Análise científica da corrupção



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Transcrição:

Corrupção e Qualidade da Democracia: o que pensam os portugueses Luís de Sousa, Investigador (luis.sousa@ics.ul.pt) Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Análise científica da corrupção Definição: O que é? Medição: Quanto? De que tipo? Explicação: Como? Porquê? Com que efeitos? Previsão: Desenhar, implementar, efectivar e avaliar controlos 1

Tipos de corrupção 2

Corrupção esporádica ou fragmentada Baixa frequência e baixos recursos Este tipo de corrupção não incide num sector de actividade específico; Ocorrência ocasional; Contexto e actores não são necessariamente recorrentes; Troca diádica, imediata, não premeditada, e não prolongada no tempo. É a corrupção mais portuguesa, quer pela sua extensão a todas as classes sociais, quer pela sua incidência em todos os níveis de governação; A arte do desenrascanço pressupõe: um espírito de sobrevivência individual numa sociedade carente de confiança social e institucional; redes de apoio familiares, de amizade ou partidárias fulcrais para o capital social de um indivíduo. Corrupção estrutural ou cultural Alta frequência e baixos recursos 3

Corrupção sistémica ou política Alta frequência e altos recursos Mecanismos de troca sofisticados; Múltiplos actores e papéis na troca ilícita: Partes interessadas (o corrupto activo e passivo), Mediadores(brokers) e Actores periféricos (dummies). Permeabilidade política e negócios. Exemplo:Compra de decisões, prerrogativas ou acesso a mercados públicos, através de donativos de campanha e luvas a eleitos e actores que gozem de confiança partidária. Corrupção meta-sistémica ou de colarinho branco Baixa frequência e altos recursos Operações financeiras extremamente complexas e envolvendo quantias avultadas; Mecanismos de troca transnacionais; Enorme especialização e internacionalização dos actores; Recurso a offshoresde modo a garantir a eficácia das operações, tornando-as mais clandestinas. 4

Quais as causas da corrupção? Níveis de desenvolvimento Processos de modernização Cultura cívica Qualidade das instituições Corrupção e níveis de desenvolvimento A corrupção estilo Robin Hood tem grande aceitação na sociedade portuguesa e é sintomática de uma cultura cívica ainda muito assente na satisfação de necessidades básicas 63,6% dos portugueses toleram a corrupção desde que essa produza efeitos benéficos para a população em geral (Inquérito Corrupção e Ética em Democracia: O Caso de Portugalrealizado em 2006) 5

Corrupção e processos de modernização Modernização inacabada: Persiste um capitalismo de natureza corporativista; Persiste uma democracia a duas velocidades ; Persiste um Estado assolado por clientelismo e patrocinato político. Corrupção e cultura cívica Os portuguesesescolhem frequentemente fazer mais do que a lei permite e menos do que a ética exige; Em termos abstractos, a maioria dos cidadãos rejeita a corrupção; Porém, na prática, perante constrangimentos reais à satisfação das suas necessidades, acaba por aceder. 6

Qualidade das instituições A corrupção é produto de más leis e más instituições; A corrupção expande-se através da conjugação de várias debilidades organizacionais: o modo de organização e de gestão pública do Estado; a dimensão do aparelho do Estado; o grau de intervenção do Estado na economia; o grau de circulação e renovação de elites; e as formas de organização do poder político. Condições que favorecem a corrupção Intervenção excessiva e desordeira do Estado na economia; Desordem/complexidade normativa; Concentração de poderes; Ineficiência administrativa; Controlos formais ineficazes e inconsequentes; Definição imprecisa de interesse público; Fraca cultura de serviço público ; Nomeações políticas no sector público; Conflito de interesses; Financiamento político; A falta de liberdade e qualidade da comunicação social; e Ausência de uma cidadania activa. 7

Efeitos da corrupção em Democracia Impede modernização da burocracia e cristaliza o nepotismo e sistemas clientelares de gestão da coisa pública. Cria sistemas ou poderes informais de decisão paralelos; Reduz eficácia governamental (aumenta despesa pública) e coloca o governo refém de interesses privados ou lobbies; Prejudica a confiança dos cidadãos nas instituições e gera cinismo e populismo; Acentua instabilidade dos sistemas de legitimidade democrática a todos os níveis (acesso, processo e resultado). A democracia continua a ser o pior de todos os regimes com excepção de todos os outros 10,10% 15,50% 14,80% 4,10% A democracia é preferível a qualquer outra forma de governo 55,50% Nalgumas circunstâncias, um governo autoritário é preferível a um sistema democrático Para pessoas como eu, é indiferente uma ou outra forma de governo Fonte: BQD Inquérito 2011 Não sabe Não responde 8

Em geral, os cidadãos estão pouco ou nada satisfeitos com a maneira como funciona a democracia em Portugal. 2,70% 1% 9,20% 22,50% Totalmente satisfeito/bastante satisfeito Algo satisfeito/a Pouco satisfeito/nada satisfeito Não sabe 64,60% Não responde Fonte: BQD Inquérito 2011 Quais são os maiores defeitos na maneira como funciona a democracia em Portugal? 1,70% Falta de confiança nos políticos / governo Governantes não eficazes Corrupção 0,70% 2,50% 20% 19,30% Desigualdades sociais Não há democracia / A democracia funciona mal Cada um por si / Não haver respeito pelas pessoas Crise 3,20% 3,60% 4,20% 11,30% 10,40% Desemprego Só funciona para os ricos / para os que menos precisam Outras respostas Justiça 4,30% 4,60% 4,80% 5% 9,80% Liberdade a mais Dependentes do exterior Não sabe Fonte: BQD Inquérito 2011 9

Quais aspectos da política e da sociedade essenciais para a democracia? 100 75 50 25 52,2 51,9 49,5 48,4 44,6 43,9 39,9 39,9 36,2 34,5 29 0 Fonte: BQD Inquérito 2011 www.transparencia.pt 10