Introdução. 1 Pesquisador do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-história da Universidade Estadual de Maringá
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- Filipe Lencastre Casqueira
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1 Glauco Constantino Perez 1. Grafismo Guarani: um estudo do acervo cerâmico do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-história. (UEM mestrando 2 ) Introdução O historiador procura estudar as sociedades do passado mais remoto da humanidade nos seus aspectos mais diversos: físico, demográfico, patológico etc. Contudo não dispões de documentos escritos propriamente ditos e acabam utilizando vestígios materiais deixados por essas sociedades, que são encontrados em sítios arqueológicos e coletados por meio das mais diversas técnicas que a arqueologia pode nos oferecer. Neste artigo objetiva-se apresentar os grafismos impressos nas cerâmicas arqueológicas Guarani, esta uma cultura arqueológica que recebeu um nome que lembra um grupo indígena conhecido historicamente, como uma forma de espelho para o passado desse grupo social. Os Guarani tinham em seu poder o manejo de adequadas para a fabricação de cerâmica que se tornou importante nos últimos três milênios. A vasilha cerâmica dentro do grupo social Guarani não acompanhava necessariamente as andanças, tendo, sobretudo, seu lugar nos aldeamentos de base e é importante destacar que dependendo da região de fixação de um determinado grupo pode-se perceber a especificação na escolha de partículas anti-plásticas colocadas no barro a fim de se evitar rachaduras durante a sua queima 3. Para La Salvia e Brochado, o acabamento de superfície nem sempre tem uma finalidade simplesmente decorativa, por vezes sua intenção é utilitária. Na face interna a forma e o fim a que se destina a vasilha irão determinar o tipo de acabamento e a respectiva ação a ser desenvolvida, normalmente de alisamento natural ou com o uso da barbotina. Esses autores nos proporcionam o entendimento de que a pintura não é uma simples manifestação de vontades, mas algo que está ligado ao processo de origem do grupo, já os motivos impressos nela seriam representações de entidades, animais ou vegetais que estariam ali simbolizados. Sua alternância entre a borda e o bojo estaria ligados à que se destinaria ou a quem iria utilizar. Há segundo estes autores, uma constância do pintado, quanto externo alcança sempre até o diâmetro maior, seja nas vasilhas grandes ou pequenas; quando interno ocupa, normalmente toda a área disponível. Dessa forma, a pintura possui uma relação maior com o 1 Pesquisador do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-história da Universidade Estadual de Maringá Maringá/PR e mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Estadual de Maringá UEM. 2 Lucio Tadeu Mota (UEM Professor Doutor) orientador da pesquisa. - Pesquisador do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-história da Universidade Estadual de Maringá Maringá/PR e pós-doutor pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, UFRJ. 3 PROUS, André. Arqueologia brasileira. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília, p. 390.
2 grupo e sua tradição, do que com o tipo ou a variação da decoração plástica e a interpretação dos motivos na pintura só poderão ser feitas e fixadas, espacial e cronologicamente se estudarmos a cultura Guarani como um todo e não na compartimentação das fases dentro dos espaços com a abrangência de momentos que chegam a durar séculos ou até milênios. É importante destacar, de acordo com Francastel que qualquer obra humana geradora de um produto é, de certo modo, uma arte 4. Este autor considera que a obra do espirito em si mesma, como um microcosmo que reflete necessariamente a totalidade do seu universo, só encontra personalizada na medida em que seleciona e organiza elementos da sua realidade. Francastel, ainda apresenta a idéia de que um [...] objeto artístico não é apenas um fenômeno estético, ele está incrustado na realidade humana e social, através de uma rede complexa de relações. Isso significa considerar uma obra o signo correspondente a realidade do artista 5. Com isto entende-se que os trabalhos artísticos sempre estão ligados ao seu significado momentâneo e sua interpretação recorrente nos permite conhecer quem o executou e por reflexo, a sua sociedade. Assim o estudo recorrente dos grafismos cerâmicos nos permite conhecer o artesão que executou o trabalho, toda sua gama de habilidades manuais, cognitivas e psicológicas e por fim, como um reflexo disso tudo, a sua sociedade. Nesta perspectiva, o registro arqueológico deixado pelas populações Guarani pode ser analisado do ponto de vista de sua dimensão simbólica buscando ser identificado como parte de um sistema de representações visuais (grafismos). Assim, pretende-se juntamente com estudos realizados por Sérgio Baptista da Silva, de estudo da cultura material e das manifestações estéticas da sociedade indígena Guarani, lançam luz sobre o sistema de representações visuais (cultura material e grafismos) dos antecedentes dessa sociedade. Arte e grafismo Guarani A arte contribui para que os indivíduos fixem as representações sobre si mesmas, sobre o mundo e sobre seus modos de pensar-se. Porém, diante da amplitude desse assunto que compõem e que o cerca, necessita-se que exista um recorte do mesmo. Nesse sentido pode-se abrir mão de uma discussão mais ideológica sobre a qualidade dos aspectos a fim de preservar o foco deste estudo nos grafismos Guaranis. Historicamente, as noções contemporâneas sobre arte foram geradas por transformações que acompanharam os processos históricos. Antes disso, ela se aproximava mais da função 4 FRANCASTEL, Pierre. A imagem, a visão e a imaginação. Paris, p FRANCASTEL, Pierre. A imagem, a visão e a imaginação. Paris, p. 23.
