Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Vigésima Segunda Câmara Cível Apelação Cível nº

Transcrição

1 Apelante: SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Apelado: ERNESTINA GARABAL PEREIRA Relator: DES. CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA A C Ó R D Ã O APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. RÉ QUE NÃO FAZ JUS A GRATUIDADE DE JUSTIÇA PRETENDIDA. RECONHECIMENTO DE TITULARIDADE DE JAZIGO DA AUTORA PELA RÉ. NEGATIVA DE ACESSO A PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE TRATA DA QUESTÃO, BEM COMO DE CERTIDÕES DE TITULARIDADE E DE LOCALIZAÇÃO DE RESTOS MORTAIS. CONDUTA DESARRAZOADA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. - Autora que adquiriu a titularidade do carneiro nº 9.851, da quadra 12, localizado no Cemitério São João Batista, através de processo que tramitou perante o 5º Juizado Especial Cível nº Pretensão de obtenção do benefício da gratuidade de justiça. Deferimento pelo juízo monocrático exclusivamente para recebimento do recurso de apelação. Pessoa jurídica que deve comprovar sua necessidade, independentemente de ter ou não fins lucrativos. Entendimento dos Tribunais Superiores. Não se pode extrair pela documentação acostada aos autos o alegado estado de miserabilidade econômica, mormente diante do valor do patrimônio líquido indicado na declaração de imposto de renda de fl Apesar de reconhecer a existência de processo judicial, fl. 29, e de ordem emanada no sentido de que a autora é quem detém a titularidade do carneiro nº 9.851, a ré, desarrazoadamente, se nega a exarar certidão no sentido de tal titularidade, o que se afigura inaceitável. - Negativa de acesso da autora a processo administrativo oriundo do aludido processo judicial. Conduta inconcebível, em virtude do evidente interesse da autora. - Demandada que deixou de impugnar o pedido de exibição de certidão contendo a localização dos restos mortais do finado marido da demandante. De certo, a ré removeu os restos mortais do falecido sem a anuência do responsável legal, devendo informar à autora, sua viúva, a atual localização, como pretendido na inicial. - Decreto nº que apenas disciplina o processo de transição dos serviços cemiteriais e funerários, não comprovando, de forma inequívoca, que a ré não pode cumprir obrigação judicialmente imposta no caso concreto. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n , em que é Apelante: SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO e Apelado: ERNESTINA GARABAL PEREIRA, Secretaria da

2 ACORDAM os Desembargadores da 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em conhecer do recurso, negando-lhe provimento, nos termos do voto do Desembargador Relator. Rio de Janeiro, 26 de maio de Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA Relator Secretaria da

3 V O T O Trata-se de ação de exibição de documentos na qual a autora relata que obteve a titularidade do carneiro nº 9.851, da quadra 12, localizado no Cemitério São João Batista, através de processo que tramitou perante o 5º Juizado Especial Cível nº Afirma que compareceu ao referido cemitério, mas foi informada que não consta no sistema interno do mesmo a referida titularidade e que não está mais sepultado no local os restos mortais de Antonio Maneiros Civis. Afirma, ainda, que existe o processo administrativo nº de 20/04/2009, oriundo do referido processo judicial, tendo a ré negado acesso a autora. Requer a exibição do processo administrativo nº 2.628; a exibição de todas as despesas emitidas pela ré; a expedição de certidão da localização dos restos mortais do finado Antonio Maneiros Civis e de certidão do nome do titular do carneiro nº 9.851, da quadra 12 do cemitério São João Batista. A sentença, fls. 132/135, julgou parcialmente procedente o pedido inicial, determinando que a ré exiba a cópia do processo administrativo nº 2.628, a certidão de localização dos restos mortais de Antonio Maneiros Cives e a certidão do nome do titular do carneiro perpétuo nº 9.851, da quadra 12, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 50,00 (cinquenta reais). Condenou a ré ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios arbitrados em R$ 500,00 (quinhentos reais). Recurso de apelação interposto pela parte ré, fls. 138/148, postulando a concessão da gratuidade de justiça. Sustenta que Resolução publicada em 09/07/2013 proíbe a realização de transferência de titularidade de jazigos perpétuos; que não é mais administradora do cemitério desde 13/08/2014, sendo responsável a nova concessionária Prever Rio Pax S. A.; que não possui a documentação solicitada e que se trata de obrigação impossível. Gratuidade de Justiça concedida pelo juízo monocrático tão somente em relação ao recurso de apelação. Contrarrazões às fls. 184/196. É o relatório. Secretaria da

4 Na hipótese vertente, a autora adquiriu a titularidade do carneiro nº 9.851, da quadra 12, localizado no Cemitério São João Batista, através de processo que tramitou perante o 5º Juizado Especial Cível nº Em princípio, cabe apreciar o pedido de gratuidade de justiça formulado pela ré. Não há dúvidas quanto à possibilidade de deferimento da gratuidade de justiça em favor de pessoa jurídica, entendimento pacificado no âmbito das Cortes Estaduais e dos Tribunais Superiores. Todavia, a simples condição de entidade associativa sem fins lucrativos não induz o acolhimento automático do pedido. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, este após certa relutância, firmaram entendimento no sentido de que o benefício da gratuidade somente pode ser concedido às pessoas jurídicas que comprovem sua necessidade, independentemente de terem ou não fins lucrativos. A propósito, vide os julgados a seguir: 1. O pedido de justiça gratuita de pessoa jurídica de direito privado deve ser acompanhado de detalhada comprovação da efetiva insuficiência de recursos. Precedentes. 2. Rever a decisão do Tribunal de origem, para concluir de modo diverso, implicaria o reexame de fatos e provas, o que é vedado em sede extraordinária (Súmula STF nº 279). 3. Agravo regimental improvido. (AI AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe-148 DIVULG PUBLIC EMENT VOL PP-03413) TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA SEM FINS LUCRATIVOS. NECESSIDADE DE PROVA DA INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que mesmo em favor das pessoas jurídicas é possível a concessão do benefício da justiça gratuita, nos termos da Lei 1.060/50. Referido benefício pode ser concedido às pessoas jurídicas apenas se comprovarem que dele necessitam, independentemente de terem ou não fins lucrativos. 2. Na hipótese dos autos, a gratuidade foi indeferida ao fundamento de que "não restou demonstrada a insuficiência econômica que justificaria a concessão da assistência judiciária gratuita, mesmo tratando-se de entidade sem fins lucrativos". Secretaria da

