Desenvolvimento de aparatos eletroacústicos aplicados ao ensaio de cavidades automotivas Jair Dias de Oliveira Junior*, Leandro Fernandes Lins de Vasconcelos*, Marcus Vinicius Girão de Moraes* e Suélia de Siqueira Rodrigues Fleury Rosa* *Faculdade do Gama - FGA Universidade de Brasília Área Especial 2 Lote 14 Setor Central Gama/DF - Brasil Telf: +55 61 3384 3443; e-mail: j.junior89@hotmail.com, vasconcelos.fl.leandro@gmail.com, mvmoraes@unb.com, rodrigues.suelia@gmail.com Resumo Neste trabalho propõe-se o estudo experimental do comportamento vibroacústico de cavidades veiculares. O aparato experimental consiste em uma cavidade acústica cilíndrica excitada por fonte sonora (alto-falante). Um dispositivo eletrônico, composto por fonte de alimentação simétrica, gerador de tons de áudio acoplado a um amplificador de estágio final, foi desenvolvido para excitar a cavidade com ondas estacionárias senoidais puras a frequência ajustável. Os resultados experimentais são comparados a soluções analíticas e numéricas tanto em frequência quanto em pressão acústica. Busca-se reproduzir o comportamento modal da cavidade acústica em baixas frequências correspondendo à zona de ressonância. Este estudo preliminar busca desenvolver um savoir-faire em análise experimental útil para próximos estudos em acústica automotiva. 1. Introdução Há muitos séculos já se estuda a natureza do som e, em particular, a sua forma de propagação. Aristóteles foi um dos poucos antigos a tratar da velocidade do som, afirmando (erroneamente) que os sons agudos se propagam mais rápido que os graves. As primeiras medidas foram feitas por Pierre Gassendi em 1635, observando o disparo de um canhão e medindo o tempo entre a chegada do clarão e do som [1]. O som, por ser uma onda mecânica, necessita de um meio material para se propagar e sofre alterações em suas características de acordo com a densidade do material. Focalizando-se no estudo com o fluido ar, a pressão e temperatura serão variáveis de importante consideração. No estudo da teoria ondulatória o conceito de ressonância é amplamente importante, principalmente quando se analisa a acústica em tubos abertos ou fechados. Nos ensaios executados para este trabalho são analisadas frequências ressonantes para obter diversos dados que serão posteriormente aplicados ao ensaio de cavidades veiculares. 2. Teoria aplicada A. Velocidade de propagação do som Existem dois métodos de medidas da velocidade do som. O primeiro consiste na observação de frequências ressonantes em tubos e o segundo consiste em mensurar o tempo em que o som leva para percorrer determinada distância. Temos, de forma geral, que a velocidade do som está diretamente relacionada à frequência e ao comprimento da onda produzida (1). (1) Para o segundo modo, temos que a velocidade do som será dada pela razão da variação de espaço pela variação do tempo, como em (2). C. Velocidade do som em um meio material (2) A velocidade do som em um meio material é dada pela raiz quadrada da razão do modulo de Young do meio e a sua densidade. Como, no caso do ar, em que as compressões e expansões produzidas pela propagação podem ser consideradas adiabáticas, a equação pode ser reescrita da seguinte forma: (3) Em que γ=cp/cv e vale a 1,40, R é a constante universal dos gases ideais igual a 8,31 J/mol.K e M é a massa molecular do ar, que equivale a 29,0x10-³kg/mol [2].
