O GAUCHE COMO PÁRIA NA PROSA E POESIA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
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- Juan Carmona Brezinski
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1 O GAUCHE COMO PÁRIA NA PROSA E POESIA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE Valdirene de Assis Moraes 1 ; Célia Sebastiana Silva 2 1 Programa de Iniciação Científica UEG Unidade Universitária Cora Coralina 2 Professora Orientadora UEG RESUMO A modernidade literária trouxe novas formas de pensar a arte poética, que apresenta, a partir de então, valores próprios e sem referências a outros valores. Foi assim, um momento de ruptura com todas as "leis" que regiam a literatura até então. Representou para as artes ruptura estética e psicológica, e é a partir desse momento que surge a figura do pária na literatura. Na poesia brasileira, vale destaque para a obra drummondiana em que se nota a afinidade do poeta com a arte literária moderna. O presente trabalho dá enfoque à inserção da figura marginalizada na obra de Drummond, tanto na prosa como na poesia. O objetivo principal do projeto desenvolvido foi mostrar como o pária aparece na poesia e prosa do escritor sob um foco diferenciador da sua produção, que é a figura do gauche. Essa idéia de gauche, tão recorrente na obra de Drummond, está subsidiada pela figura do pária na arte moderna. Assim, pode-se mostrar a afinidade de Drummond com a modernidade literária e a importância da figura gauche como o pária moderno, a partir da análise do poema "Canto ao homem do povo Charlie Chaplin", e do conto "A doida", e também de outros poemas e contos nos quais a figura gauche se faz presente, com o fim de se compreender, também, a liberdade com que o escritor transita entre os dois gêneros em questão trabalhando um mesmo tema. Palavras-Chave: Drummond. Modernidade. Pária. Prosa. Poesia.Gauche. Introdução Na modernidade, é a partir dos postulados de Baudelaire que a arte literária ganha nova roupagem. Os poetas que sucederam a esse momento passaram a possuir liberdade em relação às suas criações. Isso porque Baudelaire rompe com traços de uma arte conservadora para transformar em poesia resíduos sociais, ou tudo que não era convencionalmente chamado de belo. Assim, seus sucessores voltaram-se para as figuras marginalizadas pela sociedade. A arte moderna, então, rompe, a partir daí, com conceitos que até então forneciam à poesia apenas matéria de beleza, e tudo passa a ser questionado dentro da arte, inclusive o conceito de beleza. Vale lembrar os postulados de Victor Hugo (2004, p.27), ao afirmar que nem tudo na arte é belo e que o feio existe ao lado desse belo, e ainda que, o belo da arte não necessita estar em simetria com a natureza "Nada é belo ou feio nas artes senão pela execução". Então, o poeta moderno possui liberdade para transformar em sublime o que é convencionalmente determinado como feio, grotesco, alheio ao padrão usual. É nesse momento que surge a figura do pária na literatura. O pária é, então, o sujeito marginalizado, excluído pela sociedade moderna, desprestigiado no meio social, aquele que está a margem. 1
2 Percorrendo a obra drummondiana, nota-se sua extrema afinidade com a arte moderna, o que nos interessa, primeiro por Drummond inserir em sua obra essa figura marginalizada, que, sendo um anti-herói - traço da literatura moderna -, torna-se herói aos nossos olhos, diante do tratamento que lhes dispensa o poeta, segundo por transitar livremente entre prosa e poesia com esse mesmo tema. Desse modo, percebe-se na prosa e poesia drummondianas, a penetração nesse universo que propõe Baudelaire, e assim, a sublimação dos seres que estão à margem da sociedade. A figura do pária na prosa e poesia de Drummond aparece sob um foco diferenciador da sua produção, que é o gauche. Essa idéia de gauche tão recorrente na obra do poeta está subsidiada pela figura do pária na arte moderna. Gauche é uma palavra de origem francesa que significa esquerdo. Drummond em seu primeiro livro usa o termo no "Poema das sete faces": "Quando nasci, um anjo torto/ desses que vivem na sombra/ disse: Vai Carlos! Ser gauche na vida". A partir de então, o gauchismo ganha uma dimensão tamanha na obra do escritor, que só é possível interpretar sua obra no todo, a partir de tal perspectiva, ou seja, o gauche é na obra drummondiana um ponto norteador. Gauche passa então a ter um significado próprio na literatura de Drummond, de acordo com Affonso Romano de Sant anna (1992, p.38) significa "o indivíduo desajustado, marginalizado, à