RECUPERAÇÃO LEXICAL E TEMPO DE ESPERA NA INTERPRETAÇÃO SIMULTÂNEA DE PALAVRAS DO PORTUGUÊS PARA A LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA
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- Heitor Castelhano Machado
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1 RECUPERAÇÃO LEXICAL E TEMPO DE ESPERA NA INTERPRETAÇÃO SIMULTÂNEA DE PALAVRAS DO PORTUGUÊS PARA A LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA Barbosa, FV*; Freitas, FA*; Thang, T*; Navas, ALGP**; Durant, AS** *Universidade de São Paulo **Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo Resumo A Interpretação Simultânea envolve uma série de habilidades cognitivas em conjunto com o conhecimento das línguas fonte e língua alvo. O intérprete em situação de Interpretação Simultânea executa a interpretação daquilo que ouviu no mesmo momento em que recebe outras informações a serem interpretadas em seguida e, ao mesmo tempo, monitora a qualidade de sua interpretação. Nesse processo destacam-se a memória operacional e a recuperação lexical como habilidades cognitivas imprescindíveis ao bom funcionamento deste exercício de interpretação. O presente estudo tem por objetivo analisar a interpretação de listas de palavras do português (língua fonte) na interpretação para a Língua de Sinais Brasileira (Libras, neste estudo, a língua alvo) no que se refere ao tempo de reação para a recuperação do item lexical da Libras correspondente à palavra do português e ao tempo de espera no exercício da Interpretação Simultânea. Foram elaboradas listas de palavras do português (substantivos e números) e organizadas em apresentações aleatórias e separadas em dois grupos de apresentação: listas com palavras separadas por intervalos de 700 milissegundos e listas com palavras apresentadas sem intervalo entre as apresentações. Os sujeitos ouviram as listas e realizaram a interpretação dos estímulos apresentados auditivamente. Os resultados iniciais mostram diferença estatisticamente significante entre o tempo de reação (latência) para recuperação do item lexical na língua alvo e o tempo de espera (lag time) para substantivos e números, assim como fraca correlação negativa entre o tempo de reação e o tempo de espera. 1
2 1.Introdução Diversos componentes cognitivos co-ocorrem no exercício da IS. A compreensão da língua fonte, a conversão para a língua alvo, o planejamento da produção, a produção propriamente dita são alguns dos mais identificáveis processos que estão envolvidos na interpretação e alguns deles ocorrem em paralelo. Por exemplo, a codificação, planejamento e produção da língua alvo ocorrem ao mesmo tempo em que novas informações da língua fonte estão sendo codificadas e interpretadas, o que exige um grande esforço de diversas estruturas cognitivas, entre elas, a memória (Lee, 2002). O conceito de memória de trabalho proposto por Baddeley et al. (1996) apresenta em sua definição as características de armazenamento, processamento e controle executivo de uma função cognitiva de grande importância, por exemplo, para o processamento das línguas naturais. No processamento da interpretação simultânea (IS) a memória de trabalho tem sido considerada uma habilidade fundamental e embora pesquisas possam apresentar diferentes resultados em estudos comparativos do perfil desta habilidade para grupos distintos (Timarová, 2008), todos concordam que o seu funcionamento é imprescindível para que a língua seja processada e para que a IS ocorra de forma adequadamente (Campos et al., 2009). A influência da memória de trabalho na IS pode ser percebida na importância da Recuperação Lexical (RL) e do Tempo de Espera 1 (TE) no processamento da interpretação. Diretamente ligados à memória de trabalho, a RL e o TE são fatores considerados preditores potenciais da qualidade da IS. Esses fatores, dentre outros, permitem que os processamentos das duas línguas envolvidas ocorram de forma equilibrada e dão condições para que o indivíduo faça a seleção lexical e use recursos interpretativos de diversas ordens de forma confortável. O TE é uma das poucas variáveis da IS observáveis e pode ser quantificada facilmente pelos pesquisadores do tipo de interpretação em questão (Lee, 2002). Trata-se da diferença de tempo entre a informação recebida pela língua fonte e a execução da interpretação para a língua alvo. É uma capacidade individual controlada pelo intérprete que, com o aumento do TE possibilita a redução da chance de equívocos com o aumento do potencial de compreensão 1 Lag Time ou Ear-Voice Span (EVS) 2
