O que é ser sociólogo? Reflexões sobre experiências profissionais no Departamento de Formação
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- Miguel Vilaverde Batista
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1 Simpósio Fazer sociologia fora da academia: artes e ossos do ofício O que é ser sociólogo? Reflexões sobre experiências profissionais no Departamento de Formação Irene Ribeiro Direção de Relações Humanas Continental Mabor A Sociologia surgiu como opção de estudo, derivado ao gosto vivenciado pelo lado humano e social. Pela vontade enorme de compreender as pessoas, a sociedade, as organizações que a compõem e as suas relações. Apesar da curiosidade nas várias temáticas abordadas em Sociologia, por toda a sua abrangência, desde cedo, o meu foco na Sociologia foi a Sociologia das Organizações. Desta forma, todo o meu percurso académico foi delineado e pensado para que, aquando a realização do estágio curricular, estivesse preparada a ser integrada na Direção de Recursos Humanos de uma empresa. Destaco aqui, não só todas as Unidades Curriculares na área organizacional, mas também, todas as colaborações pontuais, que tive a oportunidade de participar e que me permitiram adquirir alguma experiência e Knowhow enquanto socióloga. Aquando a escolha de Relatório de Investigação ou Estágio Curricular para término do curso, a minha decisão foi muito fácil queria ter oportunidade de conhecer o mundo real de trabalho e, se possível, enveredar por uma área pela qual tinha uma certa paixão Formação e Desenvolvimento. O porquê desta área, ainda hoje não sei as razões, mas talvez por toda a envolvência de analisar as pessoas, perceber os Gaps existentes entre o que lhes era pretendido e o que efetivamente possuem, pela forma como temos que analisar as pessoas, traçar o diagnóstico e acompanhar o seu desenvolvimento, quer no que diz respeito a competências técnicas, 1
2 quer a competências comportamentais. No entanto, depois de 3 anos de Curso, ainda sentia alguma dificuldade em perceber como iria conseguir fazer uma relação entre saberes teóricos e metodológicos adquiridos em contexto universitário e saberes transpostos para o contexto profissional. Mas tal como refere Costa (2009, p. 26), A Sociologia, como qualquer especialidade científica e profissional, só se aprende efetivamente praticandoa. Assim, entrei no Mercado de Trabalho e, por sorte, aquilo que tinha delineado foi conseguido. Consegui entrar numa empresa de renome, no Departamento de Formação e Desenvolvimento, tal como sempre sonhei. Mas e depois? Fui bem clara no que gostava de realizar, queria perceber se a formação profissional que os colaboradores recebiam era, efetivamente, transposta para o desempenho das suas funções. Mas como? A formação em Sociologia corresponde a um vasto leque de papéis profissionais possíveis (Costa, 2004, p. 47), ao contrário do que acontece com áreas como Medicina, Arquitectura, tal como António Firmino da Costa (2004) alerta, afirmando que uma formação corresponde a uma profissão específica. Confesso que, quando entrei no Mercado de Trabalho, estas questões faziam-me alguma confusão mas, mais uma vez, por sorte, na empresa onde iniciei os meus primeiros passos, fui acolhida e orientada por uma Licenciada em Sociologia, que me desafiou a sair da minha zona de conforto e dar um salto para o dia-adia de uma organização industrial. No decorrer deste estágio tive a oportunidade de analisar o modelo de formação profissional que estava a ser implementado na empresa e perceber se existia, efetivamente, um impacto real da formação recebida ao nível do local de 2
3 trabalho. Inicialmente, o trabalho foi desenvolvido sem dificuldades, todavia, no momento em que quis explorar de forma real as questões de estudo, as barreiras começaram a surgir, não por parte da minha orientadora e respetivos colegas, mas sim pela Administração da Empresa, pois viam o sociólogo a executar, a ajudar nas questões administrativas, mas sem qualquer tipo de implicação e de entendimento em relação ao que realmente se passava. Este foi o primeiro grande desafio enquanto socióloga, mas foi aqui que tive oportunidade de mostrar que o nosso curso é muito mais que construir inquéritos, é saber aplicálos! E neste desafio, no meu entender, foi o saber estar, o saber falar que me permitiu ultrapassar este problema. Consegui aplicar, na realidade de uma organização, todos os conhecimentos e teorias adquiridos ao longo da minha formação académica, nomeadamente aqueles que muitas vezes não estão nos conteúdos das Unidades Curriculares, mas que, por inerência a determinada atividade, nós aprendemos. Destaco, por exemplo, o caso de adaptar a forma de entrevistar, de explicar o que se pretende do inquirido e de ajustar as questões à sua personalidade, aos objetivos concretos e, algo muito valorizado pelas empresas e que em Sociologia vamos aprendendo ao longo das investigações realizadas: a gestão de tempo para cada projeto e o respetivo planeamento. Durante este curto estágio consegui perceber que o Curso de Sociologia, era muito mais do que aquilo que eu inicialmente pensava. Não era só teorias e metodologias; pelo contrário, o Curso de Sociologia dotou-me de capacidades e competências essenciais e de forte aplicabilidade no desempenho de qualquer profissão: aprender a construir instrumentos de análise inquéritos, entrevistas, análise de conteúdo, utilizando, para isso, e muitas vezes sem perceber, as competências comportamentais, 3
