Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado. Genetic parameters in Hancornia speciosa Gomes progenies from Cerrado
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- Aparecida Carvalho Teixeira
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1 Sci e n t i a For e s ta l i s Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado Genetic parameters in Hancornia speciosa Gomes progenies from Cerrado Rita Maria Devós Ganga¹, Lázaro José Chaves² e Ronaldo Veloso Naves² Resumo O trabalho objetivou avaliar progênies de Hancornia speciosa Gomes da coleção de germoplasma da EA/UFG e estimar parâmetros genéticos relativos ao seu desenvolvimento inicial no campo, abrangendo 28 populações de quatro variedades botânicas. Avaliaram-se a altura das plantas e o diâmetro do caule, totalizando 20 leituras mensais que foram transformadas em taxas de crescimento. As progênies apresentam altos níveis de variação genética para os caracteres avaliados, sendo que para diâmetro do caule, a maior parte da variação genética estava dentro de populações e para altura estava entre populações; as variedades botânicas cuyabensis e gardneri apresentaram maior desenvolvimento em campo em relação ao diâmetro do caule e altura das plantas. Palavras-Chave: Mangaba, Mangabeira, Espécie nativa, Recursos genéticos Abstract The objective of this research was to evaluate the genetic variation and estimate genetic parameters of growth of Hancornia speciosa Gomes plants that constitute the EA/UFG Germplasm Collection, including 28 populations of four botanical varieties. Plant height and stem diameter were evaluated, which resulted in 20 measures that were transformed into growth rate. Mangaba tree progenies present high levels of genetic variation in stem diameter and plant height and to their growth rates. For stem diameter, most of the genetic variation within populations and for plant height it was among populations. The botanical varieties cuyabensis and gardneri had better growth rates, both in stem diameter and in plant height. Keywords: Mangaba, Mangaba tree, Native species, Genetic resources INTRODUÇÃO A mangabeira (Hancornia speciosa Gomes) é uma frutífera nativa do Brasil encontrada em diversas regiões do país, desde os tabuleiros costeiros e baixada litorânea do Nordeste até o Cerrado das regiões Centro-Oeste, Norte e Sudeste (SILVA JUNIOR, 2004). Seus frutos são saborosos e muito apreciados para consumo in natura ou no preparo de doces, sucos, licores e sorvetes. Por essa razão, tem se destacado em potencial econômico e despertado o interesse de consumidores e setores envolvidos na sua industrialização e comercialização. Pertence à família Apocynaceae, compreendendo seis variedades botânicas que se diferenciam por algumas características morfológicas, principalmente da folha e da flor: H. speciosa var. speciosa, H. speciosa var. maximiliani, H. speciosa var. cuyabensis, H. speciosa var. lundii, H. speciosa var. gardneri e H. speciosa var. pubescens. No Nordeste, registra-se a predominância da variedade speciosa; a gardneri ocorre no Brasil Central; a pubescens em Goiás e Minas Gerais; a cuyabensis no Mato Grosso, mais especificamente na Chapada dos Guimarães; a maximiliani em Minas Gerais e a lundii ocorre em Minas Gerais, Pernambuco, Bahia e Goiás (MONACHINO, 1945). A mangabeira é uma árvore perene, com porte variando entre 4 m e 7 m de altura, podendo chegar até 15 m, de crescimento lento e copa ampla. A raiz é pivotante profunda e toda a planta exsuda látex de cor branca ou róseo-pálida. Possui folha simples, oposta, oval ou lanceolada, peciolada, glabra ou não, de consistência coriácea. Suas flores são hipocrateriformes, com um tubo floral relativamente longo e estreito, de coloração branca, campanuladas e aromáticas. Em ramos novos do ano existem inflorescência em dicásio terminal, com dois a quatro ou até cinco ¹Doutora em Genética e Melhoramento de Plantas pela Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Goiás - Rua Miquelina Volpe Morello, 51 - Colina Verde - Jaboticabal, SP ritaganga@yahoo.com.br ²Professor Titular do Setor de Melhoramento Vegetal da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Goiás - Campus Samambaia - Rodovia Goiânia/Nova Veneza, km 0 - Caixa Postal Goiânia, GO lchaves@agro.ufg.br; ronaldo@agro.ufg.br 395
