CIÊNCIA, TÉCNICA E TECNOLOGIA E SUAS IMPLICAÇÕES NA SOCIEDADE MODERNA



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Transcrição:

67 CIÊNCIA, TÉCNICA E TECNOLOGIA E SUAS IMPLICAÇÕES NA SOCIEDADE MODERNA Helania Mara Grippa Rui 98 Resumo: O objetivo deste artigo é discutir as propostas sobre o que é ciência, técnica e tecnologia na tentativa de trazer à baila conceitos que permitam a compreensão das transformações, profundas e espetaculares, em curso no mundo moderno. Entender tais conceitos facilita e contribui para controlar e prever as transformações que ocorrem na natureza, de forma que se permitam fazer propostas que levem a um equilíbrio sustentável satisfatório. Para que esse escopo seja alcançado, é necessário analisar algumas concepções que possam fornecer dados relevantes para o entendimento do que venham a ser ciência, técnica e tecnologia. Palavras-chave: Ciência. Técnica. Tecnologia. Abstract: The purpose of this article is to discuss the proposals on what is science, technique and technology in an attempt to bring up concepts that allow the understanding of deep and spectacular transformations in the modern world. Understand these concepts facilitates and helps to control and predict the transformations that occur in nature, so that they may make proposals that will lead to a sustainable balance satisfactory quality of life. So that this scope is reached, it is necessary to analyze some conceptions that can provide data relevant to the understanding of what will be science, technique and technology. Keywords: Science. Technique. Technology. Introdução Muitas são as discussões propostas entre o que seja ciência, técnica e tecnologia na tentativa de promover conceitos que permitam compreender as transformações que estão ocorrendo em nosso mundo moderno de maneira profunda e espetacular. Entender a reflexão desses conceitos cria facilidades e contribui para controlar e prever as transformações que ocorrem na natureza, de forma a propiciar melhores condições que permitam fazer propostas que conduzam a um equilíbrio sustentável satisfatório. 98 Licenciada em Ciências Biológicas, professora de Ciências da Rede Municipal de Educação Básica de Aracruz/ES. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática Aracruz Espirito Santo. E-mail: helaniamara@hotmail.com

68 Torna-se necessário, assim, analisar algumas concepções que possam fornecer dados relevantes para a elaboração de um esclarecimento sobre o que vêm a ser ciência, técnica e tecnologia. A ciência e suas concepções Chassot considera a Ciência como "uma linguagem para facilitar a leitura do mundo" 99 e que seria desejável que os conhecimentos científicos não apenas facilitassem a nossa leitura de mundo, mas que nos ajudassem a entender a necessidade de transformá-lo para melhor: Acredito que se possa pensar mais amplamente nas possibilidades de fazer com que alunos e alunas, ao entenderem a ciência, possam compreender melhor as manifestações do universo 100. Com o grande mérito de sintetizar reflexões sobre ciências de forma a delinear a interpretação da ciência como uma produção cultural, Chassot 101 nos leva à reflexão na qual a ciência pode ser considerada como uma linguagem construída pelos homens e pelas mulheres para explicar o nosso mundo natural, de forma a contribuir para controlar e prever as transformações que ocorrem na natureza. De modo que o ensino de Ciências deve propiciar a todos os cidadãos conhecimentos e oportunidades de desenvolvimento de capacidades necessárias para se orientarem em uma sociedade complexa, compreendendo o que se passa à sua volta 102. Paulo Freire conseguiu transformar o processo de alfabetização de adultos em um processo dinâmico de leitura do próprio mundo. Aqui, reforça-se que é fundamental transformar a educação científica num processo que possibilite aos alunos a leitura do mundo e a interpretação/reflexão sobre os acontecimentos presentes em nossa dura realidade. Segundo Freire, não há educação fora das sociedades e não há homem no vazio 103, de modo que não há sentido em pensar uma educação científica que não contemple os problemas da sociedade, que se encerre numa redoma na qual só 99 CHASSOT, Attico. Alfabetização científica: questões e desafios para educação. ljuí. Unijuí, 2000, p. 37. 100 Idem, Ibidem. p. 91. 101 CHASSOT, Attico. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. Ijuí: Unijuí, 2003. 102 CHASSOT, Attico. Alfabetização científica: questões e desafios para educação. ljuí. Unijuí, 2000. 103 FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, p. 35.

