Depressão Algumas considerações sobre seu entendimento e seu tratamento

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3 Depressão Algumas considerações sobre seu entendimento e seu tratamento

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5 Carmem Dametto Depressão Algumas considerações sobre seu entendimento e seu tratamento 1ª Edição POD Petrópolis KBR 2014

6 Revisão de texto Noga Sklar Editoração KBR Capa KBR sobre desenho de Darel Valença, Paranduba amazonense, gravura em metal, Copyright 2014 Carmem Dametto Todos os direitos reservados à autora. ISBN: KBR Editora Digital Ltda PSY Psicologia, depressão

7 Carmem Dametto é psiquiatra e psicanalista da SBPRJ. Nasceu em Garibaldi, Rio Grande do Sul, em 1941, e vive no Rio de Janeiro desde a década de Foi muito perseguida nos anos do Regime Militar por sua formação marxista. Talvez por essa formação dialética, tem com seus pacientes uma abordagem terapêutica inovadora. Escreveu cinco livros e foi fundadora da extinta Pensão Margaridas, clinica dinâmica de tratamento de pacientes internados ou semi-internados. Foi Professora Titular da Cadeira de Psiquiatria em Vassouras, e chefe e supervisora da 1ª clínica de Tratamento Dinâmico, RJ na década de 1970, a chamada Vila Pinheiros. carmemdametto@gmail.com Blog da autora: carmemdametto.blogspot.com

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9 Dedico este livro à minha filha Marcela, aguerrida e vitoriosa.

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11 Agradecimentos A todos os meus preciosos pacientes, supervisionandos, alunos e alguns colegas, meu eterno agradecimento. Agradeço a Noga Sklar e sua Editora KBR pela dedicação ao meu trabalho. Um agradecimento especial vai para Darel Valença Lins, pelo magnífico desenho da capa e ilustração, que, no meu entender, representam a depressão e a cura do narcisismo.

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13 Sumário Agradecimentos 9 Introdução 13 Capítulo 1 - Considerações Gerais 17 Capítulo 2 - Personalidade depressiva Personalidade depressiva psicótica Personalidade depressiva neurótica Depressão neurótica x depressão psicótica 27 Capítulo 3 Principais sintomas da depressão No afeto No pensamento Na conduta Na percepção sensorial 44 Capítulo 4 Dificuldades do psicoterapeuta 47 13

14 Carmem Dametto Capítulo 5 Minha conduta como terapeuta Transferência Internação e eletrochoque Épocas do ano 75 Capítulo 6 O superego na depressão 77 Capítulo 7 Depressão infantil Relação mãe-bebê Tratamento infantil 97 Capítulo 8 Obesidade e depressão Depressão e outros vícios 108 Últimas considerações 111 Bibliografia

15 Introdução Comecei a escrever este livro em 2010, e por motivos alheios à minha vontade não consegui terminá-lo até março de Acho uma boa data para nascer. Não há novidades quanto à depressão, creio. O que mudou é minha maneira de tratá-la. Tenho uma experiência de mais ou menos 50 anos com depressão psicótica e depressão neurótica são diferentes. Sendo assim, já que o mencionei, vou logo dizendo que, a pedido de Freud, alguém deveria estudar os psicóticos. Um grande psicanalista, Wilfred Bion, deu a chave para mostrar quem pode ser psicanalisado e quem não deve sê-lo, é o que vim aprendendo desde os meus 18 anos, quando trabalhava como auxiliar psiquiátrica na Clínica Pinel, em Porto Alegre, RS, com Marcelo Blaya Perez considero Blaya o pai de meu pensamento atual. Via os psicóticos saindo da clínica para consulta e os via voltando em estado muito pior. Logo, é verdadeiro o que Bion afirmou sobre 15

