SPREAD BANCÁRIO ENTRE 2000 A 2009 NO BRASIL 1

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Transcrição:

53 SPREAD BANCÁRIO ENTRE 2000 A 2009 NO BRASIL 1 Robert da Silva Pereira Takahashi* Manuel Antonio Munguia Payés** *Bacharel em Ciências Econômicas pela UNISO, Sorocaba, SP, Brasil. Email: robert_tdb1@hotmail.com ** Dr. em Economia, Docente e Coordenador do Curso de Economia da Uniso,Sorocaba,SP, Brasil. Email: manuel.payes@prof.uniso.br Recebido em: Fevereiro de 2011 Avaliado em: Agosto de 2011 RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar os determinantes do spread bancário no Brasil de 2000 a 2009. A pesquisa proposta caracteriza-se, sob o ponto de vista metodológico, como explicativa e bibliográfica. Conclui-se que o principal determinante do spread bancário é a taxa básica de juros (Selic). PALAVRAS-CHAVE: Spread bancário. Taxa básica de juro. Crédito. BANKING SPREAD BETWEEN 2000 AND 2009 IN BRAZIL ABSTRACT: This report aims to analyze the main determinants of banking spreads in Brazil from 2000 to 2009. The proposed research is characterized, from the methodological point of view, as a bibliographical and explanatory. We conclude that the main determinants of banking spread are the basic interest rate (Selic). ABSTRACT: Banking spread. Basic interest rate. Credit. 1 INTRODUÇÃO O spread bancário, definido como diferença entre a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras e o custo financeiro de captação dos recursos, é alvo de muita crítica no Brasil. Isto porque, o spread no Brasil é muito elevado se comparado com a média internacional e isso encarece o crédito para os agentes econômicos. O racionamento do crédito, ocasionado pela elevada taxa de juros, influencia diretamente no crescimento do país. Nós ainda temos uma baixa relação crédito/pib. Com efeito, nos países desenvolvidos como EUA, Japão e Alemanha a relação crédito/pib chega a atingir 90%, ao passo que no Brasil não passa de 50%. O presente artigo tem por objetivo analisar os determinantes do spread bancário no Brasil de 2000 a 2009. Para tal foi realizada uma revisão bibliográfico de textos 1 Artigo originário do Trabalho de Conclusão de Curso

54 especializados. Além disso, utilizou-se a estatística descritiva no tratamento dos dados. A pesquisa caracteriza-se, sob o ponto de vista metodológico, como explicativa e bibliográfica. Explicativa porque se propõe tornar inteligíveis os determinantes do elevado spread bancário. O artigo está dividido em quatro seções, incluindo esta introdução. Na segunda é apresentada a revisão bibliográfica que serviu de base para o desenvolvimento da análise e interpretação dos dados. Na terceira são apresentados os resultados da pesquisa. Na última seção são apresentadas as considerações finais. 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A taxa básica de juros, ou simplesmente taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), serve como piso de outras taxas cobradas no país e é uma das variáveis que determinam o spread bancário no Brasil, isto é, a diferença entre a taxa de captação de recursos financeiros e a taxa de empréstimo. Essa determinação decorre do financiamento da dívida pública federal: as instituições financeiras observam nos títulos públicos uma oportunidade de investimento, pois esses títulos apresentam boa rentabilidade, liquidez e pouco risco. Como consequência, os bancos diminuem a oferta de crédito para o público e elevam as exigências quando da concessão dos empréstimos, cobrando ainda do mutuário um elevado prêmio de risco. De acordo com Oliveira e Carvalho (2007, p. 392): O maior prêmio de risco embutido nas operações de crédito se traduz não apenas em maior spread bancário e racionamento de crédito, mas também em maior exigência de colaterais quando da realização de empréstimos por parte dos bancos, conduta que reflete a maior aversão ao risco por parte dessas instituições. Uma vez que os bancos podem optar pela aplicação em papéis líquidos, seguros e rentáveis, o grau de aversão ao risco dessas instituições se torna muito elevado. Importante destacar, ainda, que tais atributos permitem a consolidação de um portfólio que, além de propiciar a obtenção de ganhos significativos, mostra-se altamente responsivo às novas oportunidades percebidas de lucro, em face da elevada liquidez dos títulos públicos federais. Ocorre que o elevado prêmio de risco cobrado pelos bancos acaba prejudicando a adoção de novos projetos de investimento e o crescimento econômico do país. Com efeito, a viabilidade econômico-financeira de um projeto de investimento depende da