esquerda dos acontecimentos". Gauche representa a cisão entre o indivíduo e o mundo exterior, é aquele ser que recolhido no seu canto que observa o mundo de uma posição sempre contrária. Há, então, na produção do escritor, párias previamente determinados pela ordem social, e há os que são transformados em párias devido à condição de gauche do escritor. Desse modo, a presença dos párias como seres marginalizados pela sociedade ganham nova roupagem na obra do prosador. O que nos permite comungar com o pensamento de Alcides Villaça (2006, p.35) "Drummond dota o seu sujeito da identidade complexa de quem está sempre fora de alguma ordem de expectativa". As figuras gauches estão diluídas por toda a obra de Drummond, povoando, deste modo, a sua poesia e também seus contos. Vários são os disfarces gauches utilizados por Drummond e os párias inseridos em sua obra. Assim pode-se confirmar essa presença em poemas como "Morte do leiteiro", "A Carlito", "O elefante", "José", "Canto ao homem do povo Charlie Chaplin", e nos conto "A doida", "Beira-Rio", "Aquele bêbado", "A bailarina", entre outros poemas e contos nos quais se encontram a figura do gauche como pária. Essas figuras gauches passam com a arte moderna a ganhar espaço nas produções, e uma certa beleza e suavização conferida pelos olhos do poeta, tal como nos afirmou Victor Hugo (2004). Drummond ao se denominar gauche, e assumir tal posição, dá a voz aos párias, para figurarem em sua poesia, como ele mesmo afirma em "Canto ao homem do povo Charlie Chaplin": "Falam por mim os abandonados da justiça, os simples de coração,/ os párias, os falidos, os mutilados, os deficientes, os recalcados,/ os oprimidos, os solitários, os indecisos, os líricos, os cismarentos,/ os irresponsáveis, os pueris, os cariciosos, os loucos e os patéticos". Com a mesma habilidade, Drummond desenvolve tal tema em sua prosa e, ao tratar de um mesmo tema em prosa e poesia, reafirma o que diz Cândido (1993, p.19), ao se referir ao livre trânsito entre elas: "Isto faz pensar em certa divisão do trabalho literário, segundo a qual a prosa serviria para repassar a mesma matéria da poesia, mas num nível menor de tensão". 2
3 Pode-se notar, então, um Drummond antenado com a modernidade literária, e que insere em sua prosa e poesia a figura do pária, sob um foco diferenciador, a posição de gauche, de quem já se colocou a margem, a esquerda, para então, subsidiar a existência do pária em sua produção. Material e Métodos Ao longo da pesquisa em voga foram realizadas as leituras da obra de Carlos Drummond de Andrade, que constituíram o corpus de análise, tanto da prosa como da poesia, a fim de investigar a liberdade com que Drummond adentra os dois gêneros trabalhando um mesmo tema. Assim pôde-se observar a sua afinidade com a arte literária moderna, ao se perceber a presença do gauche como pária na sua poesia e prosa. Tal investigação foi realizada nas obras Contos Plausíveis, Contos de Aprendiz, e Poesia e Prosa. Para tanto, tomamos as corroborações de estudiosos e críticos da literatura drummondiana, a verificar: Antonio Candido, Rita de Cássia Barbosa, Jorge, Alcides Villaça, Luiz Costa Lima, Flora Sussekind, Affonso Romano de Sant anna, dentre outros. Atentamos também à leitura teórica de Victor Hugo, Marshall Berman, Walter Benjamin, Charles Baudelaire, acerca da modernidade literária. A leitura das obras tomou viés crítico, à medida que estabelecemos diálogo entre elas, procurando alcançar os objetivos do projeto, o estudo da relação entre a prosa de ficção e a poesia de CDA e a influência que uma estabelece sobre a outra. Resultados e Discussões Ao estabelecermos a aproximação entre prosa e poesia drummondianas, foi possível atestar ao trânsito que ocorre entre elas, bem como perceber nuances dessa riquíssima obra, como a face gauche que se revela tanto na poesia como na prosa, e que atestam, assim, a afinidade de Drummond com a modernidade literária. Para tanto, pôde-se comprovar a presença do gauche nos poemas, dos quais vale destacar "Canto ao homem do povo CharlieChaplin" e "A Carlito", e nos contos, principalmente em "A doida" e "Beira- rio". A obra do escritor tem sido estudada exaustivamente, porém, são poucos os estudos sobre sua prosa, o que possibilitou que o estudo acerca de seus contos se tornasse relevante. É válido citar Alcides Villaça, Antonio Candido, Affonso Romano de Sant Anna, Haroldo de Campos, Gilberto Mendonça Telles, Mário de Andrade, Otto Maria Carpeaux, Antônio Houssais, Luiz Costa Lima, Maria Zilda Ferreira Cury, Flora Sussekind, Célia Sebastiana