3 mas, por outro lado, sobrecarrega a memória de trabalho. A redução do TE, ao contrário, alivia a sobrecarga da memória de trabalho, mas aumenta a chance de erro (Duong, 2006). Outro fator de impacto na IS é a recuperação do item lexical na língua alvo. O tempo gasto pelo intérprete nesta tarefa deve ser o menor possível e essa recuperação deverá ocorrer de forma natural, sem grande esforço, facilitando o funcionamento de outros componentes cognitivos em processamento durante a atividade de interpretação. O TR, medida de tempo entre o estímulo dado e a execução da palavra na língua alvo, também influenciará na qualidade da IS. O objetivo deste estudo é analisar o desempenho de intérpretes na Interpretação Simultânea (IS) de lista de palavras (substantivos e números) com a comparação entre o Tempo de Reação (TR) ao estímulo lexical e o Tempo de Espera (TE) para os dois tipos de listas de palavras. 2.Métodos 2.1.Participantes Participaram desta pesquisa três intérpretes de Língua Brasileira com experiência mínima de cinco anos em IS. Todos os intérpretes são fluentes em Libras e Português e foram recrutados para participação na pesquisa através da indicação de profissionais da área. Foram agendadas sessões individuais com os participantes que se propuseram a participar voluntariamente. 2.2.Materiais - elaboração e controle do estímulo a ser apresentado A partir de dois tipos de listas matrizes de palavras (lista-matriz de substantivos e lista-matriz de números, cada uma com dez unidades distintas), foram elaboradas 4 listas-teste com repetição aleatória dos itens lexicais das listas matrizes durante 1 minuto. As listas-teste foram organizadas em blocos de forma que cada um desses blocos contivesse uma lista de substantivos e uma lista de números. Cada um dos blocos de listas foi submetido a um tratamento de controle do tempo de intervalo das apresentações dos itens lexicais, resultando 3
4 na organização dos estímulos em um bloco de listas com 700 milissegundos de intervalo entre as apresentações e um bloco de listas sem intervalo entre as apresentações. 2.3.Procedimentos Em sessões agendadas individualmente, as listas elaboradas e descritas no tópico anterior foram apresentadas aos sujeitos por um fone de ouvido estéreo. A instrução dada aos participantes foi de que poderiam realizar a interpretação da forma como costumavam realizar em suas práticas em IS. A atividade de interpretação a partir do estímulo apresentado foi capturada com filmadora digital e os dados arquivados para análise Análise dos dados Os vídeos obtidos na coleta de dados foram editados para utilização nos programas de análise utilizados. Foram usados o programa Sony Vegas Pro 11 para as análises que serão especificadas em seguida. Foi observado o comportamento linguístico na atividade de IS relativo ao tempo de reação na recuperação lexical (TR) e o tempo de espera (TE) no conjunto das listas de itens lexicais (listas-teste) e de acordo com as variáveis apresentadas (intervalo de apresentação do estímulo). Foi realizada a análise das médias de tempo de reação para a interpretação das palavras e comparados os resultados entre os blocos de palavras (substantivos e números e listas com e sem intervalo). Foi observado o uso de TE (média) calculado o TE máximo usada pelos intérpretes com a média dos cinco maiores TE consecutivos imediatos (sem erros intercalados). Os dados foram submetidos a análise estatística descritiva e inferencial, coma aplicação dos testes de Mann-Whitney e correlação simples entre variáveis, para a comparação das médias dos resultados e análise de correlação entre as respostas para TR e TE. 4
