia Civil, PUC-Rio, Rio de Janeiro, Brasil 3 Departamento de Engenharia Civil, UFPB, Paraíba, Brasil RESUMO Este trabalho apresenta os resultados experimentais de um estudo que procurou desenvolver compósitos de matriz cimentícia reforçada com polpa de bambu. Foram usados dois tipos de polpa: refinada e sem refino. Fez-se variar o teor de fibras de 0 a 16% em massa da matriz. Utilizou-se o processo de sucção usado no método para moldagem e prensagem, a fim de fabricar polpa de bambu como matrizes cimentícias(pbmc). Os compósitos tiveram seu comportamento mecânico determinado através do ensaio de flexão, em três pontos, com obtenção dos respectivos diagramas carga-deflexão Conseqüentemente foi obtida a capacidade de absorção de energia e algumas imagens no microscópio eletrônico de varredura foram realizadas com o intuito de analisar o tipo de ruptura apresentado pelos compósitos. Foram também determinadas algumas propriedades físicas, como absorção, porosidade aparente, densidade seca e úmida dos compósitos. Os resultados mostraram melhor performance dos compósitos com fibras refinadas em relação àquelas com fibras sem refino. Também indicaram que a fração massa ótimo de fibras refinadas situou-se em torno de 8%, quando promoveram notáveis melhoramentos das propriedades mecânicas dos compósitos em relação à matriz plena. Mas o PBMC com teor de 14% em massa apresentou energia absorvida três vezes maior que a de 8%. PALAVRAS-CHAVE Matriz cimentícia, fibra vegetal, polpa de bambu, materiais compósitos.
2 INTRODUÇÃO A combinação de cimento e fibras vegetais para produção de compósitos duráveis é um grande desafio, mas que se concretizado pode criar um material de construção ecológico, resistente e durável com grande capacidade de renovação, embasada em recursos naturais renováveis (Swamy, 2000). As fibras vegetais sofrem com o ataque alcalino do cimento ao longo do tempo. Cristais de hidróxido de cálcio, oriundos da hidratação do cimento, penetram nas fibras mineralizando-as e fragilizando-as, provocando também perda de aderência com a matriz. Ocorre assim uma diminuição na resistência e na ductilidade do compósito e com isso é necessário encontrar alternativas para proteção das fibras, seja por modificação da matriz ou por modificação na constituição das fibras. Estudos recentes utilizaram alternativas para modificação da matriz através da substituição parcial do cimento Portland por materiais com propriedades pozolânicas como sílica ativa e escória granulada de alto forno (Ghavami et al., 1999; Toledo et al., 2000 e Savastano et al., 2000). Materiais pozolânicos podem melhorar significativamente as propriedades dos compósitos tanto no estado fresco quanto endurecido, melhorando também sua durabilidade através da reação pozolânica realizada por esses materiais que transformam o hidróxido de cálcio, cristais grandes e instáveis, em estruturas cristalinas menores e mais resistentes, o CSH (silicato de cálcio hidratado). Outros materiais com propriedades pozolânicas têm sido usados para substituição parcial do cimento como a cinza volante, a cinza da casca de arroz, a metacaulinita, a cinza do bagaço e da palha da cana de açúcar. A modificação na constituição das fibras vegetais é conseguida através do processo de polpação, que confere uma diminuição no teor de lignina e hemicelulose do material de origem. Os fibrocimentos com reforço de polpa de madeira são utilizados na Austrália desde 1981, em substituição ao cimento-amianto (Coutts & Ni, 1995). O presente trabalho tem como objetivo analisar o comportamento físico e mecânico dos compósitos de matriz cimentícia reforçados com polpas de bambu, determinando o teor de reforço ideal. MATERIAIS E MÉTODOS Neste trabalho foi utilizado cimento Portland CP II E 32, marca Eldorado. As polpas celulósicas de bambu foram provenientes da fábrica de papel Itapajé, localizada no Estado do Maranhão. Essas apresentavam umidade natural variando de 7% a 15% e 35% a 72%, com absorção máxima de 590% e 715%, respectivamente, para as polpas refinadas e sem refino. Os materiais utilizados para produção dos compósitos foram matrizes cimentícias (pasta de cimento) reforçadas por polpas celulósicas de bambu (antes e após o processo de refino). Foram utilizadas as proporções de 4% a 16% de polpa em relação à massa do material cimentício, sendo também utilizada a matriz plena como referência. A nomenclatura utilizada para identificar os diferentes tipos de compósito é a seguinte: CP compósito com polpa refinada e CPS compósito com polpa sem refino. O número após o tipo de compósito indica o teor de reforço.
