Margaritifera margaritifera Mexilhão-de-rio, Mexilhão-de-rio do norte

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Transcrição:

Margaritifera margaritifera Mexilhão-de-rio, Mexilhão-de-rio do norte Taxonomia: Família: Margaritiferidae Espécie: Margaritifera margaritifera (Linnaeus, 1758) Código da Espécie: 1029 Estatuto de Conservação: Global (IUCN 1994): EN (Em perigo) Protecção legal: Decreto-Lei nº 140/99, com a redacção que lhe é dada pelo Decreto-Lei nº 49/05, de 24 de Fevereiro, de 24 de Abril, Anexo B-II e B-V, transposição da Directiva Habitats (92/43/CEE), de 21 de Maio de 1992, Anexos II e V Decreto-Lei nº 316/89, de 22 de Setembro, transposição da Convenção de Berna, Anexo III Distribuição: Global: Distribui-se pela região holártica: Norte da Europa, Euroásia e Nordeste da América (Wells & Chatfield 1992, Woodward 1995). Comunitária: Região biogeográfica Atlântica: Alemanha, Dinamarca, Espanha, França, Irlanda e Reino Unido Região biogeográfica Mediterrânica: Portugal e Espanha Região biogeográfica Continental: Luxemburgo, Alemanha, França, Bélgica, Áustria e Suécia Região biogeográfica Alpina: Finlândia e Suécia Região biogeográfica Boreal: Finlândia e Suécia Nacional: Em Portugal ocorre a Norte, incluindo a Bacia do Douro - Rios Cávado, Mente, Neiva, Paiva, Tuela e Rabaçal. Tendência Populacional: Esta espécie terá sido o animal aquático mais abundante dos rios da região holártica, tendo sofrido uma regressão notável no último século (cerca de 90% na Europa) devido à acção do Homem (Quesada1999, Araújo & Ramos 2001, Reis 2004). Após ter sido dada como extinta em Portugal (Bauer 1986, Young et al. 2001b in Reis 2004), a redescoberta da M. margaritifera é sem dúvida um acontecimento marcante a nível europeu. A importância desta nova descoberta é acentuada pelas boas condições em que parecem subsistir as populações dos rios Rabaçal, Mente e Tuela. Curioso também encontrá-la ainda num rio tão regularizado como o Cávado, mas neste caso todos os indicadores biológicos e ecológicos apontam para que se extinga a curto prazo se nada for feito. A extinção em Portugal pode ocorrer a um ritmo mais acelerado que no resto da Europa, devido à menor longevidade dos animais (Young et al. 2000 in Reis 2002). A conservação das populações dos rios Rabaçal, Mente e Tuela e a recuperação das populações dos rios Cávado, Neiva e Paiva é absolutamente indispensável no contexto do cumprimento das obrigações portuguesas perante a União Europeia no âmbito da Directiva Habitats, tanto mais que as três primeiras mostram indícios de recrutamento, o que é raro na maioria das populações europeias. 1

Abundância: A abundância é considerada baixa nos rios Cávado, Neiva e Paiva e sem evidências recentes de recrutamento. A maior abundância foi encontrada no rio Rabaçal, com densidades superiores a 50 mexilhões/m 2 (Reis 2003a). Rio Cávado Mente Neiva Paiva Tuela Rabaçal Troço do Rio onde ocorre a 10 8 a 10 26 63 espécie (Km) Densidade (mexilhões/m 2 ) b 0.16 b b 0.05-0.32 0.09-50 População Total, estimada, no Rio <100 22 000 <100 <500 50 000 1 000 000 a- Só se encontraram 3 indivíduos na proximidade uns dos outros. b- Foram encontrados poucos mexilhões para calcular a densidade. Segundo Moorkens (1999 in Araújo & Ramos 2001), a unidade populacional mínima viável é de 500 indivíduos reprodutores/0.5 Km de rio. Requisitos ecológicos: Habitat: Os bivalves de água doce têm, na sua maioria, tolerância muito reduzida à salinidade. Habitam toda uma variedade de habitats de água doce, desde lagos e charcas até rios e valas, enterrando-se total ou parcialmente no substrato arenoso ou de cascalho. O tipo de substrato do leito do rio é extremamente importante, em particular para os