A PRÁTICA DA LEITURA E DA ESCRITA ATRAVÉS DE GÊNEROS TEXTUAIS Andreia Rezende Garcia Reis* 1 Resumo: Este texto é um relato de experiência referente à prática de leitura e escrita de textos nas aulas de Língua Portuguesa nas turmas da segunda fase do Ensino Fundamental. Tem como objetivo relatar, aos professores e demais interessados pelo assunto, uma experiência no trabalho com leitura e produção de textos orais e escritos na escola. Aborda atividades desenvolvidas a partir das concepções de letramento, de acordo com a proposta de Magda Soares (2004), e de gêneros textuais, segundo Marcuschi (2001), as quais objetivam construir juntamente com os alunos um significado para as aulas de língua portuguesa na escola, significado esse diretamente relacionado ao interesse e a vida dos discentes. A partir dessas atividades, espera-se que os alunos adquiram o prazer e o hábito pela leitura e pela escrita, como forma de participação na sociedade em que vivem, além do desenvolvimento de novas habilidades. Durante o texto, o leitor entenderá o porquê da preocupação com o sentido dado tanto pelo professor quanto pelos alunos às aulas de português na escola, preocupação que surgiu com a dificuldade de despertar o interesse dos alunos pelas aulas e também com os altos índices de fracasso e falta de habilidade em expressar-se através da escrita ou oralmente nos vários contextos sociais. Palavras-chave: Letramento. Gêneros textuais. Oralidade. Atualmente compartilhamos de discussões acerca do ensino de língua materna no nosso caso a língua portuguesa em várias instâncias da sociedade. Todos querem opinar ou indagar aos professores de português sobre o que vem ocorrendo nas aulas dessa disciplina, já que a mídia vem mostrando cada vez mais alunos com dificuldades sérias para compreender e escrever textos. Participamos de muitos congressos, oficinas, grupos de estudo, bancas de monografias, conversas informais com professores interessados no assunto, mas, no entanto observamos poucos resultados concretos nas salas de aula e nas atividades desenvolvidas pelos alunos no Ensino Fundamental. Eu, como professora de língua portuguesa na Rede Municipal de Educação, atualmente na Escola Municipal Menelick de Carvalho e também docente do Curso Normal Superior da Faculdade Metodista Granbery, tenho tido a preocupação, tanto com meus alunos diretos, quanto com meus alunos que serão futuros professores de língua materna nas séries iniciais do Ensino * Mestra em Lingüística pela UFJF, professora de Língua Portuguesa da Escola Municipal Menelick de Carvalho e da Faculdade Metodista Granbery.
Fundamental; de levá-los não somente a ler e escrever textos, mas muito mais do que isso, de construir um significado, um motivo concreto para as aulas de língua portuguesa na escola. Qual seria então esse sentido que procuramos dar às atividades realizadas nas aulas? A busca desse sentido é que me levou a repensar as aulas, a discutir com os alunos sua serventia, a ler mais sobre o assunto e a tentar mudar o quadro hoje existente com relação ao ensino de língua portuguesa. O caminho que venho trilhando está atrelado às concepções de letramento e gêneros textuais, caminho esse orientado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCNLP). Esses parâmetros, amplamente distribuídos pelo Governo Federal a partir 1997, trazem os objetivos gerais do Ensino Fundamental e também os objetivos do ensino de língua portuguesa para a mesma fase de ensino. 2 Ao lê-los com atenção, podemos observar a preocupação com o uso efetivo da linguagem nos mais diferentes contextos sociais aos quais estamos ligados, uso esse que muitas vezes só terá chances de ocorrer dentro da escola, uma vez que nossos alunos podem não ter contato, principalmente com a língua escrita, nos contextos sociais que estão inseridos. Quando ampliamos nossa visão de linguagem e trabalhamos com a perspectiva do letramento (Magda Soares, 2004), logo associamos essa perspectiva aos gêneros textuais. De acordo com Marcuschi (2001) o gênero é uma forma textual concretamente realizada e encontrada como texto empírico, materializado. O gênero tem existência concreta expressa em designações diversas, constituindo, em princípio, conjuntos abertos. Eis a grande importância de pautarmos nossas aulas nos gêneros textuais: serem eles textos concretos e autênticos nos quais podemos delimitar o autor, os objetivos pretendidos, os possíveis leitores, enfim, suas características originais podem ser recuperadas e vão contribuir para uma melhor relação entre o texto e os alunos em contato com ele. Foi buscando cumprir os objetivos estabelecidos nos PCNLP e acreditando na proposta do letramento trabalhado através dos gêneros textuais que iniciei meu trabalho com os alunos de 6ª, 7ª e 8ª séries do Ensino Fundamental, ou 1ª, 2ª e 3ª etapas do terceiro ciclo, no caso das escolas organizadas em ciclos de formação. 3 2 Não cito aqui os objetivos por não achar necessário, uma vez que podemos encontrá-los no material referido. 3 Cito especificamente as três séries ou etapas, pois são as turmas com as quais trabalhei ou trabalho atualmente.
