A TERCEIRIZAÇÃO DO TRABALHO E O PRECARIADO NA SOCIEDADE BRASILEIRA
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- Mafalda Leão Barreto
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1 PROPOSTA DE REDAÇÃO A questão da terceirização do trabalho ocupa, neste instante, uma posição de centralidade nos debates político-sociais do país, dividindo opositores e defensores do projeto de lei que busca regularizar a terceirização do trabalho no Brasil. Paralelamente a tal debate, verifica-se a expansão daquilo que hoje se denomina como precariado. Enquanto alguns cientistas sociais veem o precariado como uma nova e perigosa classe social, outros o veem como o desdobramento do próprio proletariado, não havendo nova classe social e sim uma específica camada da classe social já existente. Aqueles que se opõe ao projeto de lei, veem a terceirização do trabalho como um impulso para aumentar decisivamente a proporção do precariado no país. Considerando os trechos de artigos e de entrevista abaixo como motivadores para a formulação de tese e linha argumentativa, escreva uma dissertação-argumentativa sobre o tema: A TERCEIRIZAÇÃO DO TRABALHO E O PRECARIADO NA SOCIEDADE BRASILEIRA NOVOS RUMOS Vantagens e desvantagens do projeto de lei sobre terceirização 14 de abril de 2015, 10h00 Por Fernando Borges Vieira Há tempos não presenciávamos um embate tão acalorado sobre tema de ordem legal: os novos rumos da terceirização do trabalho propostos pelo Projeto de Lei 4330, apresentado em 26 outubro de 2004 pelo deputado Sandro Mabel (PL-GO), o qual foi aprovado sob o relatório do deputado Arthur Oliveira Maia (PMDB-BA), em 08 de abril de 2015 em Sessão Extraordinária da Câmara dos Deputados após intensos debates, ainda pendendo a apreciação e votação de emendas. Desde a apresentação de referido Projeto de Lei observou-se a dicotomia da sociedade brasileira; de um lado a iniciativa privada a qual compreende que o atual ordenamento jurídico lhe é por demais contundente ao imputar obrigações de distintas ordens e que chegam até mesmo a obstacularizar o desenvolvimento de suas atividades e de outro lado os trabalhadores, seus organismos de classe e boa parte dos juslaboralistas, cuja compreensão segue no sentido de que a terceirização, tal como aprovada, se consubstancia em verdadeiro atentado à organização do trabalho. Para que se possa compreender a relevância do tema em tela, é importante traçar mesmo que em breve notícia um paralelo entre o fenômeno da terceirização antes e depois do modelo proposto. Antes do Projeto de Lei 4330/04 inexistia regramento jurídico sobre a terceirização, cabendo à Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho estabelecer a impossibilidade de terceirização das atividades-fim (aquelas principais ou essenciais às empresas) e a permissão apenas em relação às atividades-meio (aquelas secundárias ou não essenciais às empresas). Em suma, era permitida a a terceirização em apenas quatro hipóteses: contratação de trabalhadores por empresa de trabalho temporário, contração de serviços de vigilância, de serviços de conservação e limpeza, e de atividades-meio, desde que inexistente a subordinação
2 direta. O modelo aprovado é considerado por muitos sobretudo os empresários como o marco regulatório da terceirização no Brasil e acaba por autorizar a terceirização de atividades-fim (aquelas principais ou essenciais às empresas) ao avesso do entendimento até então prevalecente. Além, o texto aprovado prevê outros aspectos relevantes: i) apenas as empresas especializadas poderão prestar serviço terceirizado; ii) familiares de empresas contratantes não poderão criar empresa para oferecer serviço terceirizado; iii) as empresas tomadoras dos serviços deverão recolher o que for devido pela empresa terceirizada contratada em impostos e contribuições, a exemplo do PIS/Cofins, CSLL e FGTS; iv) a responsabilidade das empresas tomadoras de serviços passa a ser subsidiária, razão pela qual os trabalhadores terceirizados somente poderão executar sentenças judiciais após esgotados os bens das empresas que terceirizam; v) as empresas contratadas devem destinar 4% do valor do contrato para um seguro, o qual irá abastecer um fundo para pagamento de indenizações trabalhistas; vi) a possibilidade de terceirização no serviço público e vii) a previsão de que os empregados terceirizados sejam regidos pelas convenções ou acordos trabalhistas estabelecidos entre a contratada e o sindicato