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Ciência Animal, 27 (1); 118-126, 2017 TÉCNICA DE FIXAÇÃO COM FIO METÁLICO ASSOCIADO AO USO DE RESINA ACRÍLICA, PARA REDUÇÃO DE FRATURA NO CORPO DA MANDÍBULA EM CÃO RELATO DE CASO (Metallic wire fixation technique associated with the use of acrylic resin to reduce fracture in the jaw body in dogs Case Report) Victor Manuel de Lacerda Freitas 1 ; Francisco Antônio Félix Xavier Júnior 2 ; João Alison de Moraes Silveira 3 ; Maria Míria Cavalcante Marinho 4 ; Janaina Serra Azul Monteiro Evangelista 1 1 Faculdade de Veterinária da Universidade Estadual do Ceará (UECE); 2 Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias (UECE), Av. Dr. Silas Munguba, 1700 - Campus do Itaperi, Fortaleza, Ceará. CEP: 60.714-502, Brazil; 3 Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal do Ceará; 4 Hospital Veterinário Amadeu Marinho. RESUMO As fraturas de mandíbula são bastante frequentes na clínica de pequenos animais, sendo importante para o Médico Veterinário saber diagnosticar e tratar adequadamente os pacientes que chegam ao hospital; muitas vezes, em estado crítico. O método de diagnóstico utilizado amplamente, ainda hoje, é a radiografia, por ser de baixo custo e, consequentemente, acessível para a maior parte da população, além de proporcionar diagnósticos confiáveis. A escolha do tipo de tratamento (conservativo ou cirúrgico) vai depender basicamente do tipo de fratura e de como o cirurgião vai proceder, analisando o escore de avaliação da fratura. É imprescindível, portanto, que as técnicas conservadoras e cirúrgicas, disponíveis para a realização do procedimento terapêutico, devam ser conhecidas pelo Médico Veterinário, para a correta execução durante o procedimento. O objetivo desse trabalho foi relatar um caso de redução de fratura no corpo da mandíbula de um cão, utilizando a técnica de fixação com fio metálico, associado ao uso de resina acrílica. A técnica associada, utilizada nesse trabalho, apresentou-se adequada, demonstrando resultados positivos para o tipo de paciente que estava sendo tratado, animal jovem, agitado e que a tutora não tinha tempo disponível para, regularmente, oferecer a atenção necessária aos cuidados da fratura do animal. Palavras chave: Cirurgia craniofacial, fio de aço, resina acrílica. ABSTRACT Mandibular fractures are quite common in small animals. Therefore, it is important for the veterinarian how to diagnose and treat, with an adequate approach, the patients that arrive at the hospital often in a critical condition, requiring a proper stabilization and then undergo with the necessary procedures to increase the chances of animal survival * Endereço para correspondência: janainaserrazul@gmail.com

and reduce the possibility of sequel. Even today, the method of diagnosis widely used is the x-ray, since it is considered to have a low cost and then affordable for the majority of the people. The type of treatment (conservative or surgical) depends largely on fracture and how a surgeon wants to proceed, analyzing the factors related to the evaluation fracture score. It is imperative that the Veterinarian has total dominion over the cranial anatomy. Moreover, the surgeon has to know all the techniques available to carry out the therapeutic procedures with conservative or surgical techniques. The goal of this study was to report a case of fracture reduction in the mandibular body of a dog using the fixation technique with wire, associated with the use of acrylic resin. The associated technique used in this study can be considered as satisfactory, for showing positive results for the type of patient who was being treated, taking into account the mechanical, biological and clinical factors. Keywords: Craniofacial surgery, acrylic resin, steel wire. INTRODUÇÃO As fraturas de mandíbulas são relativamente comuns em cães. Em alguns casos, elas poderiam ocorrer, concomitantemente, com fraturas na maxila, que seriam menos frequentes, quando comparados às lesões mandibulares (LOPES et al., 2005), que poderiam ser resultado de traumas, de periodontites severas ou de neoplasias. Os traumas que atingiriam a cabeça seriam, com muita frequência, acompanhados de obstrução das vias aéreas superiores, de pneumotórax e de miocardite traumática (JOHNSON, 2015). Os princípios fundamentais para uma boa restauração de fratura na mandíbula, com uma consolidação óssea adequada, seriam um perfeito alinhamento oclusal, a estabilidade adequada, a ausência de danos em tecidos moles e duros, a preservação da dentição e o retorno imediato de sua função (MARETA, 2005). Dentre os métodos mais invasivos utilizados para a redução da fratura, destacariam-se a utilização de fio metálico, de pino intramedular, de fixador esquelético externo, de resina acrílica e de placa óssea (VERSTRAETE, 2007). Uma das técnicas mais utilizada seria a aplicação de fios de aço interdentários. Em fraturas simples transversas ou obliquas curtas, poderia ser utilizado o fio de aço interdental como único método de fixação, caso o animal tenha dentes firmes em cada lado da linha de fratura (JOHNSON, 2015). Se o animal tiver uma fratura onde houvesse fragmentação e/ou perda óssea, a técnica de aplicação de fios interdentários poderia acabar levando a uma má oclusão (RAHAL et al., 1998). A aplicação de fio de aço seria considerada uma técnica simples, efetiva e possuiria poucos 119