Silva, que muito contribuíram para ao longo do estudo. Assim, Carlos Drummond de Andrade afina com a modernidade em sua produção literária pela renovação de estilo que realiza, ao romper os tênues limites teóricos acerca dos gêneros e promover um diálogo entre prosa e poesia que revela o perfil moderno da obra desse importante escritor da literatura brasileira. Conclusões Os estudos acerca da prosa e poesia de Drummond muito nos acrescentou, à medida em que a obra de Drummond se configura como uma da mais importantes de nossa literatura. O estudo pôde propiciar uma aproximação não só com sua poesia, mas também de sua prosa, que pouco tem sido lida e estudada, o que tornou de imensurável contribuição para nossa vida acadêmica tal estudo. Muito nos foi acrescentado pelas leituras acerca de sua fortuna crítica e estudos afins direcionados à obra drummondiana, tais como os 3
4 apontamentos de Candido, Rita de Cássia Barbosa, Affonso Romano de Sant anna, Alcides Villaça, Luiz Costa Lima, Flora Sussekind, dentre outros. Foram relevantes também as leituras teóricas realizadas durante tal estudo, a verificar Victor Hugo, Berman Marshal, Walter Benjamin, Charles Baudelaire, dentre outras. Ressaltamos também os frutos dessa pesquisa como o Trabalho de Conclusão de Curso direcionado à temática em voga, a verificar a abordagem das faces gauche de Drummond que se revelam na poesia e na prosa, sob a perspectiva do pária na modernidade literária, bem como o trabalho apresentado no X Encontro de Letras da Unidade Universitária Cora Coralina da Universidade Estadual de Goiás, bem como a publicação no caderno de resumos do evento, também intitulado O gauche como pária na prosa e poesia de Carlos Drummond de Andrade. Assim, atestamos mais uma vez a pertinência do estudo proposto, bem como nos aprofundamos um pouco mais no riquíssimo universo drummondiano. Referências DO AUTOR ANDRADE, Carlos Drummond. Contos plausíveis (1ª ed.). Rio de Janeiro: José Olympio, Contos plausíveis. Rio de Janeiro: Record, Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, Contos de aprendiz. Rio de Janeiro: Record, SOBRE O AUTOR BRAYNER, Sônia (org.). Carlos Drummond de Andrade. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, (col. Fortuna Crítica). CAMILO, Vagner. Drummond. Da rosa do povo à rosa das trevas. São Paulo: Ateliê editorial, CANDIDO, Antonio. Inquietudes na poesia de Drummond. In: Vários escritos. São Paulo: Duas cidades Drummond prosador. in: ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Aguilar, Drummond prosador. Recortes. São Paulo: Companhia das Letras, Notas de crítica literária: "Confissões de Minas". Textos de intervenção. São Paulo: Duas cidades; Ed. 34, COSTA LIMA, Luiz. O princípio-corrosão na poesia de Carlos Drummond de Andrade. Lira & antilira. Mário, Cabral, Drummond. Rio de Janeiro: Topbooks, GLEDSON, John. Poesia e poética de Carlos Drummond de Andrade. São Paulo: Duas cidades, SANT ANNA, Afonso Romano de. Drummond: o gauche no tempo. Rio de janeiro: Record, SANTIAGO, Silviano. Carlos Drummond de Andrade. Petrópolis: Vozes, SILVA, Célia Sebastiana. A consciência crítica na prosa de ficção de Carlos Drummond de Andrade. Brasília: Departamento de literatura da UnB, SÜSSEKIND, Flora. Um poeta invade a crônica. Papéis colados. Rio de janeiro: UFRJ, 4
5 Curva curva curva: estratégia narrativa e forma poética em Drummond. Poesia Sempre. nº 18. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, setembro/2004. TELES, Gilberto Mendonça. A linguagem criadora de Drummond. in: ANDRADE, Carlos Drummond. Seleta em prosa e verso. Rio de Janeiro: Record, Drummond - a estilística da repetição. Rio de Janeiro: José Olympio, VILLAÇA, Alcides. Passos de Drummond. São Paulo: Cosac Naify, GERAL BAUDELAIRE, Charles. Sobre a modernidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas. Magia e técnica, arte e política. (vol.1). São Paulo: Brasiliense, A modernidade e os modernos. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,1975. BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar. São Paulo: Companhia das Letras, CANDIDO, Antonio. Vários escritos. São Paulo: Duas Cidades, HUGO, Victor. Do grotesco e do sublime. Tradução do prefácio de Cromwell.(trad. e notas Célia Berrettini). São Paulo: Perspectiva, SCHLEGEL, Friedrich. O dialeto dos fragmentos (tradução, apresentação e notas de Márcio Suzuki). São Paulo: Iluminuras, STAIGER, Emil. Conceitos fundamentais de poética (trad. Celeste Aída Galeão). Rio de Janeiro: Tempo brasileiro,
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