5 Modificar o entendimento firmado pelo Tribunal de origem, como pretende o recorrente, demandaria incursão no contexto fático-probatório dos autos, defeso em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp /RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 26/05/2011) Nesta toada, não se pode extrair pela documentação acostada aos autos o alegado estado de miserabilidade econômica, apto a justificar a concessão do benefício da gratuidade de justiça requerido pela apelante, mormente diante do valor do patrimônio líquido indicado na declaração de imposto de renda de fl A respeito do tema em tela, transcrevem-se os seguintes arestos: AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. BENEDICTO ABICAIR - Julgamento: 08/09/ SEXTA CAMARA CIVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. INDEFERIMENTO. ENTIDADE FILANTRÓPICA. SANTA CASA DE MISERICÓRIDA. 1. Conquanto possa ser deferido o benefício da gratuidade de justiça a pessoa jurídica que comprove estado de hipossuficiência econômica, a simples condição de entidade associativa sem fins lucrativos não induz a presunção de veracidade de tal alegação ou o acolhimento automático do pedido de gratuidade de justiça. 2. Precedentes do STJ. 3. Negativa de seguimento ao recurso, nos termos do art. 557, caput, do CPC AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. CAMILO RIBEIRO RULIERE - Julgamento: 18/02/ PRIMEIRA CAMARA CIVEL Indenizatória em fase de execução Indeferimento da gratuidade de justiça - Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro Cabe à pessoa jurídica, seja ela com fins lucrativos ou beneficentes, a gratuidade de justiça, desde que comprovada a impossibilidade de suportar as despesas do processo. Patrimônio líquido de mais de quinze milhões de reais que faz prova em contrário da hipossuficiência da entidade filantrópica. Hipossuficiência não demonstrada - Descumprimento do artigo 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal e da Lei nº 1.060/50 - Desprovimento do recurso. Secretaria da

6 APELACAO DES. MARCO ANTONIO IBRAHIM - Julgamento: 02/05/ VIGESIMA CAMARA CIVEL Civil. Incidente de impugnação à gratuidade de justiça deferida nos autos principais. Pobreza e necessidade. Benefício da gratuidade que revela instrumentalidade no acesso à Justiça. Necessidade que não implica escassez total de recursos ou patente miserabilidade. Patrimônio não incompatível com a concessão do benefício. Possibilidade de revogação do benefício a qualquer tempo, a critério do Juiz. Recurso a que se nega seguimento. Em relação ao mérito da demanda, saliente-se que é possível extrair do documento de fl. 29, elaborado pela ré, que Tania Maria de Laia da Silva solicitou, por intermédio do aludido processo judicial, a transferência de titularidade do citado carneiro para o nome da demandante, obtendo êxito, em conformidade com sentença proferida pelo juízo leigo e homologada pelo juízo do 5º Juizado Especial Cível. Dessume-se, pois, que, apesar de reconhecer a existência de processo judicial e de ordem emanada no sentido de que a autora é quem detém a titularidade do carneiro nº 9.851, a ré, desarrazoadamente, se nega a exarar certidão no sentido de tal titularidade, o que se afigura inaceitável. Inconcebível, também, que a ré não permita que a autora tenha acesso ao processo administrativo oriundo do processo judicial, ao argumento de que se trata de controle interno. Se o processo administrativo se refere a troca de titularidade do carneiro nº 9.851, por óbvio, é de interesse da autora, a quem deve ser permitida a consulta e até mesmo a extração de cópia. Nem se diga que não é mais possível a transferência de titularidade de jazigo, na medida em que a Resolução apontada pela ré data do ano de 2013, sendo certo que o magistrado que atua perante o 5º Juizado Especial Cível proferiu sentença em 2008, consoante consulta realizada no sistema INTRANET deste TJ/RJ, portanto, antes da vigência de dita Resolução. Por outro lado, quando da apresentação da peça de bloqueio, a demandada deixou de impugnar o pedido de exibição de certidão contendo a localização dos restos mortais de Antonio Maneiros Civis, que não se encontram no carneiro nº 9.851, apesar de sepultado no mesmo, em conformidade com o já mencionado documento de fl. 29 e com a certidão de óbito de fl. 30. Secretaria da

7 De certo, a ré removeu os restos mortais do falecido sem a anuência do responsável legal, devendo informar à autora, sua viúva, a atual localização, como pretendido na inicial. Por fim, cumpre rechaçar a alegação da ré de que não é mais administradora do cemitério e que não possui mais a documentação pretendida, eis que o Decreto nº de 12/08/2014, acostado aos autos à fl. 149, tão somente constitui comitê destinado a proceder a transição dos serviços cemiteriais e funerários que menciona. O Decreto nº apenas disciplina o processo de transição, não comprovando, de forma inequívoca, que a ré não pode cumprir obrigação judicialmente imposta no caso concreto. Destarte, não prosperam as razões recursais, confirmando-se na íntegra a sentença apelada. À conta de tais argumentos, conheço do recurso, negando-lhe provimento. Rio de Janeiro, 26 de maio de Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA Relator Secretaria da