3 social de transmitir idéias e valores de seu tempo. Hoje, a arte constitui expressão consciente e livre do artista elaborada na [...] construção de um modo de percepção propriamente estético que situa o princípio da criação artística na representação e não na coisa representada e que nunca se afirma tão plenamente como na sua capacidade de constituir esteticamente os objetos baixos ou vulgares do mundo moderno 6. Sendo assim, os valores com os quais apreciamos os objetos artísticos estão voltados para a compreensão da arte a partir dos modelos europeus ocidentais, fechados em um tempo histórico e projetados dentro de padrões sociais específicos. No entanto, não podemos deixar de destacar o poder dos museus como uma das instituições legitimadoras da arte, capaz de criar categorias para incluir objetos da cultura material no patamar artístico. Dessa forma se observa a formação de um objeto da pré-história ganhando o status de arte pré-histórica. Para chegarmos a uma concepção da arte que possa ser empregada no tempo e no espaço, é necessário consideramos noções diversas de contextos e historicidade. Desse modo, o objetivo não é chegar a um conceito de arte capaz de congregar as manifestações estéticas consagradas como arte por determinado contexto social e histórico; o que se pretende é levantar outras classificações da arte, que possam alcançar fundamentos para a compreensão do grafismo com uma forma de cultura. Levando-se em conta que há uma distância temporal que deve ser considerada e se nos referimos a esta manifestação enquanto artística é porque a sensibilidade estética expressa nela, de alguma forma, chama a atenção. Para uma apropriada relativização do conceito de arte, Ludimília J. de Mello Vaz 7 relata que Clifford Geertz considera as diferenças culturais em sua análise sobre a arte como um sistema cultural. Segundo o autor, a arte é construída pela sensibilidade em conexão com a experiência humana. Esta definição dá ênfase não só ao universo do artista como também ao universo que o envolve. A arte se forma dentro das relações culturais e é neste campo que se legitima e faz com que seja compreendida. Além dos elementos formais, que dão materialidade à arte deve-se levar em consideração os significados sociais desses elementos, já que o laboratório do artista é a vida cotidiana, local onde é elaborada e reelaborada nossa compreensão do mundo, nossa noção de bem e mal, belo e feio, ou seja, nossos valores. Conforme Mello Vaz indica penetramos na compreensão da arte especialmente direcionada às culturas ágrafas e percebemos que ela é uma expressão simbólica identificada e compreendida pela comunidade que a produziu. 6 BOURDIEU, P. O poder simbólico. 6ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, p MELO VAZ, L. J.. A arte rupestre e sua relação com a contemporaneidade. In: 13º Encontro Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, 2004, Brasília. Arte em pesquisa: especificidades. Brasília : Editora da Pós-graduação em Artes da Universidade de Brasília, v. 1. p.3.
