Universidade de São Paulo Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI Departamento de Clínica Médica - FMVZ/VCM Artigos e Materiais de Revistas Científicas - FMVZ/VCM 2008 Acidose láctica ruminal aguda em bovinos confinados: como prevenir Revista V & Z em Minas, Belo Horizonte, v. 18, n. 97, p. 20-22, 2008 http://producao.usp.br/handle/bdpi/1837 Downloaded from: Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI, Universidade de São Paulo
REVISTA VETERINARIA E ZOOTECNIA EM MINAS 0 que e ser responsavel tocnico? Revista Oficial do Conselho Regional de Medicina Veterinaria do Estado de Minas Gerais
Acidose Lactica Ruminal Aguda em bovinos confinados: como prevenir Procedures to prevent the occurrence of acute latic acidosis in the rumen of the confined cattle Thales dos Anjos de Faria Vechiato', Enrico Lippi Ortolani 2 1- Graduado em Medicina Veterinaria - Pos-graduando - Departamento de Clinica Medica da FMVZ-USP 2- Doutor, Professor Titular do Departamento de Clinica Medica-FMVZ-USP, Pesquisador CNPq, Consultor do Globo Rural - e-mail: ortolani@ usp.br RESUMO Nesta revisdo sao apresentados os fatores predisponentes a ocorr'encia da acidose lactica ruminal aguda (ALRA) em bovinos que recebem dietas ricas em graos energeticos e as suas conseqiiencias para os animais. Os autores apresentam os procedimentos basicos para evitar a ocorrencia de ALRA em bovinos confinados em nosso meio. Palavras-Chave: Acidose lactica ruminal - confinamento - bovinos beu graos ou subprodutos industriais (polpa citrica, caroco de algodao, casquinha de soja etc.), como forma de alimento. Essas dietas estao divididas em tr'es categorias, segundo a quantidade de concentrados presentes na dieta total: baixa (ate 40 % da materia seca ingerida) media (entre 41% a 69 %) e alta (acima de 70 %). Segundo FRANCO (2006), atualmente, pelo menos, 800.000 bovinos sao arracoados corn dietas de alto grao, esperando-se em curto prazo um aumento desse contingente. ABSTRACT In this review are presented the predisposing factors to the occurrence of acute lactic acidosis in the rumen (ALRA) of cattle and their consequences for the animals. The authors present the basic procedures to prevent the occurrence of ALRA in cattle confined in our country. Key-words: Lactic Acidosis - cattle- feedlot INTRODU00 O agronegocio da came no Brasil tern experimentado um vertiginoso crescimento nas ultimas decadas, constituindo-se em importante item de nossa pauta de exportacoes. Esse crescimento deve-se aos novos modelos de producao de bovinos de corte que passa por grandes transformacoes no seu manejo corn o objetivo de aumentar o capital de giro e diminuir o custo operacional da arroba produzida, aumentando a lucratividade. Uma das estrategias utilizadas é o emprego de tecnicas de confinamento ou de semiconfinamento para bovinos em fase de terminacao ou, em menor grau, na fase de recria (Figura 1). Projetos de confinamento corn maior nivel de tecnificacao chegam a atingir numeros proximos a 50.000 cabecas. Assim, dos 45 milhoes de bovinos abatidos em 2007, estima-se que 13 % deste contingente rece- 20 Figura 1 Bovinos em confinamento. FATORES PREDISPONENTES As dietas ricas em graos energeticos aumentam o ganho de peso, favorecem a deposicao de gordura na carcaca, facilitam o manejo estrategico dentro da propriedade e diminuem o tempo de confinamento, encurtando, assim, o ciclo de abate. Alem disso, seus custos de armazenamento e facilidade de serem distribuidas nos cochos as tornam bastantes atrati-
nestes sistemas padecam desse mal no decorrer do periodo confinado. Num dos confinamentos visitados pelos autores, chegou-se a encontrar ate 30% dos animais corn ALRA, ocorrendo morte ern 50% dos bovinos nao tratados. QUADRO CLINICO Ingestao de dietas ricas em graos energeticos. vas em grandes confinamentos (Figura 2). Se por urn lado essas sao extremamente vantajosas, em contrapartida podem predispor a doencas digestivas dentre elas a Acidose Lactica Ruminal Aguda (ALRA). Essa doenca é caracterizada por uma alta fermentacao dos graos dentro do rumen resultando na formacao de acid lactico, normalmente pouco produzido, o qual aumenta inicialmente a acidez (ph) no interior do orgao e em seguida em todo organismo, podendo levar o animal a morte. A ALRA geralmente ocorre em bovinos criados extensivamente que no confinamento passam a receber subitamente alias quantidades de graos, sem uma devida adaptacao; ou ainda em animais bem adaptados que por urn erro na mistura da racao ingerem quantidades muito alias de concentrados, ou ainda naqueles animais "glutoes" que comem exageradas quantidades de racoes, principalmente alp& um periodo de privacao de comida no pr6prio confinamento, ou ainda a colocacao de bovinos nao adaptados em lotes ja adaptados aos graos. Quanto mais facil e rapida for a fermentacao dos graos pelas bacterias ruminais maior a chance de formacao de acidos fortes no rumen e de ocorrencia de ALRA. Em ordem decrescente de facilidade de fermentacao destacam-se o trigo, aveia, arroz, milho e o sorgo. Em experimento corn o use da polpa citrica foi detectado que a alta ingestao de polpa provoca, di-. ferente