dos terceirizados sendo que as negociações da contratante com seus empregados não se aplicariam aos terceirizados. Dentre estes aspectos, destacamos o fato de que as tomadoras de serviços somente responderão pelos créditos trabalhistas oriundos de condenações judiciais após esgotado o patrimônio da empregadora, não mais havendo a responsabilização solidária segundo a qual inexiste preferência ou ordem. Além, a permissão de terceirização de serviços públicos lança ao chão a proibição preconizada pela já referida Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, o que certamente impactará sobremaneira no mercado de trabalho. Por fim, destacamos ter sido e ainda será! objeto de muita e acolorada discussão o fato de que os empregados terceirizados se submetam às normas coletivas dos instrumentos firmados entre a contratada e o sindicato que os representa, não se aplicando os diplomas coletivos que regem a relação entre as tomadoras de serviços e os seus empregados. Sem embargos de compreensões contrárias, a aprovação do Projeto de Lei 4.330/04 traz consigo vantagens e desvantagens, tanto sob o olhar dos empregadores como dos empregados, sendo forçoso reconhecer que aqueles de beneficiam em maior razão. Para os empregados é vantajoso que caiba à tomadora de serviços o recolhimento de tributos e contribuições o que ao menos em tese lhes assegura o adimplemento de direitos; também lhes é benéfico que as empresas fornecedoras de mão de obra terceirizada tenham de destinar 4% do valor do contrato em favor de um fundo cujo fito seja o de responder pelas indenizações trabalhistas. Para os tomadores de serviços terceirizados, há indubitavelmente um rol maior de vantagens. Aos empregadores é consideravelmente vantajosa a possibilidade de terceirizar todas as atividades da empresa, sejam atividades-fim ou atividades-meio; é sobremaneira favorável passe a responsabilidade ser subsidiária e não mais solidária e, enfim, acaba também por lhes beneficiar até mesmo o fato de não se aplicar aos terceirizados a Convenção ou o Acordo Coletivo diversos daqueles que tutelam os seus empregados. Rogando vênia para fugir à isenção e em que pese percebermos a terceirização como um fenômeno importante e do qual não podemos nos afastar e de partilharmos do entendimento de que a legislação trabalhista atual é demasiadamente onerosa aos empregadores compreendemos com reserva a aprovação do Projeto de Lei 4.330/04, pois acreditamos estarmos diante de gravíssima lesão social de direitos sociais, trabalhistas e previdenciários e já vislumbramos o rebaixamento da remuneração contratual dos trabalhadores condição que impactará negativamente no mercado de trabalho e de consumo. Cumpre-nos, de mesmo modo, considerar o receio de que a diminuição substantiva da arrecadação tributária e previdenciária
3 acabe por deflagrar problemas de fiscais ao Estado. O novo regramento sobre a terceirização é vantajoso? Depende se o considerarmos sobre o prisma patronal ou sobre o prisma obreiro. A única certeza que conservamos é a de que não a curto penso que a médio prazo a sociedade sentirá os efeitos negativos dos novos rumos dados à terceirização em nosso país e quiçá estejamos diante do maior ato de precarização das relações trabalhistas e de um cabal atentado à organização do trabalho espero estar equivocado! Uma nova classe social ou o proletariado que se transforma? Leonor Assad NOVA CLASSE SOCIAL Resultado da junção das palavras proletário e precário, o termo precariado suscita ainda muitos debates sobre o que realmente representa. Um grupo importante, no qual se destacam o sociólogo francês Robert Castel e o professor de economia inglês Guy Standing, considera o precariado uma nova classe social formada por profissionais, geralmente jovens qualificados, que enfrentam condições de trabalho cada vez mais precárias. Castel, falecido em março último, já discutia a precarização da condição salarial no livro As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário, lançado na França em Em entrevista à Revue d'information Sociale, em 2010, Castel insistia: "a situação não melhorou... o fenômeno da precarização permanece importante e parece ter sido ocultado pelo problema do desemprego... muitos continuam a trabalhar em condições abaixo do que foi e do que ainda é considerado um emprego". Para Standing, o precariado é uma nova classe social, emergente e heterogênea, composta pelos que não têm educação ou status