D. Comprimento do tubo de ar na ressonância Para tubos com uma extremidade aberta e outra fechada, o comprimento L da coluna de ar relativo à ressonância é dado por (4). da frequência fundamental [4]. Portanto, podemos escrever: (6) Substituindo (5) e (6) em (1), teremos: L para n=1, 2, 3, 4... (4) (7) Assim, a diferença no comprimento do tubo para duas ressonâncias consecutivas é a razão entre a velocidade do som por duas vezes a frequência [2]. E. Frequências ressonantes em tubos fechado/fechado Se em um tubo fechado em ambas as extremidades for injetado um sinal senoidal de áudio crescente, acontecerá que, partindo da menor frequência, a onda irá oscilar de forma irregular dentro do tubo até que chegará a uma forma estável, que vibrará com maior intensidade a onda entra em ressonância com o tubo. Esta será a forma fundamental de vibração (ou primeiro harmônico) como representado na Figura 1. Onde é a frequência produzida pelo gerador de áudio. Unificando, a frequência de ressonância no tubo fechado em ambas as extremidade é dada por: (8) E n é o numero de ventres da onda, para n=1, temos a frequência fundamental e para n>1 temos os harmônicos. F. Frequências ressonantes em tubos fechado/aberto Para um tubo fechado em uma extremidade e aberto na outra. Tem-se que a forma fundamental de vibração equivale a um quarto de uma onda completa, já que a extremidade aberta sempre será um ventre de vibração [4]. Com isto podemos descrever que a frequência de ressonância neste tipo de tubo é dada por: para n=1,3,5,7... (9) 3. Materiais e métodos utilizados Fig. 1. Primeiro Harmônico Verifica-se que a onda obtida nesta forma de onda equivale à metade de uma onda completa, logo: 2 (5) Onde L é o comprimento do tubo. Aumentando gradativamente a frequência, a onda sai da ressonância e volta a vibrar irregularmente até entrar em ressonância novamente. Será obtido o segundo harmônico: Fig. 2. Segundo harmônico Agora, a onda passa a ter dois ventres e três nós. E à medida que se aumenta a frequência serão encontradas novas frequências harmônicas que são múltiplos inteiros Para realizar ensaios em laboratório a fim de observar o comportamento modal de ondas estacionárias em tubos fechado/fechado e fechado/aberto e, também, para metrificar a velocidade do som, foi construída uma bancada constituída por um gerador de tons de áudio acoplado a um amplificador, um tubo de impedância e osciloscópio. A. Gerador de áudio O gerado de áudio consiste em um equipamento eletrônico capaz de gerar ondas senoidais puras à frequência ajustável. Sua faixa total de frequência varia de 20Hz a 22KHz podendo ser ajustada através de uma chave seletora de banda e um potenciômetro de ajuste fino. Assim, na primeira banda obtemos frequências entre 20Hz e 200Hz, na segunda banda obtemos frequências entre 200Hz e 2KHz e na terceira banda obtemos frequências entre 2KHz e 22KHz. Este espectro corresponde, aproximadamente, à faixa de frequência audível pelo ser-humano. A base do oscilador deste equipamento é um circuito integrado TL084 que contém quatro amplificadores operacionais internamente. A banda e a variação de frequência são ajustadas por uma malha RC (Resistor/Capacitor) onde cada capacitor deve ser dez vezes maior que o outro e o resistor do tipo variável. Logo, para cada banda de frequência selecionada, existe