55 eficiência marginal do capital, mas também do custo financeiro, isto é, da taxa de juros que financiará o investimento planejado. Caso a rentabilidade esperada do projeto não supere com vantagem o custo financeiro, o projeto não será implementado. Mais ainda, a cobrança pelos bancos de prêmios de risco elevados exigem projetos mais arriscados para conseguir um retorno superior. De acordo com Afonso, Kohler e Machado (2009 p. 17): A taxa básica de juros está positivamente correlacionada com o spread, em primeiro lugar, porque reflete o estado de risco da economia. Além disso, quanto maior a taxa de juros, maior a rentabilidade necessária para um projeto ser viável. Como projetos mais rentáveis tendem ser mais arriscados devem estar associados à maior inadimplência. Pode se conjecturar também que, como o sistema financeiro é não competitivo, a alta taxa de juros oferecidos pelo governo poderia deixar os banqueiros mais relaxados, pouco interessados em investir recursos na oferta de crédito para o setor privado, encarecendo o seu preço. A taxa Selic costuma mudar de patamar principalmente por conta do regime de metas de inflação. O ataque especulativo promovido contra o Real em janeiro de 1999 obrigou o Banco Central do Brasil (BCB) a abandonar o regime de bandas cambiais e a adotar o regime metas de inflação a partir de julho de 1999. Um regime de metas de inflação é aquele no qual as ações da política monetária, sobretudo a fixação da taxa de juros básica, são guiadas com o objetivo explícito de obtenção de uma taxa de inflação (ou de nível de preços) previamente determinado. Nesse contexto, o Banco Central deve aumentar a taxa nominal de juros toda a vez que houver um aumento das expectativas de inflação, e deve reduzir a taxa nominal de juros toda a vez que houver uma redução da inflação esperada. Expectativas inflacionárias (e a consequente alta da taxa Selic) ou instabilidade macroeconômica costumam elevar a inadimplência esperada, o que faz com que as instituições financeiras aumentem o spread bancário e cobrem maiores taxas de juros a fim de se proteger, já que um empréstimo lucrativo no presente poderá se tornar no futuro em prejuízo. Cabe observar que a assimetria de informação não permite aos bancos identificar ex-ante e nem rapidamente os bons dos maus pagadores. Como consequência, generalizam a todos os tomadores de empréstimos a maior taxa de juros. Noutras palavras: os bons pagadores pagam um custo mais elevado do empréstimos para