4 Dessa forma, a autora afirma que a arte gráfica dessas etnias já foi empreendida por estudiosos da antropologia, arqueologia e história fundamentados em Lévi-Strauss e demonstram que nos elementos plásticos da arte de grupos primitivos estão registrados as crenças, fruto da vivência social e do conhecimento por eles adquiridos. E as manifestações culturais correspondem a um conjunto orgânico onde o estilo, as convenções estéticas, a organização social e a vida espiritual estão estruturalmente ligados. Deve considerar-se que em algumas sociedades não há um termo definido sobre o que é a arte onde estão incluídas as manifestações estéticas, mas nem por isso ela deixa de existir. Nesse sentido, o fato é que estas manifestações estão dissimuladas nas danças ritualísticas, pintura corporal, adornos, ou representação dos seres superiores em máscaras, totens ou objetos 8. Como se observa os grafismos elaborados pelas populações Guarani compreendem uma manifestação estética do passado ligada às experiências cotidianas daqueles que as produziram. Para o mundo contemporâneo, esses grafismos podem sem vistos pelo valor histórico e artístico, mas fora do discurso moderno de arte é respeitado como patrimônio cultural. Para Ulpiano Bezerra de Menezes, em Identidade cultural e arqueologia, a preservação do patrimônio arqueológico se justifica pelos vínculos afetivos do homem com o seu espaço: espaços que vêm assim a funcionar como suporte de comunicação, de inter-relação, de organização de sentido e, enfim, de fecundidade: terra matriz e motriz 9. Esta forma de manifestação estética compreendida como o grafismo cerâmico Guarani não deixa de se integrar ao tempo presente, porém deve ser considerada como um sistema de significação mais complexa do que aqueles aceitos normalmente, tais como, a representação do mundo das coisas e o poder mágico das imagens 10. Nesse sentido, o grafismo deve ser encarado como um estilo de representação imagética, levando-se em consideração toda a gama de habilidades manuais, cognitivas e psicológicas de uma população. Córrego da Lagoa 2: um acervo e um espelho para o passado Com o que foi destacado, sobre arte e os grafismos em si pretende-se apresentar algumas reflexões sobre o acervo cerâmico Guarani, que em um primeiro momento resultou em uma dissertação de mestrado apresentado ao Curso de pós-graduação em História Social na Universidade Estadual de Maringá por Ana Paula Simão, e que atualmente esta sob pesquisa do 8 MELO VAZ, L. J.. A arte rupestre e sua relação com a contemporaneidade. In: 13º Encontro Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, 2004, Brasília. Arte em pesquisa: especificidades. Brasília : Editora da Pós-graduação em Artes da Universidade de Brasília, v. 1. p.3. 9 BEZERRA DE MENEZES, U. Identidade cultural e arqueologia. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. n. 20. p PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília, p. 539.
5 autor deste artigo com um trabalho de mestrado intitulado Etnoarqueologia dos grafismos guarani: estudo do acervo cerâmico do Sítio Arqueológico Lagoa Xambrê Altônia PR. Nesse sentido sabe-se que as pesquisas arqueológicas realizadas pela equipe do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-História (LAEE) Programa Interdisciplinar de Estudos de População, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), entre janeiro de 1996 e janeiro de 1997, resultaram em uma das maiores coleções brasileiras obtidas em um único sítio arqueológico, totalizando peças 11. A área do sítio Córrego da Lagoa 2, localizado às margens da Lagoa Xambrê, junto ao rio Paraná (23 o S/53 o W), no município de Altônia, Estado do Paraná, é de aproximadamente metros quadrados, com uma espessura média de oito centímetros, correspondendo ao piso e às áreas de uma habitação típica de uma família extensa 12. Partindo dos pressupostos estabelecidos por Brochado e Monticelli, o trabalho de Ana Paula Simão focou seus estudos nos fragmentos. Eles foram separados em conjuntos levando em consideração os tipos de tratamentos de superfície, porque o objetivo de Simão era o de realizar as reconstruções gráficas do acervo. No conjunto de fragmentos separados quanto à pintura, em uma primeira análise, pode observar-se que as cerâmicas receberam tintas básicas que podem ser tanto de origem vegetal, quanto mineral. As peças que receberam as tintas vegetais seriam nas tonalidades preta, vermelha e amarela, e as com tintas minerais seriam as tonalidades brancas, vermelhas e ocre 13. O total de fragmentos pintados é de 3.985, sendo que têm sua pintura realizada sobre uma camada de tinta aplicada inicialmente, chamada de engobe, sendo 75% desses fragmentos; os outros 25% são de pinturas realizadas na superfície natural das vasilhas 14. Nesta perspectiva, o registro arqueológico deixado pelas populações Guarani pode ser analisado do ponto de vista de sua dimensão simbólica buscando ser identificado como parte de um sistema de representações visuais: os grafismos. Para Silva, a arqueologia cognitiva não é o estudo de aspectos econômico, de dieta e de padrões de assentamentos, como querem muitos profissionais da arqueologia de subsistência/assentamento. Igualmente ela não é o estudo de epifenômenos. É o estudo de todos os aspectos de uma antiga cultura que são o produto da mente humana: a percepção, 11 SIMÃO, Ana Paula Do caco ao fragmento: análise da coleção cerâmica guarani do sítio arqueológico Lagoa Xambrê Altônia/PR. Dissertação de mestrado. Maringá p.1 12 SIMÃO, Ana Paula. Do caco ao fragmento: análise da coleção cerâmica guarani do sítio arqueológico Lagoa Xambrê Altônia/PR. Dissertação de mestrado. Maringá p.1 13 SIMÃO, Ana Paula. Do caco ao fragmento: análise da coleção cerâmica guarani do sítio arqueológico Lagoa Xambrê Altônia/PR. Dissertação de mestrado. Maringá p SIMÃO, Ana Paula. Do caco ao fragmento: análise da coleção cerâmica guarani do sítio arqueológico Lagoa Xambrê Altônia/PR. Dissertação de mestrado. Maringá p.73.
