Referência Araújo, F., Pais Ribeiro, J., Oliveira. A., Pinto, C., & Martins, T. (2008). Validação da escala de Lawton e Brody numa amostra de idosos não institucionalizados. In: I.Leal, J.Pais-Ribeiro, I. Silva & S.Marques (Edts.). Actas do 7º congresso nacional de psicologia da saúde (pp.217-220). Lisboa: ISPA Validação da escala de Lawton e Brody numa amostra de idosos não institucionalizados Fátima Araújo 1, José Luís Pais Ribeiro 2, António Oliveira 3, Cristina Pinto 1;: Teresa Martins 1 1- ESEP; 2- FPCE da UP; 3- ICBAS; O decréscimo da natalidade e o aumento da esperança de vida que se têm vindo a instalar desde meados do século passado, fundamentalmente nas sociedades ocidentais, explicam o aumento crescente da curva populacional dos idosos. Neste grupo etário emerge com significativa expressão os designados mais idosos (80e mais anos para uns autores, mais de 84 anos para outros), o que reconfigura os contextos sociais actuais e coloca novos desafios nomeadamente no âmbito das dinâmicas familiares (Ocampo, 2005; Sousa, 2004) e no campo da saúde (Benítez del Rosário, 1999; Caldas, 2003). Não sendo apanágio dos idosos, as doenças crónicas assumem neste grupo um importante significado (Lopes, 2007;Paixão & Reichenheim, 2005). Algumas das situações crónicas prevalentes entre os efectivos mais velhos da população estão habitualmente associadas a diferentes níveis de incapacidade (Abellán, & Puga, 2001; Caldas, 2003), que frequentemente os tornam dependentes de quem os ajude na realização das actividades de vida diária (Karsch, 2003). A independência dos idosos na execução das Actividades de Vida Diária (básicas, instrumentais e avançadas) tem um impacto significativo na saúde e qualidade de vida dos mais velhos e conforme constatou Paúl (1997) a perda da capacidade funcional pode constituir o principal motivo para o idoso ingressar numa instituição. 1
As AVD integram as actividades que se relacionam com o autocuidado (actividades básicas de vida diária ABVD), actividades que dizem respeito à capacidade da pessoa interagir com a comunidade e o meio ambiente para manter a sua independência (actividades Instrumentais de vida diária AIVD) e ainda as designadas actividades avançadas de vida diária (AAVD) que permitem ao individuo a sua participação em actividades de âmbito social, recreativo e de trabalho (Oliveira & Villaverde, 2001). Em contexto comunitário, onde a grande maioria dos efectivos do grupo de idosos vive demonstrando independência na realização das ABVD, a avaliação das AIVD assume especial interesse na identificação da fragilidade incipiente (Lesende, 2005), tirando partido da característica dinâmica da incapacidade e com base em planos terapêuticos personalizados fazer reverter a funcionalidade dos idosos para níveis que lhes permita continuar a viver de forma independente no seu contexto habitual de vida (Benítez Rosario, Martín Ortega & Martínez del Castillo,2002; Botelho, 2005). Para avaliar a funcionalidade instrumental, uma das escalas mais utilizadas foi a desenvolvida por Lawton e Brody, em 1969. Trata-se de uma medida genérica que avalia o nível de independência da pessoa idosa no que se refere à realização das actividades instrumentais (AIVD) que compreendem tarefas como usar telefone, fazer compras, preparação da alimentação, lida da casa, lavagem da roupa, uso de transportes, preparar medicação e gerir o dinheiro, mediante a atribuição de uma pontuação segundo a capacidade do sujeito avaliado para realizar essas actividades. Algumas das razões subjacentes ao seu uso alargado são a sua fácil aplicação e interpretação, baixo custo, não exigir pessoal especializado para a sua aplicação, consumir pouco tempo no seu preenchimento e ainda devido á sua utilidade para rastreio (precoce) da incapacidade. 2