Como o objetivo deste texto é relatar uma experiência nas aulas de língua portuguesa, irei agora contar como se concretizam efetivamente as atividades realizadas sob a perspectiva apontada acima. Inicialmente, faz-se necessário conhecer um pouco da turma, do que os alunos gostam, sobre o que conversam, suas preferências musicais e esportivas, onde moram e etc. Munidos dessas informações, teremos condições de levar até eles temas mais voltados aos seus interesses; não nos limitando apenas em assuntos já conhecidos por eles, mas aproveitando seus conhecimentos prévios para avançar e despertar o interesse de todos. Após esse primeiro momento, precisamos fazer uma busca pelos assuntos elegidos e, através dos assuntos, buscarmos textos dos mais variados gêneros para que possamos começar o trabalho. 4 Ao escolhermos um tema e um ou mais textos relacionados a ele, precisamos verificar o gênero textual, o autor, os objetivos pretendidos ao escrever, a que público alvo o texto é direcionado, quais os objetivos pretendidos pelo autor, suas características de composição e formatação, etc, pois todos esses pontos deverão ser discutidos com os alunos nas atividades em sala. Quando chegar o momento de iniciar o trabalho na sala, antes de distribuir o texto, é preciso conversar com os alunos a respeito do assunto (conversa que pode variar de intensidade, uma vez que talvez o tema já tenha sido abordado, quando o professor estava conhecendo os alunos ou em outro momento), se já sabem algo específico, ao tratar de uma reportagem por exemplo, algum aluno pode tê-la assistido em outro meio de comunicação. Depois de distribuir o texto, é interessante que os alunos levantem hipóteses do que será lido, qual poderá ser o gênero, onde o texto foi publicado, qual o tipo de linguagem que será utilizada, etc. Este momento é de fundamental importância para a compreensão futura do texto, para o desenvolvimento da oralidade e para despertar o interesse daqueles mais desinteressados. O professor deve aceitar todas as inferências feitas pelos alunos como possibilidades de acerto, pedindo que eles justifiquem as hipóteses levantadas e argumentem a favor de suas opiniões, aproveitando também para solucionar alguma dúvida e levantar as dificuldades apresentadas pela classe. Finalmente pode ser feita a leitura do texto, variando sua forma, um dia ela poderá ser realizada pelo professor e acompanhada pelos alunos, outro dia os alunos podem ler individual e 4 Quando me refiro a textos, pretendo dizer que podem ser escolhidos textos escritos, orais, como também filmes, músicas, cartazes, fotos, gravuras e outros.
silenciosamente, em outro momento podem fazer uma leitura coletiva em voz alta, enfim, é importante variar o modo de realização desta atividade para que todos tenham a oportunidade de participar da forma que mais gostam. Depois de lido o texto, assistido ao filme ou interpretado a figura ou foto, se for o caso, deve-se fazer uma interpretação oral do mesmo, comparando com as inferências feitas, tirando possíveis dúvidas de compreensão e coletivamente construir interpretações para o que foi lido, visto ou escutado. Novamente, este é um momento em que o professor deverá estar atento para trabalhar a linguagem oral, pois muitas questões podem surgir, dependendo do tema abordado e do interesse dos alunos. Também neste momento pode ser discutido o gênero do texto, levantando suas características, que podem ser escritas no quadro após serem ditas pelos alunos. É também uma ocasião adequada para discutirmos a linguagem do texto, se esta apresenta-se no português padrão, se é mais formal ou menos formal, se os alunos têm alguma dificuldade de compreensão do vocabulário, enfim, são discussões que devem partir da linguagem oral e podem ser sistematizadas no quadro ou através de algum material escrito para os alunos, pois dependendo da idade, do envolvimento ou do interesse, eles podem não estar devidamente atentos à discussão e não conseguirem organizar essas informações, de forma que construam conhecimento e tenham condições de apreender o que está sendo tratado. Ao esgotar todas as discussões a respeito do material trabalhado, o professor poderá propor atividades escritas de compreensão, de reflexão sobre a língua (questões gramaticais referentes ao texto), dentre outras, de acordo com os objetivos previamente estabelecidos. Depois de mais essa etapa, poderá ser elaborado um texto oral ou escrito pelos alunos, dentro de algum gênero já discutido em sala e com as orientações do professor. Esse texto poderá servir para compor um mural na escola, ser publicado num jornal da comunidade ou jornal da própria escola. É importante que os textos dos alunos têm leitores de fato, como aqueles textos lidos e trabalhados por eles no início da atividade, para que tenham maior interesse e comprometimento ao fazê-los. Normalmente, gosto de trabalhar um tema com mais de um gênero textual, pois dá aos alunos a dimensão de que um assunto pode ser abordado sob diferentes perspectivas, ter diferentes opiniões e chegar até aos leitores através de portadores de textos diferenciados. Gostaria de concluir este relato dizendo da eficácia deste trabalho, que realmente vem dando resultados e motivando os alunos a terem contato com a leitura na escola. Desta forma, os alunos podem estabelecer sentido para as aulas de português no ambiente escolar, associando os temas discutidos e as atividades desenvolvidas com sua vida fora da escola, sentido muitas vezes
perdido por muitos deles e também incentivá-los na busca de outros textos, de seus vários portadores, praticando assim a leitura e a escrita de modo significativo, deixando de lado a prática mecânica dessas atividades. Referências Bibliográficas BAGNO, Marcos. Preconceito Lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2004. Língua Materna: letramento, variação e ensino. São Paulo: Parábola, 2002. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa. Brasília: MEC, 1997. MARCUSCHI, Luiz Antonio. Letramento e Oralidade no contexto das práticas sociais e eventos comunicativos. In: SIGNORINI, Inês. Investigando a relação oral/escrito e as teorias de Letramento. Campinas: Mercado das letras, 2001. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. Email para contato: andreirgarcia@yahoo.com.br