A atuação da terapia ocupacional em Geronto-Geriatria Marcia Pontes Mendonça A terapia Ocupacional (TO) tem um papel fundamental no tratamento de pessoas que apresentam disfunções/distúrbios de ordem física, sensorial, mental, emocional, social, que geram dificuldades de adaptação ao meio, e que possam desencadear prejuízos ao indivíduo e à sociedade em que está circunscrito. No mundo atual e globalizado é fundamental que profissões como esta sejam amplamente e devidamente (re)conhecidas por todos os profissionais da área da saúde, da área social e da educação, áreas onde a Terapia ocupacional está inserida, a fim de tratar holisticamente o indivíduopaciente. O texto a seguir pretende elucidar a atuação da Terapia Ocupacional Geronto-Geriátrica e, dentro dessa especialidade, abordar algumas áreas específicas, sem a pretensão de encerrar o tema ou atuação nessa área, sendo imprescindível destacar que a Terapia Ocupacional segue diferentes linhas/teorias de atuação e múltiplas formas de abordagem. Introdução Com a crescente demanda de idosos em busca de mais qualidade de vida diante do aumento da longevidade, faz-se necessário implementar os serviços especializados de atenção à saúde, no sentido de oferecer um aporte técnico adequado às novas exigências, auxiliando na compressão da morbidade e na postergação da dependência, pelo maior tempo possível. Aponta-se para a necessidade de programas e ações de cunho preventivo, bem como, de ações de maior complexidade, orientações e formação de pessoal capacitado para lidar com a pluralidade de questões e desafios que essa etapa da vida imprime a um número crescente de pessoas que envelhecem, incluindo-se neste quadro o terapeuta ocupacional. A seguir serão descritas resumidamente e em linhas gerais algumas áreas clássicas de atuação da terapia ocupacional em geriatria e gerontologia e seu método de trabalho.
O que é Terapia Ocupacional? A Terapia Ocupacional é caracterizada como a profissão da área de saúde, da Educação e da Área Social, que promove o desenvolvimento, tratamento e a reabilitação de indivíduos ou grupos que necessitem de cuidados físicos, sensoriais, psicológicos e/ou sociais, de modo a ampliar seu desempenho e participação social, através de instrumentos que envolvam a atividade humana em um processo dinâmico relacional entre esta e a pessoa do paciente e a do terapeuta. Para isto o terapeuta ocupacional lançará mão, em diferentes situações, do uso específico de atividades expressivas, lúdicas, artesanais, da vida diária e de auto-manutenção, psicopedagógicas, profissionalizantes, entre outras, previamente analisadas e avaliadas, sob os aspectos anatomo-fisiológicos, cinesiológicos, psicológicos, sociais, culturais e econômicos. O terapeuta ocupacional, sempre que necessário, trabalha em estreita cooperação com outros profissionais e atua ainda nas áreas de pesquisa científica, educacional e administrativa. Nesta última, dirigindo, supervisionando e orientando serviços próprios em instituições públicas ou privadas, educacionais e assistenciais. As qualidades curativas do trabalho, dos exercícios e dos jogos, expedientes comuns à Terapia Ocupacional, são reconhecidas e utilizadas há milhares de anos. Os povos antigos interrelacionavam essas três atividades para o tratamento do corpo e da alma. No século XX a Terapia Ocupacional se estruturou como profissão, inicialmente voltada para tratar/reabilitar os indivíduos que se tornaram incapacitados física e mentalmente, durante as guerras mundiais. O curso de graduação em Terapia Ocupacional foi reconhecido em 1969 e a profissão oficializada em 1971. Objetivos da Terapia Ocupacional Promover e manter a saúde, restaurar e/ou reforçar capacidades funcionais, facilitar a aprendizagem de funções essenciais e desenvolver habilidades adaptativas visando auxiliar o indivíduo a atingir o grau máximo possível de autonomia no ambiente social, doméstico, de trabalho e de lazer, tornando-o produtivo na vida de relação, proporcionando qualidade de vida e bem-estar.