5 3.Resultados Foi utilizado o software Assistat (versão 7.6 beta, 2012) para o tratamento estatístico dos dados. Para a comparação dos valores médios de TR e TE foi usado o Teste de Mann- Whitney, testando a hipótese de serem os valores iguais para a comparação dos resultados obtidos com as listas de números e substantivos. Resultados iniciais mostram que a diferença de TR para palavras e números é estatisticamente significante (p-valor < 0.05; Z= 1.96). A média de TR para substantivos e números dos três sujeitos foi de 571,5ms e 298,5ms, respectivamente. Os resultados para o TE também mostram diferença estatística significante (p-valor < 0.05; Z= 1.96). A média do TE foi de 528,8ms para palavras e 386,7ms para números, com TE máximo de 1027,6 ms para palavras e 696,1ms para números. Os sujeitos não conseguiram interpretar corretamente uma sequência maior do que 5 itens mantendo TE maior do que o máximo apresentado (1027,6 ms e 696,1 ms). Também foi testada a correlação entre TR e TE com o teste de correlação simples entre variáveis e os dados iniciais mostram fraca correlação negativa entre TR e TE (p= -0,16). 4.Discussão As diferenças das médias para o TR e TE entre substantivos e números mostram que a latência para a recuperação do item lexical na língua alvo é maior do que a latência para recuperação de dígitos (números). Na apresentação on line dos estímulos (zero ms de intervalo), o TE foi menor do que a latência no tempo de reação. A co-ocorrência de informações processadas no momento da IS dos estímulos sem intervalo provocou o uso do TE pelos intérpretes que automaticamente passaram a processar o sinal de entrada com o de saída da mesma forma que costumam realizada na IS de textos. A literatura na área apresenta maiores extensões de TE (ver Lee, 2002), entretanto, são dados obtidos na IS de conteúdos organizados em textos falados, que permitem a associação semântica e sintática entre as partes do texto, além da compreensão e concatenação dos conceitos apresentados nos estímulos. Isso, com o acréscimo das informações obtidas por estudo de Campos et al. (2009) que elencam a organização de sentenças desconexas como um problema para a IS, nos 5
6 permite entender que o TE máximo encontrado no presente estudo não seria discrepante, dadas as diferenças metodológicas aqui apresentadas. O número de sinais corretos consecutivos na manutenção de TE longo (maior lag time) não foi superior a 5 itens. Na IS, a memória, a atenção e os sistemas de programação motora para a produção da língua alvo estão em exercício no processamento de duas línguas, o que sobrecarrega a memória de trabalho, e é provavelmente por esse motivo que se observa um número mínimo de itens corretos sendo executados juntamente com o TE longo. O TE está, então, relacionado diretamente com a memória operacional e, provavelmente, intérpretes com baixa latência no TR permitem que a memória operacional funcione mais livremente para o TE, o que aumentaria a capacidade de lag time desses indivíduos (correlação negativa). Entretanto, os dados iniciais encontrados neste estudo indicam fraca correlação entre o TR e TE. A casuística apresentada aqui ainda é pequena e é necessário que um maior número de dados seja coletado para que se corrobore a hipótese sugerida pelos dados apresentados neste artigo. Uma hipótese que pode ser formulada para explicar a fraca correlação é a de que os mecanismos da memória operacional subjacentes ao TR e TE sejam diferentes. Enquanto na recuperação lexical temos a evocação do item lexical como foco, principalmente no uso da alça fonológica, o TE usa principalmente o executivo central e buffer episódico com a atividade de armazenamento da informação por um período curto de tempo. Referências Bibliográficas BADDELEY, A; DELLA SALA, S; ROBBINS, TW. Working Memory and Executive Control. Philosophical Transactions: Biological Sciences, Vol. 351, No CAMPOS, VP; VISINTIN, AZ; BARUCH, RC. Main problems of language and communication in interpretation. V Foro de Estudios en Lenguas Internacional
7 DUONG, TT. How to improve short-term memory in interpreting. Hanoi University of Foreign Studies LEE, TH. Ear Voice Span in English into Korean Simultaneous Interpretation. Meta:Translators' Journal, vol. 47, n 4, TIMAROVÁ, S. Working Memory and Simultaneous Interpreting, in: BOULOGNE, P (ed.). Translation and Its Others. Selected Papers of the CETRA Research Seminar in Translation Studies
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