Felippe Mendes Falesic João Marcos Gertrudes Tavares 1º Comentário a Acórdão

Transcrição

1 Universidade de Brasília Faculdade de Direito FD Teoria Geral do Processo II Felippe Mendes Falesic João Marcos Gertrudes Tavares 1º Comentário a Acórdão 2014

2 Recurso Extraordinário : EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Servidor público militar. Exclusão da Corporação. Ato administrativo. Controle judicial. Possibilidade. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Precedentes. 1. Não viola o princípio da separação dos poderes o controle de legalidade exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos administrativos. 2. A Corte de origem, ao analisar o conjunto fático-probatório da causa, concluiu que a punição aplicada foi excessiva, restando violados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 3. Não se presta o recurso extraordinário ao reexame de fatos e provas da causa. Incidência da Súmula nº 279/STF. 4. Agravo regimental não provido. (RE AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 05/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe- 078 DIVULG PUBLIC ) No trabalho em questão comentário a acórdão faz-se necessário relacionar algum dos princípios estudados durante as aulas com um acórdão do Supremo Tribunal Federal. No caso, o acórdão escolhido resultado do Recurso Extraordinário possui estreita relação com o princípio da proporcionalidade (razoabilidade) e será foco de análise neste trabalho.

3 De forma introdutória, importante será a análise do que são os princípios processuais. Assim, tais princípios classificam-se como espécies normativas que estabelecem fins a serem atingidos. Com base no pensamento de Humberto Ávila: os princípios instituem o dever de adotar comportamentos necessários à realização de um estado de coisas ou, inversamente, instituem o dever de efetivação de um estado de coisas pela adoção de comportamentos a ele necessários. Os princípios também exercem uma função interpretativa servindo para interpretar normas construídas a partir de textos normativos expressos. Desse modo, exercem uma função bloqueadora: servem para justificar a não-aplicação de normas que embora expressamente previstas sejam incompatíveis com o estado de coisas que se busca promover. Ainda antes de estudar propriamente o princípio da proporcionalidade, faz-se necessária a análise de outro princípio processual: o devido processo legal. Como uma ideia geral do princípio, o processo deve estar em conformidade com o direito como um todo. É importante ressaltar que direito não significa somente a normatização textual, mas sim uma ideia mais ampla que envolve conceitos de justiça e igualdade. Assim, o devido processo legal se define como uma garantia contra o abuso de poderes. Contudo, o devido processo legal pode ser entendido por um viés formal ou substancial. A corrente principiológica que se refere ao devido processo legal substancial possui estreitas relações com a proporcionalidade e será objeto de análise. Tal corrente desenvolveu-se nos EUA, postulando que um processo devido não é apenas o que segue exigências formais. Devido seria o processo que gerasse decisões jurídicas substancialmente devidas. A jurisprudência brasileira concretizou o princípio do devido processo legal de maneira bem peculiar, considerando-lhe fundamento constitucional da proporcionalidade e razoabilidade. Assim, o devido processo legal se relaciona intimamente com a razoabilidade e proporcionalidade em busca de um processo que se resolva de maneira adequada e justa. Como princípio da proporcionalidade propriamente dito, destaca-se sua delineação pelo direito constitucional, mas com grande aplicabilidade processual. Nesse sentido, tal princípio busca evitar o excessivo subjetivismo do juiz. Sendo assim, obedece a parâmetros