56 compensar os maus pagadores que futuramente serão inadimplentes. Segundo Oreiro et al. (2006, p. 622): Uma das características mais marcantes de um sistema bancário é a presença de assimetria de informação. Um banco tem mais informações sobre características de seus clientes do que seus concorrentes, e devido a problema de seleção adversa torna-se muito difícil atrair clientes de boa qualidade (bons pagadores) sem que os benefícios e ofertas concedidos também atraiam clientes de baixa qualidade. A existência de custos de informação e de transferência - tanto pelos bancos, que precisam conhecer melhor seus clientes, como pelos clientes, que devem demonstrar suas qualidades para obter benefícios em outros bancos possibilitariam aos bancos a prática do poder de mercado. A deficiência do ambiente institucional brasileiro constitui outro problema e é alvo de críticas por parte das instituições financeiras, pois induz maus pagadores a fazer empréstimos, sabendo da deficiência da justiça e da demora dos processos nos tribunais por anos. De acordo com Oliveira e Carvalho (2007, p. 387): Pode se atribuir a elevada participação desse componente mormente ao ambiente macroeconômico altamente instável, às deficiências institucionais que atuam no sentido de estimular comportamento oportunístico por parte dos tomadores de crédito, bem como às próprias altas taxas de juros prevalecentes nas operações de empréstimos, vetor que se configura como grande responsável pela incapacidade de parcela do mutuário horarem com suas dívidas. O custo administrativo também determina o spread, pois os bancos têm altos custos e pouco serviço, isto é, pouca escala, passando parte dos custos para as operações de crédito. O custo administrativo afeta mais intensamente as pessoas que fazem empréstimo de pequeno valor, pois quanto maior for o empréstimo, menor é a razão custo administrativo/empréstimo. Segundo Ferreira e Perobelli (2005, p. 7): o superdimensionamento do setor bancário ocorrido nos últimos anos e a baixa alavancagem das operações de empréstimo no Brasil (altos custos fixos, diluídos entre poucos serviços prestados). Ademais, é válido salientar que as despesas administrativas afetam mais os baixos valores, do que as pessoas físicas e jurídicas que tomam empréstimo de maior vulto, haja visto serem as despesas administrativas inversamente proporcionais ao montante da operação, ou seja, quanto maior o montante da operação, menor será proporcionalmente a despesa para se realizar a intermediação financeira. Essas despesas estão relacionadas com o suporte jurídico, despesas com pessoal e até com campanhas publicitárias.

57 O recolhimento do compulsório, com uma elevada alíquota, também limita a oferta de crédito, fazendo com que ele fique escasso e o seu valor fique mais elevado. Os subsídios cruzados, da mesma forma que são uma parcela de todos os depósitos à vista das instituições financeiras e, que devem ser direcionados para o crédito rural e habitacional, com taxa de juros pré-determinadas pelo governo, também restringem a oferta de crédito. Para compensar a baixa lucratividade nos empréstimos direcionados, os bancos cobram maior taxa de juros nas suas operações de crédito normal para pessoas física e jurídica. A carga tributária é frequentemente apontada pelos bancos como outra causa do alto spread. Os impostos incluídos no spread são: a) imposto indireto, que seria o COFINS, IOF, ISS e o PIS; b) imposto direto, IR e CSLL, que são taxados diretamente no lucro dos bancos; c) FGC é um fundo que garante o seu crédito caso o banco venha a falir. Todavia, os altos impostos cobrados no Brasil não tem impacto na determinação do elevado spread. De acordo com o estudo feito por Bignotto e Rodrigues (2006, apud AFONSO et al., 2009, p. 17), a redução da carga tributária teria impacto quase nulo no spread, oscilando entre 0 e 0,5 ponto percentual. 3 RESULTADOS A eficiência da intermediação financeira no Brasil é medido pelo spread: quanto maior essa diferença, menor tende a ser a eficiência do sistema bancário e vice-versa. De acordo com Afonso et al. (2009, p. 2): O spread bancário, definido como a diferença entre taxa de juros cobrada pelas as instituições financeiras e o custo financeiro de captação dos recursos, é das matérias mais complexas e polêmicas no Brasil, sendo vista como um dos principais obstáculos à expansão do crédito e ao aprofundamento do sistema financeiro, bem como fator limitador do desenvolvimento do país. A instabilidade macroeconômica era acirrada antes do Plano Real e por conta disso o spread era também muito elevado, chegando à taxa de 150% a.a. As instituições financeiras, dessa forma, protegiam-se da volatilidade da alta inflação que havia no país. Após o sucesso do Plano Real (a partir de meados de 1994), a manutenção da abertura econômica e da integração financeira internacional e a adoção do regime de metas de