Metodologia de Trabalho De modo geral, a prática Terapêutica Ocupacional tem um método de trabalho que compõe-se basicamente de: - Realizar entrevista e anamnese junto ao paciente, e se necessário junto à família; - avaliar o paciente na disfunção específica, levando-se em consideração a queixa principal que o paciente traz, correlacionando-a à totalidade de suas relações com o mundo; - estabelecer os objetivos terapêuticos, se possível conjuntamente com o paciente e/ou família, destacando e ordenando as prioridades, idealizando assim um cronograma a fim de gerar um parâmetro temporal de possibilidades realísticas; - selecionar e aplicar métodos, técnicas e recursos apropriados ao tratamento e adequados à realidade sócio-econômica e cultural do paciente; - criar, estimular e desenvolver condição e/ou situações que favoreçam o desencadeamento do processo terapêutico. Em terapia ocupacional, esse processo se dá, essencialmente, através da inter-relação do paciente com o terapeuta, a atividade e/ou grupo, sendo que nessa dinâmica, assume papel fundamental a pessoa do terapeuta, como um dos elementos facilitadores e integradores do processo; - desenvolver e avaliar sistematicamente o programa estabelecido, tendo sempre como valor e referência básica para seu trabalho o respeito à condição humana daquele que está sob seus cuidados (bioética); - avaliar o momento ideal para que o paciente possa receber alta. Atuação da Terapia Ocupacional Geronto-Geriátrica A Terapia Ocupacional tem um papel fundamental no tratamento de idosos, incluindo aqueles com disfunções físicas, sensoriais e/ou mentais e sociais que vivenciam dificuldades de adaptação ao meio e a dependência em face da iminente incapacidade e fragilidade, e as consequências deste quadro no convívio familiar. De um modo geral, o Terapeuta Ocupacional, na atuação com o idoso, exerce o papel de
facilitador que o capacita a fazer melhor uso das capacidades remanescentes, a tomar suas próprias decisões e lhe assegurar uma conscientização de alternativas realísticas. Através do estímulo ao autoconhecimento, proporcionam-se ao idoso, condições de lidar com seus potenciais e a partir daí construir uma maneira própria de se relacionar com o meio social, atuando nele, atribuindo-lhe valores ou refazendo conceitos. Basicamente, almeja-se que o idoso tenha a sua atuação e o seu desempenho o mais independente possível, enfatizando as áreas de autocuidado, do trabalho (remunerado ou não), do lazer, da manutenção de seus direitos e papéis sociais e da sua expressão social. Neste contexto, a atividade é um meio através do qual se vivencia significado existencial através da expressão de valores, da auto-responsabilidade, da (re)descoberta de competências e habilidades, do compromisso, e de sistematicidade, podendo envolver ainda convívio social pautado por bem-estar. A Terapia Ocupacional utiliza instrumentos de avaliação funcional, das estruturas mentais, emocionais e sociais, e avalia principalmente o desempenho das Atividades da Vida Diária, pois são os principais indicadores da autonomia do idoso. A avaliação do idoso em terapia ocupacional é determinada pela estimativa de sua força e debilidade, pelo reconhecimento de potencialidades remanescentes e de possibilidades reais de desempenho das atividades cotidianas. Para tanto deve-se analisar o que o paciente fazia antes de sua enfermidade e/ou estado atual e o impedimento entre ambos. Avalia-se também o estado biológico (força, tônus muscular, amplitude articular, etc.), o estado psicológico (memória, estado de ânimo, capacidade de aprendizagem, etc.), o estado social (incluindo a capacidade dos que o ajudam: familiares, amigos, voluntários) e o ambiente físico (barreiras arquitetônicas e possibilidades ambientais) na perspectiva de segurança do idoso no seu lar. Todos estes fatores devem ser analisados e adaptados para obter-se o máximo aproveitamento das condições, tendo-se em conta as limitações funcionais do paciente. A capacidade física dos idosos está limitada por alguns fatores fisiológicos: diminuição da potência muscular, fragilidade óssea, artrites e perda da elasticidade do tecido conjuntivo.