um capacitor correspondente e a frequência ajustada é dada pela variação do potenciômetro. O estágio final do gerador de tons consiste em um amplificador de baixo sinal com um FET (Transistor de Efeito de Campo) que leva o sinal à saída com amplitude aceitável. Como os amplificadores operacionais necessitam de alimentação simétrica, a fonte retificadora deste equipamento é do tipo simétrica de 12-0-12V. Utiliza um transformador abaixador de 220V/15+15V com center-tape capaz de fornecer até 300mA. A saída cc (corrente contínua) é regulada com os circuitos integrados 7812 e 7912. Todo o equipamento é montado dentro de uma caixa própria para facilitar seu manuseio. Levando-se em consideração que a amplitude do sinal gerado por este equipamento ainda é suficientemente baixa para excitar a cavidade escolhida, é necessário acoplá-lo à um amplificador externo de alta fidelidade e potência. O sinal amplificado é enviado para o altofalante do tubo de impedância. B. Sistema de aquisição de dados O osciloscópio digital é uma importante ferramenta neste projeto pois, através dele pode-se metrificar a frequência ajustada e a amplitude do sinal gerado. Exemplo: com o canal A do osciloscópio ligado à saída do gerador de áudio e o canal B ligado à saída do amplificador externo, pode-se analisar a amplificação do sinal e eventuais distorções. Este teste é feito para descobrir a amplitude mínima de onda necessária para excitar a cavidade acústica. Com o auxílio de um microfone acoplado à placa de som do computador e, utilizando-se de um software específico, será feita uma analise espectral do som, a qual relacionará a amplitude e a frequência do sinal injetado no tubo. As frequências ressonantes serão aquelas com maior amplitude. Assim também poderá ser feita uma analise da atuação do tubo como filtro, onde apenas as frequências ressonantes serão amplificadas. Conhecendo-se o comprimento do tubo e a frequência injetada nele, pode-se, facilmente, calcular a velocidade do som no ar. Deste modo, serão feitas várias medidas nos diferentes harmônicos do tubo. C. Tubo de impedância O tubo de impedância consiste em um tubo de acrílico de 80 cm de comprimento. Em uma de suas extremidades está acoplado um alto-falante com diâmetro de 5 polegadas e impedância de 4 Ohms. Na outra extremidade é colocada uma tampa para se obter um tubo fechado/fechado. Retirando-se esta tampa, temos a configuração de um tubo fechado/aberto. Como suporte, são colocadas espumas sob o tubo a fim de amortecer o impacto e a transmissão de vibração entre o tubo e a mesa onde está apoiado. Fig. 3. Esquema simplificado da bancada de testes F. Método estático usado na análise dos dados obtidos No interior do tubo é colocado um pó (talco, cortiça ou, até mesmo, farinha de trigo) para se poder visuarlizar o comportamento das ondas no tubo. Espera-se que ao atingir uma frequência ressonante, fiquem visíveis os nós e ventres da onda. Nos nós não haverá movimento do pó, mas, nos ventres, haverá grande agitação das particulas. D. Obtendo a velocidade do som O método experimental consiste em variar a frequência do gerador de áudio vagarosamente, partindo da menor frequência, com o tubo fechado em ambas extremidades até ser atingida a primeira ressonância. Esta frequência será a frequência fundamental. Observando o pó dentro do tubo, é possível ver as regiões de nós e ventres da onda. À medida que a frequência é aumentada, deve-se encontrar novas frequências de ressonância, que são múltiplos inteiros da frequência fundamental. Portanto, descobrindo as frequências ressonantes e conhecendo o comprimento do tubo, pode-se obter a velocidade do som através da equação (7). Como teste complementar, pode-se repetir o procedimento com uma das extremidades abertas. Para tal, vale a equação (9). E. Análise do espectro sonoro A analise espectral de um som complexo como, por exemplo, o de um ruído branco, que possui frequências harmônicas e inarmônicas, consiste em decompô-lo em partes mais simples. Estas partes simples são um conjunto de tons puros harmonicamente relacionados a um tom fundamental. O espectro relaciona frequência e amplitude. Utilizando o microfone para captar e gravar o som no interior do tubo com o gravador de som do Windows, é possível obter o espectro sonoro do ruído através do software Cool Edit 2000 no computador. No espectro também serão observados as frequências ressonantes e, a partir destas, a velocidade de propagação do som também poderá ser definidia.
