118 Paraíba. De todas as doenças que atingiram. Uma das Maiores Prevalências de Câncer Bucal da Federação Brasileira

Transcrição

1 118 Paraíba Uma das Maiores Prevalências de Câncer Bucal da Federação Brasileira zxz Rosimar de Castro Barreto 1, Marcos Farias de Paiva 2, Giuseppe A. S. Pereira 3 e Joni M. S. Oliveira 4 1, 2 e 3 Professores do Departamento de Ciência Odontológica e Social da UFPB. 4 Chefe do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Dr. Napoleão Laureano - João Pessoa/PB De todas as doenças que atingiram o ser humano no curso da civilização, o câncer ressaltou-se pelo seu comportamento anormal e nefastas repercussões orgânicas, destruindo e aniquilando, progressivamente, todas as reservas vitais e resistindo aos mais complexos tratamentos e levando quase sempre os pacientes à morte (Chaves 1966). No Brasil, os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde (1997), através da Coordenação dos Programas do Instituto Nacional de Combate ao Câncer, são alarmantes, posicionando esta patologia no terceiro lugar de causa mortis na população brasileira, perdendo apenas para as doenças do aparelho circulatório e os acidentes de trânsito. Nos países de primeiro mundo chega a ocupar a sexta posição com estimativas de mortes anuais (Gupta, Murti, Bhonsle, 1996). Dentre as neoplasias, as da cavidade bucal destacam-se devido a sua alta incidência, existindo estimativas de que esse tipo de patologia deva atingir cerca de 10% do total dos tumores malignos que acometem o ser humano. De acordo com trabalhos de Brumini (1982), a Paraíba é a segunda região da Federação Brasileira com mais prevalência de câncer primário de boca, alcançando 15,8% da Freqüência Nacional, enquanto isso Tommasi (1989) relata ser o Estado da Paraíba considerado na literatura o de maior ocorrência de câncer bucal entre os estados brasileiros. As lesões malignas que afetam a cavidade bucal são de dois tipos: Os carcinomas (epiteliais e melanoma) e os sarcomas (conjuntivos). A incidência do carcinoma bucal vem crescendo consideravelmente em nível nacional, particularmente na Paraíba, causando uma preocupação nos profissionais que tratam da saúde bucal (Torres & Andrade, 1987; Rosa, Falcão e Sampaio,1997; Beltrão,1998). A Etiologia desse mal que afeta a humanidade é de caráter multifatorial, tendo os agentes oncogênicos externos e internos papel primordial no seu desenvolvimento (Tommasi 1989). Embora ocorram em qualquer parte da cavidade bucal, certas localizações anatômicas são mais atingidas pelos carcinomas de células escamosas constituindo cerca de 90% a 95% de todos os tumores malignos que ocorrem na boca, sendo a língua, o lábio e o assoalho da boca as áreas de maior comprometimento (Beltrão, l998). A variabilidade de localizações afetadas e a sua associação com determinados fatores como o tabaco, álcool, deficiência nutricional e ainda traumatismos cons- Conc. João Pessoa, v.4, n 6, p Jul./Dez. 2001

2 Conc. João Pessoa, v.4, n 6, p Jul./Dez tantes causados por restos radiculares e próteses de bordas aguçadas, são citados como fatores de possíveis influências no desenvolvimento do câncer bucal (Araújo Filho et al., 1998). Diversas outras circunstâncias em que o indivíduo se expõe no meio ambiente constituem fatores de risco tais como: atividade ocupacional em indústrias químicas, consumo de certos alimentos, medicamentos, produtos domésticos e ainda fatores físicos externos da natureza como água, terra, ar e irradiação solar e ainda exposições constantes a aparelhos que emitem energia Ionizante (Raio X). O somatório de uma destas condições carcinogênicas ao tempo de exposição, intensidade e herança genética são fatores predisponentes básicos na gênese das neoplasias que acometem a cavidade bucal (Shafer, Hine, Levy,1987). Determinados tipos de lesões poderão sofrer transformações e desencadear o aparecimento do câncer bucal, assim como a leucoplasia, eritroplasia, fibrose submucosa e ceratose actínica (Tommasi, 1989). Em virtude da alta incidência dos tumores malignos, os pesquisadores vêm despertando a atenção sobre a demografia do câncer, excelentes informações sobre a prevalência como, por exemplo, a predominância de certos tipos de câncer bucal em determinadas regiões do Brasil, permitindo obter dados de grande importância epidemiológica que, de certo modo, contribuirão para futuras pesquisas. No estado da Paraíba, pesquisas epidemiológicas sobre câncer bucal foram relacionadas com sexo, faixa etária, localização anatômica e tipo histológico (Sampaio,1985; Rosa,1985; Rosa, Falcão, Sampaio, 1997; Beltrão, 1998). Com relação ao estudo sobre a distribuição geográfica do câncer bucal existem relatos de Chaves (1966), ainda que feitos de forma generalizada, não se restringindo apenas à boca. A extensa área ocupada pelo território paraibano proporciona variações climáticas severas, além da diversidade na composição racial, hábitos e atividades profissionais que dificultam uma avaliação concreta dos levantamentos epidemiológicos. Desta forma, a presente pesquisa teve como propósito realizar estudo epidemiológico sobre a prevalência das neoplasias malignas da boca no estado da Paraíba e fornecer dados de interesse sobre os presumíveis agentes etiológicos capazes de desencadear tais lesões, levando em consideração o tipo histológico, localização anatômica, sexo, raça, faixa etária e ainda a distribuição demográfica, como um fator capaz de influenciar no aparecimento do câncer bucal. 119