Os fatores que afetam o Sistema Nervoso Central são os que, com maior freqüência, produzem incapacidades no transcurso dos anos. Variações das atividades mentais como a diminuição de atenção, perda progressiva de memória e instabilidade emocional, adicionadas às alterações da atividade neurológica como diminuição dos reflexos e dificuldade em realizar movimentos, além das alterações sensoriais decorrentes do processo do envelhecimento. Os idosos mostram-se ansiosos quanto à sua segurança, à sua saúde, às relações familiares e cansam-se mais facilmente a medida que a idade aumenta. Não aprendem tão rapidamente nem retém as informações recebidas como as pessoas jovens, portanto em terapia ocupacional os cuidados devem ser direcionados para estas características peculiares dos idosos. Objetivos gerais da Terapia Ocupacional em Geriatria e Gerontologia 1. Integrar a pessoa em idade avançada à sua própria comunidade, tornando-a o mais independente possível e em contato com pessoas de todas as idades, promovendo relações interpessoais. 2. Incentivar, encorajar e estimular o idoso a continuar fazendo planos, ter ambições e aspirações. 3. Contribuir para o ajustamento psico-emocional do idoso e sua expressão social. 4. Manter o nível de atividade, alterando o ambiente se necessário. 5. Enfatizar os aspectos preventivos do envelhecimento prematuro e de promoção de saúde. 6. Reabilitar o idoso com incapacidade física e/ou mental ou proporcionar adaptações necessárias para que ele seja o mais independente possível. Tais objetivos estão na dependência do estado de saúde do indivíduo, do seu grau de independência nas atividades da vida diária (AVD) e no seu grau de interesse e participação. Locais de atuação da TO Geronto-Geriátrica - Centros de Convivência, Hospitais-Dia, visando a melhoria na qualidade de vida, através da socialização, organização da rotina, recreação e lazer
- Ambulatórios, Hospitais, Centros de Especialidades Médicas, através da prevenção de agravos, decorrentes da não orientação ao paciente idoso e/ou familiares, e a reabilitação física e mental devido à degeneração ocasionada por patologias crônicas. - Atendimentos Domiciliares, desenvolvendo adaptações ambientais (segurança do lar), treinos e orientações específicas para familiares e/ou cuidadores, e serviços especializados para atender a várias patologias (físicas e/ou mentais) que acometem os idosos, como: seqüelas de acidente vascular cerebral, mal de Parkinson, vários tipos de Demências incluindo principalmente, a Doença de Alzheimer, Depressão, Artrite Reumatóide, Doenças Cardiovasculares, Musculares e Respiratórias, entre outras. - Instituições Asilares, Abrigos e Casas de Repouso, realizando uma atenção dirigida para a integração social do idoso institucionalizado, bem como a prevenção de degeneração física, mental e social ocasionada, na maioria das vezes, por um longo período de asilamento. Terapia Ocupacional em Reabilitação Geriátrica Esta modalidade de TO tem sido comprovada como tratamento da mais alta eficácia em vários hospitais e por diversos autores, que são unânimes em ressaltar não só os benefícios físicos advindos desse tratamento, como também os benefícios terapêuticos no caso de problemas sociais e psicológicos. O grande objetivo da Terapia Ocupacional em Reabilitação Geriátrica é manter no idoso a vontade de viver, e que o mundo para ele continue povoado de finalidades. Sentindo-se útil e ativo ele escapa ao tédio, à decadência e à marginalização. Em Reabilitação Geriátrica, não se insiste em metas profissionais. Sob o ponto de vista físico, o importante é o restabelecimento funcional máximo; manter as funções corporais, melhorar as funções dos músculos e articulações com o objetivo de conseguir o máximo de independência física, sobretudo em atividades da vida diária. Preocupação constante quando acamado, como mudanças de posição, tratamento da pele, exercícios físicos, visando sempre ao aspecto preventivo de invalidez permanente.