4. Resultados e discussões A. Gerador de áudio A forma obtida com o circuito eletrônico montado está representada na Figura 4. Consiste em uma onda senoidal, isenta de ruídos e simétrica, para todos quadrantes. Fig. 5. FFT obtida a 260 Hz com tubo fechado/fechado A partir dos espectros sonoros foi feita uma estimativa da velocidade do som. Com base nos resultados obtidos, as seguintes tabelas são geradas: Fig. 4. Sinal de saída do gerador de áudio captado com o osciloscópio. B. Amplificador de áudio É necessário que o amplificador de áudio seja de alta fidelidade e que sua resposta de frequência atenda à banda fornecida pelo gerador de tons. Além disto sua impedância deve casar-se com a do alto-falante utilziado. Contudo, o amplificador utilizado nos ensaios gerou uma distorção considerável no sinal, o que criou harmônicos indesejados no interior do tubo. C. Análise do método estático Sabe-se que é necessário certa potência para excitar convenientemente a coluna de ar dentro do tubo. Mais ainda para gerar o efeito visual com o pó em seu interior. Devido ao comprimento e diâmetro do tubo serem muito grandes, a visualização do efeito não foi possível. Isto não quer dizer que o efeito de ressonância não aconteça. Pode-se notar que, nas proximidades das esperadas frequências ressonantes, o som no interior do tubo é amplificado e o tubo vibra com maior intensidade. D. Analise espectral do som no interior do tubo Diversos ensaios foram feitos com o tubo de impedância em frequências diferentes a fim de se obter o espectro sonoro e seus respectivos harmônicos. O software Cool Edit 2000 possibilita analisar um arquivo previamente gravado no computador sua forma de onda e o espectro sonoro através de uma FFT (Transformada Rápida de Fourier). A Figura 5 mostra o espectro sonoro feito a 260 Hz com o tubo fechado. Também foi feita uma análise a 400 Hz com o tubo aberto. Os picos da onda representam as frequências de ressonância captadas e o primeiro pico, o de maior amplitude, é correspondentee à frequência injetada no tubo. TABELA I ESTIMATIVA DA VELOCIDADE DO SOM COM BASE NO ENSAIO A 260 HZ COM TUBO FECHADO/FECHADO Frequência V- Tubo fechado Erro Erro ² 260 Hz 338,00 m/s 1,49 2,21 773 Hz 334,96 m/s -1,55 2,41 1289 Hz 335,14 m/s -1,37 1,88 1816 Hz 337,25 m/s 0,74 0,54 2338 Hz 337,21 m/s 0,70 0,49 Média Valor Esperado Máximo Mínimo 336,51 m/s 0,00 1,51 336,51 m/s +- 1,51 338,02 m/s 335,00 m/s TABELA II ESTIMATIVA DA VELOCIDADE DO SOM COM BASE NO ENSAIO A 400 HZ COM TUBO FECHADO/ABERTO Frequência 400 Hz 346,66 1159 Hz 335,11 1942 Hz 336,61 2746 Hz 339,98 3520 Hz 338,96 Média 339,46 Valor Esperado 339,46 Máximo 355,35 Mínimo 323,58 V- Tubo aberto Erro Erro ² 7,20 51,78-4,35 18,96-2,85 8,15 0,52 0,27-0,50 0,25 0,00 15,88 +- 15,88 Nota-se que o ensaio com uma das extremidades abertas possui maior variância entre os valores. Isto acontece
devido ao ruído externo do ambiente ser captado durante a gravação. 5. Conclusões finais A necessidade de aprimoramento dos métodos de aquisição de dados para se obter a maior precisão possível é inerente ao sucesso deste trabalho. Para tal, será feita nova bateria de ensaios modificando alguns dos métodos utilizados até então. A compra de novos equipamentos também se fará necessária. Um amplificador de alta fidelidade - atentando-se para a impedância de saída - e um microfone com boa sensibilidade são indispensáveis. Para que a análise com o método estático seja bem sucedida, sugere-se a utilização de um tubo com menor diâmetro, o que requerirá menor potência de sinal para a visualização completa da ressonância dentro do tubo. Posteriormente, estes resultados serão aplicados ao ensaio (também no tubo de impedância) do amortecimento do som em um determinado material. Os dados coletados serão, então, utilizados para o ensaio com cavidades automotivas. Agradecimentos Aos professores orientadores Marcus Girão e Suélia Rodrigues e às nossas famílias por todo o apoio. Referências [1] AGUIAR. Carlos Eduardo, FREITAS. Marcos Antônio e LAUDARES. Francisco. Medindo a velocidade do som com o microfone do PC, Instituto de Física e Coppe, Universidade Federal do Rio de Janeiro. [2] DA SILVA. Wilton Pereira, E SILVA. Cleide M. D. P. S., FEREIRA. Tarso V., ROCHA. Jerônimo S., E SILVA. Diogo D. P. S., E SILVA. Cleiton D. P. S., Velocidade do som no ar: um experimento caseiro com microcomputadores e balde d água. Departamento de Física, Universidade Federal de Campina Grande. [3] CAVALCANTE. Marisa Almeida e TAVOLARO. Critiane R. C. Ondulatória e acústica através de experimentos assistidos por computador. Departamento de Física, Pontifícia Universidade Católida de São Paulo.