Tendo consciência que não existem instrumentos perfeitos, a literatura também chama a atenção de alguns pontos fracos associados ao instrumento como é o facto de algumas das actividades contempladas (limpeza da casa, lavagem da roupa, cozinhar) serem influenciadas pela cultura e pelo género, pois em algumas regiões do globo, nomeadamente nas sociedades ocidentais, são tradicionalmente realizadas pelas mulheres (Botelho, 2005). No contexto da prática clínica, nomeadamente nos cuidados de saúde primários, colocase-nos ainda a questão, se a utilização da escala na sua versão original, onde o sujeito é classificado em cada item com base numa pontuação dicotómica, em que o zero (0) corresponde à dependência (incapacidade) e o um (1) à independência (capacidade), é pertinente na avaliação da evolução temporal dos sujeitos, no planeamento de cuidados e na gestão dos recursos. Apesar desta escala ser amplamente utilizada no grupo dos idosos, com o propósito de avaliar as AIVD, desconhecemos o estudo da sua validação no nosso meio. Nesse sentido foi objecto da presente investigação, avaliar as qualidades psicométricas do instrumento bem como avaliar um modo alternativo de pontuação (policotómico) comparativamente ao modo original (dicotómico). MÉTODO Participantes Foi constituída uma amostra de conveniência integrando 225 indivíduos com idade igual ou superior a 65 anos, a viverem no seu domicílio. Ao questionário aplicado em contexto domiciliário por duas enfermeiras, podia responder o próprio idoso (84,0%) ou o cuidador principal (16,0%), depois de dado e assinado o consentimento informado para participar no estudo. Colheu-se informação sobre características sociodemográficas e actividades de vida diária (básicas e instrumentais). 3
Material A capacidade funcional instrumental foi avaliada através da escala de Lawton, pontuada na sua versão original (dicotómica) e numa versão alternativa (policotómica), em que mais baixa pontuação corresponde a pior funcionalidade. Todos os cálculos foram realizados com o recurso à versão 15.0 do pacote Estatístico para as Ciências Sociais (SPSS). RESULTADOS A amostra é formada maioritariamente por mulheres (62,7%) e apresenta uma média etária de 77, 7 anos (idades entre os 65 e os 96 anos). Casados e viúvos apresentam a mesma proporção na amostra (44,9%). Entre os viúvos as mulheres representam 82,2% dos efectivos. A viver sozinhos foram identificados 40 idosos (17,8%), maioritariamente do sexo feminino (35). Os inquiridos apresentam baixo nível de escolaridade. No sentido de conhecermos algumas qualidades psicometricas da escala, avaliamos o α de Cronbach para a escala pontuada na forma original (0 ou 1) e na versão alternativa policotomica, obtendo-se os valores de α = 0,91 e α = 0,94, respectivamente. De acordo com os valores obtidos verifica-se um nível de fidelidade elevado em ambas as versões, apresentando os itens da escala correlações com a escala total, corrigidos para sobreposição, entre r = 0,52 e r = 0,80 na versão original e r = 0,77 e r = 0,86 na versão policotómica (quadro.1). Quadro 1 Fidelidade da escala de Lawton com diferentes pontuações Escala de Lawton & Brody Versão Original * Versão Alternativa * α de Cronbach 0,909 0,936 r = 0,52 e r = 0,80 r = 0,77 e r = 0,86 * 0- Dependente, 1-Independente ** Policotómica (0,1,2,3,4) Com base nos valores obtidos, podemos concluir que a escala com pontuação 4
