Avaliação das preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará, por meio de Provas de precipitina *
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1 267 Avaliação das preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará, por meio de Provas de precipitina * Deane, L. M. Vernin, C. S. Damasceno, R. G. Programa da Amazônia do Serviço Especial de Saúde Pública. Para determinar as preferências alimentares dos anofelinos reconhecidos como importantes transmissores de Malária em Belém, Pará, o Anopheles darlingi e o Anopheles aquasalis (= tarsimaculatus), realizamos de fevereiro a dezembro de 1948 as provas aqui descritas. Tais provas consistiram em verificar, por meio de imuno-reações de precipitação, a natureza do sangue contido no tubo digestivo de fêmeas de anofelinos colhidas em gaiolas onde haviam sido sôltas na véspera e onde haviam pernoitado, além do homem, sete espécies de animais domésticos mais comuns na localidade. Para comparar as predileções demonstradas nessas experiências com as evidenciadas pelo exame de mosquitos apanhados dentro de habitações humanas, executamos também uma série de provas com exemplares obtidos na mesma época, em capturas domiciliares. Provas de precipitina já haviam sido anteriormente feitas com o conteúdo gástrico de anofelinos capturados em domicílios de Belém. Mello, segundo Galvão, Damasceno e Marques (1942), teria obtido índice antropofílico de 63.3% para exemplares de darlingi apanhados em habitações do bairro Entroncamento, em outubro e * Publicado originalmente em Revista do Serviço Especial de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 2, n. 3, p , jul
2 268 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia novembro de Galvão e colaboradores, nos primeiros meses de 1942, trabalhando também com mosquitos apanhados dentro de casas de Entroncamento, encontraram índices antropofílicos de 12% para o darlingi e de 14.2% para o tarsimaculatus (= aquasalis). Nas observações de Mello não foi obtido com darlingi nenhum resultado positivo para sangue de cavalo, enquanto nas de Galvão e colaboradores, 45.3% dos darlingi e 51.7% dos aquasalis demonstraram haver sugado êsse animal. Há muito se reconhece que os resultados de provas de precipitina dependem do local onde foram encontrados os anofelinos: exemplares da mesma espécie, quando apanhados dentro das casas, têm maior probabilidade de conter sangue humano do que quando obtidos sob as casas, ou em estábulos ou outros abrigos extra-domiciliares, conforme verificaram King e Bull (1925) para o quadrimaculatus nos Estados Unidos e Barber e Rice (1935) e Rice e Barber (1937) na Grécia, em relação a sacharovi, maculipennis, superpictus, algeriensis, bifurcatus e hyrcanus. Por isso mesmo, as provas de precipitina feitas com mosquitos apanhados no campo quer em domicílios quer em abrigos extra-domiciliares, não fornecem informações fidedignas sôbre as suas preferências alimentares. Mais expressivos são os resultados de provas feitas com mosquitos criados em laboratório e soltos em compartimento contendo possíveis hospedeiros de várias espécies. Êste tipo de prova foi utilizado por Bull e Root (1923) nos Estados Unidos, em relação ao quadrimaculatus e por Hu e Yu (1936) para o hyrcanus var. sinensis, na China. Em vista da variabilidade dos resultados obtidos pelo exame dos mosquitos apanhados em domicílios e, particularmente, das divergências reveladas nas provas efetuadas por Mello e Galvão e colaboradores, resolvemos fazer as experiências que seguem.
3 269 TÉCNICA USADA Obtenção e conservação dos repastos sanguíneos A obtenção variou conforme se tratava de experiências com mosquitos de criação, soltos em gaiola com diferentes iscas, ou de observações feitas com mosquitos capturados em domicílios. Para as provas do primeiro tipo procedemos como segue: Em terreno aos fundos do laboratório, armamos uma gaiola de seis metros de comprimento por três de largura e dois de altura, tôda de pano, sustentada por varas de modo que, quando armada, seus bordos inferiores chegassem até o chão. Um tôldo de lona protegia-a da chuva. Debaixo da gaiola fizemos armações de madeira destinadas a suportar uma rêde para a isca humana e a conter os outros animais. Durante o dia mantínhamos levantadas as paredes da gaiola. Logo antes do anoitecer fazíamos nela entrar um exemplar de cada um dos seguintes animais destinados a servirem de isca: homem, cão, gato, porco, carneiro, boi, cavalo e galinha. O indivíduo que servia de isca humana dormia na rêde, só de calção e era impedido de cobrir-se ou de afugentar os mosquitos. Os outros animais eram mantidos individualmente nas armações especiais, ou em gaiolas de tela de arame de malhas bem largas, de modo a que ficassem impossibilitados de locomover-se, mas que ao mesmo tempo a maneira de contê-los não dificultasse a picada dos mosquitos. Depois de instaladas as iscas e baixadas as paredes da gaiola, soltávamos em seu interior, às 18 horas, mosquitos criados em laboratório e geralmente com mais de 48 horas de emergidos da fase pupal. As experiências foram feitas principalmente com Anopheles darlingi e A. aquasalis. Como, porém, ao tempo em que as executávamos, estavam sendo criados no insetário A. oswaldoi e A. intermedius, aproveitamos para efetuar algumas provas com exemplares dessas espécies, consideradas sem importância epidemiológica.
