TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL N.º

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1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL N.º APELANTE: CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL - CASSI APELADO: ALBERT RAYMOND HESSE RELATOR: DESEMBARGADOR CLEBER GHELFENSTEIN DECISÃO MONOCRÁTICA DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FORNECIMENTO DE SERVIÇO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. RECUSA PELO RÉU DA COBERTURA DE EXAME PET-SCAN ONCOLÓGICO, SOB A ALEGAÇÃO DE QUE O CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES NÃO PREVÊ O PROCEDIMENTO REQUERIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE, CONFIRMANDO A TUTELA CONCEDIDA E CONDENANDO A RÉ AO PAGAMENTO DOS DANOS MORAIS. APELAÇÃO DO RÉU BUSCANDO IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. A ESCOLHA DOS PROCEDIMENTOS NECESSÁRIOS E ADEQUADOS AO PACIENTE CABE AO MÉDICO INCUMBIDO DE SEU TRATAMENTO. PROCEDIMENTO MÉDICO SOLICITADO QUE É INSUBSTITUÍVEL E A SUA NEGATIVA EM AUTORIZÁ-LO COLOCA A VIDA E A SOBREVIVÊNCIA DO PACIENTE EM RISCO, EM TOTAL AFRONTA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DANO MORAL CONFIGURADO. FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO QUE DEVE SER EQUILIBRADA E OBSERVAR OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. NA ESPÉCIE, REVELA-SE EXACERBADO O VALOR ARBITRADO, MERECENDO REDUÇÃO. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA ACERCA DO TEMA. DOU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO, NA FORMA DO ARTIGO 557, 1º-A, DO CPC, APENAS PARA, REPARANDO A SENTENÇA, MINORAR O VALOR COMPENSATÓRIO POR DANO MORAL PARA R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS). 1

2 Trata-se de ação de obrigação de fornecimento de serviço com pedido de antecipação dos efeitos da tutela proposta por ALBERT RAYMOND HESSE em face CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL - CASSI, objetivando, em antecipação de tutela, a autorização para a realização do exame PET SCAN. No mérito, requer a confirmação da tutela concedida, bem como, a condenação do réu ao pagamento de 60 salários mínimos a título de danos morais. Alega o autor, em síntese, ter setenta e quatro anos de idade e ser beneficiário do plano de saúde fornecido pela empresa ré, desde 1998, estando com o pagamento de suas obrigações em dia, sendo portador de Linfoma Não-Hodgkin, tendo se submetido a tratamento com quimioterapia. Aduz que foi solicitada por seu oncologista a realização do exame Pet-Scan (fls. 25/26), com o objetivo de se confirmar a presença de doença residual, e em caso positivo, necessitará o paciente de extensão do tratamento com quimioterapia visando a cura. Entretanto, o exame não foi autorizado pela empresa ré. Decisão às fls. 38 deferindo a antecipação de tutela. Contestação às fls. 43/56, em que alega a ré, em síntese, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, que o contrato firmado entre as partes não prevê a cobertura do procedimento requerido pelo autor, que o contrato do autor é anterior a lei 9.656/98 e que inexiste dano moral indenizável. Requer a improcedência do pedido inicial. Sentença às fls. 97/101, que julgou procedente em parte o pedido autoral, confirmando a tutela anteriormente deferida, condenando a ré ao pagamento da quantia de R$ ,00 (dez mil reais), a título de danos morais, acrescida de juros legais a contar da citação e correção monetária da data desta sentença, bem como ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação. Apelação da empresa demandada às fls. 102/113, repisando os argumentos de sua peça de bloqueio, requerendo que seja dado provimento ao recurso, com a improcedência dos pedidos iniciais. Contrarrazões às fls. 119/126 pela manutenção in totun da sentença prolatada. É o sucinto relatório. Passo a decidir. De início, cumpre mencionar que encontram-se presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, razão pela qual dele conheço. 2