alternativa apresenta boas qualidades psicométricas para ser utilizada em contexto comunitário possibilitando descriminar melhor os sujeitos, relativamente à capacidade de realização das AIVD. O método da análise de componentes principais, com rotação ortagonal através do método varimax, para cada uma das versões em estudo, sugere apenas um factor, o qual explica 72,66% da variância explicada (versão alternativa) e 61,29% na versão original, sendo que nesta última os itens apresentam valores entre 0,37 e 0,74 e na versão policotómica todos os itens apresentam valores superiores a 0,65 (0,65 0,78). No sentido de se estudar a validade convergente do instrumento, que constitui uma forma de validação externa que verifica se o construto apresenta correlações com outras variáveis relacionadas, formulou-se a hipótese que a escala de Lawton que preconiza a avaliação das actividades instrumentais e o índice de Barthel (Mahoney & Barthel, 1965) que avalia as actividades básicas de vida, se correlacionam de uma forma positiva e significativa. Ambos os instrumentos são unidimensionais, pelo que estudamos a correlação entre os escores totais de ambas as escalas (quadro 2). Quadro 2- Correlação entre a escala de Lawton e Brody e o Índice de Barthel Escalas Lawton (score final) Lawton original(escore final) 0,80** Lawton versão policotómica (escore total) 0,82** ** p<0.01 Verifica-se efectivamente uma correlação fortemente positiva e estatisticamente significativa ao nível de p<0.01, que traduz que a autonomia nas actividades instrumentais de vida diária se relaciona de uma forma directa com as actividades básicas de vida. REFERENCIAS Abellán,A., & Puga, M.D. (2001). Patrones de entrada en discapacidad. Rev Multidisciplinar de Gerontología, 14(2), 105-107. 5
Benítez del Rosário, M.A. (1999). Atención de salud en el paciente anciano. In A. Martín Zurro, & J.F.Cano Lopez (Eds.), Atención Primaria: conceptos, organización e pratica (4ª ed.) (pp.1595-1623). Madrid: Harcourt Brace. Benítez del Rosário, M.A., Martín, A.S., Ortega, J.J.M., Martínez del Castillo, L.P. (2002). La valoración multidimensional del paciente y de la familia. Atención Primaria, 29 (4),237-240. Caldas, C. P. (2003). Envelhecimento com dependência: responsabilidades e demandas da família. Cad. Saúde Pública, 19(3), 773-781. Karsch, U. M. (2003). Idosos dependentes: famílias e cuidadores. Cadernos de Saúde Pública, 19, 861-866. Lawton, M.P. & Brody, M.H.(1969). Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. The Gerontologist, 9, 179-186. Lesende, I.M.(2005). Detección de ancianos de riesgo en atención primaria. Recomendación. Atención Primaria, 36(5), 273-277. Lopes, L.M.(2007). Necessidades e estrategias na dependência: uma visão da família. Rev Portuguesa de Saúde Pública, 25(1),39-46. Mahoney, F.I., Barthel, D.W.(1965).Functional evaluation: Barthel index. Maryland State Medical Journal,14,61-65. Oliveira, R., Villaverde, C. (2001). Una nueva aproximación conceptual para la Incapacidad. Rev Multidisciplinar de Gerontología, 11(2), 72-77. Paixão, C.M., & Reichenheim, M.E. (2005). Uma revisão sobre instrumentos de avaliação do estado funcional do idoso. Cadernos de Saúde Pública, 21, 7-19. Paul, M.C.1997. Lá para o fim da vida: idosos, família e meio ambiente. Coimbra: Almedina. Botelho, A. (2005). A funcionalidade dos idosos. In C.Paúl, & A. M. Fonseca (Eds.). Envelhecer em Portugal (110-135). Lisboa: Climepsi Editores. Ocampo, J.M. (2005). Evaluación geriátrica multidimensional del anciano en cuidados paliativos. Persona y Bioética, 2(25), 46-58. Acedido em http://aquichan.unisabana.edu.co/index.php/personaybioetica/article/viewfile/356/520. Sousa, L.(2004). Ciclo (final) de vida familiar. In L. Sousa, D. Figueiredo, M. Cerqueira (Eds.), Envelhecer em família: os cuidados familiares na velhice (pp.13-58).porto: Âmbar. 6