3 ENSAIOS REALIZADOS Propriedades físicas As propriedades físicas determinadas neste trabalho foram densidade no estado seco (D s ) e úmido (D h ), absorção de água (W a ) e porosidade aparente (P a ), segundo recomendações do RILEM-1984, sendo este teste realizado aos 28 dias. Ensaio de flexão Os ensaios de flexão foram realizados também, aos 28 dias, em equipamento de três cutelos com vão livre L = 100 mm e aplicação de carga centrada no sentido da espessura, com deslocamento de travessão constante de 0,5 mm/minuto utilizando-se uma máquina de ensaio Instron 5500 N. Os espécimes utilizados tinham dimensões de 120 mm de comprimento total e largura b = 36,5 mm com espessura e = 6 mm. O ensaio foi realizado de acordo com o ASTM C A capacidade de absorver energia estática na flexão é determinada pela área abaixo do gráfico carga versus deflexão, até o nível de carga de 40% da carga máxima (de pico) no trecho descendente, de acordo com o proposto pelo RILEM Processo de fabricação dos compósitos A primeira etapa para a produção dos compósitos é a dispersão das polpas que foi realizada em um equipamento adaptado com hélice tipo centrífuga e rotação de rpm (Figura 1). (A) (B (C (A) Equipamento de dispersão (B) Polpa antes da dispersão (C) Polpa após dispersão FIGURA 1. DISPERSÃO DAS POLPAS AGLUTINADAS A mistura dos materiais para a produção dos compósitos foi realizada com um misturador elétrico com velocidade de rotação de 500 rpm, com copo e hélice de aço. A mistura foi feita por 10 min, resultando em uma pasta fluida de cimento e polpa. Após a homogeneização, o material foi transferido rapidamente para a câmara de moldagem, com dimensões de (120 x 120) mm e altura de 100 mm, onde foi submetido a uma subpressão em sua face inferior, com o auxílio de uma bomba de vácuo, mostrada na Figura 2.
4 Misturado Bomba de vácuo Placa após sucção Câmara de moldagem Armazenamento de água Mistura do compósito (A) Equipamento de moldagem (B) Mistura, moldagem e desforma FIGURA 2. EQUIPAMENTO E SEQÜÊNCIA DE MOLDAGEM Para cada percentual de polpa foram produzidas três placas, as quais são empilhadas e intercaladas por chapas de aço e toalhas de papel, para serem submetidas à prensagem em uma prensa hidráulica, durante 5 minutos, a uma pressão constante de 3,2 MPa. A prensagem é realizada para retirar o excesso de água que restou nas placas após a sucção ou que tenha sido absorvida pela polpa. Após a prensagem, as placas foram acondicionadas em sacos plásticos durante 24 horas, para manter uma umidade constante em torno de 90-95%, e evitar a perda de água para o meio ambiente. Após a cura por imersão, durante 6 dias, as placas foram retiradas e cortadas com uma serra circular de disco diamantado, nas dimensões finais de (36,5 x 120) mm. Esses corposde-prova foram mantidos em ambiente controlado a uma temperatura de 23 ± 2 0 C e umidade em torno de 50 ± 5%, até a data dos ensaios. RESULTADOS E DISCUSSÃO Absorção de água, porosidade aparente (vazios permeáveis) e densidades seca e úmida são propriedades físicas inter-relacionadas e de grande importância para o uso pretendido desses compósitos, como por exemplo em painéis de cobertura. A Figura 3 mostra a variação da absorção de água dos compósitos com sua massa especifica para os resultados obtidos no presente trabalho e os verificados na literatura. Uma relação exponencial, com coeficiente de regressão de 0,96, foi ajustada ao conjunto de resultados o que demonstra uma boa concordância dos resultados obtidos no presente trabalho em relação a trabalhos anteriores. Verificou-se, também, que os compósitos reforçados com polpa sem refino apresentaram maior absorção de água que os compósitos com polpa refinada, fato que pode estar relacionado com o aspecto da fibra refinada, que apresenta uma superfície lisa e pouco danificada, em forma de fita, parecendo ser mais densa que a fibra sem refino. Esta última apresenta um aspecto mais circular e mais poroso, como pode ser visto na Figura 4. As fibras sem refino apresentaram, em média, diâmetro de 11 µm; já as polpas refinadas tinham variação de diâmetro com média de 7 µm, numa estimativa feita ao microscópio eletrônico de varredura (MEV).