3 Metodologia O estudo foi realizado no Hospital Dr. Napoleão Laureano, no município de João Pessoa Paraíba, especializado no diagnóstico e tratamento do câncer. Nossas observações limitaram-se aos casos de neoplasias malignas da cavidade bucal, diagnosticadas e encontradas no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, no período de 1989 a 1999, somando um total Dos 1671 casos de câncer registrados no Serviço de Cabeça e Pescoço no Hospital Dr. Napoleão Laureano em João Pessoa PB, no período de 1989 a 1999, 1237 estavam localizados na cavidade bucal, representando 74% dos casos. Analisando a distribuição geográfica do número de câncer de 1237 casos. A metodologia aplicada para obtenção de dados obedeceu aos seguintes critérios: foram incluídos os prontuários de pacientes com diagnóstico histopatológico de neoplasia maligna da cavidade bucal como tumor primário e excluídos os prontuários com dados incompletos ou duvidosos. Os dados foram coletados por um único examinador, através de ficha de identificação, sendo os mesmos transcritos em um Resultados e Discussão programa de computador, por meio de um banco de dados em software do serviço médico e estatístico do próprio hospital. Os resultados obtidos foram submetidos à análise estatística e descritos em forma de tabelas e figuras, contendo números absolutos e percentuais de acordo com a epidemiologia, o tipo histológico da lesão, sexo, raça, faixa etária, localização anatômica, bem como a procedência regional dos pacientes. dos demonstrados na Fig. 1, podese verificar que a região do litoral apresenta a menor área territorial com 4.186,1 km 2 e a maior densidade demográfica com 289,75 hab/ km 2. Em contrapartida, a região do sertão apresenta a maior área regional com ,8 km 2 do território paraibano e a terceira densidade demográfica com 38,9 hab/km 2. Reprodução Digital Figura 1 - Distribuição de nº de casos Câncer Bucal Segundo Procedência Regional Com base nos dados citados, verifica-se que a região do litoral com população de hab registrou 493 casos, representando a região de maior prevalência estimada em 39 casos para habitantes. Proporções semelhantes foram observadas na região do sertão que possui uma população de hab. e uma cifra de 320 casos estimados em 37 casos/ hab. denotando a segunda região de maior freqüência. Comparando estas duas regiões, observa-se que a densidade demográfica do Litoral é 7,6 vezes maior que a do Sertão e área territoribucal, no estado da Paraíba, ficou demonstrado que a maior freqüência foi de 493 casos no litoral (39,9%); 337 casos no agreste (27,2%); 320 casos no sertão (25,9%); 61 casos na região da Borborema (4,9%); e 26 casos de cidades limítrofes pertencentes a outros estados (2,1%). De acordo com os dados obtial 5.6 vezes menor, entretanto, os índices de prevalência são semelhantes. A região do Agreste possui a segunda maior população, com hab. e o segundo maior número de câncer bucal com 337 casos (27,2%), porém, corresponde à terceira prevalência regional estimada em 27 casos/ hab. E a Borborema de a menor densidade demográfica com 21 hab/km2, e com o menor número de casos 61 (4,9%), representa a menor prevalência regional, estimada em 19 casos por hab. Estes dados comprovam que a prevalência de câncer bucal nas regiões paraibanas está relacionada apenas com o número populacional, indiferente à área territorial. Dos casos, 747 (62,6%) originaram-se no sexo masculino e 448 (37,4%) no sexo feminino, havendo atualmente uma tendência a igualar, devido à mudança de hábito, visto que a proporção era de 4 homens para 1 mulher. As localizações de maior prevalência foram observadas na língua, lábio inferior, área retromolar, assoalho bucal e palato, afetando em maior número a raça branca entre a 6ª e 8ª década. (Tabela 1). 118 Conc. João Pessoa, v.4, n 6, p Jul./Dez. 2001