aspectos negativos relacionados. Um exemplo de aspecto negativo seria um acúmulo de alimentos e de partículas entre o fio e a linha da gengiva, podendo causar gengivites (HARASEN, 2008). O objetivo desse trabalho foi relatar um caso de redução de fratura no corpo da mandíbula de um cão, utilizando a técnica de fixação com fio metálico, associado com resina acrílica. MATERIAL E MÉTODOS Um animal da espécie canina, macho, sem padrão racial definido, com 14 kg de massa corporal e aproximadamente 5 meses de vida, foi atendido no Hospital Veterinário Amadeu Marinho, Fortaleza CE, com histórico de atropelamento por uma motocicleta. No exame físico, observou-se que o canino apresentava mucosas hipocoradas, midríase bilateral, sangramento na cavidade oral, algia à manipulação de grau intenso no espelho nasal, palpação abdominal sem alteração e linfonodos sem alteração. Na auscultação cardíaca e pulmonar foram observadas taquicardia e taquipnéia, além da temperatura corporal estar a 39,3 ºC. No exame neurológico, foi avaliado que o animal apresentava todos os reflexos normais, a propriocepção e uma reação à dor também foram observadas. Foram solicitados hemograma completo, bioquímica sérica (ureia, creatinina, alanina aminotransferase e fosfatase alcalina) e uma radiografia do crânio (projeções látero-lateral direita e crâniocaudal) e uma radiografia intra-oral. O paciente foi internado para controle da analgesia e de possível edema cerebral, até os resultados dos exames estarem prontos e um diagnóstico preciso do trauma poder ser definido. A opção terapêutica para a estabilização do cão incidiu sobre Manitol solução a 20% (2mL/kg/minuto, IV), cloridrato de tramadol (3 mg/kg, SC, TID), meloxicam (0,2mg/kg, SC, SID), ceftriaxona sódica (30 mg/kg, IV, SID) e metronidazol) (15 mg/kg, IV, BID). O perfil hematológico e bioquímico do animal não apresentou alteração relevante; porém, nas imagens radiológicas, foi observada uma linha de fratura do corpo direito da mandíbula, caudal aos primeiro e segundo molares (Fig. 1A e Fig. 1B). Diante do exposto e confirmado pelos exames, pode-se ter um diagnóstico definitivo de uma fratura transversal, completa e fechada no corpo da mandíbula direita, caudal ao primeiro dente molar, com escore de avaliação da fratura 7 (grau moderado). Como tratamento, foi indicada a realização de uma correção por técnica cirúrgica 120

aplicada no corpo da mandíbula (Mandibulopexia). Figura 1: (A) Radiografia do crânio na qual se observa linha de fratura do corpo direito da mandíbula, caudal ao primeiro molar. (B) Radiografia intra-oral da mandíbula, indicando fratura completa entre o primeiro e o segundo molares da mandíbula. (C) Técnica utilizando fio de aço e resina acrílica para a redução de fratura de mandíbula. (D) Radiografia intra-oral da lesão, após 20 dias. Observe-se a formação do calo ósseo. Diante do exposto e confirmado pelos exames, pode-se ter um diagnóstico definitivo de uma fratura transversal, completa e fechada no corpo da mandíbula direita, caudal ao primeiro dente molar, com escore de avaliação da fratura 7 (grau moderado). Como tratamento, foi indicada a realização de uma correção por técnica cirúrgica aplicada no corpo da mandíbula (Mandibulopexia). A medicação pré-anestésica (MPA) utilizada foi morfina (0,5mg/kg), via intramuscular. Para indução anestésica, foi utilizado propofol (5mg/kg), via endovenosa, administrado de forma lenta. A manutenção anestésica foi realizada com isoflurano, no sistema aberto com circuito Baraka. Foi realizado 121

monitoramento cardíaco com o eletrocardiograma, capnógrafo e oximetria de dedo e, da mesma forma, os dados referentes à pressão arterial e temperatura estavam disponíveis, em tempo real. A técnica de correção cirúrgica do corpo da mandíbula consistiu-se, basicamente, no posicionamento firme de um fio de aço no osso da mesma, mais especificamente, em torno do colo, entre os dentes molares 310 e canino 304, com fios de aço maleável 2,0 hexagon, para que se evitasse um deslizamento para fora da coroa. Os fios foram colocados através de orifícios que foram feitos entre os dentes. Os dentes foram circundados e, então, os fios foram apertados. Quando se colocou a resina acrílica nos dentes, previamente tratados, realizou-se a técnica combinada de fixação (Fig. 1C). Os dentes foram limpos, polidos e tratados previamente com solução ácida, para melhorar a adesão da resina. Foi realizada uma antissepsia de toda a boca, com digluconato de clorexidine a 0,12% e profilaxia para retirada de biofilme das coroas dentárias, com polimento da superfície dos dentes com o auxílio de taça de borracha impregnada por gel de flúor e pedrapomes para reduzir o acúmulo de placa, durante a recuperação pós-cirúrgica. A medicação prescrita para o pós-operatório foi Spiraphar10 (Espiramicina, 90.000UI/kg; Dimetridazol, 12,5mg/kg), 1 comprimido e ½ SID durante 15 dias e o Maxicam 2mg (Meloxicam, 0,15mg/kg), 1 comprimido e ½ SID durante 5 dias. Além disso, foi recomendado que se fizesse a higienização oral com Periovet spray (Digluconato de clorexidine 20%; aroma menta) uma vez por semana e até o retorno do animal; após 20 dias, oferecer somente alimento pastoso, até uma completa osteosíntese; aplicação de um colar Elisabethano e restrição do espaço. No retorno, após 19 dias, foi feito uma nova radiografia intra-oral, sendo observada a formação do calo ósseo (Fig. 1D). RESULTADOS E DISCUSSÃO O animal atendido era um macho, sendo esse sexo considerado o mais predisposto a sofrer acidentes, se envolver em brigas e ser mais agressivo, devido à influência dos hormônios masculinos (esteroides) e aos padrões comportamentais, geneticamente determinados (HART, 1985; SHAMIR, 2002). Tem sido demonstrado, também, que cães com peso menor que 16kg teriam uma maior prevalência na ocorrência das injúrias maxilares e mandibulares (SHAMIR, 2002; KITSHOFF et al., 2013), sendo que o peso do cão desse 122

relato de caso foi menor que 16kg, fato esse que corrobora com a prevalência citada pela literatura. A região da mandíbula seria comumente associada com fraturas, nas porções pré-molar e molar (LOPES, 2005; KITSHOFF et al., 2013). No caso do cão aqui enfatizado, a fratura ocorreu caudal ao primeiro dente molar. Seria importante, igualmente, considerar que os cães de raças pequenas desenvolveriam doenças periodontais com mais frequência e poderiam apresentar perda de osso alveolar, predispondo esses animais a uma fratura mandibular (HARVEY, 1994). Muitos trabalhos têm apresentado uma maior prevalência de injúrias traumáticas em cães jovens. Kitshoff et al. (2013), em seu trabalho, identificou que, aproximadamente 57% dos animais examinados que apresentaram fraturas maxilo-mandibulares, tinham menos de 12 meses de idade. Frequentemente, fraturas mandibulares ocorreriam devido a acidentes traumáticos. Estudos anteriores teriam reportado que os acidentes causados por veículos automotores seria uma das causas mais comuns na ocorrência das injúrias traumáticas na mandíbula de cães e gatos (LOPES, 2005). Outros trabalhos têm demonstrado que as brigas com outros animais seria as causas mais prováveis das fraturas mandibulares (MULHERIN et al., 2014). No caso desse relato, a causa da fratura foi um atropelamento automobilístico, indo de acordo com as citações da literatura. Foi realizado um exame físico e clínico completo, com a finalidade de identificar qualquer outra injúria que pudesse pôr a vida do animal em risco; pois, como seria preconizado por Verstraete (2007), todo animal com fratura de mandíbula deveria ser examinado, estabilizado e posteriormente realizados os procedimentos definitivos. A escolha dos diferentes métodos de tratamento e do material a ser utilizado na estabilização vai depender de alguns fatores, como a localização, o tipo de fratura, a presença ou ausência de dentes, a destruição de tecidos moles, o grau de habilidade do cirurgião, o tipo de material disponível e a colaboração do proprietário e do paciente no pós-operatório (BILGILI, 2002). Com relação ao escore de avaliação da fratura, foram levados em consideração os fatores mecânicos, biológicos e clínicos. Os fatores mecânicos estão relacionados ao número de membros acometidos, tamanho do paciente, como também a atividade do mesmo. Já os fatores biológicos levam em consideração a idade do animal, a saúde do paciente e o tipo de fratura. Por sua vez, os fatores clínicos estão 123