4 270 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia As iscas permaneciam na gaiola durante tôda a noite, e cêdo na manhã seguinte um guarda capturava todos os anofelinos que aí encontrasse, fazendo logo depois sairem o homem e os outros animais. Os mosquitos fêmeas, capturados isoladamente em tubinhos de montagem, eram levados imediatamente para uma geladeira, a fim de impedir que continuasse a ser digerido o sangue que porventura contivessem, em vista de terem Bull e King (1923) anteriormente demonstrado que a proporção de amostra utilizável para as Provas de precipitina vai diminuindo à medida que progride a digestão. A conservação do sangue sugado pelos mosquitos era feita em quadrados de cêrca de dois centímetros de lado, recortados em papel de filtro pouco absorvente (Whatman, nº 50) e que dobrávamos aquém do meio, deixando sobrar uma pequena margem que virávamos para formar como que um envelope. Retirados da geladeira os tubos com os mosquitos capturados na gaiola, eram desprezadas as fêmeas vazias e identificadas as engorgitadas, ainda vivas, o que era possível em virtude de trabalharmos com espécies fàcilmente distinguíveis. Separadas por espécie, eram então as fêmeas mortas pelo clorofórmio e, depois de arrancadas suas asas e pernas, eram colocadas individualmente dentro dos envelopes de papel de filtro, onde o seu abdome era esmagado. Com uma pinça retirávamos os restos do exoesqueleto do mosquito, ficando o sangue que êste prèviamente sugara, retido nas faces internas do envelope. Na face externa e próximo a um dos bordos de cada envelope, escrevíamos símbolos correspondentes ao nome da espécie e à origem do mosquito. Descartados todos os envelopes onde tivéssemos obtido sangue insuficiente ou de côr parda ou negra, denunciando digestão avançada, os demais eram conservados em placas de Petri forradas de papel de filtro, que por sua vez eram colocadas dentro de caixas de papelão e guardadas em geladeira. Obtivemos resultados satisfatórios usando sangues preparados até quatro meses antes.
5 271 Para as provas feitas com mosquitos capturados nas casas, êstes eram apanhados à noite, entre 18 e 6 horas, e mortos com clorofórmio ao fim de cada hora, no próprio local, para impedir o prosseguimento da digestão do sangue ingerido; cada mosquito era esmagado em um dos pequenos envelopes de papel de filtro acima descritos e êstes, conservados em caixas de papelão etiquetadas com os dados referentes à captura, eram trazidos ao laboratório na manhã seguinte. Os mosquitos eram então identificados pelas características das asas e patas que tinham ficado retidas no envelope e que eram depois retiradas com pinça. Os envelopes de papel de filtro com sangue eram guardados na geladeira com os mesmos cuidados referidos para os mosquitos apanhados na gaiola. Obtenção e conservação dos anti-sôros Os anti-sôros usados foram feitos por nós, em vista da dificuldade de conseguí-los já preparados. Os sôros antígenos foram obtidos de cada uma das oito espécies de animais que serviram de isca na gaiola; utilizamos animais adultos, de ambos os sexos, aparentemente sadios. Na preparação dos anti-sôros seguimos a técnica mencionada por Kolmer e Boerner (1941): duas injeções endovenosas de oito mililitros, duas de cinco e duas de três mililitros de sôro antígeno, em coelhos, com cinco dias de intervalo entre as injeções, sendo que da segunda em diante as inoculações eram precedidas, meia hora antes, de uma dose dessensibilizante de 0.2 de mililitro de sôro. Dez dias após a última injeção, e estando os coelhos em dieta hídrica desde 18 horas antes, fazíamos uma sangria de prova para verificar se o anti-sôro havia atingido a sensibilidade desejada, de 1:1000, admitida como suficiente. Em caso afirmativo, colhíamos então, por punção cardíaca, cêrca de 40 mililitros de sangue de cada coelho e dois dias depois, fazíamos nova sangria de igual volume. Alguns coelhos morreram no decurso das inoculações; dos seis injetados com sôro de galinha sòmente um sobreviveu até a época de ser sangrado; a maioria dos demais, entretanto,