2 Ganga, Chaves e Naves Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado flores hermafroditas. O fruto é uma baga elipsóide e carnosa, com número de sementes variável, coloração amarela ou esverdeada, com pigmentação avermelhada. As sementes, recalcitrantes, são discóides, achatadas, de coloração castanhoclara e rugosas, com hilo central (MONACHINO, 1945). Aspectos da biologia floral de H. speciosa a tornam uma planta alógama e autoincompatível (DARRAULT e SCHLINDWEIN, 2006). A espécie continua a ser um produto essencialmente extrativista e, salvo algumas raras exceções, não existem ainda pomares organizados ou implantados com a finalidade de exploração racional para a produção de frutos. Segundo as estatísticas da extração vegetal do Brasil (IBGE, 2006), a produção em 2004 foi equivalente a 790 toneladas, das quais a maioria proveio da região Nordeste, sendo Sergipe, Bahia e Rio Grande do Norte os estados de maior produção, respectivamente. A conquista de novos mercados está condicionada à implantação de pomares comerciais, pois a produção atual mal atende à demanda do mercado consumidor local (LEDERMAN et al., 2000). Informações sobre desenvolvimento, produção e variação genética são necessidades supridas por meio de estudos de procedências e progênies, que indicam a potencialidade e a escolha daquelas que são adequadas à exploração econômica e ao melhoramento genético. Esses esclarecimentos são especialmente importantes para espécies nativas como H. speciosa, cuja exploração de frutos já vem ocorrendo e o conhecimento científico ainda é incipiente. A domesticação e incorporação dessas espécies nos sistemas produtivos regionais, bem como o desenvolvimento de estratégias de conservação eficientes estão estreitamente relacionadas ao conhecimento da magnitude e distribuição da variabilidade genética nas populações naturais. O objetivo deste trabalho foi avaliar progênies de mangabeira que compõem a coleção de germoplasma da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Goiás (EA/ UFG) e estimar parâmetros genéticos relativos ao desenvolvimento inicial de plantas no campo. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi realizado na área experimental da EA/UFG, localizada no município de Goiânia, GO ( S; W; 730 m de altitude). De acordo com a classificação de Köppen, o clima da região é do tipo Aw (quente e semi-úmido com estação seca bem definida de maio a setembro) e o solo do local é caracterizado como latossolo vermelho distrófico, de textura média e relevo suave ondulado (BRASIL, 1992; EMBRAPA, 1999). Amostragens em populações naturais de H. speciosa foram realizadas nos estados de GO, TO, MT, MS e BA (Tabela 1). Os frutos foram coletados e as sementes, após a extração, foram plantadas em viveiro telado em novembro de 2004, onde permaneceram até o plantio em campo. O experimento no campo foi instalado em dezembro de 2005, em delineamento experimental de blocos completos casualizados com 57 tratamentos, quatro repetições e uma planta por parcela no espaçamento de 5 x 6 m. Os tratamentos foram constituídos por progênies de polinização livre originadas das plantas amostradas, abrangendo 28 populações das variedades botânicas pubescens, gardneri, speciosa e cuyabensis, constituindo assim, a coleção de germoplasma de H. speciosa da EA/UFG. A avaliação das progênies constou na medição da altura das plantas e do diâmetro basal do caule em todas as plantas, durante o período de janeiro de 2006 a agosto de 2007, totalizando 20 leituras. Estes dados foram transformados em taxas de crescimento mensal, pelo cálculo da inclinação da linha de regressão linear, no final do período. Os dados de mudas replantadas logo na segunda ou terceira avaliação foram considerados nos cálculos das taxas de crescimento, enquanto os referentes a outros replantios foram desprezados para não comprometerem a análise estatística. A análise de variância e estimativas de parâmetros genéticos foi obtida também para os dados da última leitura (vigésima) em diâmetro do caule e altura das plantas no campo, com o auxílio do software genético-estatístico Genes (CRUZ, 1997). A análise de variância dos dados foi realizada segundo o modelo de blocos completos casualizados com os tratamentos hierarquizados de duas maneiras alternativas, a saber: populações e progênies dentro de populações; e variedades botânicas e progênies dentro de variedades. No segundo caso, o efeito de progênies dentro de variedades foi ainda subdividido nos componentes dentro de cada variedade botânica em particular. Foram estimados os coeficientes de correlação fenotípica, genotípica e residual entre as taxas de crescimento, bem como entre as medições finais. Posteriormente e utilizando o software genético-estatístico Genes (CRUZ, 1997), foram estimadas as correlações fenotípi- 396
3 Tabela 1. Localidades, coordenadas geográficas e variedades botânicas das plantas matrizes de H. speciosa coletadas no Cerrado. Table 1. Localities, geographical coordinates and botanical varieties of H. speciosa mother plants collected in the Cerrado. População Progênies Município - Estado Latitude (S) Longitude (O) Altitude (m) Variedade botânica 1 3 Barro Alto - GO 14º46,157 49º03, pubescens e gardneri 2 1 Campinorte - GO 14º16,790 49º13, pubescens 3 1 Porangatu - GO 13º06,162 49º11, gardneri 4 4 Ponte Alta - TO 10º30,923 46º53, speciosa 5 1 Mateiro - TO 10º24,520 46º29, speciosa 6 1 Dianópolis - TO 11º02,970 46º33, speciosa 7 1 Dianópolis - TO 11º33,829 46º33, speciosa 8 1 São Desidério - BA 12º33,002 45º55, speciosa 9 1 Alvorada do Norte - GO 14º30,746 46º32, gardneri 10 2 Alexânia - GO 16º12,756 48º24, pubescens 11 1 Matrinchã - GO 15º32,393 50º26, gardneri 12 1 Goiás - GO 15º59,545 50º06, gardneri 13 2 Silvânia - GO 16º34,349 48º21, gardneri 14 2 Luziânia - GO 16º43,081 48º05, gardneri 15 4 Goiânia - GO 16º35,994 49º16, pubescens e gardneri 16 3 Pirenópolis - GO 15º48,332 48º52, gardneri 17 1 Piranhas - GO 16º27,585 51º42, gardneri 18 3 Barra do Garças - MT 15º51,259 52º11, gardneri 19 2 General Carneiro - MT 15º36,230 53º04, gardneri 20 3 Chapada dos Guimarães -MT 15º30,579 55º17, cuyabensis 21 1 Jaciara - MT 15º48,403 55º15, cuyabensis 22 3 Rondonópolis - MT 16º44,743 54º38, cuyabensis 23 3 Sonora - MT 17º49,688 54º43, gardneri 24 3 Coxim - MT 18º36,954 54º46, gardneri 25 3 Alcinópolis - MS 18º14,744 53º59, gardneri 26 1 Costa Rica - MS 18º23,604 53º20, gardneri 27 2 Chapadão do Sul - MS 18º36,580 53º00, gardneri 28 3 Caçu - GO 18º33,316 51º08, gardneri cas entre as taxas de crescimento, altura e diâmetro finais, altura e diâmetro iniciais e os seguintes caracteres relativos às plantas matrizes: peso do fruto, número de sementes por fruto e peso médio de uma semente. Os dados das plantas matrizes foram utilizados para caracterização morfológica das plantas em condições naturais (GANGA, 2008). A altura e o diâmetro iniciais de todas as mudas foram mensurados ainda no viveiro telado, antes de serem transplantadas para o campo. RESULTADOS E DISCUSSÃO Análise de variância e estimativas de parâmetros As plantas das populações de Barra do Garças, MT e General Carneiro, MT deixaram dúvidas quanto à qual variedade pertenciam realmente, por se parecerem, ao mesmo tempo, às variedades botânicas gardneri e cuyabensis. Essas populações localizavam-se próximas às regiões limítrofes de ocorrência de variedades diferentes, indicando a possibilidade de hibridação entre elas, caso não haja barreiras a esse cruzamento. Como não foi realizado um estudo minucioso para a sua diferenciação, tais populações foram desconsideradas na realização da análise estatística dos dados. O crescimento médio mensal em diâmetro foi de 1,56 mm, enquanto o de altura foi de 6,16 cm. Entre as variedades botânicas, cuyabensis e gardneri foram as que apresentaram as maiores taxas de crescimento, tanto em altura quanto em diâmetro (7,22 cm e 1,79 mm; 6,67 cm e 1,68 mm, respectivamente), sem diferirem entre si pelo teste de Tukey (P>0,05) (Tabela 2). O diâmetro final médio das progênies foi de 33,90 mm e a altura final média foi de 135,49 cm. As variedades cuyabensis e gardneri apresentaram os maiores diâmetros finais, sem diferirem entre si. H. speciosa var. pubescens e H. speciosa var. speciosa diferiram das demais, mas não entre si, apresentando médias menores. 397
