TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO 34 a Câmara Seção de Direito Privado Julgamento sem segredo de justiça: 13 de setembro de 2006, v.u. Relator: Desembargador Irineu Pedrotti. APELAÇÃO COM REVISÃO Nº 861.671-0/4 São Paulo Apelantes: D. V. e I. do C. E. C. Apelados: A. dos S. A. e A. E. A. LOCAÇÃO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CULPA DOS LOCADORES NÃO DEMONSTRADA. PRETENSÃO ACOLHIDA PARCIALMENTE PARA A RESCISÃO DO CONTRATO E DEVOLUÇÃO DO VALOR DEPOSITADO EM GARANTIA. A prova não foi suficiente para demonstrar que os Apelados tivessem agido com dolo ou culpa para a rescisão contratual e, com isto, ensejado os prejuízos alegados na inicial. Incumbia aos Requerentes o ônus da prova quanto à existência do fato constitutivo do seu direito, e não aos Apelados a demonstração de fato que pudesse impedir, modificar ou extinguir esse direito. Sendo recíproca a intenção de rescisão do contrato, a pretensão fica acolhida nessa parte, determinando-se aos Requeridos a devolução da quantia recebida como garantia da locação (R$ 250,00), acrescida de juros e correção monetária desde o pagamento. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. Ambas as partes deram ensejos aos respectivos perdimentos. Afigura-se justa a repartição em partes iguais, das custas, pagando cada qual as despesas que deu causa e os honorários do respectivo Advogado. É a regra insculpida no artigo 21 do Código de Processo Civil. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CARÁTER PROTELATÓRIO. NÃO- OCORRÊNCIA. MULTA. EXCLUSÃO. A penalidade prevista no parágrafo único, do artigo 538 do Código de Processo Civil, exige, para que seja imposta, a caracterização de "mala fides" na oposição de Embargos de Declaração para protelar o desfecho da causa, elemento subjetivo não identificável, que se pautou pela técnica processual adequada à busca de complementação do julgado. Voto n o 8.848. Visto, D. V. e I. DO C. E. C. ingressaram com AÇÃO ORDINÁRIA DE RESCISÃO DE CONTRATO, cumulada com DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS e INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (folha 2 negrito do original) contra A. DOS S. A. e A. E. A., partes qualificadas nos autos, alegando que:... locaram da reqda. O imóvel situado na Rua Epicuro, nº 79 fundos....... passaram a tomar as providências para a concretização da mudança e assim o fizeram, contratando o caminhão para o transporte e pessoas para ajudar no carregamento dos móveis e utensílios....... os réus (...) não permitiram a entrada dos reqtes. no imóvel locado....... a posição adotada pelos réus afronta, diretamente, as disposições contidas na lei do inquilinato... (folha 4). Requereram:... RESCISÃO do Contrato de Locação celebrado....... Condenar os réus a devolver aos autores a importância depositada por ocasião da celebração do contrato.... - 1 -
... Condenar os réus a pagar a multa contratual....... Condenar os réus ao reembolso das despesas havidas com o pagamento de ajudantes e com o caminhão contratado para a mudança....... Condenar os réus ao pagamento dos danos morais... (folha 5). Formalizada a angularidade, os Requeridos apresentaram contestação, que foi impugnada. Inviabilizada a conciliação e encerrada a instrução, seguiu-se a entrega da prestação jurisdicional:... JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, declarando rescindido o contrato de locação, devendo se restituída a importância de R$ 250,00, contra a entrega das chaves, no prazo de cinco dias. Ficam rejeitados os pedidos correspondentes aos danos materiais e morais pleiteados pelos autores. Tendo em vista o princípio da causação e considerando ainda que os autores sucumbiram em parte substancial do pedido, arcarão por inteiro com o pagamento das verbas de sucumbência, assim, condeno os autores no pagamento das custas, despesas processuais, e bem assim, nos honorários advocatícios que arbitro em R$ 500,00.. (folha 70 destaque do original). D. V. e I. DO C. E. C. opuseram Embargos de Declaração (folhas 78/81), que foram rejeitados, sendo-lhes aplicada a multa de 1% sobre o valor da causa (folha 87). Em seguida, recorreram. Perseguem a reforma da decisão alegando que:... tendo em vista que a r. sentença não esclareceu quanto a aplicação de juros e correção monetária na devolução do depósito, os apelantes interpuseram embargos de declaração, entendendo o D. Magistrado a quo que tal recurso era procrastinatório, razão pela qual os condenou ao pagamento de 