CISTERNA DE PLACAS PRÉ-MOLDADAS
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- Ana Júlia de Figueiredo Philippi
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1 CISTERNA DE PLACAS PRÉ-MOLDADAS José Afonso Bezerra Matias, Técnico de Campo do Programa de Aplicação de Tecnologia Apropriada às Comunidades PATAC., José Dias Campos, Centro de Educação Popular e Formação Sindical CEPFS. Puxinanã/PB. (83) patac@cgnet.com.br RESUMO Apesar do Brasil só ver noticias do semi-árido quando ocorrem as secas, despertando a solidariedade pelos flagelados da seca, ou estimulando o governo a elaborar programas emergências (e assistencialistas), a região também oferece outros aspectos para serem observados (embora o resto do Brasil não veja) que são as formas equilibradas de se conviver com o ambiente semi-árido (incluindo a seca como aspecto desse ambiente). Uma dessas formas é a cisterna de placas de cimento pré-moldadas, tecnologia apropriada à realidade regional. Esse relato busca mostrar como essa tecnologia pode ser construída e difundida em comunidades rurais do semi-árido.
2 Palavras-Chave: tecnologia apropriada, tecnologia social, capacitação, convivência com o semi-árido INTRODUÇÃO A maior parte da população brasileira só ouve falar do sertão nordestino nos momentos em que a falta d água castiga homens e animais; nos momentos em que as crianças padecem de desnutrição e animais morrem de sede; momentos em que a vegetação sertaneja assume seu colorido cinza-azulado fantasmagórico, característico dos períodos de seca e estiagem. Ou seja, quando a indústria da desgraça desencadeia campanhas nacionais de comoção ao flagelo da seca. Da mesma forma, são as políticas públicas desenvolvidas pelos poderes constituídos que, nos seus três níveis (federal, estadual e municipal) reproduzem o estereótipo em torno da questão, insistindo, há séculos, na mesma concepção política do assistencialismo. O que não é divulgado ao Brasil é que quando chove no semi-árido, até mesmo o mais pobre posseiro ou meeiro consegue plantar, colher, criar animais e, assim, garantir uma melhor qualidade de vida, em regra, melhor que a de muitos bolsões de pobreza das grandes cidades. Neste momento, o resto do país se esquece do sertão e não compartilha da alegria de uma população de fibra, produtora de uma cultura rica e determinante para a identidade brasileira. As políticas públicas do assistencialismo perdem, temporariamente, seu ponto focal. Nosso solidário Brasil só voltará a ter notícias do sertão no próximo ciclo de seca, momento este de emergência e sofrimento. O sertão é, de fato, contraditório. O paradoxo a que fazemos referência é real, concreto, resultante de uma realidade multifacetada e desconhecida em suas sutilezas pela maior parte da população brasileira. Porém, sabemos ser possível equilibrar e reduzir os impactos devastadores da seca na região. Como outros povos, nós, no Semi- Árido Brasileiro, podemos adequar nossa maneira de viver às especificidades do meioambiente que nos acolhe, desenvolvendo tecnologias simples e apropriadas ao nosso contexto sócio-ambiental. Assim, é o caso das cisternas de placas de cimento pré-moldadas que está sendo difundida na região semi-árida, onde a irregularidade das chuvas e a falta de uma infraestrutura adequada para distribuição de água potável, tornam necessária a recuperação das águas da chuva, em particular aquelas escoadas nos telhados das casas. As cisternas de placas demonstram essa capacidade de armazenar a água da chuva escoada no telhado, além de demonstrar um baixo custo e uma durabilidade, em
3 relação aos outros modelos convencionais (de tijolos, por exemplo). Enfim, elas representam uma alternativa tecnológica adaptada à região e à realidade dos pequenos agricultores, pois sua tecnologia é acessível aos pedreiros do meio rural. ANTECEDENTES HISTÓRICOS Este tipo de cisterna de placas foi concebido por pedreiros dos Estados da Bahia e de Sergipe, há aproximadamente 30 anos e se difundiu principalmente nas regiões semi-áridas destes dois Estados. Tudo começou quando um pedreiro da região noroeste do Estado de Sergipe (Simão Dias) chamado Nel que após vários anos de trabalho em São Paulo construindo piscinas, aprendeu a utilizar placas de cimento pré-moldadas. Depois que voltou ao Nordeste, valeu de sua experiência para criar um novo modelo de cisterna rural de forma cilíndrica, a partir de placas pré-moldadas curvadas. A difusão do modelo foi realizada primeiro através dos contatos que teve com vários pedreiros da região no Sergipe e Nordeste da Bahia. Depois Nel e seu irmão espalharam essa técnica na região de Paulo Afonso. Já outro colega pedreiro, difundiu as cisternas de placas na região de Feira de Santana/BA, mais especificamente em Conceição de Coité, tornando-se um dos principais centros de divulgação desse modelo na Bahia. A cisterna de placas tem uma forma cilíndrica, é coberta e semi-enterrada e também pode ser utilizada como cisterna comunitária ou chafariz, para o armazenamento da água captada num rio ou num poço, antes da sua distribuição em pequenas comunidades rurais ou grupos de famílias. OBJETIVOS DA DIFUSÃO DA TECNOLOGIA A difusão da tecnologia da cisterna de placas de cimento pré-moldadas tem um caráter social no sentido de desenvolver ações de convivência com o semi-árido, em especial, na Paraíba, na área de recursos hídricos, buscando a preservação dos recursos naturais e o aumento da sustentabilidade das unidades de produção familiar. Daí que podemos chamar a cisterna de placas de uma tecnologia social porque busca promover a melhoria da qualidade de vida das populações rurais e o desenvolvimento local, integrado e sustentável por meio da multiplicação do número de cisternas através da
