CAPTAÇÃO DA ÁGUA DE CHUVA INTEGRADA AO TRABALHO DA PASTORAL DA CRIANÇA Maria de Fátima Lima, Coordenadora da Pastoral da Criança na Diocese de Patos, Gilberto Nunes de Sousa, Central das Associações do Município de Cacimbas, José de Anchieta de Assis, Cáritas Arquidiocesana Brasileira, Irenaldo Pereira de Araújo, Programa de Promoção e Ação Comunitária PROPAC. Patos/PB. propac@rix.com.br RESUMO A construção de cisternas para captação da água da chuva surge da dificuldade em que muitas famílias têm de conseguir água para consumo doméstico e que, na maioria das vezes, fazem longas caminhadas para obtenção dessa água. Por outro lado, o acesso à água em nada garante sua qualidade; em alguns casos, a água obtida não é apropriada ao consumo humano. Diante desse problema, algumas organizações da sociedade civil começaram a criar experiências de capacitação de agricultores para uma melhor convivência com o semi-árido. Dentre elas, a construção de cisternas de placas para captação de água de chuva é uma experiência bem sucedida. Nesse sentido, a Pastoral da Criança também se propõe a implantar uma experiência-piloto com cisternas em algumas comunidades na intenção de melhorar a qualidade de vida e os impactos negativos dos períodos de estiagem tão comuns na região semi-árida. Esse texto busca relatar o processo de construção dessa experiência na Diocese de Patos/PB.
Palavras-Chave: Capacitação, Cisterna de placas, Gestão dos recursos hídricos. INTRODUÇÃO No semi-árido brasileiro a escassez de água para o consumo humano ainda é um drama social principalmente durante as secas. Nesses períodos, a necessidade diária de buscar água para o consumo doméstico obriga principalmente as mulheres a longas caminhadas à sua procura. As estimativas apontam que dois terços dos domicílios rurais no Nordeste 1 se encontram nessa situação. Na maioria dos casos, sem ter outra alternativa, utilizam água imprópria ao consumo humano ou esperam dias, e até semanas, pelo abastecimento do caminhão-pipa. O esforço despendido para obtenção de água nos períodos de escassez de chuvas é significativo. São cerca de três dias/homem por semana para obtenção de água, segundo estudos da EMBRAPA. Sem falar dos problemas causados pelo consumo de água contaminada. O UNICEF, usando dados do Ministério da Saúde do Brasil, alerta para o fato de que a cada quatro crianças que morrem na região, uma deixa a vida acometida por diarréia, conseqüência indesejável do consumo de água imprópria. Os custos diretos e indiretos, financeiros e sociais, desta situação são imensos e se repetem com uma freqüência inaceitável, principalmente quando se considera que, segundo a Constituição Federal, a saúde é dever do estado e direito de todos. Contudo, o trabalho de diversas organizações da sociedade civil (ONGs, associações rurais, organismos de igrejas, movimento sindical dos trabalhadores rurais) vem mostrando, na prática, que é possível mudar esse quadro. Hoje, já existem centenas de experiências bem sucedidas de captação e armazenamento de água de chuva, por meio de cisternas rurais, integrados a um processo educativo para um bom gerenciamento no uso da água. Os impactos desses trabalhos, vivenciados na última grande seca (1998/1999) foram, indiscutivelmente, marcantes no que diz respeito ao acesso à água de qualidade para o consumo humano e, conseqüentemente, na melhoria da saúde das famílias, principalmente, das crianças. 1 Segundo dados do PNAD, são 3,3 milhões de domicílios rurais no Nordeste.