de outros alimentos, apenas uma acidose ruminal branda e passageira. A forma corn que se oferece o gran tambem interfere na producao de acidos. Por exemplo, o grao de milho inteiro fermenta menos no rumen que o prensado, triturado, moido (fuba), timid e em forma de flocos, em ordem crescente. Nao existem dados nacionais da freqiiencia da ALRA em bovinos confinados no Brasil, mas estima-se que pelo menos 10% a 15 % dos anim4is Os sinais clinicos apresentados pelos bovinos corn ALRA sao variados dependendo da intensidade do quadro (Figs 3-4-5). Quando a quantidade de acid lactic produzida no rumen é pequena, os animais apenas deixam de corner por um ou dois dias voltando a se alimentar em seguida. Mesmo assim, esse animal perde de 2 a 4 kg de peso vivo. Num quadro mais intenso os bovinos param de comer e de andar, apresentam diarreia, parada de movimentacao do rumen, grande apatia, desidratacao entre outros sintomas. Caso este animal sobreviva o mesmo podera perder ate 15 kg de peso vivo, pois o apetite apenas e restabelecido apos 4 a 5 dias do inicio do quadro clinico. Figura 3 Quadro de apatia causado por ALRA. Figura 4 Morte subita em casos de ALRA. 21
Acidose Lactica Ruminal Aguda em bovinos confinados: como prevenir A ALRA pode ainda deixar conseqiiencias em 20% a 30 % dos animais recuperados, como o desenvolvimento de laminite (inflamacao na parede dos cascos), que leva ao crescimento anormal das unhas e casos de manqueira, akin do desenvolvimento de processo inflamatorio na parede ruminal e abscessos hepaticos; o animal diminui o ganho de peso e piora a sua conversdo alimentar. Figura 5 Quadro de diarreia causada por ALRA. PREVEN00 O ponto chave para o controle da ALRA e a sua prevencao. Para tal, deve-se ter em mente que o bovino e as bacterias que vivem no rumen geralmente desenvolvem mecanismos para evitar o acomulo de acidos nesse orgao. Esses mecanismos se desenvolvem lentamente no decorrer dos primeiros 10 a 20 dias de confinamento, e podem ser andliados com medidas de manejo nutricional e por alguns aditivos colocados nas racoes. Entre essas adaptkoes ha o crescimento de certas bacterias ruminais que destroem o acido lactic ai produzido; a grande producao de saliva pelo bovino, a qual ingerida bloqueia o efeito do acido no rumen, entre outras. Procedimentos para evitar a ocorrencia de ALRA em bovinos confinados: 1)Nos primeiros dias do confinamento ofereca mais volumosos (silagem, capim, bagko ou feno) que concentrados, os quais devem ser fornecidos em quantidades crescentes lentamente ate atingir a quantidade estabelecida pelo programa de confinamento; 2) Lotes de bois ou novilhas que vieram do pasto e nunca receberam concentrados devem ter urn period de adaptacao mais longo. 3) Oferecer racao total (TMR), em que o concentrado ja esta previamente misturado ao volumoso, em vez de dar o concentrado a parte, pois os bois preferem corner concentrados ao volumoso. 22 4)Caso nao tenha o misturador para TMR, nao ofereca toda racao concentrada de uma so vez, o que ira facilitar a fermentacao; distribuir esta racao em duas ou tres partes iguais no decorrer do dia. 5) Evite picar em demasia a sua fonte de volumoso, pois quanto mais comprido for o capim (ideal de 1 a 3 cm) maior sera a quantidade de saliva produzida pelo animal. Assim, antes de iniciar o confinamento verifique se sua picadora nao esta picando ou triturando demais o volumoso. 6)Nunca introduza bovinos nao adaptados em grupos ja adaptados, pois sao comuns os casos de ALRA nesses animais. 7)Caso tenha misturador, confira sempre se ele esta misturando e distribuindo quantidades esperadas de racao. Falhas mecanicas e falta de ajuste sao freqiientemente encontrados. 8) Nunca deixe os bovinos sem cornida, ou corn cocho quase vazio. 8) Bois com fome comem muito alem da conta. Acompanhe no decorrer do dia como esta o apetite e o grau de enchimento do cocho. 9) Nos primeiros dias de confinamento, ou se dieta em graos for superior a 60 %, adicione sempre calcario na racao, o qual tem papel semelhante a saliva. 10)Substancias ionoforas (monensina e lasalocida) e certos tipos de probioticos aumentam a quantidade de bacterias ruminais que degrada o acido lactic e favorecem o ganho de peso. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS FRANCO, M. Alto grao x alto volumoso. Revista DBO. (Materia de capa) n.308, ano 25, p.54-58, 2006. GLOCK, R.D.; DEGROOT, B.D. Sudden Death of Feedlot Cattle. J. Animal Science. V. 76,p.315-319, 1998. MARUTA, C. A.; ORTOLANI, E. L. Susceptibilidade de bovinos das ragas Jersey e Gir a acidose lactica ruminal: I - variaveis ruminais e fecais. Ciencia Rural, Santa Maria, v. 32, n. 1, p. 55-59, 2002. ORTOLANI, E. L. Principais disturbios metabolicos que afetam vacas leiteiras. In: P. R. Piekarski. (Org.). Curso intensivo de atualizacao em bovinocultura leiteira. 1 ed. Curitiba: Sociedade Paranaense de Medicina Veterinaria/UFPR, v. 1, p. 74-105, 1989 RADOSTITS, 0. M.; GAY, C. C.; BLOOD, D. C.; HINCHCLIFF, K. W. Clinica veterinaria: um tratado de doencas dos bovinos, ovinos, suinos, caprinos e eqiiinos. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. 1737 p.