58 inflação, esperava-se que o spread convergisse com a média praticada no mercado internacional, mas isso não ocorreu como mostra o gráfico 1. Gráfico 1 Spread no Brasil e média internacional entre 2000 e 2008 Fonte: Banco Mundial. A tabela 1 apresenta o spread bancário desagregado por país entre 2000 e 2008. Repare-se que a média internacional ficou entre 6 a 7% sendo que, entre os países desenvolvidos, a Alemanha destaca-se como o país com o maior spread (em torno de 7%) e o Japão com o menor (cerca de 1,5%). Inversamente, na América Latina o Brasil é o campeão e o Chile o país que pratica o menor spread bancário. Note-se que o spread no Brasil ficou entre 33% e 45%, ao passo que no Chile ficou entre 2 e 5%. Uma diferença muito significativa, se levarmos em conta que o Chile também é um país latino e em desenvolvimento.

59 Tabela 1 Spread bancário no G7 e América Latina entre 2000 e 2008 País 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Média Internacional 6,99 7,11 7,13 6,91 6,45 6,61 6,51 6,58 6,11 Países Desenvolvidos (G7) Alemanha 6,23 6,45 7,04 Canadá 3,79 3,56 3,38 3,59 3,22 3,63 3,99 4,02 3,23 Estados Unidos França 4,08 3,98 3,60 3,91 4,35 Itália 5,19 5,33 5,11 4,88 Japão 2,00 1,91 1,83 1,78 1,69 1,41 0,98 1,08 1,32 Reino Unido América Latina Argentina 2,75 11,54 12,43 8,99 4,16 2,40 2,21 3,08 8,42 Bolívia 23,61 10,24 11,05 6,25 7,05 11,68 7,86 9,32 9,22 Brasil 39,63 39,76 43,73 45,11 39,51 37,75 36,88 33,14 35,59 Chile 5,64 5,70 3,96 3,45 3,19 2,75 2,89 3,06 5,77 Colômbia 6,64 8,29 7,39 7,38 7,28 7,55 6,62 7,37 7,43 México 8,67 6,56 4,45 3,94 4,74 6,24 4,22 4,36 5,66 Paraguai 11,06 12,03 15,79 34,16 28,44 28,25 23,42 20,02 22,73 Peru 20,20 17,43 17,23 17,89 22,26 22,94 20,73 19,63 20,17 Uruguai 27,80 26,96 55,80 29,25 17,48 10,77 7,42 6,58 9,22 Fonte: Banco Mundial. É verdade que quando observamos o spread bancário no Brasil num período mais longo nota-se que vem diminuindo, notadamente, após o Plano Real (gráfico 2). Todavia, diversos eventos, após 1994, fizeram com que o spread voltasse a elevar-se e interrompessem temporariamente a trajetória de redução. Em 1995 elevou-se em razão das medidas de política monetária fortemente contracionista implementadas pelo Banco Central do Brasil após a crise mexicana. Essa crise, conhecida como Efeito Tequila, provocou fuga de capitais também no Brasil e alta de juros. Posteriormente, em 1997 e 1998, ocorreram outras altas do spread como consequência de novas crises internacionais, respectivamente, a asiática e russa. Também o spread se eleva em 2003, por conta da adoção de uma política fiscal e monetária contracionistas no primeiro ano do governo Lula, e em 2008 por causa da crise financeira americana (subprime). Segundo Rehder (2009, p. 1), em 12 meses de crise financeira global, o chamado spread bancário custou R$ 261,7 bilhões às empresas e consumidores brasileiros, cujo pagamento deve ser feito ao longo de dois anos.