3 Matéria de entendimento consolidado na jurisprudência deste e dos Tribunais Superiores, suportando o proferimento de deliberação monocrática pelo relator, na forma do artigo 557 do CPC, eis que a ratio essendi do dispositivo, com a redação dada pelo art. 1º da Lei 9.756/98, visa a desobstruir as pautas dos tribunais, dando preferência a julgamentos de recursos que encerrem matéria controversa. Versa a presente lide acerca de obrigação de fazer e pedido compensatório por danos morais em razão da negativa de autorização pela empresa ré da realização do exame denominado PET-SCAN A sentença confirmou a antecipação de tutela concedida e condenou a ré a autorizar a realização do exame descrito na inicial, bem como compensá-la pelos danos morais sofridos e ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios. Insurge-se a parte ré, ora apelante, contra esta decisão, sob os argumentos de que o contrato celebrado entre as partes exclui claramente a cobertura do procedimento requerido, e que ao negar a autorização para a realização do exame, agiu dentro dos limites estabelecidos no contrato. Por fim, alega que eventual inadimplemento contratual não gera compensação por dano moral em favor do autor. Em verdade, a sentença merece pequeno reparo. Considerando como consumidor todo aquele que utiliza serviço como destinatário final (art. 2 da Lei n 8,078/1990), e fornecedor a pessoa jurídica que presta serviços mediante remuneração (art. 3 e 2 da Lei 8.078/1990, observando-se a existência, na presente situação, de uma relação de consumo, na qual devem ser aplicadas as disposições de proteção, estatuídas principalmente no art. 6 do CDC. Verifica-se, no caso em tela, que houve recusa por parte da ré em autorizar a realização do exame Pet-Scan, sob o fundamento de que o contrato firmado entre as partes não prevê a cobertura para tal procedimento. Contudo, o exame em tela é muito importante para os portadores de doenças tumorais, sendo que a partir de 1º de janeiro do corrente ano, ele passou a constar do rol dos procedimentos de cobertura obrigatória relacionados pela Agência Nacional de Saúde. Ademais, é de se convir de que a escolha dos procedimentos necessários e adequados ao paciente cabe ao médico incumbido de seu tratamento, o que foi feito pelo laudo médico às fls. 25/26. Por tais motivos, em que pesem as ponderações da ré, fato é que o procedimento médico solicitado é insubstituível e a sua negativa em 3

4 autorizá-lo coloca a vida e a sobrevivência do paciente em risco, em total afronta ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Nesse diapasão, diante da gravidade do diagnóstico apresentado pelo autor, a inércia da empresa de saúde em autorizar o procedimento apontado na inicial revela-se abusiva, contrariando a boa-fé do consumidor, eis que veda a realização da expectativa legítima da prestação dos serviços almejados em clara desobediência à prescrição médica. Tal conduta ameaça o próprio objetivo do contrato que é o fornecimento do serviço de saúde, o que implica em forte desequilíbrio contratual. Afigura-se, assim, a responsabilidade objetiva da ré, por evidente defeito na prestação de serviço, fundada no artigo 14, caput e 1º do CDC. Neste sentido pronuncia-se a jurisprudência desta E. Corte, como demonstrado a seguir: APELACAO - DES. JOSE C. FIGUEIREDO - Julgamento: 29/08/ DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL RECUSA INJUSTIFICADA PARA AUTORIZAÇÃO DE EXAMES. AUTORA PORTADORA DE LINFOMA DE HODGKIN (CÂNCER). EXAME DE PET-SCAN. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA BOA FÉ E DA CONFIANÇA. SEGURADA QUE CUMPRE FIELMENTE AS SUAS OBRIGAÇÕES. RISCO QUE É DA ESSÊNCIA DO CONTRATO DE SEGURO. PONDERAÇÃO DE INTERESSES. DIREITO À SAÚDE E À VIDA QUE SOBREPÕE A EVENTUAIS TABELAS ELABORADAS PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE. O contrato de seguro saúde deve ser interpretado da forma mais favorável ao consumidor e, havendo risco de vida, devem ser afastadas as cláusulas contratuais que excluem da cobertura o custeio dos materiais necessários à cirurgia urgente e necessária. IMPROVIMENTO DO RECURSO APELACAO - DES. MARCIA ALVARENGA - Julgamento: 15/05/ DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. SEGURO SAÚDE. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE PROTEÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA A FIM DE COMPELIR A RÉ A AUTORIZAR O EXAME SOLICITADO DENOMINADO PET SCAN. MATÉRIA AFETA À PRESERVAÇÃO DO DIREITO À VIDA E À SAÚDE. É ABUSIVA A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE EXCLUI A COBERTURA DE EXAME NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DA CONSUMIDORA. DANOS MORAIS 4