4 LOCALIZAÇÃO ANATÔMICA TIPO HISTOLÓGICO S E X O CARCINOMA DE CÉLULAS ESCAMOSAS MASCULINO FEMININO Nº % Nº % SUBTOTAL Nº % Língua (SOE) Lábio Inferior Boca (SOE) Área Retromolar Gengiva Assoalho Bucal Palato mole Lábio (SOE) Palato (SOE) Palato duro Labio Superior Mucosa Jugal Mandíbula Maxila ,2 10,1 5,9 5,8 4,4 4,3 3,8 4,0 2,9 0, ,9 3,4 3,3 3,0 3,7 2,3 2,1 2,4 1,8 1,7 0,5 0,3 0, ,1 13,5 9,2 8,8 8,1 6,6 5,9 5,3 5,3 3,2 3,0 1,0 Total , , ,0 TABELA 01 Distribuição do número de casos de Carcinoma de Células, Escamosas segundo a localização anatômica e o sexo Pelo que foi apresentado, é de caráter primordial que se tenha uma maior atenção das autoridades sanitárias competentes para a criação de programas preventivos que viabilizem o diagnóstico precoce e tratamento adequado do câncer bucal em todo o território nacional e que o indivíduo mantenha uma vida saudável, evitando o consumo excessivo de álcool, fumo, exposição ao sol, energia ionizante e tenha uma alimentação à base de vegetais e frutas ricos em vitaminas A e E, que atuam na prevenção do câncer (Moller, 1989). Diante do exposto pode-se concluir: - A prevalência do câncer bucal entre as regiões do estado da Paraíba não é proporcional as suas respectivas densidades populacionais. - As regiões paraibanas de maior freqüência foram o litoral com 39 casos/ hab. e o sertão com 37 casos/ hab. - As localizações de maior prevalência foram a língua com 338 casos, dos quais 150 casos procedentes do litoral, e lábio inferior, com 165 casos, dos quais 70 oriundos do sertão. - Orienta-se que o individuo tenha uma boa higiene bucal e visite periodicamente o profissional da área de saúde do seu município. Conc. João Pessoa, v.4, n 6, p Jul./Dez

5 bibliografia CHAVES, E. Contribuição ao Estudo do Câncer no Estado da Paraíba. João Pessoa: Imprensa Universitária, pg. GUPTA, P.C.; MURTI, P.R. BHONSLE, R.B. Epidemiology of Cancer by Tobacco Products and the Significance of TSNA. Critical Reviews in Toxicology. V. 26, n2, p , BRUMINI, R. Câncer no Barsil: Dados Histopatológicos, 1976 a Campanha Nacional de Combate ao Câncer, INCA, 480p. Rio de Janeiro: TOMMASI, A. F. Semiologia do Câncer Bucal IN: Diagnóstico em Patologia Bucal. 2ª edição. São Paulo: Pancast Cap. 25, p TORRES, I. A.; ANDRADE, M.G.N. Câncer de Boca no Interior da Paraíba, Relato de Cinco Casos. Revista Ciências, Cultura e Saúde. v. 9, n.3. P ROSA M.R.D., FALCÃO, A. V., SAMPAIO, G.S. Epidemiologia do Câncer Bucal no Es-tado da Paraíba-Brasil ( ). Revista Brasileira de Ciências da Saúde. v.1. n.1/3. p , BELTRÃO, R. V. Estudo Epidemiológico do Carcinoma Espinocelular da Cavidade Bucal em Pacientes do Hospital Dr. Napoleão Laureano f. Dissertação (Mestrado em Odontologia) CCS/UFPB, João Pessoa, ARAÚJO FILHO V. J. F. et al. Perfil de Incidência do Câncer Oral em um Hospital Geral em São Paulo. Rev. HOSPITAL CLÍN. Fac. Med. São Paulo, v.53, n.3, p , SHAFER, W.G. HINE, M.K. LEVY. P.M. Tumores Malignos da Cavidade Bucal In. Tratado de Patologia Bucal. 4ª ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan 1987, 837p. Cap.2, p SAMPAIO, M.C.C. et al. Análise do Carcinoma Bucal. Casuística do Hospital Napoleão Laureano João Pessoa-PB. Revista Brasileira de Cancerologia. v.31. n.2, p ROSA, M.R.D.; Câncer Oral. Estudo Epidemiológico de 670 Casos Registrados no Hospital Dr. Napoleão Laureano, João Pessoa. Revista Ciências, Cultura e Saúde. v.7, p.41-45, MOLLER, H. Changeng. Indice of Cancer of Tongue, Oral Cavity and Pharynse in Denmark. J. ORAL Pathol. v.18, n.4, p , Conc. João Pessoa, v.4, n 6, p Jul./Dez. 2001