4 Ganga, Chaves e Naves Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado Quanto à altura final, as variedades cuyabensis e gardneri foram as mais altas, alcançando médias de 151,85 cm e 147,80 cm, respectivamente. As variedades pubescens (106,73 cm) e speciosa (78,27 cm) não diferiram (P>0,05) em altura, diferindo significativamente das anteriores. Os estudos com essa espécie ainda são, de certa forma, recentes. Trabalhos avaliando a taxa de crescimento são escassos, mas existem alguns caracterizando populações adultas quanto a diversos caracteres, como altura da planta, circunferência do caule, diâmetro de copa, produção etc (SILVA JUNIOR et al., 2007; ALMEIDA et al., 2003; BARREIRO NETO, 2003; REZENDE et al., 2003;). A circunferência do caule (75,7%) e o volume da copa (23,2%), entre outros caracteres morfológicos foram considerados as variáveis que mais contribuem na divergência genética (LÉDO et al., 2003). A influência da adubação no desenvolvimento em altura de H. speciosa de zero a 24 meses foi avaliada por Guerra et al. (2002) em Planaltina, DF. Segundo os autores, as taxas médias de crescimento foram de 2,49 cm a 3,86 cm por mês, sendo que as maiores taxas de crescimento foram proporcionadas pelos níveis mais baixos de adubação. Tais valores são menores que a média geral de crescimento mensal em altura das progênies no presente trabalho (6,16 cm) e também em relação às médias apresentadas pelas variedades cuyabensis e gardneri. Confrontando com o crescimento distinto das variedades neste trabalho, novos estudos talvez possam evidenciar respostas diferenciadas das variedades botânicas à adubação. Por dez anos, progênies de H. speciosa var. pubescens foram estudadas quanto ao crescimento em altura, número de ramificações e circunferência do tronco (SANO e FONSECA, 2003), demonstrando que o crescimento é mais acentuado a partir do segundo ano e que ocorre frutificação precoce nas progênies com melhor desempenho no crescimento e estabelecimento. Nesse sentido, é interessante mencionar que uma das progênies do presente trabalho, pertencente à variedade H. speciosa var. cuyabensis floresceu com aproximadamente dois anos de idade (considerando o tempo em viveiro telado e o tempo em campo), indicando uma possível precocidade a ser melhor avaliada. A análise de variância das taxas de crescimento e medições finais em diâmetro do caule e altura das plantas em H. speciosa permitiu verificar a existência de variações significativas entre progênies e entre variedades botânicas (P<0,01), pelo teste F (Tabela 2). Isto significa que o crescimento foi diferenciado entre as progênies e entre as variedades, havendo possibilidade de serem selecionadas aquelas que apresentarem um crescimento mais rápido para programas de pré-melhoramento. Entre populações, as diferenças mostraram-se significativas para a taxa de crescimento em altura (P<0,05) e altura final (P<0,01). Dentro de populações as diferenças foram detectadas no diâmetro do caule, tanto para a taxa de crescimento quanto para o diâmetro final (P<0,01). A variação também se mostrou significativa nas progênies dentro de variedades, tanto para as medições finais (P<0,01) como para as taxas de crescimento (P<0,05). Tabela 2. Resumo da análise de variância das taxas de crescimento e medições finais em diâmetro do caule e altura de plantas de progênies de H. speciosa. Table 2. Summary of variance analysis for growth rates, final measurements in stem diameter and plant height of H. speciosa progenies. Quadrado Médio Fontes de G.L. Taxa de crescimento Medição Final Variação Diâmetro (mm) Altura (cm) Diâmetro (mm) Altura (cm) Blocos 3 0,0365 NS 2,0156 NS 10,09 NS 484,49 NS Progênies 51 0,6276** 13,9003** 278,84** 5232,82** População 25 0,7668 NS 18,4844* 353,56 NS 7688,68** Prog/Pop 26 0,4937** 9,4925 NS 207,00** 2871,42 NS Variedade 3 3,9893** 77,7129** 1813,02** 32303,01** Prog/Var 48 0,4174* 9,9197* 182,96** 3540,94** Prog/cuyabensis 6 0,5968* 8,7964 NS 250,63* 3501,16 NS