69 existam conceitos, fórmulas, algoritmos, fenômenos e processos a serem memorizados acriticamente pelos educandos. Aliás, essa ideia de que fazer ciência restringe-se a se trancar em laboratórios e bibliotecas, ficando o pesquisador isolado do mundo exterior, é uma imagem típica, com a qual, conforme o pensamento de Carvalho e Gil-Pérez, nosso ensino lamentavelmente contribui, reduzindo a Ciência à transmissão de conteúdos conceituais e, se muito, treinamento em alguma destreza, deixando de lado os aspectos históricos e sociais 104. Para Chassot 105, a Ciência é sempre adjetivada: Ciência como uma linguagem para facilitar nossa leitura do mundo, mas a marca da ciência, atualmente, é a incerteza. Ele vincula a alfabetização cientifica ao Movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), e, através das suas propostas de integração dos benefícios da ciência com a sociedade, normalmente através da escola, pode-se compreender a alfabetização cientifica como meio de contextualizar essas propostas. O Movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) está ligado a eventos históricos. A Revolução Industrial produziu, como consequência, a Revolução Científica dos séculos XVII e XVIII, a qual proporcionou grande crescimento na produção do conhecimento, que implicou mudanças na estrutura e na economia da sociedade. Conforme Paulo Marcelo Marini Teixeira: Movimento CTS conjugado com o conjunto de reflexões geradas na base conceitual das teorias progressistas em educação, e aliado aos avanços já alcançados pela pesquisa didática na área de ciências, incluindo também o trabalho realizado pelo programa construtivista [...], inegavelmente trouxe contribuições importantes para a área; poderá constituir-se em referencial para o redimensionamento da educação científica, com desdobramentos no campo da pesquisa e principalmente na prática pedagógica dos educadores e na própria sala de aula, com a possibilidade de superação das práticas conservadoras que perpassam o ensino ministrado nos componentes curriculares pertencentes a esse ramo de ensino 106. 104 CARVALHO, A.M.P.; GIL-PÉREZ, D. Formação de professores de Ciências. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000, p. 24. 105 CHASSOT, Attico. Educação consciência. 2. ed. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2007, p. 37. 106 TEIXEIRA, P.M.M. Educação científica e movimento C.T.S. no quadro das tendências pedagógicas no Brasil. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2003, p. 99-100.

70 Cuevas 107 observa, oportunamente, que a partir da Segunda Guerra Mundial se começou a discutir e a questionar a relação entre ciência e sociedade. Assim, nas décadas de 1960 e 1970, nasceu o movimento de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) evidenciando o interesse e a necessidade de pesquisas sobre a dimensão social da ciência e da tecnologia (C&T). Esse movimento inclui uma diversidade de campos de estudos que compartilham a crítica à neutralidade da C&T e a promoção da participação pública na tomada de decisões, como meios de instrumentalização da cidadania. Santos aborda a ciência como sendo uma concepção exteriorizante na qual a verdade é "o efeito de convencimento dos vários discursos de verdade em presença e em conflito" 108. Ou seja, a justificativa da prática cientifica se estabelece pelas consequências que é capaz de produzir, tanto na sociedade quanto na comunidade científica, de forma que o saber científico se associa a outros saberes, propiciando questionamentos na constituição de novos conhecimentos. Para Fourez 109, a ciência é uma tecnologia intelectual destinada a fornecer interpretações do mundo que correspondam a nossos projetos, no qual a ciência, enquanto tecnologia intelectual, possui, em sua estrutura, seu lado material, composto pelas bibliotecas, laboratórios, rede de revistas, entre outros. Assim, segundo Fourez 110, definir ciência como tecnologia intelectual é relativamente adequado, haja vista que uma tecnologia não é simplesmente um instrumento, mas também uma organização social que se utiliza de certo número de instrumentos materiais, ou seja, está ligada a projetos humanos de dominação e de gestão do mundo material. Uma ciência construída socialmente para a sociedade e um conhecimento científico socialmente reconhecido e historicamente condicionado, ambos extremamente eficazes para resolver inter-relações com o mundo, tendo, na perspectiva de Gérard Fourez, a valorização da construção do saber pelo próprio indivíduo. Também a ciência está inserida numa complexidade própria, principalmente 107 CUEVAS, A. Conocimiento científico, ciudadanía y democracia. Revista Iberoamericana de Ciencia, Tecnología y Sociedad, v. 4, n. 10, p. 67-83, jan. 2008. Disponível em: <http://oeibolivia. org/files/volumen%.pdf>. Acesso em 27 jun. 2012. 108 SANTOS, B.S. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989, p. 149. 109 FOUREZ, G. A construção das ciências: introdução à filosofia e à ética das ciências. São Paulo: EDUNESP, 1995. 110 Idem, ibidem.