4 estritos, que são: a adequação entre meios empregados e fins visados; a proporcionalidade estrita, entendida como aferição e balanceamento dos valores em jogo; o menor sacrifício possível ao bem considerado menos importante. A relativização da coisa julgada material tem suas bases fundadas no princípio da proporcionalidade, de modo a haver uma apreciação harmoniosa dos fatos para que se decida, em um conflito de princípios, pelo que mais se adéqua à situação. Assim, deve-se sempre dar prevalência àquela decisão que no caso concreto se mostre mais justa e adequada. Esse é o modo pelo qual o direito conseguiu se defender de decisões arbitrárias proferidas por alguns magistrados evitando disparidades legais. O Princípio da Proporcionalidade ou razoabilidade é o que fica mais evidente neste acórdão (RE ). Este princípio tem como marco de sua origem a passagem do Estado absolutista para o Estado liberal. A proporcionalidade chegou como um mecanismo para coibir e limitar diversos mecanismos para se atingir determinada finalidade. A lei antes garantia poder absoluto ao monarca, e agora ela serviria, entre outras funções, para frear seus atos, para trazer proporcionalidade aos seus atos. A Constituição brasileira de 1988 é um marco claro de como o princípio da proporcionalidade está concretizado e em vigor no nosso país. A Constituição veio carregada de direitos importantes para a manutenção do Estado Democrático de Direito, das liberdades e garantias individuais, dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana, e isso é uma comprovação de que o princípio da proporcionalidade ocupa posição de destaque na nossa Constituição. Agora, pegando o caso concreto do acórdão RE , podemos perceber que o principio da proporcionalidade foi usado pelo ministro Dias Toffoli ao proferir o seu voto. Ele colhe do voto condutor alguns argumentos em favor do principio da proporcionalidade. Primeiro, o fato do sargento ter apenas tangenciado a esfera criminal, por conta da dificuldade de se provar a existência de dolo no momento em que ele colocou o pacote de chá no bolso e saiu sem pagar, principalmente por ter pago todo o restante da mercadoria. Segundo, o fato de estar a 28 anos prestando serviços, sem antecedentes e com uma excelente ficha funcional.

5 Todos esses fatos levaram o ministro a entender que o ato de exclusão do sargento foi ilegal, devido ao fato de ser uma punição excessiva (desproporcional), e com isso, ferindo o principio da proporcionalidade. Sua exclusão só seria legal caso comprovado à prática de ilícito funcional por parte do sargento. Nosso entendimento sobre o caso vai de acordo com o entendimento do ministro Dias Toffoli. Primeiramente, o fato do sargento ter pago todo o restante da mercadoria e só não ter pago o pacote de chá nos parece não passar de um mero esquecimento, principalmente por ele ter colocado o chá dentro do bolso, o que facilita esse esquecimento. Outro ponto também é o de que toda pessoa constrói uma reputação, e tal reputação tem que ser levada em conta ao analisarmos um caso assim. Uma pessoa como esse sargento, que nunca cometeu nenhum ato ilícito em sua vida, com uma excelente ficha funcional, merece pelo menos o benefício da dúvida quando acusado de cometer um crime que não pode ser comprovado. Contudo, entendemos que o principio da proporcionalidade foi utilizado de forma correta nesse caso, inocentando o sargento e tornando ilegal sua expulsão do Regime Militar. Qualquer outra decisão estaria prejudicando o sargento de forma excessivamente dura, e estaria violando o principio da proporcionalidade. De forma a também exemplificar o princípio da proporcionalidade, pode-se examinar decisões jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal. Um caso emblemático é o Habeas Corpus : EMENTA - Habeas corpus. 2. Atentado violento ao pudor. Violência presumida. Condenação. Regime inicial semiaberto. 3. Pedido de fixação do regime aberto. Impossibilidade. A gravidade concreta da conduta justifica a fixação do regime mais gravoso, pois a escolha do regime inicial não está atrelada, de modo absoluto, ao quantum da pena estabelecida, devendo-se considerar as demais circunstâncias do caso, as quais revelam a maior periculosidade do agente. Precedentes. 4. Princípio da proporcionalidade: a fixação do regime aberto representaria proteção judicial insuficiente. 5. Ordem denegada. (HC , Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 22/10/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe- 236 DIVULG PUBLIC )

6 No caso em questão, o princípio da proporcionalidade foi utilizado de modo a denegar o pedido de Habeas Corpus. Tal fato ocorreu, pois o que se pediu foi um abrandamento de pena, que no caso proporcionaria uma proteção judicial insuficiente. Sendo assim, a razoabilidade foi utilizada de forma a evitar que uma pena muito branda fosse utilizada para punir um crime que requeria mais punição. Ou seja, utilizou-se o pensamento proporcional a fim de adequar os meios utilizados aos fins visados. BIBLIOGRAFIA: - DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual civil. 14ª Ed. Salvador: Juspodvm, 2012, v. 1 - CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido R. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros.