NOTA TÉCNICA COMO SE COMPORTOU A ARRECADAÇÃO TRIBUTÁRIA FEDERAL RECORRENTE EM 2013 Érica Diniz e José Roberto Afonso 0 Janeiro de 2014
Nos primeiros dias de 2014, o Ministro da Fazenda anunciou que a União teria cumprido sua meta de superávit primário do ano passado. Resultado em grande parte alcançado pelo recente crescimento da receita, especialmente a de caráter extraordinário. Para 2014, ano eleitoral, pouco se espera do lado dos gastos públicos. Estes são dominados por compromissos fixos (salários) e indexados (benefícios sociais e juros), o que dificulta qualquer redução. A perspectiva da campanha presidencial torna ainda mais remota a possibilidade de cortes. Uma melhora permanente da receita parece ser a única opção para encorpar o superávit no curtíssimo prazo. O problema é como aumentar a arrecadação diante de um crescimento econômico pífio e com o forte aumento das desonerações tributárias, segundo as próprias estimativas oficiais. Em 2014, o comportamento das receitas não extraordinárias será variável decisiva para o resultado fiscal. É importante, portanto, acompanhar o seu desempenho. A Receita Federal do Brasil (RFB) arrecadou em 2013 pouco mais de R$ 1,1 trilhões correntes: crescimento real de 4,4% sobre a arrecadação de 2012, superior ao crescimento do PIB. Este bom desempenho, no entanto, precisa ser qualificado. Do ganho real acumulado no ano (R$ 47,2 bilhões), exatos 60% provieram de duas fontes excepcionais: o parcelamento de antigas dívidas tributárias previstos na Lei 12.865/13 (R$ 21,8 bilhões) e o recolhimento extraordinário de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS (R$ 6,6 bilhões). A RFB, por sua vez, alega que as desonerações tributárias dispararam (se gastou R$ 31,3 bilhões a mais no ano passado). Não fosse isso, sem computar tanto o aumento das desonerações no ano quanto as duas receitas excepcionais antes citadas, a RFB (ver slide 9 da apresentação do resultado de dezembro) informa que a arrecadação federal cresceu em 5,1% entre 2012 e 2013 que pode ser mais que o dobro do crescimento do PIB no período, ou seja, um desempenho muito bom. Porém, o efeito das renúncias 1
tributárias permanecerá e até se expandirá em 2014, puxado por desoneração da folha de novos e grandes setores. Por outro lado, não há expectativa de novas captações extraordinárias de receitas (resíduo do último refinanciamento que rendeu R$ 1,4 bilhões em dezembro e pode se repetir nos próximos meses). Outra avaliação para eliminar os efeitos de medidas atípicas ou temporárias passa por excluir do total da receita arrecadada pela RFB as chamadas outras receitas. Neste caso, o crescimento acumulado no ano passado da receita recorrente foi de 3,8% com relação a 2012. A evolução da arrecadação federal acumulada para os anos entre 2008 e 2013, expressa em proporção do PIB, é apresentada na tabela a seguir. A arrecadação recorrente aumentou de 22,4% para 23,5% do PIB em cinco anos. Foram fortes as oscilações: se a crise global diminuiu essa carga em 0,9 ponto do PIB entre 2008 e 2010, houve uma rápida recuperação de 1,6 pontos até 2012, e um ligeiro aumento de 0,3 pontos até o de 2013. Para o ganho de carga de 1,2 pontos do PIB ao longo dos últimos cinco anos foi decisiva a tributação da base salário (incremento de quase 1 ponto graças a contribuição previdenciária, apesar das desonerações), pois caiu o recolhido pelas empresas sobre vendas e lucros, ainda que em parte compensado por mais recolhimentos de bancos e das importações. Em % do PIB Descrição 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2008-2013 Arrecadação Total 22,6 21,6 21,9 23,4 23,4 23,8 