71 por que está articulada com a realidade cultural e histórica de sociedades específicas. Por algum tempo se acreditou que a ciência era sempre a mesma, independentemente de quem a observava. No entanto hoje se percebe que a ciência é marcada por paradigmas, ou seja, que ela depende da visão de mundo do observador e da filosofia que este adota. Habermas aponta para esta interação: A ciência ou seja, a ciência modelar que deve servir de padrão. Para as outras ciências, a física ou a neurofisiologia não passa de uma ficção elucubrada pelos filósofos. No âmbito de um espectro altamente diferenciado e amplamente difundido, existem entre a filosofia e as ciências particulares relações de parentesco em graus diferentes: algumas são mais ou menos independentes de pensamentos filosóficos, outras mais ou menos abertas a tais arroubos especulativos 111. Sendo assim, parece oportuno ter presentes as afirmações de Granger: A ciência é uma das mais extraordinárias criações do homem, que lhe confere, ao mesmo tempo, poderes e satisfação intelectual, até pela estética que suas explicações lhe proporcionam. No entanto, ela não é lugar de certezas absolutas e [...] nossos conhecimentos científicos são necessariamente parciais e relativos 112. O papel da técnica e da tecnologia Ainda se discute a definição dos termos técnica e tecnologia. Morais 113 denomina como técnica as invenções criadas pelo ser humano na era paleolítica, neolítica, medieval e moderna para atender necessidades básicas, tais como o fogo, a habitação, a roda, a linguagem, entre outras. Ele considera, ainda, tecnologia as inovações humanas desenvolvidas a partir da era moderna, que, para ele, têm a função de suprir "falsas necessidades modernas", o que, em outras palavras, são necessidades supérfluas. Na visão de Morais, essas inovações são "subprodutos surpreendentes e incontroláveis" que são/estão "subvertida(s) pelos interesses econômicos industriais" 114. Buscando esclarecer conceitos, Silva e Silva afirmam que "a tecnologia é uma 111 HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da modernidade. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990, p. 15. 112 GRANGER, Gilles-Gaston. A ciência e as ciências. São Paulo: Editora da UNESP, 1994, p. 113. 113 MORAIS, Regis de. Filosofia da ciência e da tecnologia: introdução metodológica e crítica. 6. ed. Campinas: Papirus, 1997. 114 Idem, ibidem, p. 100.

72 ferramenta para estender nossas habilidades" 115. A televisão, por exemplo, estende nossa visão porque podemos ver coisas que estão acontecendo longe, como uma partida de futebol ou uma corrida de carros. Há outras definições de tecnologia, como: "uma aplicação da ciência" 116, "Construção do espírito humano" 117, "Computação humana" 118. O Dicionário da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda, indica a palavra "tecnologia" como "um conjunto de conhecimentos, especialmente princípios científicos, que se aplicam a um determinado ramo de atividade: tecnologia mecânica" 119. Desta forma, a utilização da palavra "tecnologia" vem sendo ampliada para muitas áreas do conhecimento, no mercado de trabalho, nas formas organizacionais. Segundo Sérates 120, a sociedade atual caracterizada por crescentes e rápidas alterações, por vezes complexas, em que é preciso analisar, interpretar e resolver tem necessidade de pessoas com grande capacidade de adaptação, aptas a aprender novas técnicas, capazes de formular problemas decorrentes de situações com as quais se deparem e de resolvê-los com habilidades, ou seja, indivíduos que pensam de uma forma versátil, crítica, eficaz e criativa. Para Miranda: A tecnologia é fruto da aliança entre ciência e técnica, a qual produziu a razão instrumental, como no dizer da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt. Esta aliança proporcionou o agir-racional-com-respeito-afins, conforme assinala Habermas, a serviço do poder político e econômico da sociedade baseada no modo de produção capitalista (séc. XVIII) que tem como mola propulsora o lucro, advindo da produção e da expropriação da natureza. Então se antes a razão tinha caráter contemplativo, com o advento da modernidade ela passou a ser instrumental. É nesse contexto que deve ser pensada a tecnologia moderna; ela não pode ser analisada fora do modo de produção, conforme observou Marx 121. Sendo assim, ao analisar os conceitos apresentados percebe-se que a ciência 115 SILVA, Luiz R. A.; SILVA, Robson S. Gestão escolar e tecnologias. Manaus: UEA Edições, 2008, p. 20. 116 MAIA, Freire Newton. A ciência por dentro. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 20. 117 DEMO, Pedro. Conhecimento moderno: sobre ética e intervenção do conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 45. 118 MORIN, Edgar. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007, p. 117. 119 DICIONÁRIO DO AURÉLIO. Disponível em: <http://www.dicionariodoaurelio.com/>. Acesso em 27 jun. 2012. 120 SÉRATES, J. Raciocínio lógico: lógico matemático, lógico quantitativo, lógico numérico, lógico analítico, lógico crítico, 83. ed vol. 1, Brasília: Jonofon Ltda, 1998. 121 MIRANDA, A. L. Da natureza da tecnologia: uma análise filosófica sobre as dimensões ontológica, epistemológica e axiológica da tecnologia moderna. 2002. (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-Graduação em Tecnologia do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET-PR), p. 51.