jovens, que vivem enterrados e necessitam de oxigénio, determinando as áreas de ocorrência onde a espécie pode sobreviver (Araújo & Ramos 2001). M. margaritifera prefere ambientes lóticos, nunca tendo sido encontrada em regime lêntico (Reis 2002). Ocorre geralmente a temperaturas inferiores a 20ºC e em águas com ph próximo de 7 e evita águas com baixo grau de oxigénio. É extremamente intolerante a qualquer tipo de poluição (Reis 2004). Alimentação: Todos os bivalves de água doce se alimentam filtrando a água por um sistema de cílios, sendo a sua dieta constituída por detritos e plancton (Reis 2004). Em condições óptimas, os bivalves atingem densidades elevadas e são então eles próprios determinantes da qualidade de água, devido ao volume que filtram (Reis 2002 e 2004), sendo um indicador da boa qualidade da água. As larvas (gloquídio) de M. margaritifera parasitam obrigatoriamente membros da família Salmonidae, nomeadamente Salmo salar e Salmo trutta fario (Wells & Chatfield 1992, Araújo & Ramos 2001, Reis 2002 e 2004). Reprodução: Atingem a maturidade sexual entre os 7-20 anos (Meyers & Milleman 1977 e Young & Williams 1984 in Araujo & Ramos 2001, Wells & Chatfield 1992, Woodward 1995). Espécie dióica, mas existem vários relatos de hermafroditismo, em situações em que a densidade populacional cai abaixo de um valor crítico (Wells & Chatfield 1992, Woodward 1995, Araujo & Ramos 2001). A gravidez dura 2-3 meses, desde Junho, e a fase larvar inicia-se em Agosto, tendo uma duração que vai de várias semanas até 10 meses (Woodward 1995, Ziuganov et al. 1994 in Araújo & Ramos 2001), dependendo da temperatura. As larvas permanecem fixas às guelras dos peixes, sofrendo várias metamorfoses, até que se soltam do peixe, estando a sua sobrevivência dependente do local onde caem. A vida parasitária constitui, assim, uma fase do desenvolvimento larvar e simultaneamente de disseminação da espécie, devido às deslocações do hospedeiro. 2

Bauer (1988 in Quesada 1999) considera como populações saudáveis aquelas que apresentam uma elevada proporção de juvenis, com uma percentagem de indivíduos com menos de 20 anos superior a 30%. Espécie de grande longevidade, cujos indivíduos podem atingir 140 anos ou mais (Woodward 1995). Ameaças: A poluição resultante de descargas de efluentes não tratados de origem industrial, ou urbana, a par com fontes de poluição difusa devidas à intensificação da utilização de pesticidas e fertilizantes na agricultura, cria situações de elevada eutrofização do meio, com a consequente perda da qualidade da água, tornando-se esta imprópria para a sobrevivência da espécie, podendo levar a situações de elevada toxicidade, com maior repercussão nos períodos de estiagem. As descargas provocam também episódios de anóxia, que eliminam por completo populações inteiras de bivalves, incapazes de fugir. A construção de barragens e açudes provoca a conversão de um sistema lótico em lêntico, absolutamente inadequado à sobrevivência de M. margaritifera. A eutrofização e alteração dos parâmetros físico-químicos da água (nomeadamente aumento de temperatura da água, diminuição do oxigénio dissolvido e alteração de ph) que se verificam na grande maioria de albufeiras, tornam estas áreas impróprias como habitat desta espécie, que nunca foi encontrada em regime lêntico. Provocam também fragmentação do habitat, separando uma população em pequenos fragmentos que muitas vezes não subsistem isolados. As barragens e açudes restringem frequentemente a maioria das trutas a montante das mesmas, levando à extinção de M. margaritifera a jusante. A regularização de sistemas hídricos - nomeadamente através da transformação dos cursos de água em valas artificiais com a uniformização do substrato, no intuito de melhorar o escoamento hídrico leva à modificação drástica do leito do rio, à destruição total da mata ripícola e da vegetação aquática e à reestruturação artificial das margens, provocando a homogeneização do habitat, eliminando a alternância das zonas de remanso e de rápidos, essenciais para a sobrevivência dos bivalves e para o refúgio, reprodução e alimentação dos peixes hospedeiros das suas larvas. O desaparecimento dos hospedeiros das larvas de M. margaritifera, os membros da família Salmonidae, nomeadamente Salmo salar e Salmo trutta fario. As alterações do habitat dos hospedeiros funcionam como ameaça também para M. margaritifera (Araújo e Ramos, 2001). De referir que, em muitos países europeus, esta é a principal ameaça à espécie, pelo que tudo o que afecte os salmonídeos afecta M. margaritifera. Quando da extracção de materiais inertes, os bivalves, que se enterram na areia, são removidos, podendo ser destruída toda uma população. Pelas alterações da morfologia do leito do rio e destruição da vegetação ripícola que esta actividade implica, são igualmente afectados os peixes hospedeiros, no que respeita ao abrigo, alimentação e desova, sendo particularmente grave se efectuada nas zonas e épocas de desova da espécie. Durante os trabalhos de extracção há ainda um elevado aumento da turbidez da água num troço considerável a jusante, o que pode causar mortalidades importantes na ictiofauna, por provocar a asfixia dos peixes (devido à deposição de partículas nas guelras) e a colmatação das suas posturas. O aumento da turbidez é também responsável pela deposição de sedimentos finos que colmatam o substrato, impedindo o desenvolvimento dos bivalves juvenis. A introdução de espécies exóticas de peixes restringe o número de espécies autóctones, hospedeiros das larvas de M. margaritifera (Araujo & Ramos 2001). As espécies exóticas de lagostim alimentamse dos estádios juvenis e adultos jovens desta espécie, e as espécies exóticas de bivalves competem directamente com M. margaritifera. 3

Objectivos de Conservação: Manter os efectivos das populações estáveis (Mente, Rabaçal e Tuela) Incrementar os efectivos das populações dos rios Cávado, Neiva e Paiva Reintroduzir a espécie nos rios onde já foi conhecida (Ferreira, Sousa, Tâmega, Douro, Ul) Aumentar a área de ocupação actual Manter a qualidade do Habitat dos rios Mente, Rabaçal e Tuela. Recuperar o habitat dos restantes cursos de água: Assegurar habitat de alimentação Assegurar habitat de reprodução Orientações de gestão: Importa salientar que, dada a dependência da espécie, na sua fase larvar, de hospedeiros piscícolas, qualquer intervenção sobre estes últimos tem grande influência sobre as populações de M. margaritifera. Melhorar a eficiência de transposição de barragens e açudes já construídos, através da colocação de passagens adequadas para os salmonídeos, hospedeiros da M. margaritifera, e manutenção do caudal ecológico. Sempre que possível, recorrer a outras alternativas à construção de novas barragens e açudes, tais como a exploração de aquíferos. Nos casos em que a sua construção seja imprescindível, deverá optarse por soluções que induzam uma menor alteração dos habitats naturais - nomeadamente através da redução das dimensões dos diques e respectivas albufeiras e da implementação de sistemas de passagem para a fauna - diminuindo, assim, a possibilidade de ocorrência de isolamentos populacionais. Assegurar o caudal dos cursos de água adequado às necessidades ecológicas da espécie e dos seus hospedeiros e que respeite as variações naturais dos regimes hidrológicos. Condicionar a regularização dos sistemas hídricos em toda a área de ocorrência da espécie e restaurar as condições originais dos rios onde a espécie já existiu. Manter ou melhorar (consoante as áreas em causa) a qualidade da água a um nível favorável à conservação da espécie (não existindo informação específica relativa aos limites dos vários parâmetros físico-químicos da água tolerados pela espécie, poderão considerar-se como valores de referência os limites previstos nas Normas de qualidade aplicáveis às águas piscícolas, mais concretamente às águas dos salmonídeos, de acordo com o disposto no Decreto-Lei nº 236/98, de 1 de Agosto ). Restringir o uso de agro-químicos, adoptando técnicas alternativas, como a protecção integrada e outros métodos biológicos, em áreas contíguas ao habitat da espécie. Melhorar a eficácia de fiscalização sobre a emissão de efluentes, garantindo o cumprimento da legislação. Monitorizar a qualidade da água, articulando com outras monitorizações já existentes 1. Implementar um programa de reforço das populações samonícolas (trutas e salmões), hospedeiros da espécie, em todos os rios mencionados. Os esforços de conservação da M. margaritifera de nada valem se não se conservar também os hospedeiros das suas larvas. 1 O Decreto-Lei nº 236/98 de 1 de Agosto, Anexo XI, refere amostragens mensais para diferentes parâmetros físico-químicos, à excepção da temperatura, que é semanal. No entanto, a rede de monitorização instalada poderá não ser a mais apropriada para esta espécie. 4

Interditar a extracção de inertes, em qualquer época do ano, em toda a área de ocorrência da espécie. Na medida em que esta actividade também afecta os peixes hospedeiros, deverá ser proibida nos locais conhecidos e/ou com grande probabilidade de coincidirem com áreas de reprodução, em qualquer época do ano. Nos locais em que se venha a autorizar a extracção 2, esta deverá ser efectuada fora das épocas de migração e desova (Março a Julho). Não destruir a vegetação marginal nem o equilíbrio hidrológico do curso de água aquando das intervenções. Evitar a afectação de troços com uma vegetação ripícola bem desenvolvida e das duas margens em simultâneo. Prever a recuperação das áreas intervencionadas logo após desactivação da exploração e/ou paralelamente à evolução espacial da exploração. Reforçar a fiscalização, de forma a garantir o cumprimento destas orientações. Controlar introduções furtivas de espécies animais não autóctones, através de educação ambiental e fiscalização. Reforçar os meios humanos, nomeadamente com estabelecimento de parcerias entre DGF, GNR e ICN, em especial no interior de Áreas Classificadas. Controlar ou erradicar as populações das espécies já introduzidas 3. Definir zonas de protecção para a M. margaritifera em Portugal, atendendo a que alguns núcleos populacionais são essenciais à sobrevivência de toda a população. Planificar programas de recuperação de populações criticamente ameaçadas, acção que terá de ser equacionada a curto prazo para M. margaritifera no Rio Cávado. Activar um programa de reintrodução de M. margaritifera nos rios Ferreira, Sousa, Tâmega, Douro e Ul, onde a espécie já foi conhecida, após restaurado o habitat. Ter em atenção as áreas de distribuição da espécie quando da elaboração dos estudos de impacto ambiental. Fiscalizar o cumprimento das medidas de minimização e compensação previstas nas avaliações de EIA. Informar e sensibilizar o público para a conservação da espécie e do meio que a suporta. Desenvolver campanhas de sensibilização e educação ambiental para diferentes grupos-alvo, nomeadamente pescadores profissionais, desportivos e público em geral. Aprofundar os conhecimentos relativos às distribuições, biologia e ecologia da espécie. Em particular, é necessário conhecer o ciclo de vida da espécie, incluindo