OBJETIVOS DO PROJETO De forma geral, o projeto para construção de cisterna para captação de água de chuva e capacitação para gerenciamento e tratamento da água tem como objetivos, primeiramente, contribuir para a melhoria de vida, das condições sanitárias e da convivência com o meio ambiente das famílias acompanhadas pela Pastoral da Criança na região semi-árida, inicialmente, viabilizando a construção de cisternas para captação de água de chuva que proporcionará o acesso à água de qualidade. Ao mesmo tempo, no desenvolvimento do trabalho, a idéia era desenhar um material educativo relacionado à questão da água (impactos/problemas/soluções) a partir de análise da realidade das famílias acompanhadas pela Pastoral da Criança e que já adotaram a cisterna com captação de água de chuva. Além disso, derivar da experiência de trabalho com outras ONGs sugestões práticas para o estabelecimento de parcerias em âmbito local. Com isso, pretende-se proporcionar uma melhoria na eficiência das coordenações e líderes locais na construção de parcerias. O DESENVOLVIMENTO DO PROJETO O projeto foi desenvolvido pela Pastoral da Criança da Diocese de Patos, contando com a parceria de diversas entidades. No âmbito nacional, a Fundação Esquel Brasil. No estado da Paraíba, PROPAC, CAMEC, CARITAS e PATAC. Para a realização do projeto, partindo-se do objetivo de beneficiar comunidades do semi-árido paraibano com 40 cisternas 2 e de capacitar pedreiros da comunidade na tecnologia de construção de cisternas de placas, foram elaborados alguns procedimentos operativos. Esses procedimentos foram divididos em três fases operacionais. Dentre estas, no momento de construção desse relato, a penas a primeira fase havia sido quase que totalmente concluída e, portanto, é dela que vamos apresentar alguns resultados 3. A primeira fase consistia em seis etapas de atuação. A etapa inicial correspondeu ao processo de seleção dos municípios dentro da Diocese de Patos e apresentar a proposta do projeto a todos os atores envolvidos. Os municípios beneficiados foram Livramento e Santana dos Garrotes. 2 O projeto total compreende dois estados: Paraíba e Bahia. Sendo que em cada estado foram construídas 40 cisternas. 3 A segunda (diagnóstico das famílias após a implantação das cisternas e elaboração do material educativo ou reprodução de matérias de outras ONGs) e terceira fases (um seminário de avaliação dos resultados) ainda não haviam sido iniciadas.
A segunda etapa se referiu à articulação das comunidades e famílias para apresentação do projeto e escolha das famílias a serem beneficiadas, bem como da estratégia de ação. Para escolher as comunidades foram levados alguns critérios como acesso à água em relação à distancia e à qualidade. Além disso, as comunidades escolhidas Carreira de Pedra, em Livramento e Barrinhos, em Santana dos Garrotes já deveriam ter acompanhamento da Pastoral da Criança e que tivessem crianças de até 6 anos de idade. A construção de cisternas/capacitação dos pedreiros foi a terceira etapa do projeto. Operacionalizou essa etapa uma ONG em parceria com a Fundação Esquel e a Pastoral da Criança, juntamente com as famílias beneficiadas e as pessoas envolvidas. Foram construídas 43 cisternas, capacitando 14 pedreiros em construção de cisternas nas duas comunidades. A quarta etapa da primeira fase consistia no curso de gerenciamento de recursos hídricos. Foram realizados dois encontros um em cada comunidade envolvendo cerca de 40 pessoas da comunidade, além de alguns professores da comunidade, tendo em vista o seu potencial de transformação social. As últimas etapas da primeira fase ficaram por conta do acompanhamento das famílias beneficiadas (pelo líder da Pastoral da Criança na comunidade) e pela documentação (a partir de fotos e entrevistas com as famílias beneficiadas). Foram abordadas questões relacionadas à utilização da água, tratamento e formas de prevenir contaminação. Por último, a documentação que será feita em fotos e entrevistas com famílias nas comunidades beneficiadas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora ainda não tenha sido totalmente concluído, já é possível apontar alguns impactos do projeto. A primeira questão diz respeito ao efeito positivo que as cisternas causam para os visinhos de pessoas que tem a cisterna construída. Muitas pessoas na comunidade começam a se mobilizar e formar grupos (consórcios) que viabilizaram um fundo solidário para confecção da cisterna de placas. Ou seja, ao ver a cisterna construída, começa a mobilização comunitária para que ela se difunda a todas as pessoas da comunidade. Um segundo aspecto é que em momentos de escassez de água, o abastecimento era feito em carro-pipa, passando de casa em casa. Como as famílias não tinham grandes recipientes, a água era distribuída em latas e balde, desperdiçando o precioso líquido. Com as cisternas concluídas, embora ainda se necessite do carro-pipa porque elas ainda não encheram com a água captada da chuva, existe uma maior racionalidade no abastecimento. A cada
dois dias o carro-pipa vem e enche algumas cisternas em pontos estratégicos para que todas as pessoas da comunidade tenham acesso, além de fazer o tratamento com o cloro. Na realidade, as cisternas estão funcionando de forma comunitária. Por último, a partir da construção de cisternas e do curso de tratamento e gerenciamento da água, é possível introduzir novos temas e ações no trabalho cotidiano do líder da Pastoral da Criança.