6 272 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia resistiu às duas sangrias e pôde ser utilizada para uma segunda série de inoculações do mesmo antígeno, após uma semana de repouso. Para esta nova série adotamos o seguinte esquema: uma dose inicial, subcutânea, de dois mililitros de sôro antígeno e no dia seguinte, após uma injeção dessensibilizante, cinco mililitros do mesmo sôro, diluido em igual volume de solução fisiológica, endovenosamente; com intervalos de cinco dias, fazíamos mais três injeções endovenosas do mesmo tipo. Os anti-sôros obtidos eram provados quanto ao seu poder precipitante, antes da sua diluição final. Para isso diluíamos a l:1000 em solução fisiológica, cada um dos diversos sôros-antígenos e, em tubos capilares, os fazíamos entrar em contato com cada um dos respectivos anti-sôros puro ou diluido a 1:2, 1:3, 1:5, e 1:7 no líquido que Rice e Barber (1935) recomendam. Para a diluição definitiva do anti-sôro, nesse mesmo líquido, utilizávamos a concentração imediatamente superior àquela com a qual tivéssemos obtido um anel de precipitação bem visível. Os anti-sôros diluidos eram passados em filtro bacteriológico e conservados sob uma camada de parafina estéril, em vidrinhos esterilizados, guardados em geladeira. Para verificar a especificidade dos anti-sôros antes de usálos, fazíamos entrar em contato com cada um dêles: a) o sôro-antígeno correspondente, diluido a 1:1000; b) os outros sete sôros-antígenos também diluidos a 1:1000; c) uma gota do sôro-antígeno embebida em papel de filtro e diluida segundo a mesma técnica empregada para o sangue contido nos mosquitos; d) sangue de mosquitos que haviam sugado iscas conhecidas. Sòmente depois de confirmadas as suas sensibilidade e especificidade eram os anti-sôros
7 273 considerados utilizáveis. Exceto no tocante ao anti-sôro de carneiro e ao de boi, que apresentaram reação de grupo conforme discutiremos adiante, todos os demais mostraram-se específicos e sensíveis, nas condições acima referidas. Execução das provas de precipitina Seguimos a técnica que Rice e Barber (1935) propõem, com pequenas modificações condicionadas principalmente por dificuldades na obtenção de instrumental idêntico. Recortados dos envelopes de papel de filtro os trechos que continham o sangue obtido dos mosquitos, colocávamos cada um dêles em placa de Petri de 4.5 centímetros de diâmetro e convenientemente etiquetada, adicionando depois a cada uma 0.5 de mililitro de solução fisiológica, para macerar o sangue durante uma hora. Por meio de aplicadores de madeira usados uma só vez, misturávamos a diluição do sangue até a homogeneização. Por capilaridade introduzíamos a diluição do sangue, simultâneamente, em oito tubos de 6.5 centímetros de comprimento e 2 a 2.5 milímetros de diâmetro, arranjados em pente com o auxílio de duas tiras de cartolina, prêsas uma à outra por grampos, nas extremidades e nos intervalos dos tubos. Êste arranjo com as tiras de cartolina, além da simplicidade, permitia a fácil retirada dos tubos capilares para lavagem. No extremo esquerdo de cada pente escrevíamos o número um para indicar a posição dos tubos capilares, do primeiro ao oitavo, cada um correspondente a um dos anti-sôros usados. A seguir mergulhávamos isoladamente os tubos de cada pente em cada cubeta com o anti-sôro correspondente e os colocávamos em suportes de papelão onde permaneciam em repouso durante 80 minutos.
