Programa de terapia comportamental em grupo aplicado a fóbicos sociais



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Transcrição:

ARTIGO DE ATUALIZAÇÃO Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo 2010; 55(2):71-5 Programa de terapia comportamental em grupo aplicado a fóbicos sociais Group behaviour therapy of patients with social phobia diagnosis program Mariângela Gentil Savoia 1, Márcio Antonini Bernik 2 Resumo Diversas técnicas comportamentais e cognitivas foram propostas e divulgadas como eficazes para o tratamento da fobia social, entre elas: terapia baseada em exposição, o treinamento de habilidades sociais e a terapia comportamental cognitiva em grupo. A terapia em grupo apresenta vantagens em relação à terapia individual, o grupo funciona como uma situação social vivida pelo paciente e observada pelo terapeuta, o grupo é uma forma de exposição contínua e pode tornar mais fácil a execução de situações práticas propostas, e o aspecto da supervisão pelo terapeuta em tempo real. Esse formato de tratamento apresenta uma relação custo-benefício melhor que o individual. Este trabalho tem por objetivo apresentar um modelo de intervenção em grupo para pacientes com diagnóstico de Fobia Social, estruturado em número limitado de sessões com temática descrita em um manual seguido pelos terapeutas. Esta proposta é baseada em programas de tratamento descrito na literatura e adequada aos recursos disponíveis a serviços públicos de saúde mental em nosso meio. Trata-se de um guia de tratamento que pode ser utilizado por profissionais, constituindo um modelo de terapia breve de base comportamental. Descritores: Transtornos fóbicos, Psicoterapia de grupo, 1. Professor Assistente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica. Coordenadora do Setor de Psicologia do Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental (CAISM) da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Psicóloga do Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq HC da FMUSP) 2. Professor Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Departamento de Psiquiatria, Coordenador do Ambulatório de Ansiedade (AMBAN) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPq HC da FMUSP). Endereço para correspondência: Márcio Antonini Bernik. Universidade de São Paulo. Hospital das Clínicas. Instituto de Psiquiatria - Ambulatório de Ansiedade. Rua Doutor Ovídio Pires de Campos, 785 Cerqueira Cesar 05403-010 São Paulo SP Brasil. Fones: (11) 3069 6988/ Fax (11)3085 5032. E-mail: amban@amban.org.br Terapia cognitiva, Terapia comportamental Abstract Several behavioral and cognitive techniques were proposed and divulged as efficacious for social phobia treatment, among them: therapy based on exposition, social skills training and group cognitive behavior therapy. The group therapy has advantages in relation to the individual therapy, because it operates like a social situation lived by the patient and observed by the therapist. The group is a form of continued exposure and it may become easier for the execution of proposed practices situations, and the supervision by the therapist in real time. This format of treatment presents a better cost-benefit relation compared to the individual format. This study aims to present an intervention model in group of patients with social phobia diagnosis. It was structured around a limited number of sessions having its theme connected to the therapeutic manual. The proposal was based on treatment programs described in the literature and it is adequate to the available resources for the Public Mental Health Service found in our environment. It refers to a treatment guide that may be used by professionals and it constitutes a brief behavioral therapy model. Key words: Phobic disorders; Psychotherapy, group; Cognitive therapy; Behavior therapy Introdução Fobia Social pode ser descrita como intensa ansiedade em grande variedade de situações de contato interpessoal ou de desempenho, ou mesmo ambas, acarretando sofrimento excessivo ou interferindo de forma acentuada no funcionamento do indivíduo. Este teme ser avaliado negativamente, comportar-se de um modo humilhante ou embaraçoso, com consequente desaprovação e rejeição por parte dos outros. O comportamento observável é de esquiva a um estímulo social percebido como aversivo e eliciador de ansiedade. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana em sua quarta edição revista (DSM IV TR, 2002) inclui os 71