6 descrição e classificação do universo (cosmologia); a natureza do sobrenatural (religião); os princípios, filosofias, éticas e valores pelos quais as sociedades humanas são governadas (ideologias); as maneiras como aspectos do mundo, do sobrenatural ou valores humanos são transferidos para a arte (iconografia); e todas as outras formas do comportamento intelectual e simbólico que sobreviveu no registro arqueológico 15. Assim para a construção de aspectos cognitivos do passado, as fontes etno-históricas precisam ser consultadas e os levantamentos etnográficos precisam ser empreendidos. A aproximação epistemológica aos dados etno-históricos e às informações etnográficas torna possível a possibilidade analítico-interpretativa dos aspectos de uma antiga cultura, conectando os estudos de uma arqueologia cognitiva com as abordagens atuais sobre arte indígena, que não consideram as manifestações estéticas como esfera residual ou independente do contexto no qual aparecem. O estudo dos grafismos do acervo cerâmico Guarani trás um passado distante para a nossa realidade e através do estudo desses grafismos impressos na superfície da cerâmica deixa de ser apenas uma peça antiga e fragmentada e passa as ser uma peça carregada de sentido utilizando da forma simbólica de expressão cultural, o próprio grafismo, para entender a sociedade que a produziu, já que o acabamento de uma cerâmica, como relata Brochado não é uma simples manifestação de vontades próprias do artesão, mas algo que está ligado ao processo de origem do grupo 16. Nesse sentido, um objeto artístico não é nunca apenas um fenômeno estético, está incrustado na realidade humana e social, através de uma rede complexa de relações. Pensa-se poder resolver o problema atribuído ao signo um valor simbólico. Isso significa, uma vez mais, considerar que a obra, o signo, corresponde, global e completamente a outra coisa que não aquilo que são 17. Assim, entende-se que os trabalhos artísticos sempre estão ligados ao seu significado momentâneo e sua interpretação recorrente nos permite conhecer quem o executou, sua intencionalidade, os motivos que o levaram a desenhar de uma maneira e não de outra e por fim e reflexo disso tudo, a sua sociedade. Tenta-se observar o grupo social através de uma cultura material, como se esta fosse um par de óculos que desse ao historiador a oportunidade de colocar em foco a sociedade que produziu tal objeto. Assim o estudo recorrente dos grafismos nos permite conhecer o artesão, ou 15 SILVA, Sergio Batista da. Iconografia e ecologia simbólica: retratando o cosmos guarani. IN: PROUS, André; LIMA, Tânia Andrade (orgs.). Ceramistas Tupiguarani. no Prelo. p LA SALVIA, Fernando; BROCHADO, José P. Cerâmica Guarani. Porto Alegre: Pesenato Arte e Cultura, p FRANCASTEL, Pierre. A imagem, a visão e a imaginação. Paris, p. 25.