5 Absorção (%) 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 CP (presente trabalho) CP S (pres ente trabalho ) Fibra de sisal (Coutts e Warden, 1992) Bambu autoclave (Coutts e Ni, 1995) Pinus Radiata (Savastano et al, 2000) Abs(%) = 291,16e R=0,96 1,6583X 10,0 0,0 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 2,0 2,2 2,4 Massa Específica (g/cm³) FIGURA 3. RELAÇÃO ENTRE ABSORÇÃO DE ÁGUA E MASSA ESPECÍFICA DE COMPÓSITOS DE MATRIZ CIMENTÍCIA REFORÇADOS COM POLPA CELULÓSICA (A) (B) (A) Fibra refinada (B) Fibra sem refino FIGURA 4. FIBRAS OBTIDAS NO MEV COM AUMENTO DE 2000 VEZES Comportamento à flexão A inclusão de fibras nos compósitos proporcionou tendência de crescimento na resistência à flexão, até um teor ótimo com posterior queda nesta propriedade. Isto ocorre porque, após certa taxa de polpa, a concentração volumétrica de fibras acarreta dificuldade de mistura e dispersão. No caso, os teores com maior resistência à flexão foram 6% para o compósito com polpa sem refino e 8% para o compósito com polpa refinada (Figura 5). A capacidade de absorver energia (tenacidade) foi a propriedade mais sensível ao acréscimo de polpa. Quando o teor de polpa passou de 4% para 14%, esta propriedade apresentou um aumento de 6 vezes para a polpa refinada e de aproximadamente 2,5 vezes para a polpa sem refino (Figura 6). O acréscimo de 14% no teor de polpa, em
6 relação à matriz sem reforço, aumentou a deflexão na ruptura em aproximadamente 7 vezes para ambos os tipos de polpa (Figura 7). Esses resultados demonstram o potencial da polpa celulósica de bambu para utilização em painéis submetidos à flexão. Resistência à flexão (MPa) 16,0 14,0 12,0 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 CPS CP % de polpa FIGURA 5. RESISTÊNCIA À FLEXÃO COM O TEOR DE POLPA REFINADA E SEM REFINO 1,8 1,6 CPS CP Energia específica (kj/m²) 1,4 1,2 1,0 0,8 0,6 0,4 0,2 0, % de polpa FIGURA 6. ENERGIA ESPECÍFICA ABSORVIDA NA FLEXÃO COM O TEOR DE POLPA REFINADA E SEM REFINO
7 16,0 14,0 CP4 CP6 12,0 CP8 Tensão de flexão (MPa) 10,0 8,0 6,0 4,0 CP10 CP12 CP14 CP16 2,0 0,0 CP0 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5 Deflexão (mm) FIGURA 7. TENSÃO DE FLEXÃO X DEFLEXÃO: COMPÓSITOS COM DIFERENTES TEORES DE POLPA REFINADA CONCLUSÃO A resistência à flexão apresentou tendência de crescimento com o aumento no teor de reforço até um ponto ótimo, que no caso da polpa refinada, foi de 8% e para as polpas sem refino foi de 6%. Teores de fibra acima desses valores acarretaram dificuldades de mistura e dispersão das fibras no compósito. As fibras refinadas conduziram a compósitos de melhor desempenho que as fibras sem refino. Na porcentagem de 8%, as fibras refinadas promoveram, em relação à matriz plena, uma resistência à flexão quase 110% maior e uma capacidade de absorver energia 28 vezes maior, quase cinco vezes superior a deformação na ruptura. A incorporação de fibras aumentou significativamente a absorção e a porosidade aparente do compósito, este acréscimo sendo ligeiramente superior no caso das fibras sem refino. AGRADECIMENTOS As agências financeiras CAPES, através do programa PROCAD, FAPERJ e CNPq, pelo apoio financeiro, e ao aluno de doutorado Conrado Rodrigues, pela participação no desenvolvimento deste trabalho.
8 REFERÊNCIAS Anjos, M. A. S. (2002). Compósito à Base de Cimento Reforçado com Polpa de Bambu - Caracterização Física, Mecânica e Microestrutural. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica, PUC-Rio, Rio de Janeiro, 96p. American Society for Testing and Materials-ASTM. (1996). C 1185/96 Standard Test Methods for Sampling and Testing Non-Asbestos Fiber-Cement Flat Sheet, Roofing and Siding Shingles and Clapboard, New York, 7p. Coutts, R.S.P.; Ni, Y. (1995). Autoclaved Bamboo Pulp Fibre Reinforced Cement. Cement and Concrete Composites, England, vol. 17, p Coutts, R.S.P.; Warden, P. G. (1992). Sisal Pulp Reinforced Cement Mortar. Cement and Concrete Composite, vol. 4, pp Ghavami, K.; Toledo Filho, R. D.; Barbosa, N. P. (1999). Behaviour of Composite Soil Reinforced with Natural Fibres. Cement and Concrete Composites, Elsevirer Science Ltd England, vol. 21, p Savastano Júnior, H.; Warden, P.G.; Coutts, R.S.P. (2000). Brazilian Waste Fibers as Reinforcement of Cement-Based Composites. Cement and Concrete Composites, England, vol. 22, p Swamy, R. N. (2000). Sustainnable Infrastructure Regeneration and Rehabilitation. Fibre-Reinforced Concretes (FRC), BEFB/RILEM, p Toledo Filho, R.D.; Scrivener, K.; England, G.L.; Ghavami, K. (2000). Durability of Alkalisensitive Sisal and Coconut Fibers in Cement Mortar Composites. Cement and Concrete Composites, England, vol.22, p Rilem Technical Committee 49 TFR. (1984). Testing Methods for Fibre Reinforced Cement-Based Composites, vol.17, n.102, 15p.
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