16 Carmem Dametto a possibilidade de haver um tipo de personalidade (digo, neurótica) passível de ser psicanalisada, utilizando a transferência, enquanto, por outro lado, quem tem personalidade geneticamente psicótica não pode se submeter a tratamento psicanalítico, como já dizia Freud: o ego já está desfeito na psicose. Psicanálise, repito, é para quem tem a doença neurose e pode fazer a transferência, que nem sempre é reconhecida na sessão analítica. Então, venho brigando todos estes anos para que se olhe e se assuma que nem todos podem ou devem fazer tratamento analítico, algo como tratar úlcera estomacal com aspirina, isto é, agravar o quadro, que é o que eu sempre vi e continuo vendo acontecer. Melanie Klein, mais conhecida por seu trabalho relativo ao relacionamento mãe-bebê, não deu importância alguma ao bebê, mas em compensação deu uma grande contribuição à Psicanálise ao descrever o que chamou de posições paranoide e depressiva. Winnicott, que também foi pediatra, ajudou com sua relação com as mães. Enfim, um número expressivo de grandes psicanalistas, que não preciso mencionar, levou adiante a teoria de Freud, mas não posso me esquecer de um em especial, John N. Rosen, que me emocionou com sua psicanálise direta não se aprende o que ele propõe, ou se nasce com aquela propensão ou nada. Enfim, na minha pós-graduação de dois anos com Blaya, e depois na SBPRJ, 1 onde estudei por 1 Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro. 16

17 Depressão cinco anos, vi e li inúmeras coisas. Saí já com boa bagagem de Porto Alegre, e isso acrescido de minha análise pessoal abriu-me uma ampla fronteira para o conhecimento dos psicóticos, muitas vezes contestada por meus colegas. Mas minha aflição não é com eles, é com os psicóticos. Por outro lado, não me faltou apoio. Meu trabalho diferente foi abençoado por dois grandes psicanalistas cariocas, Danilo Perestrello e Walderedo Ismael de Oliveira. Minhas supervisoras na Formação Analítica, Zenaira Aranha e Rosa Beatriz Pontes de Miranda, achavam que eu devia continuar a trabalhar, desenvolvendo esse tipo de trabalho com os psicóticos. Por fim, no lançamento de meu livro Psicoterapia do Paciente Psicótico, minha mãe me disse que algumas pessoas podem fazer análise, mas outras precisam de uma terapia e medicamentos. 17

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19 Capítulo 1 Considerações Gerais A depressão é uma doença mental que pode englobar uma infinidade de sintomas, na esfera do afeto, do pensamento, da percepção sensorial e da conduta. Cada ser humano é diferente, e pode vivenciá-los de modo diferente. Mas citarei os sintomas mais comuns, os que, grosso modo, podem ser detectados por um terapeuta atento. Muitos outros podem não estar na presente lista, visto não ser esta uma obra que eu possa qualificar como completa, no que se refere a uma descrição da depressão. Tentarei explicar cada um de modo que o leitor leigo possa me acompanhar. Quando possível, darei exemplos para ser mais explícita. Para começar, acho que a principal fonte do sofrimento que leva uma pessoa à depressão é a resolução não adequada de seu narcisismo patológico e de seu Complexo de Édipo. Explicarei melhor. No meu livro sobre filicí- 19

20 Carmem Dametto dio e narcisismo 2 há uma extensa explicação sobre a Patologia do Narcisismo: as pessoas nascem e crescem narcísicas, um sentimento básico para o desenvolvimento normal do ser humano. Porém, um bebê que já nasce de pais patologicamente narcísicos pode trazer geneticamente uma carga de narcisismo patológico que o torna doente desde que nasce, algo que não é necessariamente percebido pelos pais que só virão a ter consciência do fato ao descrever a história do filho ao psiquiatra, na adolescência do ex-bebê, doente desde que nasceu, mas não notamos. Uma criança com narcisismo patológico vai ver, sentir ou apalpar o mundo de modo a não atingi-lo, de forma a nem mesmo se aproximar da realidade. Pode ouvir frases pela metade, interpretar um carinho como agressão, pode sentir o cuidado de sua mãe como uma interferência em sua identidade. Esta criança não passará bem pela fase que Melanie Klein denomina de esquizoparanoide, nem chegará à fase depressiva (edípica) com boa resolução de nenhuma das duas. Vamos falar claro: fixará seu desenvolvimento num ponto anterior, e estará pronta a desenvolver uma depressão, que alguns chamam de endógena, na primeira frustração que tiver na vida. De qualquer forma, será uma criança deprimida, aquela que pega todas as doenças da infância, desenvolve alergias ou se machuca muito uma típica personalidade depressiva que passa despercebi- 2 Dametto, Carmem. Filicídio Considerações sobre o narcisismo. Petrópolis: KBR,