7 melhor, a artesã, que executou o trabalho, toda sua gama de habilidades manuais, psicológicas, matérias e biológicas. Com isso, pode-se pensar na cerâmica Guarani como uma forma de espelho para o passado no sentido próprio da palavra, objeto que reflete uma imagem. O grafismo na cerâmica Guarani reflete e se remete ao passado mostrando uma imagem de uma sociedade carregada de princípios, habilidades e cognições. As manifestações estéticas indígenas são sistemas de representação que procuram explicitar como a sociedade pensa a si própria e o mundo que a rodeia. Nesse sentido são encaradas como um código visual de comunicação, dos conteúdos semânticos 18. O estudo dos grafismos do acervo cerâmico Guarani trás um passado distante para a nossa realidade e através de pesquisas deixa de ser apenas uma peça antiga e fragmentada e passa as ser uma peça carregada de sentido. Considerações finais Pode observar-se que de acordo com tudo o que foi apresentado durante este artigo vale a pena elencar algumas informações que podem ser utilizadas na análise dos grafismos Guarani, tanto quanto outras formas de pintura, como as pinturas rupestres, os grafites modernos, pinturas corporais de varias outras etnias e tantas outras formas de grafismos que se apresentam na cultura passada e também na moderna. Vale lembrar que um grafismo, seja ele qual for, não reflete a vontade própria do artesão que a produz. A prática está sempre carregada de informações culturais e sociais do grupo sendo que o laboratório do artista é a sua vida cotidiana, local onde ele elaborada e reelaborada sua compreensão de mundo, sua noção de bem e mal, belo e feio, ou seja, sues valores. Como pode-se perceber, a manifestação estética do passado apresentada nos grafismos elaborados pelas populações Guarani estão ligadas às experiências cotidianas daqueles que as produziram. Para os dias atuais, esses desenhos feitos por essas sociedades ágrafas podem sem vistos pelo valor histórico e artístico, mas fora do discurso moderno de arte é respeitado como patrimônio cultural. Nesta perspectiva, um registro arqueológico deixado por essas populações deve ser analisado do ponto de vista de sua dimensão simbólica buscando ser identificado como parte de um sistema de representações visuais: os grafismos. O estudo dos grafismos do acervo cerâmico Guarani trás um passado distante para a nossa realidade e através do estudo desses grafismos 18 SILVA, Sergio Batista da. Iconografia e ecologia simbólica: retratando o cosmos guarani. IN: PROUS, André; LIMA, Tânia Andrade (orgs.). Ceramistas Tupiguarani. no Prelo. p.2
8 impressos na cerâmica deixa de ser apenas uma peça antiga e fragmentada (caco) e passa as ser uma peça carregada de sentido social (fragmento) utilizando da forma simbólica de expressão cultural. A partir, portanto, do estabelecimento desse trabalho, que abrange a arte e a estruturação social Guarani, pretende-se colaborar para o avanço teórico e metodológico das análises arqueológicas que envolvem populações Guarani, especificamente no que diz respeito ás relações entre cultura e arte, enfatizando teórica e metodologicamente uma ação interpretativa, cognitiva e simbólica sobre o passado. Por fim, é importante ressaltar que este artigo e outros trabalhos que vêm sendo realizados atendem a um objetivo maior, que é o de afirmar a cultura Guarani como um grupo social, sendo ela capaz de reduzir as fronteiras interétnicas no meio cultural e social em que está inserida. Além disso, também este artigo visa ser mais um passo na direção de confirmar de uma hipótese de estudo de que os grafismos das cerâmicas são mais do que simples desenhos decorativos, eles configuram verdadeiros códigos de informação visual capazes de expressar as crenças, histórias e fragmentos de uma cultura. Referencias teóricos BEZERRA DE MENEZES, U. Identidade cultural e arqueologia. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. n BOURDIEU, P. O poder simbólico. 6ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro FRANCASTEL, Pierre. A imagem, a visão e a imaginação. Paris, LA SALVIA, Fernando; BROCHADO, José P. Cerâmica Guarani. Porto Alegre, Posenato Arte e Cultura, MELO VAZ, L. J.. A arte rupestre e sua relação com a contemporaneidade. In: 13º Encontro Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas, 2004, Brasília. Arte em pesquisa: especificidades. Brasília : Editora da Pós-graduação em Artes da Universidade de Brasília, v. 1. p
9 OLIVEIRA, Josilene A. de. História da arqueologia paranaense: um balanço da produção arqueológica no Estado do Paraná no período de Dissertação (mestrado em história) UEM/UEL. Maringá, PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília, SIMÃO, Ana Paula. Do caco ao fragmento: análise da coleção cerâmica guarani do sítio arqueológico Lagoa Xambrê Altônia/PR. Dissertação de mestrado. Maringá SILVA, Sergio Baptista da. Etnoarqueologia dos grafismos kaingáng: um modelo para a compreensão das sociedades proto-jê meridionais. Tese de doutorado. São Paulo,
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