5 CONFIGURADOS E FIXADOS EM DESCONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO DESTA CORTE. RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO, COM FULCRO NO ART. 557, 1 - A, DO CPC. Destaque-se que não se trata de mero inadimplemento contratual relativo a direitos patrimoniais disponíveis, uma vez que, versando a contratação relativamente à saúde, incorpora direitos fundamentais regulados constitucionalmente, merecendo tratamento diferenciado em face das consequências nefastas decorrentes da inadimplência da prestadora. A angústia e o sofrimento por que passa o autor são indubitáveis, sendo agravados face a inércia da ré em autorizar o procedimento apontado na inicial, gerando constrangimento e abalo emocional que fogem à normalidade da vida cotidiana. A conduta da ré deve ser punida a título de danos morais, como bem entendeu o juízo aquo, cuja indenização, decerto, tem também um cunho punitivo e deve ser imposta quando o comportamento do ofensor se revela reprovável, como é o caso dos autos. A matéria referente à fixação de indenização por danos morais, no Direito Brasileiro, é delicada, e fica sujeita à ponderação do magistrado, fazendo-se necessário, para encontrar a solução mais adequada, que se observe o princípio da razoabilidade, tal como já decidido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, não havendo critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, sendo, portanto, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação e atendendo às peculiaridades do caso concreto (in RESP ; Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; DJ 29/10/2002). Ademais, conforme destacou o Ministro Humberto Gomes de Barros a indenização por dano moral observando critérios como o poder financeiro do ofensor e da vítima, o grau de reprovabilidade e a culpa, dentre outros deve ser tal a intimidar novas condutas ofensivas, mas não pode ser fonte de enriquecimento da vítima (in REsp /MA, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em , DJ p. 392). Com efeito, o juiz deve adotar critérios norteadores da fixação do valor da condenação, onde deve levar em conta o grau de culpa do agente, eventual culpa concorrente da vítima e condições econômicas das partes. Tenho que, no caso em concreto, não obstante a efetiva ocorrência do dano há de se considerar na fixação do quantum compensatório os critérios de moderação e razoabilidade que informam os parâmetros avaliadores adotados por esta Corte. 5

6 Assim, em observância aos critérios acima mencionados e atento às peculiaridades do caso em questão, entendo que a quantia indenizatória fixada pelo juízo a quo, no valor de R$ R$ ,00 (dez mil reais), revela-se exacerbada, devendo sofrer minoração para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), representando, pois, tal montante o espírito de proporcionalidade e razoabilidade. Neste sentido, colacionam-se os julgados abaixo: ª Ementa -APELACAO DES. CELIA MELIGA PESSOA - Julgamento: 02/05/ DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C IN-DENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. INDEVIDA NEGATIVA DE ATENDIMENTO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 13, INCISO II, DA LEI 9658/98. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. (...) o tratamento indispensável à manutenção da saúde e da vida. Dano moral caracterizado. Precedentes do STJ. Valoração. Critérios norteadores. Repercussão do dano. Quantum indenizatório (R$ 5.000,00), em consonância com a lógica do razoável e com a média dos valores aplicados em casos similares. Precedentes do TJRJ. Sentença em testilha com jurisprudência dominante do STJ e do TJRJ. Art. 557, 1º-A, do CPC. PROVIMENTO DO RECURSO APELACAO-1ª Ementa- -DES. BERNARDO MOREIRA GARCEZ NETO - Julgamento: 05/10/2011 DECIMA CAMARA CIVEL Consumidor. Plano de saúde. (...) Dano moral caracterizado. Consumidor que, em momento de angustia, vê agravada sua situação pela negativa da empresa de seguro saúde. Inaplicabilidade da Súmula 75 do TJ-RJ. Repetida jurisprudência do STJ no sentido de que a recusa, em tais situações, não é "mero inadimplemento contratual". Indenização de cinco mil reais que está destro dos padrões estabelecidos por esta Décima Câmara Cível. Sentença mantida. Seguimento negado ao apelo da ré. Prejudicado o recurso do autor. 6

7 Destarte, porquanto examinou com perfeição os fatos e aplicou corretamente o direito, a sentença não merece reparo, salvo o atinente ao valor arbitrado a título de dano moral. Sem mais considerações, dou parcial provimento ao apelo, na forma do artigo 557, 1º-A, do CPC, apenas para, reparando a sentença, minorar a compensação pecuniária por dano moral para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Rio de Janeiro, de setembro de DESEMBARGADOR CLEBER GHELFENSTEIN RELATOR 7