4 organização e gestão de fundos de créditos rotativos (formas alternativas de microcrédito). Especificamente, ela possibilita o aumento da disponibilidade de água de beber e cozinhar para as famílias e propicia o acesso descentralizado à água para o consumo humano. Sem falar que, se por um lado, a construção da cisterna está integrada a possibilidade de divulgação de métodos alternativos de tratamento e gerenciamento da água junto às famílias de agricultores para que disponham de água apropriada ao consumo humano, melhorando a qualidade de vida, especialmente, de crianças, mulheres e idosos. Por outro, ela capacita pedreiros e pessoas com habilidade na área rural, em técnicas de construção de cisternas, viabilizando uma renda complementar aos agricultores. DESCRIÇÃO DA TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO Esse modelo de cisterna é feito basicamente de placas de cimento pré-moldadas que servem para o levantamento das paredes e para a realização da cobertura da cisterna. Embora tenha sido inventado pelo pedreiro de Sergipe, o PATAC aprimorou a técnica com a ajuda dos pedreiros das comunidades. A partir daqui vamos descrever um pouco do processo de construção de uma cisterna padrão (com capacidade para 16 mil litros de água) feita pelo PATAC em parceria com as comunidades do semi-árido paraibano. O processo se inicia com a confecção das formas para fazer as placas das paredes e da tampa. Além dessas formas, ainda existem algumas ferramentas como viradeira de zinco, esticador de arame e compasso, todas confeccionadas na oficina da UTOPIA 1. O processo de construção da cisterna consiste nas seguintes etapas: i. Escolha, preparação do terreno e escavação do buraco. O local escolhido deve estar num ponto em que aproveite toda água do telhado. A marcação do buraco deve ser feita com um raio de dois metros e vinte centímetros (2,20m). A profundidade do buraco deve ser de um metro e meio (1,5m) se não der em pedra. 1 ONG fundada pelo Irmão Urbano (também fundador do PATAC). É um serviço da Congregação Redentorista Nordestina em Campina Grande.
5 ii. Confecção das placas para paredes e cobertura das cisternas. Para a cobertura, existe uma armação de ferro para uma ou duas vigas (meio da cobertura) e para as placas. Para encher as formas, são necessários dois traços de concreto (cada traço leva 9 latas de areia, 8 latas de brita e 1 saco de cimento). Já as placas da parede são necessários 5 traços de cimento (cada traço leva 16 latas de areia e 1 saco de cimento). Com essa quantidade de cimento é preciso fazer 140 placas interias e 24 meias placas (12 placas cortadas pela metade). iii. Nivelamento do contrapiso e levantamento das paredes. O contrapiso é a parte que fica no fundo do buraco (onde as paredes serão construídas). Devese nivelar o terreno e fazer o piso com cinco centímetros de espessura e em metro e 70 centímetros (1,70m) de raio. Serão necessários dois traços de cimento (cada traço leva 9 latas de areia, 9 latas de brita e 2 sacos de cimento). A parede deve ser erguida com uma distancia de um metro de meio do centro do contrapiso (1,5m de raio), deixando um espaço de um centímetro e meio (1,5cm) entre uma placa e outra para se fazer o rejunte das placas (o rejunte é feito com cimento preparado com 7 latas de areia peneirada e 1 saco de cimento). Depois de seis fiadas de placas erguidas, é preciso amarrar as fiadas que ficam para fora do buraco (em geral se usa arame 12 pré-cozido ou farpado), sendo 3 arames em cada fiada. iv. Reboco externo e colocação das vigas. O reboco externo se refere apenas a parte da parede que vai ficar enterrada (8 latas de areia para 1 saco de cimento). Depois que o reboco estiver enxuto, preenche o espaço com terra e faz a compactação. As vigas devem ser assentadas no meio da cisterna, depois coloque as meias-placas. Uma meia-placa deve ter um buraco para colocar o ladrão (cano que vai permitir o escoamento do excesso de água), fazendo com que a água não encoste nas vigas quando a cisterna estiver cheia. v. Reboco interno da cisterna e colocação da cobertura. No geral, são necessários 5 traços para se fazer o reboco interno da cisterna (cada traço leva 7 latas de areia peneirada e 1 saco de cimento). É importante que o acabamento fique bem liso e sem falhas. Depois dá uma gorda (mistura de cimento e água sendo duas partes d água e uma de cimento) por dentro da cisterna como se estivesse pintando-a, coloca-se as placas da cobertura
6 vi. (tampa) e se faz o reboco por fora (usando 12 latas de areia para 1 saco e meio de cimento). Quando o reboco estiver seco, pode-se passar uma demão de cal por fora para conservar melhor a cisterna. Construção das calhas e colocação dos canos. A calha é confeccionada com zinco e deve ser presa aos caibros da casa em barrotes de madeira. Já a encanação que leva a água à cisterna deve ser feita com canos de 75 milímetros de diâmetro. É importante deixar claro que essas etapas não são rígidas, uma camisa de força, mas servem como orientação ao padrão trabalhado pelo PATAC. Ao longo dos anos, essa técnica é constantemente aperfeiçoada, tendo como principais agentes do processo os próprios agricultores-pedreiros que trabalham com a tencologia.
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