8 274 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia A leitura dos resultados era feita sob uma lâmpada e em fundo escuro. As reações positivas eram classificadas em 1, 2 e 3, de acôrdo com o seu grau de intensidade. Obtivemos uma proporção relativamente elevada de reações negativas para qualquer dos anti-sôros empregados. Para os que trabalham em provas de precipitina com mosquitos colhidos em natureza e que portanto tiveram a liberdade de sugar maior variedade de hospedeiros, os resultados negativos podem ser atribuidos a repastos em espécies de animais cujos anti-sôros não foram usados nas provas. Em nosso trabalho, entretanto, para os mosquitos apanhados na gaiola, não podíamos formular semelhante hipótese. Tentando diminuir o número de reações negativas, experimentamos diluir os repastos em diferentes quantidades de solução fisiológica; conseguímo-lo, sem o aparecimento de reações inespecíficas (exceto as de boi + carneiro), usando 0.5 de mililitro de solução para cada repasto, em vez dos três mililitros aconselhados por Rice e Barber (1935). Não nos ocorre, entretanto, nenhuma hipótese para explicar adequadamente as reações negativas com que continuamos a nos defrontar no decorrer da experiência. Também não nos foi possível esclarecer porque nas experiências com darlingi apanhados em domicílios, a proporção de resultados negativos foi muito menor do que nas provas executadas com darlingi da gaiola ou com aquasalis das duas proveniências. Em uma determinada proporção dos repastos examinados obtivemos reações positivas para duas ou três espécies de isca ao mesmo tempo. As reações carneiro + boi foram as mais comuns. Essas duas espécies de animais, entretanto, são as únicas muito afins dentre as que empregamos como isca, pertencendo ambas a uma mesma família, Bovidae. Nas provas feitas para controlar a especificidade dos anti-sôros, obtínhamos sempre essas reações de grupo, inespecíficas, quando usávamos sangue de um dêsses animais; entretanto, quando se
9 275 tratava de sangue de boi, a positividade com sôro anti-carneiro era muito mais fraca e tardia do que a obtida com sôro anti-boi e viceversa. Em vista disso, nas provas com repastos de mosquitos, baseamonos na intensidade e precocidade das reações, interpretando como repastos realmente duplos em boi e carneiro, sòmente os casos em que obtínhamos reações de intensidade aproximadamente igual e ocorrendo ao mesmo tempo; consideramos os demais casos como provas positivas para sangue de uma só das duas iscas, boi ou carneiro. Os demais resultados positivos para mais de uma espécie foram considerados como repastos múltiplos, em vista de se terem mostrado específicos os outros anti-sôros. RESULTADOS OBTIDOS Nos Quadros 1 e 2 são apresentados os resultados que obtivemos. O primeiro mostra em detalhe todos os dados numéricos e o segundo dá as percentagens acumuladas dos mosquitos que sugaram cada espécie de isca.
10 276 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia Quadro 1 Preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará. Resultados de provas de precipitina feitas com sangue contido no tubo digestivo de exemplares capturados em gaiola onde haviam pernoitado oito espécies de animais e em domicílios, entre fevereiro e dezembro de 1948 Número de exemplares A. darlingi A. aquasalis Natureza do sangue Gaiola Domicílio Gaiola Domicílio Homem Cão Gato 11 Porco 8 19 Carneiro 1 7 Boi Cavalo Galinha Homem + cão 8 3 Homem + porco 1 1 Homem + boi Homem + carneiro Homem + galinha 4 1 Cão + gato 1 Cão + porco 1 Cão + boi 14 Cão + cavalo 5 Gato + boi 6 Gato + cavalo 2 (continua)
11 277 Quadro 1 Preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará. Resultados de provas de precipitina feitas com sangue contido no tubo digestivo de exemplares capturados em gaiola onde haviam pernoitado oito espécies de animais e em domicílios, entre fevereiro e dezembro de 1948 (conclusão) Número de exemplares A. darlingi A. aquasalis Natureza do sangue Gaiola Domicílio Gaiola Domicílio Porco + boi 2 11 Porco + cavalo 1 Porco + galinha 1 Boi + carneiro 1 11 Boi + cavalo 2 56 Boi galinha 1 Homem + porco + boi 1 Homem + carneiro + boi 1 Homem + boi + cavalo 7 Cão + carneiro + boi 1 Cão + porco + galinha 1 Gato + porco + carneiro 2 Negativos TOTAIS