Prog/gardneri 28 0,4578* 12,1966** 207,71** 4289,40** Prog/pubescens 7 0,4370 NS 7,5438 NS 151,50 NS 2845,50 NS Prog/speciosa 7 0,1733 NS 4,9967 NS 85,66 NS 1909,16 NS Resíduo 121 0,2504 6, , ,23 Média Geral 1,56 6,16 33,90 135,49 Média cuyabensis 1,79 a (1) 7,22 a 37,63 a 151,85 a Média gardneri 1,68 a 6,67 a 36,80 a 147,80 a Média pubescens 1,25 b 4,91 b 27,51 b 106,73 b Média speciosa 0,92 b 3,22 b 19,85 b 78,27 b NS : não significativo; * e ** Significativo a 5% e a 1% de probabilidade pelo teste F, respectivamente; (1) Números seguidos de mesma letra na coluna não diferem entre si pelo Teste de Tukey a 5% de probabilidade. 398
5 Verificaram-se diferenças significativas (P<0,05) para a taxa de crescimento em diâmetro nas variedades cuyabensis e gardneri e em altura apenas para essa última (P<0,01). As progênies das variedades pubescens e speciosa não mostraram variações significativas nas taxas de crescimento avaliadas. Com relação às medidas finais de diâmetro e altura, apenas a variedade gardneri apresentou variação significativa (P<0,01) em ambos os caracteres, enquanto cuyabensis mostrou variação significativa para o diâmetro (P<0,05) (Tabela 2). Estudos sobre variabilidade genética de populações de mangabeira do Cerrado ainda estão em fase inicial. Chaves (2006), com base em observações de campo constatou uma grande variação em caracteres morfológicos de plantas e frutos. A existência de variabilidade genética entre H. speciosa também foi observada em Sergipe (SILVA JUNIOR et al., 2003), Pernambuco (SILVA JUNIOR et al., 2007) e em Alagoas (AL- MEIDA et al., 2003) possibilitando a seleção de plantas com menor variação morfológica, visando pomares com maior uniformidade. A caracterização genética de populações naturais do Cerrado por meio da análise de polimorfismo de cpdna detectou elevados níveis de diversidade genética, dos quais cerca de 7% a 9% referem-se à variação entre as populações avaliadas (SILVA, 2006). A autora ressalta, ainda, que esses resultados sugerem que um elevado número de populações naturais deve ser amostrado quando da realização de programas de coleta destinados à conservação genética da espécie. Também no Cerrado, Rezende et al. (2003) detectaram maior diversidade entre populações dentro de regiões do que entre regiões, para os caracteres altura das plantas, diâmetro do caule e número de frutos em populações naturais de H. speciosa. Estudando parte dessas mesmas populações com marcadores moleculares RAPD, Moura (2003) encontrou uma variação significativa entre as populações. A variação genética entre populações ocorre quando há alguma restrição ao fluxo gênico, pelos efeitos da deriva genética e adaptações específicas ao meio ambiente via seleção. No presente caso, de toda a variação observada, a maior parte deve-se à própria variação genética existente entre as progênies, conforme se pode observar nos valores estimados para a variância na taxa de crescimento em diâmetro (60,08%), taxa de crescimento em altura (56,18%), diâmetro final do caule (63,81%) e altura final das plantas (62,63%) (Tabela 3). O restante corresponde à variação entre plantas dentro das progênies. Para o diâmetro, a análise populacional revelou que a maior parte da variação genética se encontra dentro de populações (64,51% para taxa de crescimento e 59,63% para diâmetro final) (Tabela 3), com o restante correspondendo à variação entre populações. Esta proporção Tabela 3. Estimativas de parâmetros genéticos das taxas de crescimento e medições finais em diâmetro do caule e altura de plantas de progênies de H. speciosa. Table 3. Genetic parameters estimates of growth rates and final measurements on stem diameter and plant height of H. speciosa progenies. Parâmetros Taxa de crescimento Medição Final Diâmetro (mm) Altura (cm) Diâmetro (mm) Altura (cm) ² F 0,2162 4, , ,9757 ² Prog 0,1299 2, , ,2989 ² Pop 0,0461 1, , ,6249 ² Prog/Pop 0,0838 1, , ,6739 ² Var 0,0723 1, , ,9417 ² Prog/Var 0,0576 1, , ,3572 ² Prog/cuyabensis 0,0907 0, , ,8879 ² Prog/gardneri 0,0626 1, , ,2744 ² Prog/pubescens 0,0505 0, , ,1162 ² Prog/speciosa -0,0498-0,7068-9, ,7556 h² m 0,6010 0,5618 0,6381 0,6264 CV g % 23,13 