Observar os princípios que são específicos nos casos de incapacidade física como, idealizar e adaptar os equipamento auxiliares para o idoso, como por exemplo o uso de próteses auditivas, amplificadores de som e outros. destacam-se: Dentre as principais patologias e disfunções atendidas pela Terapia Ocupacional Os Acidentes Vasculares Cerebrais, Mal de Parkinson, Doença de Alzheimer e diversos tipos de Demências, as Doenças Reumáticas e Artríticas, seqüelas decorrentes de doenças crônico-degenerativas como o Diabetes, as Neoplasias, a Hanseníase, entre outras. A Terapia Ocupacional no tratamento do Acidente Vascular Cerebral Dentre alguns objetivos gerais, destacam-se: - Prevenção e correção de deformidades. - Melhoria da função sensitivo-motora. - Melhoria da função física no hemicorpo afetado, ao máximo grau. - Melhoria da destreza e habilidade no hemicorpo são. - Melhoria da capacidade funcional nas atividades pessoais e da vida diária, utilizando se necessário adaptações que permitam independência. - Estimulação da capacidade para o pensamento organizador e abstrato. - Estimulação da capacidade para as tarefas domésticas com ou sem uso de adaptações visando uma progressiva independência. - Estimulação das funções cognitivas afetadas. - Melhoria da função da comunicação diante de uma possível afasia. - Desenvolvimento de aptidões vocacionais e/ou profissionais através da simulação do trabalho. - Auxílio no planejamento das atividades domésticas e comunitárias. - Auxílio na adaptação psico-emocional frente às limitações. A Terapia Ocupacional no tratamento do Mal de Parkinson destacam-se: Dentre os objetivos buscados pela Terapia Ocupacional neste tratamento - Estimular as motivações
- Melhorar ao máximo a capacidade física, a mobilidade geral e atividade voluntária das mãos. - Favorecer uma dicção clara - Avaliar as possibilidades da volta ao trabalho - Contribuir aos planos de apoio continuado do paciente e sua família satisfazendo a necessidade de estímulo para manter o paciente em seu melhor nível de rendimento físico e intelectual. Atendimento Domiciliar Dentre as formas de atenção, o atendimento domiciliar, é aquele que proporciona ao Terapeuta Ocupacional, um maior contato com a família do idoso, facilitando a aproximação da terapia com a realidade do paciente, e colaborando na promoção e manutenção de laços afetivos entre idosos e familiares, garantindo portanto o apoio destes, e proporcionando esclarecimentos acerca das maneiras de lidar com os idosos com limitações, ou seja uma ação educativa com a família. Na atenção domiciliar a terapia ocupacional poderá atuar considerando as reais possibilidades e opções que o idoso e a família dispõem diante de incapacidades e perda de autonomia, através de um programa que engloba desde a recuperação de habilidades até adaptações ambientais, tão necessárias à minimização dessas dificuldades. A compreensão dos tipos de relacionamentos estabelecidos com os idosos, proporciona ao terapeuta uma idéia de qual espaço o paciente ocupava no lar, e saber quais pessoas de sua convivência podem colaborar diretamente com a terapia. As situações cotidianas estão incluídas num processo terapêutico mais próximo da realidade do idoso, pois abrangem algumas de suas necessidades mais primárias (atividades da vida diária) e outras mais secundárias. A adequação de atividades diversas e da estrutura física domiciliar, quando necessárias, devem levar em conta os aspectos culturais particulares do idoso e sua família. Um capítulo a parte pode ser destinado a este conteúdo, disciplinas como a Ergonomia, o Desenho Industrial e a Arquitetura, compartilham deste conhecimento e propósito. A Terapia Ocupacional muito pode fazer no sentido de adequar o domicílio, ou o lugar onde o idoso reside, principalmente se este idoso faz uso de adaptações ou
recursos de tecnologia assistiva. No caso dos idosos, o ambiente físico pode ser um fator de risco para várias desordens de saúde se não estiver bem adaptado às suas dificuldades e necessidades, como quedas e outros acidentes semelhantes. Uma questão também pertinente é a da independência nas atividades da vida diária. Um planejamento físico adequado pode proporcionar ao idoso com deficiências ou dificuldades uma maior autonomia e segurança dentro do lar. Objetivos do atendimento domiciliar em Terapia Ocupacional - Conscientização e orientação familiar quanto às necessidades do idoso; - Adaptação física, psico-emocional e social do idoso ao seu meio, e em relação à sua atual condição; - Valorização dos aspectos culturais (hábitos e tradições), na busca de soluções de problemas; - Organização da rotina, busca de novos interesses e potenciais. - Proporcionar subsídios para o idoso prover o seu auto-cuidado. Considerações Finais É importante ressaltar que o corpo de conhecimento na área exige estudo e dedicação uma vez que o nível de complexidade da atuação da TO nesta área é grande e envolve múltiplos fatores associados, perdas progressivas e o preparo do profissional para o evento da morte, tão próxima e presente neste tipo de atuação. Faz-se necessário investimento profissional em uma formação especializada e atualizações constantes, bem como maturidade emocional para lidar com todas as variáveis contidas no processo do envelhecimento e suas consequências, nem sempre tão desejáveis. Diante do aumento populacional e da longevidade, aponta-se para a necessidade de formação de muito mais profissionais na área, incluindo a terapia ocupacional.