seguintes exemplos: incapacidade de falar ao se apresentar em público, medo de engasgar com o alimento quando comendo na frente dos outros, ser incapaz de urinar em banheiro público, receio em tremer as mãos quando escrevendo em presença de outros ou em dizer coisas tolas além do fato de acreditarem não serem capazes de responder a questões em situações sociais. A Fobia Social geralmente tem início na adolescência, fase do desenvolvimento na qual se adquirem habilidades sociais, o que impacta na vida do indivíduo, limitando o seu funcionamento acarretando déficits duradouros de habilidades sociais. (Savoia, 2000; Caballo, 2003; Isolan et al, 2007) Comorbidade com depressão é frequente, Van American et al, 1991 encontraram prevalência de 70% de depressão maior entre fóbicos sociais. Cox et al, 1994, relatam que embora não se observasse o diagnóstico de depressão maior, tentativas de suicídio foram relatadas por 12% dos pacientes com diagnóstico de fobia social. Também são freqüentes o abuso e dependência de álcool e outras substâncias psicoativas, na maioria deles o início dos sintomas fóbicos precedeu o problema de abuso ou dependência a substâncias. (Sussman, 1993; Lotufo-Neto, Gentil, 1994). Outros transtornos que podem ser encontrados em comorbidade são: transtornos ansiosos e alimentares, além de transtornos de personalidade, como o transtorno dependente, esquizotípico e paranóide (Alnaes e Torgersen, 1988; Barros Neto, 1996; Barros Neto e Lotufo Neto, 2006) Diversas técnicas comportamentais e cognitivas foram propostas e divulgadas como eficazes para o tratamento da fobia social, entre elas: terapia baseada em exposição o treinamento de habilidades sociais e a terapia comportamental cognitiva em grupo (Heimberg, 2002, Savoia, 2003). Das técnicas propostas, a exposição ao vivo às situações temidas é a técnica mais largamente reconhecida como central e eficaz na redução das reações de ansiedade fóbica, (Barlow, 1988) Diversos estudos examinaram a eficácia da exposição, em sua forma pura, no tratamento da fobia social (Alstrom et al, 1984; Wlaslo et al, 1990; Al-Kubaisy et al, 1992; Turner et al, 1994). Pacientes com Fobia Social circunscrita a uma ou poucas situações, têm uma boa resposta à exposição ao vivo com taxas que podem chegar a quase 100% de eficácia em acompanhamento de curto prazo (Turner et al, 1994) já em casos de fobia generalizada a literatura é consistente na necessidade de se acrescentar ao tratamento o treinamento de habilidades sociais (Caballo, 1995; Echeburúa,1995; Savoia e Barros Neto, 2000) O treino de habilidades sociais tem sido indicado para o tratamento desse transtorno, pois promove a redução da ansiedade no confronto interpessoal, desenvolve um melhor repertório para a exposição ao vivo e é consistente como um modelo de contracondicionamento (Turner et al, 1994). Em geral, os déficits de habilidades sociais diminuem as chances de percepção de sucesso durante exercícios de exposição. Um repertório de habilidades sociais aumentado pode facilitar não só a exposição, como também auxiliar na modificação das crenças disfuncionais devido à redução de ansiedade no contato interpessoal e redução do viés atencional para ameaças, característico dos estados de tensão e ansiedade elevados. O treino de habilidades sociais atinge grande eficácia quando são realizados ensaios comportamentais em grupo. Alguns autores também apontam melhores resultados na combinação de procedimentos cognitivos com treinamento em habilidades sociais. Pacientes fóbicos sociais, especificamente aqueles cujo déficit mais importante era em habilidades sociais, apresentaram melhor resposta ao tratamento quando foram alocados em grupos. (Wlazlo et al, 1990). Terapia em grupo A principal vantagem da terapia em grupo em relação à individual para o fóbico social é que o grupo funciona como uma situação social vivida pelo paciente e observada pelo terapeuta. O grupo, por ser uma forma de exposição contínua a uma situação social - o próprio grupo - torna mais fácil a execução de situações práticas propostas, e a observação pelo terapeuta do comportamento expresso pelo paciente que ocorre em tempo real. De acordo com a revisão de Falcone (1995), entre as vantagens do tratamento em grupo da fobia social, são: maior variedade de ensaio comportamental com um número maior de pessoas; generalização mais rápida dos ganhos terapêuticos; maior quantidade de feedback efetivo dos desempenhos (reforço social); maior experiência com um número maior de situaçõesproblema e mais suporte para solucioná-las; maior disponibilidade de modelos múltiplos; intensificação da aprendizagem de discriminação e maior generalização de novos comportamentos de enfrentamento para uma faixa mais ampla de situações. Há descrições, na literatura, de recursos terapêuticos, no manejo da fobia social com a Terapia cognitivo comportamental (TCC), que só são possíveis nas terapias em grupo (Albano et al, 1995). Além das vantagens do grupo como recurso terapêutico, Heimberg (1993) aponta que o grupo também é uma boa maneira de o terapeuta monitorar se o paciente está assimilando o tratamento de forma adequada. De acordo com este autor, é muito mais difícil para o terapeuta perceber se o paciente em terapia individual aprendeu adequadamente a aplicar suas tarefas cognitivas em situações de vida real, já que o terapeuta não poderá acompanhar a prática comportamental. No 72