12 278 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia Quadro 2 Preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará. Percentuais de positividade em provas de precipitina feitas com sangue contido no tubo digestivo de exemplares capturados em gaiola onde haviam pernoitado oito espécies de animais e em domicílios, entre fevereiro e dezembro de 1948 A. darlingi A. aquasalis Natureza do sangue Gaiola Domicílio Gaiola Domicílio Nº % N % N % N % Homem Cão Gato Porco Carneiro Boi Cavalo Galinha Provas negativas Número de provas realizadas
13 279 Anopheles darlingi Dos 230 exemplares que haviam pernoitado na gaiola juntamente com as oito iscas utilizadas, 45.7% continham sangue humano e 41.3% sangue de outros animais. Encontramos proporções relativamente elevadas de repastos com sangue de boi 28.7% e de cavalo 12.6%. O carneiro e o porco foram pouco sugados 0.9 e 0.4% respectivamente e em nenhum mosquito foi revelado sangue de cão, gato ou galinha. Mais de 95% dos espécimens com reação positiva tinham se alimentado em uma só isca e os restantes em duas. Houve 15.7% de provas negativas. Dentre os exemplares capturados em domicílios, 85.3% apresentaram sangue humano e apenas 12.7% sangue de outros animais. Aquí o cão foi, depois do homem, o hospedeiro preferido 5.6%, enquanto o boi e o cavalo concorreram com proporções bem menores de positividade 4.1 e 0.9% respectivamente. O porco, a galinha e o gato também participaram com números pequenos 1.2, 0.8 e 0.1% respectivamente, e nenhum repasto em carneiro foi evidenciado. Cêrca de 92% das provas positivas o foram para sangue de um só animal, uma para três animais e as restantes para dois. Houve 8.3% de reações negativas.
14 280 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia Gráfico 1 Preferências alimentares das fêmeas de Anopheles darlingi e Anopheles aquasalis em Belém, Pará. Resultados de provas de precipitina, fevereiro a dezembro de Homem Cão DARLINGI 1 1 Gato Porco AQUASALIS Carneiro 12 Boi Cavalo Galinha Percentual de positividade Percentual de positividade Mosquitos que pernoitaram em gaiola com oito iscas diferentes Mosquitos capturados em domicílios. Anopheles aquasalis Dos mosquitos que pernoitaram na gaiola apenas 10.9% continham sangue humano, ao passo que em 92.3% se constatou o sangue de outras iscas. Tôdas as oito iscas foram sugadas, porém mais da metade das provas 56.3% foram positivas para sangue de boi, vindo a seguir o de cavalo, com 23.4%. Os outros animais foram menos picados, distribuindo-se na seguinte ordem: cão 5.7%, porco 3%, carneiro 1.8%, gato 1.7% e galinha 0.4%. Dentre as provas positivas, 82.3% o foram para sangue de uma só isca, 16.6% de duas e 1.1% de três. As combinações mais comuns foram homem + boi e cavalo + boi. Houve 13.3% de reações negativas. Dentre os 596 exemplares capturados em domicílios, 71.8% continham sangue humano e sòmente 15.5% sangue de outros hospedeiros. Depois do homem, os animais cujo sangue se comprovou
15 281 com maior frequência foram, em ordem decrescente, o cão com 9.7% de positividade, o cavalo com 3.9% e a galinha com 1.2%. Raros repastos em boi 0.5% e em porco 0.2% foram assinalados e nenhum em gato ou galinha. Entre as provas positivas, 96.8% o foram para sangue de uma só isca, tôdas as demais o sendo para duas iscas. Houve 14.4% de provas negativas. Outros anofelinos Como dissemos atrás, fizemos algumas observações com fêmeas de Anopheles oswaldoi e A. intermedius que pernoitaram na gaiola juntamente com as oito iscas aqui consideradas. Utilizamos l74 exemplares da primeira espécie e 31 da segunda. Os resultados dessas provas foram os que seguem: A. oswaldoi A. intermedius Natureza do sangue Nº % Nº % Homem Cão Gato... Porco Carneiro Boi Cavalo Galinha... Provas negativas Apenas um exemplar de oswaldoi e quatro de intermedius apanhados em domicílios foram examinados: todos continham sangue humano. Pelos resultados mencionados verifica-se que tanto o darlingi como o aquasalis são capazes de sugar qualquer dos animais cujos anti-sôros foram usados, isto é, homem, cão, gato, porco, carneiro, boi, cavalo e galinha.