73 associada à tecnologia tem alterado o curso da história da humanidade, promovendo importantes abordagens histórica, filosófica, cultural, sociológica e epistemológica, permitindo a transposição de novos conceitos para o bem-estar da humanidade. Segundo Laranja, Simões e Fontes 122, Ciência e tecnologia não são neutras, pois refletem as contradições das sociedades que as engendram, tanto em suas organizações quanto em suas aplicações. Na realidade, são formas de poder e de dominação entre grupos humanos e de controle da natureza. É novamente Miranda 123 quem faz uma oportuna conexão entre ciência e tecnologia, ao afirmar: [...] muito além de alterar padrões de comportamento, a tecnologia, a partir da modernidade, contribui para alterar a relação do ser humano com o mundo que o cerca, implicando no estabelecimento de uma outra cosmovisão, diferentemente daquela dos gregos ou dos medievais. Neste contexto, a ciência tem o poder de articular saberes e estimular processos cognitivos, auxiliando na tomada da consciência do indivíduo na sociedade. Assim, homens e mulheres redescobrem sua função e sua importância para a construção de um ambiente mais participativo, investigativo e de pesquisa. Aqui, propõe-se a compreensão de técnica, em sentido geral, como sendo a própria ação ou atividade prática, enquanto aplicação de um conhecimento, ao passo que tecnologia é a possibilidade, sobretudo, de propiciar o desenvolvimento tecnológico, em que a própria ciência tornou possível ampliar o seu conhecimento a partir da tecnologia, permitindo que o homem comum reflita sobre o êxito e o triunfo da ciência. Conforme Vargas, a técnica sempre teve um caráter mágico e simbólico: [ ] Todas as técnicas tiveram origem mágica. Desde o arado que penetrava a mãe terra para fecundá-la e que, portanto, tinha a forma de um falo, até a medicina grega originária do deus Asclépio que curava os doentes durante o seu sono passando pela forjaria e a têmpera dos aços das espadas árabes em que os cavaleiros arrebatavam as espadas das forjas, e as temperavam e brandiam-nas contra o vento combatendo espíritos. [ ]. A transmissão dos conhecimentos técnicos de geração a geração foi também 122 LARANJA, M.; SIMÕES, V. C.; & FONTES, M. Inovação tecnológica: experiências das empresas portuguesas. Lisboa: Texto, 1997, p. 23. 123 MIRANDA, A. L. Da natureza da tecnologia: uma análise filosófica sobre as dimensões ontológica, epistemológica e axiológica da tecnologia moderna. 2002. (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-Graduação em Tecnologia do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET-PR), p. 11.