21 Depressão da aos olhos dos pais. Pode chorar muito em bebê ou, ao contrário, não chorar nunca, ser um bebê perfeito. Pode não querer mamar desde que nasce, e se dar mal com qualquer tipo de leite que lhe for apresentado. Eu diria que ela será alérgica à vida, uma criança com instinto de morte muito forte, que inconscientemente não deseja viver. Quando adulta, poderá desenvolver a doença depressão. Essa criança deixará os pediatras enlouquecidos, e as mães fazendo vacinas e chorando a cada picada que o filho tomar. Os primeiros sinais podem ser a agressividade, irritação e desatenção na escola, além da falta de concentração: os pais são chamados, têm suas orelhas puxadas por não cuidarem dos estudos do filho, mas não é disso que se trata. A criança está doente. Nesse ponto algumas consultas resolveriam o problema, mas de modo geral isso não é feito, pois os culpados são sempre os pais, que não dão atenção suficiente. Fica a criança como vítima, despersonalizada, como se nada tivesse a ver com o que lhe acontece. Tal patologia pode ser averiguada e pesquisada num simples supermercado: a criança que briga com sua mãe porque quer comprar doces, biscoitos, iogurtes, tudo, enfim para manter-se gorda; ou, por outro lado, aquela que não quer nada para si. Ambas já estão doentes. Em outras palavras, tudo o que é excessivo configura uma doença, comer demais ou comer de menos. E são as mães que pagam o pato, pelo fato de fazerem ou deixarem de fazer não sabem, 21

22 Carmem Dametto não foram instruídas sobre doença mental. A escola tampouco as ajuda, limita-se a criticar sua falta de apoio. Mas criança não vem com manual de instruções para explicar à mãe o que fazer para que o filho funcione bem. Quanto à não resolução do Complexo de Édipo (o mito do filho que mata o pai e fica com a mãe só para si), quando surge o paciente deprimido é importante verificar se não foi resolvido foi apenas ou mal resolvido em geral, o paciente não conseguiu passar a contento por essas fantasias ligadas ao filicídio, ao parricídio e ao matricídio. Ou, por outro lado, permanece tão fortes que a criança se assusta com seu próprio poder: Fui eu que separei o papai da mamãe. Casais não se separam por causa de um filho. Alguns não se separam porque não conseguem, quando mal casados, viver sem uma relação sadomasoquista, caso em que os filhos reinterpretam as brigas que assistem como as queriam em sua fantasia. O problema está na conscientização dos fatos: Eles se separaram quando adoeci. O paciente deprimido nem vê pai ou mãe como objetos totais, ou melhor, nada vê que seja fora da esfera de seu próprio umbigo. O problema com a personalidade depressiva é que ela não é facilmente resolvida nas crianças, que acabam por se tornar adultos doentes, esquizofrênicos ou deprimidos. A esquizofrenia tem seu pico de manifestação na adolescência, ao passo que a depressão surge a partir dos trinta anos, em média. Nessa 22

23 Depressão idade, pode vir mascarada de vício em drogas, que, se tratado, revela no fundo nada mais nada menos que uma profunda depressão. Em geral fica-se nos sintomas gritantes, como o uso de drogas. Os drogados gostam disso, e os terapeutas também, acham mais fácil tratar tanto uma drogadição, sem levar em conta a implícita depressão, quanto seu outro aspecto, a anorexia nervosa, que é uma manifestação da esquizofrenia paranoide. 23