16 282 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia A execução simultânea das provas com anofelinos de um lado capturados em domicílios e de outro lado apanhados na gaiola permitiu-nos confirmar o conceito de que, na determinação das preferências alimentares de mosquitos, a utilização de exemplares colhidos nas casas pode fornecer resultados enganadores. Tomandose o exemplo das duas espécies que foram o objeto principal das nossas experiências, vê-se que, se considerássemos apenas os resultados das provas feitas com exemplares capturados em domicílios, seríamos levados à conclusão de que em Belém, o darlingi e o aquasalis apresentam, aproximadamente, o mesmo grau de antropofilismo. Entretanto, os resultados das reações feitas com exemplares criados em laboratório e soltos em uma gaiola com oito iscas diferentes, vieram demonstrar que, enquanto o darlingi mostrou ainda um alto grau de antropofilismo, o aquasalis revelou nítida preferência por outros animais que não o homem. Daí deduz-se que, se a maioria dos exemplares de aquasalis apanhados em habitações de Belém contêm sangue humano, é apenas porque o homem constitui dentro das casas a fonte de alimento mais próxima e abundante; quando lhe é dada a oportunidade de escolher entre várias iscas, o aquasalis mostra um grau de antropofilismo muito menor do que o revelado pelo darlingi em condições idênticas. Pelas mesmas razões o sangue do cão foi, depois do humano, o mais frequentemente encontrado em exemplares de darlingi e aquasalis capturados em domicílios, ao passo que nas provas feitas com mosquitos da gaiola, o boi e o cavalo foram muito mais sugados que o cão, vindo logo depois do homem nas observações feitas com o darlingi e muito antes do homem nas realizadas com o aquasalis. As provas feitas com o oswaldoi e o intermedius evidenciaram que, embora as poucas fêmeas capturadas no interior de casas tenham sido tôdas positivas para sangue humano, essas espécies têm franca preferência pelo boi e a seguir pelo cavalo e pouco interêsse pelo homem, quando colocadas em gaiola com diferentes iscas.
17 283 SUMMARY Two types of experiments were simultaneously conducted in Belém, State of Pará, Brazil, for the purpose of determining, by means of precipitin tests, the host preference of the females of Anopheles darlingi and A. aquasalis, the main local vectors of Malaria. In one series of experiments the authors used mosquitoes collected inside houses. In another series, laboratory-raised specimens were released in a large cage where they remained overnight in the presence of eight different baits: man, dog, cat, pig, sheep, cow, horse and chicken. Anti-sera were prepared according to Kolmer and Boerner s (1941) scheme. In the performance of the precipitin tests, Rice and Barber s (1935) technique was followed with slight modifications. Results obtained showed that both A. darlingi and A. aquasalis are capable of feeding on all species of animals used as baits. In the tests made with mosquitoes captured inside houses the anthropophilic index was very high for both species of anophelines. Next to man, preference was given to dogs and few specimens had fed on cows and horses. On the other hand, in the tests made with mosquitoes released in the cage, A. darlingi showed a marked preference for the human bait, whereas A. aquasalis appeared to have no special liking for man. Next to man, A. darlingi fed more frequently on the cow and horse, and these two baits rated prior to man in the preferences of A. aquasalis. The dog was seldom seeked as a source of food. The percentages of tests positive for the blood of the different hosts were as follows:
18 284 Memórias do Instituto Evandro Chagas: Parasitologia Host Specimens collected inside houses Specimens released in the cage A. darlingi A. aquasalis A. darlingi A. aquasalis Man Dog Cat Pig Sheep Cow Horse Chicken Over 91 percent of the tests were positive for a single host, but there were tests positive for two and even three hosts. A small number of tests using A. oswaldoi and A. intermedius species which are common in Belém but have no domestic habits and no importance in the epidemiology of Malaria revealed that the great majority of the specimens from the cage fed on the cow and a smaller number on the horse; a limited number fed on man, although tests made with the few females of these species captured inside houses were all positive for human blood. The experiments performed allowed the authors to confirm the fact that, in determining host preferences by means of precipitin tests, the use of mosquitoes caught inside houses may furnish misleading results, whereas more accurate data are obtained with specimens raised in the laboratory and placed in an enclosure along with different baits. BIBLIOGRAFIA BARBER, M. A. & RICE, J. B Malaria studies in Greece. The relation of housing to malaria in certain villages of East Macedônia. Am. J. Hyg., 22 (3): BATES, MARSTON The natural history of mosquitoes. MacMillan Co., N.Y., E. U. A.
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