74 inicialmente feita como segredos revelados pelos deuses e, portanto, a uma corporação. De uma forma positiva, entretanto, pode-se pensar a invenção das técnicas e a sua transmissão de geração a geração como baseada num instinto esclarecedor inato ao homem a partir, talvez, do inconsciente 124. Enquanto categoria, afirma Milton Santos, a técnica pode ser entendida como um dos principais elementos na relação homem e meio, e pode ser entendida, contemporaneamente, como o conjunto de meios instrumentais e sociais a partir do qual o homem produz e transforma espaços 125. Segundo Correia 126, a ciência enunciados (leis, teorias) que permitem conhecer a realidade e modificá-la e a técnica que promove a transformação do real, consistindo em operações visando satisfazer determinadas necessidades se combinam e formam um plano, uma concepção, um desígnio a ser realizado. Para ela, o ser humano tem a capacidade de inventar técnicas, aperfeiçoá-las e transmitilas e, por isso, nem toda técnica deriva da ciência, mas a ciência é que fornece a ela novos objetos de pesquisa e amplia meios para a própria investigação. Após essas considerações, se pode prever que desejar, aqui e agora, dar uma resposta à pergunta o que é ciência, técnica e tecnologia não é fácil, pois o que se pode constatar facilmente, depois das reflexões proporcionadas, é que a humanidade sobrevive hoje devido à integração dos termos aqui propostos. Considerações finais O objetivo deste artigo foi discutir as propostas sobre o que é ciência, técnica e tecnologia na tentativa de trazer à baila conceitos que permitam a compreensão das transformações, profundas e espetaculares, em curso no mundo moderno. Assim, se pôde perceber que a ciência é um processo de desenvolvimento progressivo, um instrumento para facilitar a compreensão do mundo e que colabora com o entendimento para transformá-lo, uma linguagem formulada pelos homens que busca a compreensão do mundo natural, visando o controle e previsão das transformações da natureza. 124 VARGAS, Milton. Para uma filosofia da tecnologia. São Paulo: Alfa-Omega, 1994, p. 1. 125 SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4. ed. São Paulo: USP, 2006. 126 CORREIA, Maíra Baumgarten. Tecnologia. In: CATTANI, Antonio D. (Org.). Trabalho e tecnologia: dicionário crítico. Petrópolis, RJ: Vozes: Editora da Universidade/UFRS, 1999.

75 A tecnologia concede à ciência, na maioria das vezes, precisão e controle dos resultados de suas descobertas, facilitando a relação do homem com o mundo, de modo que possa promover determinadas modificações a serem levadas em consideração, como o bem-estar econômico, social, tecnológico, ambiental, acabando por atrelar ciência e tecnologia a tal ponto que se torna impossível pensar na dissociação entre uma e outra. Portanto, ao contrapor ciência, técnica e tecnologia percebe-se que numa prática sem teoria tem-se uma técnica, e a ciência fundamenta a teoria no contexto prático, reforçando a observação que faz parte desse processo de reflexão e desenvolvimento tecnológico. De forma que não é possível separar os paradigmas da ciência e as prerrogativas da técnica e tecnologia, tornando-se este o grande desafio da humanidade. Referências CARVALHO, A.M.P.; GIL-PÉREZ, D. Formação de professores de Ciências. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000. CHASSOT, A. Alfabetização científica: questões e desafios para educação. ljuí. Unijuí, 2000.. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. Ijuí: Unijuí, 2003. CUEVAS, A. Conocimiento científico, ciudadanía y democracia. Revista Iberoamericana de Ciencia, Tecnología y Sociedad, v. 4, n. 10, p. 67-83, jan. 2008. Disponível em: <http://oeibolivia. org/files/volumen%.pdf>. Acesso em 27 jun. 2012. DEMO, P. Conhecimento moderno: sobre ética e intervenção do conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2002. DICIONÁRIO DO AURÉLIO. Disponível em: <http://www.dicionariodoaurelio.com/>. Acesso em 27 jun. 2012. FOUREZ, G. A construção das ciências: introdução à filosofia e à ética das ciências. São Paulo: EDUNESP, 1995. FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. GRANGER, G-G. A ciência e as ciências. São Paulo: Editora da UNESP, 1994. HABERMAS, J. O discurso filosófico da modernidade. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990. LARANJA, M.; SIMÕES, V.C.; FONTES, M. Inovação tecnológica: experiências das empresas portuguesas. Lisboa, Texto, 1997. MAIA, F.N. A ciência por dentro. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. MIRANDA, A.L. Da natureza da tecnologia: uma análise filosófica sobre as dimensões ontológica, epistemológica e axiológica da tecnologia moderna. 2002 pp. 161 Dissertação (mestrado). Programa de Pós-Graduação em Tecnologia do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná (CEFET- PR). MORAIS, R. de. Filosofia da ciência e da tecnologia: introdução metodológica e crítica. 6. ed. Campinas: Papirus, 1997. MORIN, E. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. SANTOS, B.S. Introdução a uma ciência pós-moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989. SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4. ed. São Paulo: USP, 2006. SÉRATES, J. Raciocínio lógico: lógico matemático, lógico quantitativo, lógico numérico, lógico analítico, lógico critico, 83. ed. vol. 1, Brasília: Jonofon Ltda, 1998. SILVA, L. R.A.; SILVA, R. S. Gestão escolar e tecnologias. Manaus: UEA Edições, 2008. TEIXEIRA, P.M.M. Educação científica e movimento C.T.S. no quadro das tendências pedagógicas no Brasil. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2003. VARGAS, M. Para uma filosofia da tecnologia. São Paulo: Alfa-Omega, 1994.