Estado de Mato Grosso do Sul Poder Judiciário Campo Grande 2ª Vara Cível

Transcrição

1 SENTENÇA Autos: Autor(es): Waldir Neves Barbosa Réu(s): Francisco Elivaldo de Souza e Jornal Impacto MS - E.I.C. Editora Impacto & Comunicação Ltda ME I. RELATÓRIO Trata-se de ação de obrigação de fazer e não fazer c/c indenização por danos morais c/c retratação pública e pedido de tutela de urgência que Waldir Neves Barbosa move contra Francisco Elivaldo de Souza e Jornal Impacto MS - E.I.C. Editora Impacto & Comunicação Ltda ME, partes qualificadas. O requerente alegou, em síntese, que já exerceu diversos cargos políticos e hoje atua como conselheiro do Tribunal de Contas, sempre agindo com probidade e honradez, contudo veio a sofrer danos morais por conduta dos requeridos, que publicaram notícias inverídicas sobre sua pessoa, em total abuso da liberdade de expressão, com intuito de atingir a imagem do requerente. As informações lançadas fazem gravíssimas acusações que mancham a credibilidade do requerente. Assim pediu em tutela de urgência que os requeridos se abstenham de divulgar ou citar o nome do requerente em noticias pejorativas, sob pena de multa, e que retirem imediatamente a notícia divulgada de circulação. Ao final requer a condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos morais e a retratação pública da ofensa. Citada, a parte requerida apresentou contestação às f.52-72, com alegação de inexistência de danos morais, pois a CF/88 garante a plena liberdade de informação jornalística, desde que não exceda os limites necessários, sendo este respeitados na hipótese em tela. Não houve qualquer distorção ou informações inverídicas, tendo em vista que a requerida apenas reproduziu um notícia, o que não gera o dever de indenizar. Assim, requer o , -MS - cgr-2vciv@tjms.jus.br - autos Jg2 1 fls. 499

2 julgamento improcedente da ação. Réplica às f Processo saneado em decisão de f. 297 e f A tutela de urgência foi indeferida, contudo em julgamento do recurso interposto, a decisão foi reformada (f ), sendo então concedida a medida pleiteada. Em audiência não houve conciliação (f.472) e diante do desinteresse da prova oral, a instrução foi encerrada. Em seguida vieram alegações finais por memoriais. É o relatório. DECIDO. II. FUNDAMENTAÇÃO O ponto controvertido a ser dirimido nos autos se resume a constatação ou não da violação aos direitos fundamentais da honra, imagem do requerente pelos requeridos com a publicação de notícias que extrapolaram o cunho informativo da liberdade de imprensa. A liberdade de expressão é pilar fundamental e viabilizador da dinâmica democrática. Tal grau de relevância, no entanto, não permite que seu uso se dê de tal forma que prejudique o âmbito de liberdade alheia. Vê-se, portanto, que a existência de instrumentos capazes de conter esse uso abusivo não implicam em ameaça a essa liberdade, mas simples forma de garantir que possa ser plenamente exercida por todos os grupos sociais e, mais precisamente, por cada indivíduo. Desta forma, quando houver conflito entre dois ou mais direitos ou garantias fundamentais, o intérprete deve utilizar-se do princípio da concordância prática ou da harmonização de forma a coordenar e combinar os bens jurídicos em conflito, evitando o sacrifício total de uns em relação aos outros, realizando uma redução proporcional do âmbito de alcance de cada qual , -MS - cgr-2vciv@tjms.jus.br - autos Jg2 2 fls. 500

