PARECER N.º 13.943 SERVIDOR PENITENCIÁRIO QUE PARTICIPA DE ACORDO PARA FRAUDAR LICITAÇÃO PRATICA CONDUTA QUE, EM TESE, PODE GERAR SANÇÃO DEMISSÓRIA QUE, TODAVIA, É COMUTADA PARA SUSPENSÃO DE 90 DIAS EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS PENAL E ADMINISTRATIVA QUANTO À VALORAÇÃO DA PROVA, MAXIME SE O MP NÃO OFERECEU DENÚNCIA. INTELECÇÃO DO INCISO XVII DO ART. 191 DA LEI COMPLEMENTAR 10.098/94, COMINADO COM O ART. 90 DA LEI FEDERAL 8.666/93. Vem a exame e parecer da Equipe de Revisão da Procuradoria de Probidade Administrativa e de Processo Administrativo-Disciplinar o processo n.º 012490-12.02/96-0, oriundo da Secretaria da Justiça e da Segurança, que encarta o processo administrativo-disciplinar instaurado contra o Agente Penitenciário JADIR ANTÔNIO POSSEBON DE LIMA, matrícula n.º 1.284.693.7, acoimado de fraude à licitação pública quando, na administração do Presídio de Santa Cruz do Sul, em 1996. 1
O fato foi denunciado pelo Delegado de Polícia Regional daquela cidade, em maio de 1996, e repassado para a Corregedoria-Geral Penitenciária, que, instaurando a competente sindicância, recomendou a abertura de PAD por descumprimento aos deveres funcionais, em 23 de setembro de 1996 (fl. 126). Acolhida a sugestão da Corregedoria-Geral Penitenciária, foi editada a portaria instauradora do PAD, devidamente publicizada (fl. 130). Remetido o expediente à PGE, foram os autos distribuídos à 10ª Procuradoria Regional e foi designada autoridade processante o Dr. Mauro Mainardi, que instalou os trabalhos enquadrando o indiciado nas cominações do Inciso XXIV do Art. 178 da Lei Complementar 10.098/94, cuja conseqüência é a pena demissória, consoante o Inciso VII do Art. 191 do mesmo diploma legal. Realizada a instrução, o indiciado negou os fatos que lhe eram imputados, uma vez que remetia a lista de preços dos produtos a serem licitados em envelope fechado ao então DECAM, hoje CELIC, e este órgão é quem fazia a eleição do fornecedor, não tendo qualquer envolvimento pessoal com Elmo Staub, proprietário do Supermercado União, de Santa Cruz, habitual vencedor dos certames. A defesa, por ocasião das alegações preliminares, arrolou várias testemunhas. A autoridade processante, a essa altura na pessoa do Dr. César Kasper de Marsillac, arrolou sete testemunhas. Estas foram ouvidas, de modo especial as irmãs Mariane Meinhardt Silva e Joseti Meinhardt (fl. 209-212), ex-funcionárias de Elmo Staub, reafirmaram o que haviam dito na fase inquisitorial (fl. 17-21), que Elmo, proprietário do Supermercado União, sabia de antemão que venceria a licitação, pois, em alguns itens, cotara preços mais baixos do que os oferecidos na época, no mercado; depois, na hora do fornecimento, mandava entregar produtos estragados ou de péssima qualidade. Ademais, o ora indiciado ia visitar Elmo, nos fins de mês, e com ele se encerrava demoradamente no escritório. Os funcionários do supermercado falavam escancaradamente que o indiciado ia receber a sua cota do negócio. A testemunha João Adriano dos Santos, responsável pelo açougue de Elmo, disse que tinha autorização para separar as carnes de péssima qualidade e que fosse lavada para entregar ao presídio. Que, muitas vezes, viu Elmo encerrar-se no escritório com o indiciado (fls. 207-209). As testemunhas da defesa limitaram-se a dizer que o Supermercado União, de propriedade de Elmo, fornecia ao presídio em períodos anteriores à administração do indiciado. Encerrada a instrução, a autoridade processante, a esta época já sob a responsabilidade do Procurador do Estado Reginaldo Freitas da Silva, emitiu relatório, propondo o arquivamento do feito, alegando que não estava caracterizada a prática de crime, até porque o órgão do 2