26,64 23,10 24,80 Correlação Fenotípica 0,91** ++ 0,97** + Correlação Genética 0,96 0,99 Correlação Residual 0, ,91 ++ ² F : Variância fenotípica; ² Prog : Variância genética entre progênies; ² Pop : Variância genética entre populações; ² Prog/Pop : Variância genética entre progênies dentro de populações; ² Var : Efeito quadrático entre variedades; ² Prog/Var : Variância genética entre progênies dentro de variedades; ² Prog/cuyabensis : Variância genética entre progênies dentro da variedade cuyabensis; ² Prog/gardneri : Variância genética entre progênies dentro da variedade gardneri; ² Prog/pubescens : Variância genética entre progênies dentro da variedade pubescens; ² Prog/speciosa : Variância genética entre progênies dentro da variedade speciosa; h² m : herdabilidade ao nível de médias de progênies; CV g %: Coeficiente de variação genética entre progênies; ** : Significativo a 1% de probabilidade pelo teste t; ++, +: Significativo a 1% e 5%, respectivamente, pelo método de bootstrap com 20 mil simulações. 399
6 Ganga, Chaves e Naves Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado concorda com o que é esperado para espécies alógamas, ou seja, a existência de maior variação genética dentro de populações do que entre elas. Entretanto, para a altura, a maior variância foi observada entre populações, com 56,44% na taxa de crescimento e 72,05% na altura final e o restante referindo-se à variação das progênies dentro de populações. Esses números podem ser explicados pelas diferenças existentes entre as variedades botânicas abrangidas pelo estudo, as quais acentuam a variação entre populações, uma vez que, com exceção de duas, não há populações formadas por misturas de variedades. Essa diversidade no desenvolvimento das variedades pode ser facilmente visualizada na observação das progênies em campo (Figura 1). Figura 1. Plantas e detalhe das folhas de variedades de Hancornia speciosa no campo experimental da EA/UFG: AH. speciosa var. cuyabensis; B- H. speciosa var. gardneri; C- H. speciosa var. pubescens; D- H. speciosa var. speciosa. Foto: Rita Ganga (2008). Figure 1. Plant and leaf detail of Hancornia speciosa varieties in the EA/UFG experimental field: A- H. speciosa var. cuyabensis; B- H. speciosa var. gardneri; C- H. speciosa var. pubescens; D- H. speciosa var. speciosa. Photo: Rita Ganga (2008). 400
7 Com relação à variação do desenvolvimento inicial das variedades, a maior parte refere-se à variação entre variedades, tanto para diâmetro quanto para altura, devendo-se, provavelmente, às características inerentes a cada uma delas, conforme já comentado. No entanto, cabe ressaltar que também foi verificada uma importante variação nas progênies dentro de variedades, tanto na taxa de crescimento (44,34% para diâmetro e 48,93% para altura) quanto nas medidas finais (46,11% para diâmetro e 48,38% para altura), evidenciando a ampla variabilidade genética existente nos diferentes níveis estruturais. Os valores da variância nas taxas de crescimento de progênies dentro de cada variedade também foram estimados, mas para as variedades botânicas pubescens e speciosa não diferiram de zero, bem como a variância para o crescimento e medição final em altura em H. speciosa var. cuyabensis. Quanto ao diâmetro final do caule, apenas as progênies dentro das variedades gardneri e cuyabensis mostraram diferenças significativas. Para a altura final, somente as progênies dentro da variedade gardneri mostraram diferenças significativas (Tabela 3). As estimativas de herdabilidade para os caracteres avaliados apresentam valores elevados (Tabela 3), o que evidencia um bom controle genético sobre eles e indica que progressos podem ser esperados com a seleção dos materiais, utilizando-se métodos simples de seleção. Ressalta-se que estas herdabilidades são entre médias de progênies e não individuais. Em um levantamento na literatura sobre herdabilidade e coeficiente de variação genética dos caracteres altura e diâmetro de espécies arbóreas nativas do Brasil (AGUIAR, 2004), verifica-se que as estimativas de herdabilidade e coeficientes de variação genética deste trabalho são expressivas e excedem os intervalos