longevidade, taxas de crescimento, taxas fisiológicas, fecundidades, frequência de reprodução, taxa de sobrevivência das larvas, taxa de recrutamento, valências ecológicas, entre outros. Monitorizar anualmente populações chave (Rio Neiva troço Balugães; Cávado entre a barragem do Alto Cávado e a albufeira da Paradela; Rabaçal e Tuela - toda a extensão; Rio Paiva Castro Daire), recolhendo dados sobre as condições do habitat e estrutura da população, para avaliar o seu potencial reprodutivo. Outra informação relevante: Reis (2004) analisa as tendências populacionais nos últimos 100 anos, referindo quais as populações extintas e suas prováveis causas (Rio Cávado, subsistindo somente num pequeno troço a montante; Rios Sousa e Ferreira, Tâmega, Douro, jusante do Paiva, Ul). 2 Segundo o Decreto-Lei nº 46/94, de 22 de Fevereiro, art. 50º a 54º, até a DRAOT (agora CCDR) elaborar um plano de extracções de inertes, estas são proibidas; o Despacho Normativo 14/2003, de 14 de Março, apresenta as normas técnicas mínimas para a elaboração de um plano específico de gestão de extracção de inertes em domínio hídrico. 3 O Decreto-Lei nº 565/99, de 21 de Dezembro, prevê a existência de um Plano Nacional com vista ao controle ou erradicação das espécies não indígenas invasoras já introduzidas na Natureza. 5

Ainda segundo Reis (2004), para Margaritifera margaritifera existem suficientes sítios classificados para a sua conservação, sendo apenas conveniente alargar os limites de alguns sítios de forma a albergar toda a população é o caso dos Rios Rabaçal e Tuela. Bibliografia: Araujo R & Ramos A (2001). Actions Plans for Margaritifera auricularia and Margaritifera margaritifera in Europe. Nature and Environment No.117. Council of Europe Bauer G (1986). The status of the Freshwater Pearl Mussel Margaritifera margaritifera L. in the South of its European Range. Biological Conservation, 38: 1-9. IUCN 2004. 2004 IUCN Red List of Threatened Species. http://www.redlist.org, acedido em 14.01.05. MED - Ministére de l Écologie et du Développement (2004). Natura 2000. Espèces animales. http://natura2000.environnement.gouv.fr/habitats/cahiers7.html. Nobre A (1941). Fauna malacológica de Portugal II. Moluscos terrestres e fluviais. Mem. Est. Mus. Zool. Univ. Coimbra, 124: 1-278. Quesada CN (coordenador del Seminario) (1999). Informe preliminar sobre la situación de la Madreperla de río (Margaritifera margaritifera) en España. Seminario sobre Conservación de Margaritifera margaritifera y Galemys pyrenaicus en la Península Ibérica. Pola de Somiedo (Asturias, España), 6-8 Mayo 1999. Reis J (2002). Bivalves de água doce em Portugal. Inventariação e Estado de Conservação. Relatório final de estágio. Instituto da Conservação da Natureza. Reis J (2003a). The freshwater pearl mussel Margaritifera margaritifera (L.) (Unionoida: Bivalvia) rediscovered in Portugal and threats to its survival. Biological Conservation 114 (3): 447-452. Reis J (2003b). Live populations of the threatened freshwater pearl mussel Margaritifera margaritifera found in Portugal. Ecologia Mediterranea, 29 (1): 114-115. Reis J (2004). Atlas dos Bivalves de água doce de Portugal Continental. Relatório final. Projecto Documentos Estruturantes financiado pelo POA 1.100021. Instituto da Conservação da Natureza. Wells SM & Chatfield JE (1992). Threatened non-marine molluscs of Europe. Nature and Environment, nº 64. Council of Europe Press. Woodward FR (1996). Margaritifera margaritifera (Linnaeus, 1758). In: Background information on vertebrates of the Habitats Directive and the Bern Convention. Part III Mollusca and Echinodermata. Pp. 501-510. Helsdingen PJ, Willemse L & Speight MCD (eds). Nature and Environment, nº 81. Council of Europe. 6