1% sobre o valor da causa... (folhas 95/96).... mister se faz a reforma no sentido de condenar os apelados a devolver a quantia de R$ 375,00 (...) efetuada a título de depósito de uma locação, posto que os apelantes não usufruíram do imóvel por um único dia... (folha 98).... tendo em vista que os apelados impediram o uso do imóvel locado (...) deverão se sujeitar a multa contratual... (folha 101).... tendo em vista a atitude inconseqüente dos apelados, impedindo-os de tomar posse do bem, passaram os apelantes por sérios e variados constrangimentos....... demonstrado está os danos morais dos apelantes... (folha 103).... inversão do ônus sucumbêncial, uma vez que foram os apelados que deram causa a rescisão... (folha 104). A. DOS S. A. e A. E. ADDEO apresentaram contra-razões defendendo o acerto da decisão (folhas 123/125). Relatado o processo, decide-se. D. V. e I. DO C. E. C. ingressaram com AÇÃO ORDINÁRIA DE RESCISÃO DE CONTRATO, cumulada com DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS e INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (folha 2 negrito do original), contra A. DOS S. A. e A. E. A., objetivando a rescisão do contrato de locação firmado com os Requeridos e a condenação deles aos pagamentos dos danos materiais e morais. Os Requerentes sustentaram que foram impedidos de entrar no imóvel locado pelos Requeridos (Locadores). Daí a pretensão ao recebimento dos valores que teriam - 2 -
desembolsado com o transporte para a mudança, da multa contratual, do depósito feito por ocasião da celebração do contrato de locação e da indenização por danos morais. A prova produzida não foi suficiente para demonstrar que os Apelados tivessem agido com dolo ou culpa para a rescisão contratual e, com isto, ensejado os prejuízos alegados na inicial. No contrato de locação constou que:... NESTE ATO OS LOCATÁRIOS DEPOSITAM EM MÃOS DOS LOCADORES A QUANTIA SUPRA DE R$ 375,00 (...) E NA DATA DE 16/05/01 DEPOSITARAM EM CONTA CORRENTE R$ 125,00... (folha 10 destaques do original). A Requerente I. DO C. E. C., em depoimento pessoal, asseverou que não pegou recibo do valor pago à transportadora, nem tampouco do valor que depositou em mãos do locador, de R$ 375,00 (folha 72). O Requerido A. E. A., em depoimento pessoal, afirmou que:... a requerente (...) disse que tinha no momento da assinatura do contrato apenas R$ 250,00, ficando de pagar a diferença na segunda ou terça-feira subsequente. Ficando acertado que a mudança seria feita na sexta-feira. Eu não dei o recibo de R$ 250,00, que foram pagos em dinheiro, porque estava na pendência o pagamento que faltava para os R$ 375,00. Já constou do contrato os R$ 375,00, porque eu trouxe o instrumento de Praia Grande (...) Por telefone eu conversei com a requerente, noticiando que não havia interesse na continuidade do contrato, pela falta de complementação do depósito, inclusive colocando a disposição da autora os R$ 250,00 que houvera entregue... (folha 73). O pagamento é objeção cuja prova incumbe a quem alega. Os Apelantes não comprovaram o pagamento integral do valor depositado em garantia, nem tampouco demonstraram os gastos que teriam tido com o caminhão contratado para a mudança (folha 5) e, também, não restou provada a humilhação a que foram expostos (folha 5). O imóvel locado nem chegou a ser ocupado. Locação de móveis. Ação de Repetição de Indébito. Ausência de prova de pagamento de cauções (CPC, art. 333, I). Para firmeza das relações jurídicas e tranqüilidade social, devem os atos jurídicos revestir a forma legal, que lhes atribui existência e visibilidade. No caso de pagamento, a forma é a quitação; a ela tem direito o devedor, que pode retardar a solução, até que a forneça o credor. 1 Incumbia aos Requerentes o ônus da prova quanto à existência do fato constitutivo do seu direito, e não aos Apelados a demonstração de fato que pudesse impedir, modificar ou extinguir esse direito. "Contestado o fato constitutivo do direito alegado, cabe ao autor o 'ônus probandi', nos termos do artigo 333, I, do Código de Processo Civil. 2 Em igual sentido a reclamação sobre os danos morais, uma vez que a prova produzida forneceu pouquíssimos elementos para a formação da convicção sobre a sua efetiva ocorrência. Nada foi verificado no sítio de cognição que possa ser carimbado como injusto e grave para a dor e o dano. Sem prova do dano, da culpa e do nexo causal, não há direito a essa pretensa indenização. Não demonstrada a culpa dos Requeridos, mas reconhecida a intenção das partes de terminarem o ajuste, bem agiu o r. Juízo ao acolher parcialmente a pretensão, decretando a rescisão do contrato de locação, com a restituição pelos Requeridos 1 - ext. 2ºTACivSP- Ap. c/ Rev. 657.586-00/6-3ª Câm. - Rel. Juiz RIBEIRO PINTO - J. 3.6.2003. 2 - ext. 2º TACivSP - Ap. c/ Rev. 576.739-00/5-8ª Câm. - Rel. Juiz WALTER ZENI - J. 12.8.99. - 3 -