Programa terapêutico para fóbicos sociais AMBAN QUADRO 1 Semana 1 Integração do grupo e proposta terapêutica Contrato terapêutico racional do tratamento Psicoeducação de Fobia Social Semanas 2 a 8 - Treino de habilidades sociais - Semanas 2 e 3 Assertividade Ensaio comportamental das situações levantadas com o grupo para treino de assertividade, diferenciar das situações de agressividade, não assertividade. Utilizou-se o Inventário de Assertividade de Lipp e Rocha (1994) Tarefa de casa (semana2) Observação do padrão de comportamento e registrar a emissão de comportamento assertivo (semana 3) Treinar o comportamento assertivo no seu dia a dia Semanas 4 e 5 A importância da linguagem não verbal no comportamento social - Como as expressões corporais podem auxiliar ou atrapalhar no desempenho social Ensaio comportamental de expressões corporais Tarefa de casa (semana 4) Observação do comportamento não verbal. (semana 5) treinar emissão correta do comportamento não verbal Semana 6 e 7 A importância de se expressar afeto e como faze-lo em situações sociais Utilizou-se o Inventário de Expressão de Afeto de Lipp e Rocha(1994) Ensaio comportamental de situações de expressão de afeto Tarefa de casa (semana 6) observação do comportamento de expressão de afeto (semana 7) treino do comportamento de expressão de afeto Semana 8 Levantamento das situações fóbicas - quais situações que o paciente evita ou enfrenta com grande sofrimento Proposta de hierarquização das situações fóbicas Ensaio comportamental das habilidades sociais treinadas Tarefa de casa Hierarquia e observação do comportamento de esquiva a situações fóbicas Semanas 9 a 19 Quais as situações a que o paciente se expôs e com quais resultados Ensaio comportamental realizado pelo grupo das situações hierárquicas dos pacientes Tarefa de casa - Exposição às situações da hierarquia em ordem crescente Semana 20 Análise e discussão das tarefas de casa Avaliação do programa - Quanto o paciente sente, percebe a sua melhora em termos de desempenho social devido ao programa Qual a avaliação do terapeuta e sugestões deste para que as habilidades sociais ainda não bem desenvolvidas pelo paciente possam vir a ser aperfeiçoadas. A importância da continuidade de exposição. grupo, essa possibilidade é concretizada: o terapeuta pode colocar-se no papel de espectador enquanto os pacientes ensaiam as situações sociais ansiogênicas e põem em prática os novos comportamentos sociais aprendidos. Os aspectos já citados, de o grupo ser uma forma de exposição contínua a uma situação social (o próprio grupo), de tornar mais fácil a execução de situações práticas propostas, e o aspecto da supervisão pelo terapeuta em tempo real são enfatizadas 73

por Dyck (1996); segundo este autor, essas situações presenciadas pelo terapeuta têm valor maior do que aquelas desempenhadas pelo paciente fora das sessões e apenas relatadas ao terapeuta, no caso da terapia individual. Esse formato de tratamento, em grupo, apresenta uma relação custo-benefício melhor que o individual (Dyck, 1996) Vários autores têm proposto modelos de tratamento de Fobia social em grupo, em outros países. Leung e Heimberg (1996),sugerem sessões de psicoterapia em grupo - de 6 a 12 sessões semanais com duas horas e meia de duração, dois terapeutas, técnicas de psicoeducação, técnicas cognitivas e exposição a simulações de situações provocadoras de ansiedade durante as sessões de terapia e tarefas de casa para exposição ao vivo para situações previamente levantadas nas sessões. Heimberg et al, 1998, apresentam um programa de 12 sessões de 2 horas e meia Grupo composto de cinco a sete pacientes com o enfoque em técnicas cognitivas estabelecimento de metas comportamentais, experimentos comportamentais usados nas situações de exposição e tarefas de casa. Gelernter et al, 1991, desenvolvem um programa com dois terapeutas 10 pacientes por grupo, Sessões de duas horas semanais - 12 semanas, técnicas cognitivas, simulação, nas sessões, de exposição a situações sociais e tarefas de casa personalizadas. Os pacientes submetidos à terapia cognitivo comportamental em grupo mantêm os ganhos após um follow-up de um ano. Mortberg et al, 2005. Modelo de intervenção O modelo de tratamento proposto baseia-se em princípios e técnicas comportamentais. O procedimento de terapia em grupo