observados por diversos autores, principalmente com relação ao coeficiente de variação genética. Os coeficientes de variação genética, tanto para as taxas de crescimento quanto para as medições finais mostraram-se relativamente elevados (Tabela 3), corroborando a afirmação de que tal magnitude provavelmente se deve ao fato de as progênies serem oriundas de populações naturais distintas e confirmam o potencial das progênies de mangabeira para a seleção, bem como para a conservação dos recursos genéticos da espécie. Uma grande dificuldade em programas de melhoramento de espécies arbóreas e perenes, como a mangabeira, é o longo tempo despendido na recombinação de plantas selecionadas. Devido à grande variabilidade genética apresentada e por se tratar de uma espécie ainda selvagem, em início de processo de domesticação, qualquer programa de melhoramento genético deve se basear no aproveitamento dessa variabilidade natural, via seleção. A associação de programas de seleção de longo prazo com programas de conservação ex situ, plantando-se progênies em esquema experimental, do modo como fora realizado neste estudo, representa uma alternativa adequada para este tipo de espécie (TRINDADE e CHAVES, 2005; CHAVES, 2006). Correlações Foram detectadas correlações fenotípicas positivas e significativas entre os caracteres altura e diâmetro do caule avaliados, tanto para a taxa de crescimento (0,91) quanto para as medidas finais (0,97). A correlação genética também foi estimada e, embora tenha apresentado valores elevados, não foi significativa considerando os limites do intervalo de confiança construído utilizando o método de bootstrap com 20 mil aleatorizações (Tabela 3). Entretanto, por serem estimados via diferenças entre quadrados médios e produtos médios, os coeficientes de correlação genética estão, em geral, sujeitos a elevado nível de erro de estimação. Por essa razão, podem não apresentar significância, mesmo frente a valores elevados como os apresentados. Silva Junior et al. (2003) detectaram um valor alto e significativo para a estimativa do coeficiente de correlação entre a altura da planta e a circunferência do caule (0,97), semelhante ao valor encontrado neste estudo. Almeida et al. (2003) também relatam uma correlação positiva entre a altura da planta e o diâmetro do caule a 20 cm do solo, classificando-a como média (r = 0,44). No presente caso, a correlação positiva e significativa entre os dois caracteres indica que a seleção em um deles é suficiente para resultar em ganho indireto no outro, ou seja, a seleção de plantas com diâmetro basal maior implica em plantas mais altas e vice-versa, pelo menos na fase inicial de desenvolvimento. Considerando-se conjuntamente caracteres medidos nas plantas matrizes e progênies, percebe-se que há correlações positivas e significativas entre os caracteres mensurados nas progênies, ou seja, entre as medidas iniciais de tamanho, taxas de crescimento e medidas finais de altura e diâmetro (Tabela 4). Isso demonstra que plantas que forem levadas ao campo com 401
8 Ganga, Chaves e Naves Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado Tabela 4. Estimativas do coeficiente de correlação fenotípica entre as variáveis peso do fruto (PF), número de sementes (NS), peso médio de uma semente (PMS), diâmetro do caule inicial (D1), altura inicial (A1), taxa de crescimento em diâmetro (D1-20), taxa de crescimento em altura (A1-20), diâmetro final aos 20 meses (D20) e altura final aos 20 meses (A20) de H. speciosa do Cerrado (diagonal superior) e H. speciosa var. gardneri (diagonal inferior). Table 4. Phenotypic correlation coefficient estimates between the variables: fruit weight (PF), number of seeds (NS), average seed weight (PMS), initial stem diameter (D1), initial height (A1), diameter growth rate (D1-20), height growth rate (A1-20), final diameter at 20 months (D20) and final height at 20 months (A20) of H. speciosa from Cerrado (upper diagonal) and H. speciosa var. gardneri (lower diagonal). PF NS PMS D 1 A 1 D 1-20 A 1-20 D 20 A 20 PF - 0,70 ** 0,28 NS 0,46 ** 0,49 ** 0,44 ** 0,33 * 0,48 ** 0,41 ** NS 0,76 ** - -0,08 NS 0,21 NS 0,14 NS 0,19 NS 