para compreender a situação e ouvem neofascistas; pelas minorias de imigrantes e deficientes, que estão perdidos e podem explodir; e por jovens educados que não têm futuro e que não aceitam propostas políticas da direita ou da esquerda. Standing identifica três características comuns a esses grupos: o emprego é casual e não lhes dá um senso de identidade profissional; os salários são muito baixos, com perda de benefícios e é necessário fazer muitas coisas não remuneradas (preparar currículo, procurar constantemente emprego, passar por treinamento etc); e faltam direitos a benefícios além do salário, como pensões, segurosaúde e licença-maternidade. Autor do livro O precariado - a nova classe perigosa, Standing, que é ex-diretor da Organização Internacional do Trabalho (OIT), afirma que o precariado é a primeira classe social com nível de educação e qualificação acima do exigido pelo trabalho: "a pessoa tem grau universitário, mas trabalha como garçom". POLÊMICA Mas há controvérsias em relação a algumas colocações de Standing. Nomes como os dos professores Ruy Braga e Giovanni Alves, no Brasil, e Peter Alexander e Edward Webster, na África do Sul, consideram que o precariado não é uma classe nova e sim uma camada do proletariado. Ruy Braga, professor da USP, aponta que o proletariado precarizado existe desde os primórdios do capitalismo histórico. Autor do livro A política do precariado: do populismo à hegemonia lulista, Braga remete a Karl Marx para delimitar o conceito de precariado como sendo a superpopulação relativa, excluindo-se os trabalhadores qualificados e a população pauperizada; ou seja, o precariado é formado pela camada da população latente, flutuante e estagnada. O conceito de superpopulação relativa (ou exército industrial de reserva) foi cunhado por Marx na segunda metade do século XIX. A população flutuante é a parte da classe trabalhadora formada
4 pelos que entram e saem do mercado de trabalho, pois são contratados e demitidos muito rapidamente pelas empresas; a população latente é composta por trabalhadores muito jovens que estão no campo e migram para a cidade, mas ainda não ingressaram no mercado formal; já a população estagnada engloba trabalhadores submetidos a condições absolutamente degradantes e que recebem salários baixíssimos. Para Braga o precariado é a fração mais numerosa e mais explorada da classe trabalhadora, mantida na periferia do sistema capitalista. Giovanni Alves, sociólogo e professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), concorda que o precariado não é uma classe nova mas "inclui apenas jovens adultos altamente escolarizados, desempregados ou inseridos em relações de trabalho e vida precárias". Segundo ele, "evidências empíricas demonstram efetivamente que esse é o perfil da juventude trabalhadora no seio dos novos movimentos sociais de rebeldia, tanto na Europa e Estados Unidos, quanto no Brasil". Outra divergência é quanto ao perigo do precariado. Enquanto Guy Standing considera o precariado uma classe perigosa por ser massa de manobra para grupos de direita, Ruy Braga considera que trata-se de uma classe progressista: "luta para conservar direitos sociais e proteger conquistas dos trabalhadores, protegendo-se do ataque conservador aos direitos dos trabalhadores". Por outro lado, Alves defende que, politicamente, o precariado tem caráter dual, intrinsecamente contraditório: "muitos integrantes do precariado cultivam aspirações fetichistas de consumo e adotam o individualismo competitivo próprio do ethos burguês, mas estão profundamente imersos na condição de proletariado". CAPITAL EM CRISE, TRABALHO PRECÁRIO Visto como uma camada do proletariado ou como nova classe social, o precariado é consequência do neoliberalismo e da globalização do capital. Sucessivas crises do capital, como a crise do México, em 1994, da Rússia em 1998 e a crise econômica de 2008/2009, que começou nos Estados Unidos e se alastrou por vários países da Europa, afetaram principalmente pessoas que constituem o grande contingente de reserva de mão de obra. Elas se viram destituídas das garantias sociais relativas ao vínculo empregatício, como estabilidade de emprego e renda e a representação política. Ou seja, as garantias conquistadas na Europa e nos Estados Unidos, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, vêm sendo negadas aos que ingressam no mercado de trabalho atualmente. Entrevista - Guy Standing "Terceirizações devem acelerar