Ministério Público promovera pelo arquivamento e que, portanto, estaria prescrito o direito de punir do Estado (fls. 461-463). Remetido o expediente a esta especializada, pelo Parecer 13.031, da lavra do signatário, devidamente sancionado pelos demais membros da Equipe de Revisão, foi determinada a reabertura da instrução, por entender estar presente o delito previsto no Art. 90 da Lei 8.666/93, que assim soa: Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo no procedimento licitatório, com intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: pena de detenção, de 2 a 4 anos e multa. Em razão do parecer citado, foi devolvido o expediente à origem e cumprida a decisão pelo Grupo Extraordinário de Trabalho, sob a responsabilidade do Procurador do Estado Dr. Evandro Luís Dias da Silveira, que, após reinterrogar o indiciado, arrolou ex-diretores do DECAM como testemunhas. Estes disseram que não haveria possibilidade de fraude, porque o DECAM tinha uma lista dos preços dos produtos cotados no mercado para eleger a melhor proposta (fls. 515-518). Encerrada a instrução, a defesa reitera prescrição do fato punível. A autoridade processante, em seu bem articulado relatório, entendeu que a possível burla da licitação poderia consistir em receber produtos de menor qualidade do que os que foram cotados. Entretanto, é necessário mencionar que a possibilidade dessa fraude poderia alcançar os demais presídios e não somente o de Santa Cruz (fl. 535) e, por isso, recomenda a absolvição. É o relatório. Não há nulidade a ser saneada, eis que obedecido o devido processo legal. No mérito, com a devida venia da opinião emitida pela douta autoridade processante, entende o signatário que os depoimentos das irmãs Mariane e Joseti Meinhardt não deixam dúvidas de que o indiciado ia todos os fins de mês encerrar-se com o Senhor Elmo Staub, proprietário do Supermercado União, de Santa Cruz do Sul, e que Elmo sempre alardeava antecipadamente que sairia vitorioso na licitação, e que os funcionários eram orientados para fornecer produtos inferiores ou de péssima qualidade para o presídio. Todo esse elenco de fatos concatenados leva à convicção de que havia um acordo entre o indiciado e Elmo Staub para fraudar a licitação, com o intuito de ganhos financeiros compartidos. Pouco importa, ainda que se deplore, que em outros presídios tenha acontecido fatos assemelhados a este em exame. Isso, entretanto, não deve servir de motivação para deixar de sancionar aquele a quem se surpreende com o esforço investigatório. Isso posto, não estando o direito de punir prescrito, eis que a prescrição dar-se-ia em 3
julho de 2004, reconhece-se a responsabilidade do indiciado por incidência em tese do Inciso XVII do Art. 191 da Lei Complementar 10.098/94, combinado com o Art. 90 da Lei Federal 8.666/93, cuja conseqüência seria a pena demissória, que todavia se comuta para suspensão de 90 dias em atenção ao princípio da proporcionalidade a que faz menção o Art. 19 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul e recepcionado pelo 1º do Art. 187 da Lei Complementar 10.098/94. Recomenda-se, por igual, a remessa de cópia do presente parecer ao órgão do Ministério Público. É o parecer. Este parecer foi aprovado pela Equipe de Revisão, em reunião realizada no dia 29 de setembro de 2003, conforme Ata n.º 36, da qual participaram, além do signatário, os Procuradores do Estado Carlos César D Elia, Flávia Garcia Gomes, Luiz Felipe Targa, Maria da Graça Vicentini e Marília Vieira Bueno. Porto Alegre, 29 de setembro de 2003. José Hermílio Ribeiro Serpa Relator 4
Processo nº 012490-12.02/96-0 Acolho as conclusões do PARECER nº 13.943, da Procuradoria de Probidade Administrativa e de Processo Administrativo-Disciplinar, de autoria do Procurador do Estado Doutor JOSÉ HERMÍLIO RIBEIRO SERPA. Submeta-se o expediente à deliberação do Excelentíssimo Senhor Governador do Estado. Em 27 de abril de 2004. Helena Maria Silva Coelho, Procuradora-Geral do Estado.
GABINETE DO GOVERNADOR Processo nº 012490-12.02/96-0 Aprovo o PARECER nº 13.943, da Procuradoria-Geral do Estado, cujos fundamentos adoto para aplicar a penalidade de 90 (noventa) dias de SUSPENSÃO, como gradação de pena mais grave, ao servidor JADIR ANTÔNIO POSSEBOM DE LIMA, Agente Penitenciário, matrícula nº 1.284.693.7, pela incidência no inciso XVII do artigo 191 da Lei 10.098/94, combinado com o artigo 90 da Lei Federal 8.666/93, lotado na Secretaria da Justiça e da Segurança. À Procuradoria-Geral do Estado para publicação e anotações de estilo. Após, à Secretaria da Justiça e da Segurança para providências cabíveis. PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 28 de abril de 2004. GERMANO ANTÔNIO RIGOTTO, GOVERNADOR DO ESTADO.