60 Gráfico 2 Spread médio das operações de crédito com recursos livres (pré fixado) Fonte: Banco Central do Brasil. O spread tende a ser mais elevado para pessoas físicas do que para pessoas jurídicas por causa dos seguintes fatores: a) pessoas físicas têm maior índice de inadimplência do que pessoas jurídicas; b) pessoas jurídicas têm maior poder de barganha, pois tem conta em vários bancos, aumentando competitividade entre os mesmos; c) empréstimos feitos para pessoas jurídicas são geralmente para investimento, esperando assim, que se obtenha retorno e se quite a dívida, enquanto que para pessoas físicas são para adquirir bens de consumo duráveis e para satisfação pessoal. O gráfico 3 mostra o spread médio das operações de crédito com recursos livres referenciais para taxa de juros pré-fixada para pessoas físicas e jurídicas em pontos percentuais entre 1994 e 2009. Repare, que para ambos os tipos de clientes, o spread vem caindo. Além disso, nota-se que a diferença entre ambos os spread vem sistematicamente diminuindo no período.

61 Gráfico 3 Spread bancário para pessoa física e jurídica entre 1994 e 2009 Fonte: Banco Central do Brasil. O spread bancário ainda pode ser dividido por modalidade de crédito. No gráfico 4 é possível observar a evolução do spread entre 2000 e 2009 segundo a principal modalidade de crédito para pessoa física. Repare que o maior spread é o do cheque especial, tendo atingido um índice de 150 p.p. em dezembro de 2009. Esse crédito é caro, pois fica disponibilizado na conta do cliente para ele usufruir quando desejar. Por outro lado, o banco não consegue verificar a real situação do cliente, como por exemplo, se ele se mantém empregado. Para diminuir perda, caso o mutuário não venha pagar, essa taxa de juros costuma ser a mais alta entre as diversas modalidades de crédito. Já o spread para aquisição de veículos é a modalidade de crédito mais barata, pois, caso o agente não venha pagar, o banco pode tomar o veículo. A regra é a seguinte: quanto mais seguro for a operação, menor será o spread embutido nos juros contratados.

62 Gráfico 4 Spread segundo a modalidade de crédito pessoa física entre 2000 e 2009 Fonte: Banco Central do Brasil. No gráfico 5 se pode observar o spread segundo as principais modalidades de crédito para pessoa jurídica. Note que o spread associado com a conta garantida é o maior entre as diversas modalidades, pois o banco não tem nenhuma garantia de que receberá o montante de crédito que fica disponível na conta do cliente. Como consequência, os juros se tornam mais elevados para essa modalidade. Inversamente, a modalidade para aquisição de bens tem o menor spread, já que neste caso o próprio bem fica como garantia para o banco.

63 Gráfico 5 Spread segundo modalidade de crédito pessoa jurídica entre 2000 e 2009 Fonte: Banco Central do Brasil. Desde 1999, o Banco Central publica anualmente um relatório chamado Juros e Spread bancário no Brasil. A partir de 2003 passou a se chamar Relatório de Economia Bancária e Crédito. Esse relatório contém dados sobre volume de crédito, taxa de juros e decomposição contábil do spread bancário ex-post, isto é, a participação percentual de cada um dos componentes no spread. Na tabela 2 mostra a média da participação de cada um dos componentes no período entre 2001 e 2008. Observa-se que é a inadimplência o componente mais expressivo no spread, isto é, a parcela que o mutuário deixa de pagar não cumprindo com suas obrigações: representa 32% do spread. Em seguida, com 18%, vem o custo administrativo que representa as despesas que os bancos têm com salários, encargos, publicidade e propaganda, seguro, transporte, entre outros. Em terceiro lugar vem os impostos diretos com 15%, ou seja, os tributos incidentes sobre receitas líquidas da operação de crédito (IR e CSLL). Outros componentes do spread, mas com menor importância são: a) compulsório, que é a parcela retida pelo Banco Central do Brasil dos depósitos à vista, a prazo e da caderneta de poupança, para restringir ou expandir o crédito, serve como política para controle da inflação; b) subsídios cruzados, que são os recolhimentos