principalmente relacionados ao paciente e ao proprietário. Analisando todos esses fatores, seria possível definir um escore que indicaria qual tipo de técnica seria melhor para o indivíduo (JOHNSON, 2015), apesar do paciente ser jovem e apresentando uma fratura simples, fatos esses verificados e confirmados pela boa avaliação feita no animal. Os fatores clínicos relacionados ao paciente e à tutora, foram considerados ruins, pois a capacidade da proprietária em atender às necessidades do animal e, principalmente, uma não cooperação do paciente (muito ativo e incontrolável), foram fatores decisivos para a definição do escore de avaliação da fratura, sendo considerada moderada (JOHNSON, 2015). Teria sido recomendado um procedimento conservativo (focinheira de esparadrapo ou resina acrílica) para a redução da fratura, já que o cão era jovem e a fratura era simples (MANGANELLO- SOUZA e SILVA, 2002); além do fato de que o acidente ter acontecido há menos de 24 horas. No entanto, devido à dificuldade que a proprietária tinha e o comportamento difícil do paciente, foi escolhido uma técnica mais invasiva. Se fosse realizado uma técnica conservadora, a chance de não haver uma redução adequada seria maior, do que com a utilização de uma técnica mais invasiva. Portanto, o tratamento de escolha foi uma amarria interdental, associada à utilização de resina acrílica. A única complicação do pósoperatório foi a resina ter se soltado; devido, provavelmente, ao temperamento agitado do paciente, já que a proprietária relatou que o paciente quebrou o colar Elizabethano, a porta de madeira do canil e mordia tudo que tinha acesso. Johnson (2015) relataria que existiriam complicações que seriam mais relacionadas ao paciente que a própria fratura; principalmente em animais jovens, por serem mais hiperativos. Felizmente, a estabilização da fratura não foi prejudicada e a osteossíntese progrediu, não havendo má oclusão e desenvolvimento de osteomielite. Apesar do paciente ter conseguido tirar o splint de resina acrílica no 11º dia, acredita-se que sua utilização foi benéfica, já que durante os 10 dias em que a resina estava sendo utilizada, associada ao fio de aço para a redução da fratura, houve uma progressão da osteosíntese. Caso tivesse sido utilizado somente o fio de aço, é possível que alguma complicação pudesse aparecer, devido ao comportamento do cão. O trabalho mostrou a eficiência da técnica de amarria interdental, com estabilização por resina acrílica autopolimerizável na região dos dentes molares da mandíbula. 124

CONCLUSÃO Pode-se concluir que a técnica de fixação com fio metálico, associado ao uso de resina acrílica, apresenta grande importância na rotina cirúrgica de pequenos animais, devido a seu baixo custo, à praticidade e o resultado positivo da osteossíntese. Tal procedimento torna a indicação e a utilização cada vez maior da técnica de amarria interdental com a estabilização por resina acrílica autopolimerizável na rotina do hospital em pacientes veterinários com fratura no corpo da mandíbula, melhorando o prognóstico e a sobrevida do animal. REFERÊNCIAS BILGILI, H.H. Comparative study on the effects of wire, polyclioxanone and mini titanium plate osteosynthesis materials on the healing of mandibular fractures: an experimental study in rabbits. Turkish Journal of Veterinary Animal Science, v.26, p.1109-1116, 2002. HARASEN, G. Maxillary and mandibular fractures. Canadian Veterinary Journal, v.48, n.8, p.819-820, 2008. HART, B.L.; HART, L.A. Causes and therapeutic approaches for common behavioral problems: aggressive behavior in dogs. In: HART, B.L.; HART, L.A. Canine and Feline Behavioral Therapy. Philadelphia: Lea & Febiger, 1985. p.27-55. HARVEY, C.; SHOFER, F.; LASTER, L. Association of age and body weight with periodontal disease in North American dogs. Journal Veterinary Dentistry, v.11, n.3, p.94 105, 1994. JOHNSON, A.L. Fundamentos de Cirurgia Ortopédica e Tratamento de Fraturas. In: FOSSUM, T.W. Cirurgia de Pequenos Animais. Rio de Janeiro: Mosby Elsevier, 2015, p.1033-1093. JOHNSON, A.L. Tratamento de Fraturas Específicas. In: FOSSUM, T. W. Cirurgia de Pequenos Animais. Rio de Janeiro: Mosby Elsevier, 2015, p.1106-1212. LEGENDRE, L. Maxillofacial fractures repairs. Veterinary Clinics of North America Small Animal Practice, v.35, n.4, p.985-1008, 2005. LOPES, F.M. Oral fractures in dogs of Brazil-a retrospective study. Journal Veterinary Dentistry, v.22, n.2, p.86-90, 2005. KITSHOFF, A.M.; de ROOSTER, H.; FERREIRA, S.M. A retrospective study of 109 dogs with mandibular fractures. Veterinary and Comparative Orthopaedics and Traumatology, v.26, n.1, p.1-5, 2013. MANGANELLO-SOUZA, L.C.; SILVA, A.A.F. Fraturas do côndilo mandibular: classificação e tratamento. Revista 125

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