1,2 Outras Receitas 0,2 0,4 0,4 0,5 0,3 0,3 0,1 Arrecadação Recorrente 22,4 21,1 21,5 22,9 23,1 23,5 1,1 Importação 0,9 0,8 0,9 1,0 1,1 1,1 0,2 Receita dos Bancos 0,8 1,0 0,8 0,8 1,0 1,1 0,3 Receita das Empresas 8,4 7,6 7,5 7,9 7,8 8,2-0,2 Lucro 4,2 4,0 3,6 3,9 3,8 4,0-0,2 Salário 7,7 7,8 7,8 8,2 8,6 8,6 0,9 Fonte: RFB, IBGE. Elaboração Própria. Arrecadação Tributária Federal (acumulado no ano) Importação = II + IPI/Importação. Receita dos Bancos = IRPJ + COFINS + PIS/PASEP + CSLL Entidade Financeiras. Receita das Empresas = IRPJ + COFINS + PIS/PASEP + CSLL Demais Empresas. Lucro = IRPJ + CSLL. Salário = Previdenciaria + IRRF Trab. 2
O futuro pode apontar também em direção positiva, a julgar pela evolução desde 2008 da variação real da arrecadação recorrente no mês, acumulada no último trimestre ou nos últimos doze meses, comparada a igual período do ano anterior vide gráfico a seguir. Quando as curvas da variação trimestral ou mensal cortam a anualizada, isso indica mudança de tendência. Se ocorrem por baixo, o crescimento anual desacelera (como entre meados de 2010 e 2012). Mas, em 2013, o crescimento mensal foi melhor que o anualizado em todos os meses; o mesmo ocorreu com o trimestral desde maio. Há, portanto, uma visível melhora das taxas de crescimento quando o foco é o período mais recente. 25 Crescimento Real da Arrecadação Tributária Recorrente (variação em relação a igual período do ano anterior) 20 15 10 5 0-5 Anual Trimestral Mensal Fonte: RFB. Elaboração Própria. Portanto, contrariando o senso comum, a evolução no pós-crise da receita federal recorrente não apresentou desempenho tão ruim quando comparado ao PIB, mesmo depois da crise e da concessão indiscriminada de renúncias. Se é certo que haverá crescimento da arrecadação recorrente em 2014, a dúvida passa ser se será suficiente para compensar os recolhimentos excepcionalmente realizados no ano anterior. Em suma, o desempenho da arrecadação tributária está bom diante das circunstâncias econômicas e isso gera uma situação curiosa. Ora, mesmo excluindo o que foi extraordinário e ao contrário do que a maioria dos analistas disse, a arrecadação federal está boa, diante do desempenho da economia e da concessão indiscriminada de incentivos, tanto que ajudará a carga tributária federal (e provavelmente a global) de 2013 a ser recorde. Se 3
forem excluídos os efeitos de mudanças institucionais (sejam favoráveis, como refinanciamento, sejam desfavoráveis, como mais desonerações), a arrecadação federal cresceu 5% no ano passado, isto é, quase o dobro do PIB. Como esperar mais da arrecadação? Paradoxalmente, se isso é uma boa notícia para fins de política tributária, por outro lado, é péssima para a política fiscal, porque significa que, se por acaso o resultado fiscal primário verdadeiro (sem maquiagem) ficar abaixo do necessário para estabilizar a razão dívida/pib, a razão deve ser buscada no outro lado do balanço fiscal ou seja, no crescimento real demasiado acelerado do gasto público, que não se dá em cima de investimento (que poderia ser cortado no futuro). Em termos prospectivo, o bom desempenho presente da receita pode comprometer o cenário futuro para as metas fiscais pois pode significar que promover um novo ajuste fiscal (como muitos esperam do novo governo e em 2015) será um desafio muito maior que no passado pois o espaço para aumentar ainda mais a carga tributária será limitado por seu próprio tamanho afinal, ela já bateu recordes, já supera o que se arrecadava antes da crise e, pior, do que se recolhia na época em que ainda se cobrava CPMF. 4
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