3 (contradição dos princípios), sempre em busca do verdadeiro significado da norma e da harmonia do texto constitucional com sua finalidade precípua. casuística em debate. A partir destes pressupostos é que se passa a análise da Muitas das notícias veiculadas (f.21-36) fazem referencia ao Tribunal de Contas e não diretamente ao requerente, que trabalha como Conselheiro Presidente da referida instituição. É cediço que eventuais ofensas envolvendo a referida instituição não servem como motivo para indenização por danos morais ao requerente. De outro lado, ofensas proferidas a servidor público no exercício da função gera indenização. É exatamente a hipótese em tela. Ressalta-se que as noticias de f referem-se à decisões proferidas pelo Presidente do TCE-MS, portanto, de interesse público, devendo prevalecer a liberdade de imprensa. Outrossim, depreende-se dos mencionados documentos que um das notícias (f.21), logo no título, já traz palavra "atropelados", nas frases "aprovados em concurso são atropelados por Neves que prefere nomear comissionados" e "Waldir Neves atropela lei de licitações mais de 100 vezes", expressões desnecessárias e com o fim sensacionalista. No mesmo sentido, à f. 30 outra noticia traz no título "TCE: há mais de 30 anos sugando o orçamento para cuidar de nada", com a imagem do requerente logo acima, em flagrante interesse de atingi-lo. Insinuou-se também que ele deveria ficar com vergonha de realizar contratos de valores exorbitantes, com os dizeres "nem ficou vermelho", na notícia de f.29. Muito se discutiu no julgamento do recurso de agravo de instrumento interposto (f ) sobre o caráter das expressões empregadas naquelas reportagens: se foram apenas carregadas e naturais do caráter chamativo dos meios de imprensa ou se destoaram o caráter jornalístico , -MS - cgr-2vciv@tjms.jus.br - autos Jg2 3 fls. 501

4 informativo, prevalecendo este último entendimento pela maioria dos votos. Nenhum outra prova veio aos autos depois do julgamento, inclusive não houve interesse na prova oral, conforme f. 472, de modo que os elementos que o processo oferece são os mesmos por ocasião desta sentença. Portanto, reanalisando as notícias, entendo que houve de fato uma violação dos direitos de intimidade do requerente, pois o conteúdo das mesmas extrapolaram o caráter informativo, atingindo a honra e imagem dele. Observe-se o disposto no artigo 186 do Código Civil: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. resta o dever de indenizar. Assim, configurada a responsabilidade e existente o dano, Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalidade ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do requerente, e, ainda, ao porte da empresa requerida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso (RT816/387) Com isto, tendo em vista a atividade exercida pelas partes, o meio de divulgação das ofensas, que é dotado de potencial para atingir um número grande e indeterminado de pessoas, e, logo, ofender com maior profundidade a honra e a dignidade do ofendido, e a gravidade das ofensas, é razoável se fixar o valor da indenização por danos morais em R$ ,00 (quinze mil reais). E, em se tratando de indenização por dano moral, o termo inicial da correção monetária incide a partir do seu arbitramento. (Súmula n. 362/STJ) e os juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ). Indefiro, por fim, o pedido de retratação pública, pois , -MS - cgr-2vciv@tjms.jus.br - autos Jg2 4 fls. 502

5 embora escritas com expressões desnecessárias e sensacionalistas, as notícias não são inverídicas. Pelo contrário. O requerente de fato responde as investigações relatadas nelas naquelas, conforme ficou comprovado com a juntada das cópias dos processos (f ). Seria totalmente imoderado exigir que o requerido aguardasse eventual condenação para só então fazer a publicação. A informação, sobretudo na sociedade moderna e altamente integrada como a presente, deve ser atual, didático, prestativa e absolutamente ágil. Todos estão sujeitos ao a divulgação de seus atos, quando relevantes, pelos órgãos de imprensa. III. DISPOSITIVO Pelo exposto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, a fim de condenar solidariamente os requeridos ao pagamento de R$ ,00 (quinze mil reais) ao requerente, corrigido monetariamente pelo IGP- M/FGV a partir da presente sentença e com juros legais de 1% ao mês a partir da data da primeira publicação, tida como evento danoso. Confirmo a liminar concedida nos autos (f ). Condeno os requeridos, ainda, ao pagamento das custas e despesas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte contrária, fixados por equidade em 15% do valor da condenação, na forma do art. 85, 2º, do CPC. art. 487, I, do CPC/15. Prolato sentença com resolução de mérito, nos termos do P.R.I.C., 19 de outubro de Assinado digitalmente Silvia Eliane Tedardi da Silva Juiza de Direito , -MS - cgr-2vciv@tjms.jus.br - autos Jg2 5 fls. 503