foi estruturado com duas modalidades de intervenção: treino de habilidades sociais e exposição gradual ao vivo. Utilizou-se no treino de habilidades sociais o ensaio comportamental como um fator facilitador para a exposição. As tarefas de casa foram personalizadas treino de habilidades sociais nas situações vivenciadas por cada paciente e exposições a situações reais nas quais o paciente se esquivava anteriormente. As sessões foram estruturadas e foi elaborado um manual que contem um plano detalhado de tratamento, com a operacionalização das atuações dos terapeutas, no qual inclusive os exemplos a serem citados já estivessem previstos, para facilitar a aplicação do procedimento*. O conteúdo das sessões pode ser visto no quadro um. O programa de tratamento foi estruturado com 20 sessões de Psicoterapia. Considerações Finais O modelo de qualidade no cuidado ao paciente psiquiátrico deve ser personalizado, portanto, a realização de um programa de 20 sessões na clínica pode ser expandido, se necessário. Trata-se de um guia de tratamento que pode ser utilizado por profissionais, testado empiricamente, constituindo um modelo de terapia breve de base comportamental. Referências Bibliográficas Albano M, Marten P, Holt CS, Heimberg RG, Barlow DH. Cognitivebehavioral group treatment for social phobia in adolescents. J Nerv Mental Disord. 1995; 183: 649-56. Al-Kubaisy T, Marks IM, Logsdail S, Marks MP, Lovell K, Sungur M, et al. Role of exposure homework in phobia reduction: a controlled study. Behav Ther. 1992; 23:599-621. Alnaes R Torgersen S. The relationship between DSM-III symptom disorders (Axis I) and personality disorders (axis II) in an outpatient population. Acta Psychiatr Scand. 1988; 78:485-92. Alstrom JE, Nordlund CL, Persson G, Harding M, Ljungqvist C. The effects of four treatment methods on social phobic patients not suitable for insigth-oriented psychoterapy. Acta Psychiatr Scand.1984; 70:97-110. American Psychiatric Association. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. 4ª ed. rev. Porto Alegre: Artes Médicas; 2002. Barlow DH. Anxiety and its disorders. New York: Guilford; 1988. Barros TP. Perfil psicopatológico e transtornos de personalidade em uma amostra de pacientes com diagnóstico de fobia social. [Dissertação Mestrado]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo; 1996. Barros Neto TP, Lotufo Neto F. Transtornos de personalidade em pacientes com fobia social. Rev Psiquiatria Clín (São Paulo). 2006; 33:5-9. Caballo VE. Fobia social In: Caballo VE, Buela-Casal G, Carrobles A. (orgs) Manual de psicopatología y transtornos psiquiátricos. Madrid: Siglo Veintiuno de España; 1995. Caballo VE. Manual de avaliação e treinamento das habilidades sociais. São Paulo: Santos; 2003. 408p. Cox BJ, Direnfeld DM, Swinson RP, Norton GR. Suicidal ideation and suicidal attempts in panic disorders and social phobia. Am J Psychiatry. 1994; 151:882-7. Dyck R. 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Biol Psychiatry. * Este manual está disponível no Portal do Programa de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 74

2002 ; 51:101-8. Isolan L, Pheula G, ManfroG. Tratamento de ansiedade social em crianças e adolescentes. Rev Psiquiatria Clín (São Paulo). 2007; 34:3:125-32. Leung AW, Heimberg RG. Homework compliance, perceptions of control, and outcome of cognitive-behavioral treatment of social phobia. Behav Res Ther. 1996; 34:423-32. Lipp M, Rocha JC. Stress, hipertensão arterial e qualidade de vida. Campinas: Papirus; 1994. Lotufo-Neto F, Gentil V. Alcoholism and phobic anxiety- a clinicaldemographic comparison. Addiction. 1994; 89:447-53. Mortberg E, Berglund G, Sundin O. Intensive cognitive behavioral group treatment for social phobia: a pilot study. Cogn Behav Ther. 2005; 34:41-9. Savoia MG, Barros Neto TP. Tratamento psicoterápico da fobia social abordagem comportamental cognitiva. Rev Psiquiatria Clín (São Paulo). 2000; 27:335-9. Savoia MG. Fobia social. In: Abreu C, Roso M. (org) Psicoterapias cognitiva e construtivista novas fronteiras da prática clínica. Porto Alegre: Artmed; 2003. p.101-13. Sussman N. Treating anxiety while minimizing abuse and dependence. J Clin Psychiatry. 1993; 54 Suppl:44-51. Turner SM, Beildel DC, Jacob R. Social phobia: a comparison of behavior therapy and atenolol. J Consult Clin Psychol. 1994; 62:350-8. Van Ameringen M, Mancini C, Styan G, Donison D. Relationship of social phobia with other psychiatrc illness. J Affect Disord. 1991; 21:93-9. Wlaslo Z, Schoereder-Hartwig K, Hand I. Exposure in vivo versus social skills training for social phobia: long-term outcome and differential effects. Behav Res Ther. 1990; 28:181-93. Trabalho recebido: 27/05/2009 Trabalho aprovado: 19/05/2010 75