64 obrigatórios dos depósitos à vista para o crédito de direcionamento como crédito rural e habitacional; c) Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que assegura o crédito até o valor de R$ 60.000,00 caso a instituição financeira associada venha decretar falência; e d) impostos, que são tributos incidentes sobre a concessão de crédito e sobre resultados auferidos nessa operação (PIS e o COFINS). Tabela 2 Decomposição do spread entre 2001 e 2008 Discriminação Média 2001 2008 (%) 1 Spread Total 100,00 2 Custo Administrativo 17,94 3 Inadimplência 31,94 4 Custo de Direcionamento 3,85 5 Encargos Fiscais e FGC 4,29 Impostos 3,16 Custo do FGC 1,13 6 Margem bruta, erros e omissões (1-2-3-4-5) 41,98 7 Impostos Diretos 14,82 8 Margem líquida, erros e omissões (6-7) 27,16 Fonte: Banco Central do Brasil. Depep. Algumas medidas foram adotadas pelo Banco Central do Brasil para melhorar a eficiência das instituições financeiras na hora de conceder e cobrar os empréstimos e, também, para aumentar a transparência entre o banco e o mutuário: a) transparência nas operações bancárias. Esta medida visa coletar sistematicamente informações detalhadas sobre juros e encargos das principais operações de crédito e, posteriormente, divulgá-las à população pela internet; b) informação do custo efetivo total (CET). Desde maio de 2008, as instituições financeiras devem informar a seus clientes pessoas físicas, previamente à contratação da operação, o custo total da operação, expresso em termos de taxa percentual anual; c) portabilidade de informações. Esta medida pretende aumentar a concorrência bancária, autorizando os clientes a transferir seus cadastros para as diversas instituições financeiras; d) criação da Cédula de Crédito Bancário. Proposta de disseminação da utilização de um título de crédito mais simples e eficaz no

65 tramite judicial; e) alienação fiduciária. Visa aumentar o alcance desse eficiente instituto de garantia do crédito, antes restrita a bens móveis. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O principal determinante do elevado spread no Brasil é a alta taxa básica de juros (Selic), pois faz com que os bancos invistam em títulos do governo federal que apresentam menor risco, boa rentabilidade e liquidez. Como consequência, diminui a oferta de crédito para os agentes econômicos e aumenta o custo do crédito para clientes privados. Além disso, toda vez que a Selic aumenta, quer para desaquecer a demanda e atingir a meta inflacionária, quer sob a pressão de choques externos que provocam instabilidade macroeconômica, os bancos elevam o spread (e juros) protegendo-se antecipadamente da maior inadimplência esperada. REFERÊNCIAS AFONSO, J. R.; KOHLER, M. A.; FREITAS, P. S. Evolução e determinantes do spread bancário no Brasil, 2009. Disponível em: < http://www.senado.gov. br/conleg/textos_discussao/texto61spreadbanc%e1riospringerkohlereafonso.pdf>. Acesso em: 25 de nov. 2009. BACEN BANCO CENTRAL DO BRASIL. Departamento de Estudos e Pesquisas - DEPEP. Relatório de Economia Bancária e Crédito, 2008. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pec/depep/spread/relatorio_economia _bancaria_credito2008.pdf >. Acesso em: 25 de nov. 2009. BANCO MUNDIAL. Indicadores. Setor Financeiro. Spread Bancário. Disponível em: <http://data.worldbank.org/indicator/fr.inr.lndp>. Acesso em: 25 de nov. 2009. BARBOSA CAMPELLO, Nalva Cristina. Spread bancário no Brasil suas determinantes e consequências, 2008. Disponível em: < http://www.tjpe. jus.br/cej/revista/num_2/nalva%20cristina%20barbosa%20campello.pdf>. Acesso em: 25 de nov. 2009. FERREIRA, Ricardo Da Rocha; PEROBELLI, Fernanda Finotti Cordeiro. A dinâmica do spread bancário no cenário brasileiro e suas implicações no custo para o tomador de empréstimos, 2005. Disponível em:

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