a expansão do precariado no Brasil" por Miguel Martins e Rodrigo Martins publicado 01/05/ h27 Os trabalhadores só deveriam aceitar a instabilidade no emprego se tivessem acesso a políticas para garantir a segurança da renda, avalia o economista britânico Economista com Ph.D. pela Universidade de Cambridge e professor de Desenvolvimento na Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, Guy Standing há tempos alerta para o fenômeno da emergência do precariado, uma nova classe trabalhadora em formação, caracterizada pela trajetória de perda de direitos que os reduz à condição de suplicantes, em um mundo marcado pela flexibilização das relações trabalhistas. Autor do livro O Precariado: A Nova Classe Perigosa(Editora Autêntica, 2013), ele é entusiasta de programas de renda básica, entendido como uma garantia incondicional e universal, uma vez que os antigos instrumentos de
5 proteção da socialdemocracia trabalhista acabaram solapados pela onda neoliberal. CC: Caso o Parlamento brasileiro aprove a liberação das terceirizações de forma indiscriminada, que impactos sociais essa medida poderia ter? GS: O precariado cresce no Brasil há alguns anos. Acredito que a nova legislação e a continuidade da terceirização e da subcontratação pelas empresas devem acelerar este processo, o que pode levar à piora na desigualdade dentro do mercado de trabalho e intensificar a insegurança social e econômica. Tenho defendido há algum tempo que, do ponto de vista analítico e político, precisamos fazer distinções entre as sete formas de insegurança apresentadas em meu livro sobre o precariado. A insegurança empregatícia refere-se à probabilidade da perda de uma relação de emprego com um contratante específico. Isso deve ser distinguido da insegurança no trabalho ou ocupacional. Na verdade, a última é a mais séria. Se alguém vive uma situação de emprego terrível, ter uma estabilidade de longo prazo não é atraente. O problema é, principalmente, o da insegurança na remuneração. Se houvesse políticas sensíveis para garantir a segurança da remuneração, como por meio de uma renda mínima, poderíamos aceitar a insegurança no emprego. A insegurança ocupacional é de outra natureza, já que buscamos desenvolver uma identidade ocupacional, e muitos gostariam de fazer o mesmo. A realidade, no Brasil e no mundo, é que medidas como a nova legislação das terceirizações no País intensificarão todas as formas de insegurança social e econômica. Esta é a tragédia da socialdemocracia trabalhista no século 20. Mas o precariado está evoluindo, e nos levará a novas opções políticas no futuro. CC: Em seu livro, o senhor observa que o precariado não é uma classe organizada que luta pelos próprios interesses. Ao contrário, o grupo parece estar em guerra consigo mesmo. Um trabalhador temporário e com baixo salário pode ser induzido a pensar que um trabalhador com direitos é um parasita de benefícios sociais. Isso não favorece a emergência de radicalismos? GS: Em O Precariado: A Nova Classe Perigosa, e mais sistematicamente em meu novo livro, A Precariat Charter (recém-lançado no Reino Unido, sem tradução para o português), argumento que o precariado até o momento representou uma classe-em-formação. A maioria de seus integrantes sabe o que não quer, antes de saber o que quer. Isso está mudando de forma impressionantemente rápida, muito mais veloz do que durante a emergência do proletariado no século XIX e começo do século XX. Sim, inicialmente o precariado é dividido internamente, em três partes que identifico em meu livro: reacionários, nostálgicos e progressistas. Mas a terceira facção tem crescido de forma relativa e absoluta, e este setor começa a definir uma nova política progressista, particularmente em países como Espanha, Portugal, Itália, Grécia e partes da Escandinávia. Claro, devemos nos preocupar com os reacionários, aqueles que caíram no precariado depois de fazerem parte de famílias e comunidades de trabalhadores tradicionais. Eles tendem a ter pouca instrução, e dão ouvidos ao que chamo de sirenes do populismo neofascista. Eles estão se tornando a infantaria de partidos populistas de direita, como a Aurora Dourada na Grécia e a Frente Nacional na França. Mas acredito que muitos dos atraídos para esta direção só o fazem porque a parte nostálgica do precariado ainda não definiu uma alternativa, uma perspectiva para o futuro. Meu novo livro trata disto.
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