(Apelados) do valor dado em garantia, por eles admitido, sem prova em contrário, de R$ 250,00 contra a entrega das chaves (folha 70). Como consignado pelo r. Juízo:... Há de parte a parte a convergência de vontades no sentido de rescindir o contrato de locação. Nessa quadra, acolhe-se a pretensão para declarar rescindido o vínculo ex-locato. Por outro lado os autores não demonstraram os demais fatos constitutivos do alegado direito, vale dizer, não comprovaram categoricamente o pagamento integral da primeira parcela da causa, e muito menos as humilhações que alegam ter sofrido. Aliás, sequer foi demonstrada a despesa anotada para a efetivação da mudança... (folha 70). Os Requeridos (Apelados) atendendo à r. sentença, em 18 de setembro de 2002 depositaram R$ 250,00, sem acréscimos (folha 76). Não há notícia sobre a devolução das chaves. Sobre o valor a ser restituído (R$ 250,00) devem incidir juros de mora a taxa de 1% ao mês e correção monetária, a partir de 16 de abril de 2001, quando foi firmado o contrato de locação e entregue a caução, até a data do respectivo depósito (folha 76), atualizando-se a partir daí, pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo até o pronto pagamento. Se a locadora retardou a abertura da conta poupança da caução que recebeu em dinheiro tem de reembolsar a locatária, pela correção monetária e juros não acrescidos pelo período da retenção. 3 Locação. Contrato. Cláusula. Nulidade. Exclusão da caução, da correção monetária e dos juros. Reconhecimento. É nula a cláusula contratual que exclui da caução pecuniária a incidência de correção e de juros. 4 Na condenação em honorários advocatícios sobrelevam dois princípios: o (princípio) da sucumbência, pelo qual a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte em cujo favor se efetiva; o (princípio) da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à propositura ou à instauração de ação judicial ou incidente processual deve responder pelas despesas daí decorrentes. Os Requerentes (Apelantes) pugnaram pela rescisão do contrato de locação, alegando e não demonstrando a culpa dos Locadores (Requeridos) e exigiram valor superior ao realmente devido. Os Requeridos (Apelados) admitiram a intenção de encerrar o ajuste antes que se desse a ocupação do imóvel (pelos Locatários), porque eles (Locatários) não depositaram integralmente o valor oferecido em garantia, mas não cuidaram de providenciar (Locadores), como lhes competia, o distrato do contrato, que só se aperfeiçoaria se houvesse equivalente instrumentação e bilateralidade, dando causa a propositura da ação. O certo é que ambas as partes deram ensejos aos respectivos perdimentos. Afigura-se justa a repartição em partes iguais, das custas, pagando cada qual as despesas que deu causa e os honorários do respectivo Advogado. É a regra insculpida no artigo 21 do Código de Processo Civil. "Havendo sucumbência recíproca, é devido o rateio entre as partes das despesas do processo." 5 3 - ext. 2ºTACivSP - Ap. s/ Rev. 509.580-00/2-2ª Câm. - Rel. Juiz FELIPE FERREIRA - J. 2.3.98. 4 - AI 458.307-00/2-4ª Câm. - Rel. Juiz ANTONIO VILENILSON - J. 7.5.96, 'in' JTA (LEX) 160/327 (em.) 5 - Código de Processo Civil, artigo 473. - 4 -
A penalidade prevista no parágrafo único, do artigo 538 do Código de Processo Civil, exige, para que seja imposta, a caracterização de mala fides na oposição de Embargos de Declaração para protelar o desfecho da causa, elemento subjetivo não identificável na petição de folhas 78/81, que se pautou pela técnica processual adequada à busca de complementação do julgado. Fica afastada a multa imposta pelo Juízo de origem (folha 87). Em face ao exposto, dá-se parcial provimento ao recurso para, mantida a parcial procedência da pretensão, excluir a multa imposta pela oposição de Embargos de Declaração, adequar a incidência dos juros e da correção monetária sobre o valor a ser restituído pelos Requeridos e determinar que, diante da sucumbência recíproca, cada parte responda pela metade das custas e das despesas processuais e pelos honorários de seus respectivos advogados. IRINEU PEDROTTI Desembargador Relator. - 5 -