0,15 NS 0,21 NS 0,17 NS PMS 0,18 NS -0,10 NS - 0,35 * 0,56 ** 0,24 NS 0,28 NS 0,28 NS 0,38 ** D 1 0,20 NS 0,05 NS 0,30 NS - 0,66 ** 0,50 ** 0,45 ** 0,54 ** 0,49 ** A 1 0,47 * 0,23 NS 0,48 * 0,67 ** - 0,47 ** 0,41 ** 0,52 ** 0,53 ** D ,34 NS 0,22 NS 0,02 NS 0,69 ** 0,59 ** - 0,93 ** 0,98 ** 0,94 ** A ,13 NS 0,15 NS 0,14 NS 0,60 ** 0,50 ** 0,85 ** - 0,90 ** 0,97 ** D 20 0,37 NS 0,23 NS 0,07 NS 0,73 ** 0,65 ** 0,95 ** 0,77 ** - 0,93 ** A 20 0,28 NS 0,22 NS 0,25 NS 0,65 ** 0,67 ** 0,88 ** 0,95 ** 0,86 ** - NS : não significativo; * e **: significativo a 5% e a 1% de probabilidade pelo teste t, respectivamente. maior altura e diâmetro do caule, ou seja, com maior vigor juvenil, crescerão mais rapidamente e alcançarão porte mais elevado do que as demais, o que pode significar maior produção, já que esta última está correlacionada à altura das plantas, ainda que não intensamente (r = 0,25) (GANGA, 2008). O peso unitário médio de sementes também se correlacionou positivamente com as medições iniciais e com a altura final, evidenciando que a seleção de sementes maiores pode acarretar maior vigor inicial. Para verificar uma possível influência do efeito das variedades botânicas sobre estes coeficientes, procedeu-se à estimação do coeficiente de correlação entre as mesmas variáveis, desta vez apenas com os dados da variedade gardneri, por ser ela a de maior número de progênies na coleção. Evidenciou-se que a altura inicial tem uma correlação positiva e significativa com o peso do fruto (0,47) e com o peso unitário médio de sementes (0,48). As demais correlações mantiveram-se. Durante o amadurecimento, a maioria dos frutos acumula grandes quantidades de materiais de armazenamento altamente energéticos, presumivelmente destinados ao suporte da germinação da semente (CHITARRA e CHITAR- RA, 2005). Assim, frutos maiores poderiam dar maior suporte à germinação das sementes, em relação aos menores. CONCLUSÕES As progênies de mangabeira representadas na coleção de germoplasma da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos apresentam altos níveis de variação genética para os caracteres de diâmetro do caule e altura de plantas e taxas de crescimento. Para o diâmetro do caule, a maior parte da variação genética está dentro de populações e para a altura está entre populações. H. speciosa var. cuyabensis e H. speciosa var. gardneri apresentam maior desenvolvimento em campo em relação ao diâmetro do caule e à altura das plantas. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem á Prodetab/Embrapa e ao CNPq pelo suporte financeiro. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIAR, A.V. Emprego de parâmetros moleculares e quantitativos na conservação e melhoramento de Eugenia dysenterica DC p. Tese (Doutorado em Agronomia: Genética e Melhoramento de Plantas) - Escola de Agronomia, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, ALMEIDA, C.C.S.; ESPÍNDOLA, A.C.M.; CARVALHO, N.S.G.; SILVA, M.S. Variabilidade genética em mangabeira estimada através de caracteres morfológicos. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO SOBRE A CULTURA DA MANGABA, 1., 2003, Aracaju. Anais... Aracaju: Embrapa CPATC, (CD-ROM). BARREIRO NETO, M. Recursos genéticos para o melhoramento da mangabeira no estado da Paraíba. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO SOBRE A CULTURA DA MANGABA, 1., 2003, Aracaju. Anais... Aracaju: Embrapa CPATC, (CD-ROM). 402
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10 Ganga, Chaves e Naves Parâmetros genéticos em progênies de Hancornia speciosa Gomes do Cerrado SILVA JUNIOR, J.F.; XAVIER, F.R.S.; LEDO, C.A.S.; NEVES JUNIOR, J.S.; MOTA, D.M.; SCHMITZ, H.; MUSSER, R.S.; LEDO, A.S. Variabilidade em populações naturais de mangabeira do litoral de Pernambuco. Magistra, Cruz das Almas, v.19, n.4, p , TRINDADE, M.G.; CHAVES, L.J. Genetic structure of natural Eugenia dysenterica DC (Myrtaceae) populations in northeastern Goiás, Brasil, accessed by morphological traits and RAPD markers. Genetics and Molecular Biology, Ribeirão Preto, v.28, p , Recebido em 25/04/2009 Aceito para publicação em 08/09/
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