4 como o saber estar, o saber comunicar, o saber ver além de O estágio suscitou maior curiosidade e maior vontade em enveredar nesta área e, através de uma autoproposta de realização de um Estágio Profissional, consegui integrar-me numa empresa, cuja Diretora de Recursos Humanos tinha como formação de base a Sociologia. Durante dois anos e meio fui responsável pela coordenação da atividade formativa, recrutamento e seleção de formadores, elaboração dos planos de ação e formação, diagnóstico de necessidades e formação, entre outras funções. Mas, no decorrer destes dois anos e meio, foi possível perceber a pluralidade de lugares onde, como socióloga conseguia intervir, pela versatilidade que o curso me proporcionou. Lembro-me, por exemplo, que sempre que me solicitavam a construção de inquéritos, inconscientemente aplicava todas as regras e conceitos que fui aprendendo. Esta vertente mais prática, aliada a todas as outras competências apreendidas no decorrer do curso como o saber planear, organizar, saber trabalhar em equipa, a versatilidade, o saber estruturar o pensamento, saber onde procurar e como analisar a informação, o ser direta, objetiva e não dispersar, e que fui mobilizando no dia-a-dia, fez com que a empresa reconhecesse esta pluralidade de competências e aumentasse algumas das minhas responsabilidades na empresa, nomeadamente na Área da Qualidade, Responsabilidade Social, Higiene e Segurança no Trabalho, entre outras. A verdade é que o Curso de Sociologia, por não se fechar em temáticas específicas, deu-me conhecimentos básicos nestas áreas e foi, no fundo, um alicerce que foi consolidado e fortalecido com as experiências que tive oportunidade de ganhar no mundo empresarial. No entanto, existiram algumas competências técnicas que, no âmbito do meu trabalho na área de 4
5 Formação, tiveram de ser complementadas, tais como, formação para obter o Certificado de Competências Pedagógicas (que me permitiu aperfeiçoar a minha postura e a forma de comunicar) e alguma formação técnica de melhores formas de construir diagnósticos de avaliação das formações. O Curso, apesar de nos dar estas ferramentas, pela sua versatilidade e abrangência, acaba por dispersar as abordagens e não dar a fundo muitos dos temas importantes para nós. Mas a Sociologia é um curso abrangente e, no meu entender, deve ser complementado com formações mais técnicas, porque após algum tempo a trabalhar como Coordenadora de Formação, senti falta de me especializar no tema e recorri a algumas formações na área. Neste sentido, concordo quando Costa afirma que as três componentes da Sociologia das Profissões: ciência, formação e profissão, não existem umas sem as outras (2004, p. 37), e que se faz com recursos combinados de saberes e competências de vários géneros que, como indica António Firmino da Costa (2009, p. 49) variam entre: a) Saberes e competências de base, isto é, diretamente provenientes dos programas de formação curricular iniciais; b) Saberes e competências contextuais, decorrentes da experiência profissional adquirida nos contextos concretos de exercício de atividade; c) Saberes e competências complementares, obtidos em cursos de formação, cada vez mais a nível pósgraduado no prolongamento direto da formação inicial ou em domínios, por vezes, bastante diferentes. De facto, o mundo profissional, obriga-nos cada vez mais, a conjugar conhecimentos da nossa 5
6 área com conhecimentos de outra área. Trabalho há 4 anos numa empresa Multinacional, na Área de Recrutamento e Seleção, onde tive oportunidade de ter, novamente, colegas deste curso a trabalharem comigo e onde tenho notado uma grande aposta nos Processos de Recrutamento de Sociólogos. Recebemos anualmente cerca de 140 estagiários, sendo que no caso dos Sociólogos notamos que a inserção no dia-a-dia laboral é mais fácil e rápida do que nas restantes áreas, talvez pela transversalidade da formação, pela capacidade de adaptação e pela resposta adequada a contextos complexos. O rigor que adquirem com as práticas de investigação, a resolução rápida de problemas de trabalho, entre outros, faz ressalvar as suas competências comportamentais nos seus primeiros dias de estágio/trabalho. Estou em crer que a afirmação do papel do Sociólogo dentro da maioria das organizações, faz-se ainda muito pela postura de flexibilidade e de adaptação, pela atuação crítica, criativa e inovadora e pela facilidade de conjugar a Sociologia com outros conhecimentos necessários à realização das tarefas. O que nos diferencia é, sem dúvida, a forma como olhamos para o fenómeno, a forma como o observamos, o tratamos e o analisamos. Ao longo do meu percurso profissional vou aplicando conhecimentos e mobilizando a bagagem que o curso de Sociologia me proporcionou. Mas, sem dúvida, que o Curso me permitiu ter uma visão diferenciadora do mundo empresarial e perceber todos os factores que afetam o funcionamento das empresas. Costumo dizer aos estagiários que vou recebendo e que, ainda, não perceberam a importância do Curso no mundo empresarial, que a Sociologia trouxe-me mais que um Curso ou que uma Profissão, trouxeme uma forma de estar, que aplico diariamente na minha vida. 6
7 Bibliografia Costa, António Firmino da (2004), Será a sociologia profissionalizável?, in Carlos Manuel Gonçalves, Eduardo Rodrigues e Natália Azevedo (orgs.), Sociologia no Ensino Superior: Conteúdos, Práticas Pedagógicas e Investigação, Porto, Departamento de Sociologia da Faculdade de Letras do Porto, pp Costa, António Firmino da (2009[1992]), O que é Sociologia, Lisboa, Quimera. 7
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